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Ocampo dos transtornos alimentares (TA) tem pas

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Rev Bras Psiquiatr 2002;24(Supl III):1-2

O

campo dos transtornos alimentares (TA) tem pas sado por um rápido desenvolvimento nas últimas décadas. Este fenômeno é “espantoso” se consi-derarmos que a bulimia nervosa, a “segunda grande síndro-me” deste grupo, emergiu como um diagnóstico isolado so-mente em 1979. Podemos observar um interesse cada vez mai-or dos clínicos, pesquisadmai-ores e até do público em geral em relação a este grupo nosológico. Este interesse tem se refleti-do em um número crescente de publicações sobre vários as-pectos dos transtornos, fornecendo novas perspectivas e ampliando sua compreensão.

Vários mitos relacionados aos transtornos alimentares têm sido questionados. Eles são mais freqüentes do que podería-mos imaginar, se levarpodería-mos em consideração que formas sub-clínicas são mais observadas do que as síndromes completas. Ocorrem também no sexo masculino, assim como em indivídu-os de todas as classes socioeconômicas. Muito embora sejam reconhecidos como condições clínicas graves, associados a uma alta taxa de morbidade e mortalidade, se distribuem como num spectrum que vai de formas agudas até formas crônicas e, não devem ser considerados a priori como possuindo uma natureza inexoravelmente crônica. Entretanto, apesar dos avan-ços nesta área, os transtornos alimentares ainda representam um desafio aos clínicos e pesquisadores por sua natureza sindrômica, não completamente esclarecida do ponto de vista etiológico. A identificação recente de novas síndromes, como o Transtorno da Compulsão Alimentar Periódica (Binge-Eating Disorder), estimula ainda mais os questionamentos no terre-no da terre-nosologia dos transtorterre-nos alimentares. Além disso, apesar de não ser considerada um transtorno alimentar, vários aspectos da obesidade mostram-se relacionados de alguma forma com os TA. A pesquisa clínica deve se ocupar das lacu-nas no atual conhecimento para conduzir-nos à descoberta de terapêuticas mais eficazes.

O tratamento dos pacientes com transtornos alimentares tem melhorado em função de uma maior sistematização e padroniza-ção de condutas terapêuticas baseadas em evidências. Os pro-fissionais envolvidos no cuidado de pacientes com transtor-nos alimentares já contam com algoritmos para seu tratamento.

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Transtornos alimentares

ranstornos alimentares

ranstornos alimentares

ranstornos alimentares

ranstornos alimentares

Eating disorders

Eating disorders

Eating disorders

Eating disorders

Eating disorders

O Guia Prático para Tratamento de Pacientes com Transtornos Alimentares, da Associação Americana de Psiquiatria, já em sua segunda edição e os Algoritmos para Tratamento de Paci-entes com Transtornos Alimentares do Real Colégio de Psiqui-atras da Austrália e Nova Zelândia são exemplos destas inicia-tivas de normatização terapêutica. Estes manuais abordam vári-os aspectvári-os específicvári-os no manejo de pacientes com transtor-nos alimentares como, por exemplo, a necessidade de uma equi-pe multiprofissional, a identificação do melhor local para o tra-tamento (de acordo com os diferentes níveis de gravidade na apresentação clínica), as diversas abordagens psicoterápicas, farmacológicas e nutricionais indicadas e o acompanhamento e as intervenções recomendadas para as complicações clínicas e psiquiátricas associadas.

No Brasil a área dos transtornos alimentares também tem tido destaque crescente, derrubando mais um dos antigos precon-ceitos acerca da inexistência de tais quadros em países em de-senvolvimento. Na última década, observamos o surgimento e o crescimento de grupos dedicados ao atendimento e à pesqui-sa de pacientes com transtornos alimentares em várias cidades brasileiras, possibilitando a formação de profissionais com ha-bilitação mais específica. Houve também o desenvolvimento de uma produção científica nacional sobre o assunto, com uma crescente melhora em sua qualidade. Contamos também com um evento nacional multidisciplinar que reúne, a cada dois anos, os profissionais especializados e interessados pela área, o “En-contro Brasileiro de Transtornos Alimentares e Obesidade”, cuja quinta edição ocorrerá em junho de 2003 na cidade de Gramado, no Rio Grande do Sul.

É com grande satisfação que apresentamos este Suplemento da Revista Brasileira de Psiquiatria, dedicado aos transtornos alimentares. O seu objetivo principal é fornecer para os profis-sionais de saúde mental envolvidos com a prática clínica, um conjunto amplo de informações atualizadas sobre vários temas relacionados aos transtornos alimentares. Para tal, convidamos um conjunto de profissionais diretamente envolvidos com pes-quisa e atendimento a pacientes com transtornos alimentares no Brasil. Muitos dos artigos aqui publicados expressam resul-tados de projetos de pesquisa, teses de mestrado e de

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Transtornos alimentares Appolinario JC et al.

do dos autores em questão. Acreditamos que as informações aqui apresentadas reflitam os mais recentes avanços nessa área do conhecimento acrescidas da experiência dos profissionais envolvidos na preparação de cada artigo.

Por fim, gostaríamos de agradecer a participação de nossos convidados internacionais, que prontamente aceitaram em co-laborar com esta edição, particularmente os doutores Michael J. Devlin e Phillipa Hay. O Dr. Michael J. Devlin é professor associado de Psiquiatria Clínica da Universidade de Columbia, em Nova Iorque. O Dr. Devlin é considerado um importante pesquisador em transtornos alimentares, com inúmeros arti-gos publicados. Sua principal área de estudo envolve o trata-mento do transtorno da compulsão alimentar periódica. A Dra. Phillippa Hay é um outro nome bastante reconhecido nesta área. Ela é professora do Departamento de Psiquiatria da Uni-versidade de Adelaide na Austrália. A Dra. Hay tem especial

interesse pelas áreas de epidemiologia e medicina baseada em evidências, apresentando uma vasta produção científica so-bre estes assuntos.

Jose Carlos Appolinario

Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Instituto Estadual de Diabetes e Endocrinologia do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ, Brasil

Taki Athanássios Cordás

Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Departamento de Psiquiatria da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil

Angélica Medeiros Claudino

Departamento de Psiquiatria da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil

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Transtornos alimentares: fundamentos

ranstornos alimentares: fundamentos

ranstornos alimentares: fundamentos

ranstornos alimentares: fundamentos

ranstornos alimentares: fundamentos

históricos

históricos

históricos

históricos

históricos

Eating disorders: historical background

Eating disorders: historical background

Eating disorders: historical background

Eating disorders: historical background

Eating disorders: historical background

Táki Athanássios Cordás

a

e Angélica de Medeiros Claudino

b

aAmbulatório de Bulimia e Transtornos Alimentares do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de

São Paulo. Departamento de Psiquiatria da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil. bPrograma de Orientação e Assistência aos Transtornos

Alimentares do Departamento de Psiquiatria da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil

Resumo Descritores

Abstract Keywords

Os autores fazem uma breve revisão dos aspectos históricos dos transtornos alimentares. Possíveis correlações psicopatológicas com os conceitos diagnósticos atuais são discutidas.

Anorexia nervosa. Bulimia nervosa. História.

The authors make a brief review of the historical aspects of eating disorders. Possible correlations with modern psychopathological aspects are commented.

Anorexia nervosa. Bulimia nervosa. History.

Introdução

Os transtornos alimentares são freqüentemente considera-dos quadros clínicos ligaconsidera-dos à modernidade, na medida que ao avanço da mídia nas últimas décadas tem se dado papel de relevância quase casual.

Uma breve revisão histórica evidencia a existência dessas patologias ao longo do tempo e retoma a velha discussão psicopatológica do essencial e do acessório, do patogenético e do patoplástico, enfim das relações entre a doença e a cultura.

Anorexia Nervosa

Etimologicamente, o termo anorexia deriva do grego “an-”, deficiência ou ausência de, e “orexis”, apetite. Também signifi-cando aversão à comida, enjôo do estômago ou inapetência, as primeiras referências a essa condição surgem com o termo fastidium em fontes latinas da época de Cícero (106-43 aC.) e vários textos do século XVI. Já a denominação mais específica “anorexia nervosa” surgiu com William Gull a partir de 1873, referindo-se à “forma peculiar de doença que afeta principal-mente mulheres jovens e caracteriza-se por emagrecimento extremo[...]” cuja “falta de apetite é [...]decorrente de um es-tado mental mórbido e não a qualquer disfunção gástri-ca[...]”.1 Atualmente o termo “anorexia” não é utilizado em seu

sentido etimológico para a “anorexia nervosa”, visto que tais pacientes não apresentam real perda de apetite até estágios mais avançados da doença, mas sim uma recusa alimentar deli-berada, com intuito de emagrecer ou por medo de engordar.2

Durante a idade média, as práticas de jejum foram compre-endidas como estados de possessão demoníaca ou milagres divinos. Em seu livro “Holy Anorexia”, Bell3 (1985) relata o

comportamento anoréxico realizado por 260 santas italianas (que teriam vivido entre 1200 e 1600) aparentemente em res-posta à estrutura social patriarcal a qual estavam submetidas, e conhecido como “anorexia sagrada”. Pela supressão de ne-cessidades físicas e sensações básicas (como cansaço, im-pulso sexual, fome e dor) elas pareciam liberar o corpo e alcan-çar metas espirituais superiores, porém às crenças religiosas pareciam se misturar a outras intenções das jovens, como a perda dos atrativos femininos. Bastante conhecido é o caso de Santa Catarina de Siena que aos 15 anos, após a morte de sua irmã (parturiente) e diante de projetos futuros de casa-mento, iniciou restrição alimentar, preces e práticas de auto-flagelamento, chegando a induzir vômito através de ervas e galhos na garganta quando forçada a alimentar-se. Catarina havia feito um voto de castidade quando ainda era criança. A inanição haveria gerado um estado psicológico de constante vigília e experiências místicas, vindo a falecer de desnutrição aos 32 anos.

Embora não se possa afirmar que a atual concepção de anorexia nervosa esteja relacionada aos casos de “anorexia sa-grada”, em virtude de documentação falha e incerteza quanto às reais motivações, sentimentos e crenças das santas, alguns paralelos são evidentes: ambas não toleram as conseqüências do “comer”, ambas representam “estados ideais” (beatitude na

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Itália medieval e magreza no ocidente atual) e evitação da sexu-alidade, do egoísmo e do alimento. Em ambos os quadros se descrevem excesso de atividades, perfeccionismo, constante vigilância, desinteresse por relacionamentos comuns, auto-su-ficiência e preferência por cuidar dos outros ao invés de serem cuidadas.

Morton é o autor do primeiro relato médico de anorexia ner-vosa de 1689, em livro sobre doenças consumptivas, no qual descreve dois casos de “consumpção de origem nervosa”. O autor comenta sobre a influência mútua entre processos men-tais e físicos e ressalta o papel patogênico das emoções. Estes quadros não eram acompanhados de febre ou dispnéia, mas caracterizavam-se pela diminuição do apetite, amenorréia, aver-são à comida, obstipação, emagrecimento extremo e hipe-ratividade. O autor se mostra intrigado pela indiferença caracte-rística que essas pacientes denotam em relação a seu estado de desnutrição e pela preservação de suas faculdades mentais básicas.4

Vários relatos médicos estão descritos na literatura desde então, porém sem receberem a atenção merecida, como o traba-lho publicado em 1860, em Paris, por Louis-Victor Marcé intitulado “Note sur une forme de délire hypochondriaque consécutive aux dyspepsies et caracterisée principalement par le refus d’aliments”.5 É ainda na segunda metade do século

XIX que a anorexia nervosa emerge como uma entidade clínica independente, com sintomatologia e patogenia distintas, com os relatos quase que simultâneos em 1873, do médico inglês Gull e do psiquiatra francês Lasègue. Gull parece receber certa prioridade na literatura médica pelo fato de ter feito rápida refe-rência à “Apepsia Histérica” em uma conferefe-rência anual da “British Medical Association” em 1868.6

Esta referência, no entanto, passou despercebida por cinco anos até que em abril de 1873, Lasègue publica o artigo “De l’anorexie hystérique”, uma contribuição à nosologia dos “dis-túrbios dos órgãos digestivos que ocorrem no curso da histe-ria”. O psiquiatra descreve neste artigo os achados clínicos de oito pacientes, de 18 a 32 anos de idade, e ressalta a origem psíquica (causa primária) dessa doença: focaliza a fenomenologia distinta da anorexia histérica na crença mórbida de que o ali-mento é lesivo e deve ser evitado. Ele identifica ainda outras características psicopatológicas relativas a inseguranças pes-soais e busca por aprovação, e ressalta a contribuição familiar para manutenção dos sintomas.

Em outubro de 1873, Gull apresenta o tema “Anorexia Nervo-sa” para a “Clinical Society of London”, publicado apenas em 1874. O médico descreve três casos referindo que o quadro costuma ocorrer em mulheres entre os 16 e 23 anos e ocasional-mente em homens da mesma faixa etária. Em sua descrição, Gull7

(1874) se volta mais para os achados clínicos decorrentes da inanição prolongada, tais como a caquexia, a perda de apetite, a amenorréia, a constipação e a diminuição dos sinais vitais, em-bora também aponte o componente psicológico (sem, no en-tanto, priorizá-lo) e indique a necessidade de que o responsá-vel pelo tratamento assuma uma postura moral mais autoritária perante a paciente.

É provável que Charcot tenha sido o primeiro a detectar, por

volta de 1889, o aspecto psicopatológico central que motivava as mulheres anoréticas a jejuar: a “idée fixe d’obesité” ou fobia de peso.8 Outros médicos franceses teriam feito referências ao

medo de engordar na época, aspecto que não teria ocorrido em países de língua anglo-saxônica antes da virada do século. Em 1903 Janet descreve o caso de uma moça de 22 anos (Nadia), como “anorexia mental”. Durante as consultas não parava de perguntar: “M’avez vous trouvée aussi maigre que les autres fois? Faite moi le plaisir de me dire que je serais toujours maigre” (Você acredita que eu estou tão magra quanto da últi-ma vez? Por favor, diga-me que serei sempre últi-magra).

Assim como Nadia, que apresentava vergonha e aversão ao corpo feminino, na anorexia, o desejo de emagrecer relaciona-va-se à tentativa de retardar a maturidade sexual. Janet distin-guiu duas formas de anorexia com base na presença ou ausên-cia de fome: uma obsessiva, na qual a fome estava mantida, e outra, histérica, na qual as pacientes a perdiam.9

A partir de 1914, ocorre uma mudança marcante na compreen-são da anorexia nervosa, que passa a ser vista como uma doen-ça puramente orgânica (somática) quando Simmonds descre-veu um caso fatal de caquexia, no qual a autópsia revelou atrofia do lobo anterior da hipófise. A anorexia nervosa passou a ser confundida com a Doença de Simmonds (hipopituitarismo) com sérias implicações terapêuticas.10

O restabelecimento do conceito clássico de anorexia nervosa só ocorre após, aproximadamente, trinta anos quando Sheehan & Summers11 (1949) apontam que, apesar de existirem sintomas

comuns entre os dois quadros, não havia evidências clínicas de redução da função hipofisária nem anormalidades histológicas significativas da glândula na anorexia nervosa.

Ao longo de sua história, a anorexia nervosa também foi vista como um sintoma inespecífico, passível de manifestação em praticamente todos os diagnósticos psiquiátricos que levem a acentuada perda de peso. Tal concepção provavelmente decor-reu da existência de aspectos inespecíficos presentes em sua psicopatologia tais como alterações cognitivas, afetivas e comportamentais, provocadas pela inanição.12

Outra forma de se conceber a anorexia nervosa foi como vari-ante de outras doenças psiquiátricas, principalmente da histe-ria,13 da esquizofrenia,14 do transtorno obsessivo15 e da doença

afetiva.16

A partir de 1960, o número crescente de pacientes com anorexia nervosa e as tentativas de distinguir diferentes tipos de pacientes com o quadro, parecem ter contribuído para o reconhecimento da doença como síndrome psiquiátrica espe-cífica, com aspectos característicos que a distinguem de ou-tros transtornos. Hilde Bruch trouxe importante contribuição para a compreensão de aspectos psicopatológicos comuns na anorexia nervosa. Esta autora propôs que a psicopatologia central da anorexia nervosa compreendia uma constelação específica de deficiências do ego e da personalidade, consis-tindo em três áreas de perturbação do funcionamento: trans-tornos da imagem corporal; transtrans-tornos na percepção ou in-terpretação de estímulos corporais (como reconhecimento da fome) e uma sensação paralisante de ineficiência que invade todo o pensamento e atividades da paciente.2 Crisp

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conside-Rev Bras Psiquiatr 2002;24(Supl III):3-6 Transtornos alimentares: fundamentos históricos Cordás TA & Claudino AM

rou a anorexia nervosa como “um estado de fobia de peso” no qual as pacientes buscavam evitar as demandas biológicas e psicológicas da puberdade através da manutenção do peso em um nível pré-pubertário.17

Na década de 1970, começam a surgir critérios padronizados para o diagnóstico da anorexia nervosa com base nos distúrbi-os psicobiológicdistúrbi-os e psicopatológicdistúrbi-os, desenvolviddistúrbi-os para atender tanto as necessidades clínicas como as de pesquisa.18,19

De modo geral, os critérios ressaltaram: a perda considerável de peso, a preocupação mórbida com o risco de engordar, altera-ções na percepção corporal e disfunaltera-ções endócrinas (ex. amenorréia), aspectos concebidos como diagnósticos de anorexia nervosa pelos atuais sistemas classificatórios.20,21 Bulimia nervosa

Desde a primeira descrição da Bulimia Nervosa (BN) por Gerald Russell22 (1979), o conhecimento deste quadro como entidade

nosológica distinta tem avançado rapidamente, graças à prolife-ração de grupos de pesquisa em vários países. Este fato é, princi-palmente, reflexo da importância clínica e epidemiológica que a BN vem demonstrando, superando em número de publicações, o interesse pela sua “irmã mais velha”, a Anorexia Nervosa.

A BN é caracterizada, em sua forma típica, pela ingestão com-pulsiva e rápida de grande quantidade de alimento, com pouco ou nenhum prazer, alternada com comportamento dirigido para evitar o ganho de peso (como vomitar, abusar de laxantes e diuréticos ou períodos de restrição alimentar severa) e medo mórbido de engordar.

O vômito auto-induzido é extremamente comum, sendo en-contrado em até 95% dos pacientes, provavelmente pelo seu efeito de redução imediata da ansiedade.23 É interessante

lem-brar que o comportamento de forçar o vômito é muito antigo e pode ser encontrado precocemente na história de diferentes povos da Antiguidade. No antigo Egito, por exemplo, grande parte do papiro de Eber é dedicado ao estímulo e às virtudes do ato de vomitar. Segundo Heródoto, os egípcios vomitavam e usavam purgativos todo mês, por três dias consecutivos, jul-gando que “todas as doenças dos homens são oriundas da comida”. Na medicina grega é sabido que Hipócrates também recomendava a indução de vômitos por dois dias consecutivos todo mês como um método de prevenir diferentes doenças. Os romanos criaram o vomitorium, que lhes permitia alimentar-se em excesso durante os banquetes, e posteriormente vomitar em local reservado para esta finalidade, às vezes usando uma pena de ave para estimular o reflexo do vômito na garganta.

Purgantes eram populares já na Idade Média. De fato junto

com os eméticos (medicamentos para induzir o vômito) domina-ram o arsenal terapêutico por muitos anos, sendo tudo o que um médico podia prescrever na época, prática que foi violenta-mente satirizada por Moliére em suas peças.

O termo bulimia tem uma história muito antiga; deriva do gre-go “bous” (boi) e “limos” (fome), designando assim um apetite tão grande que seria possível a um homem comer um boi, ou quase. Entre os séculos XV e XVIII, diferentes variantes do termo, como os derivados do latim “bulimus” e “bolismos” ou do francês “bolisme”, com o mesmo significado anterior, foram empregados na literatura médica na Inglaterra, França, Alema-nha e Polônia.24

Desde há quase um século, pacientes com Bulimia Nervosa, como o célebre caso Ellen West, descrito por Binswanger, apa-recem na literatura psiquiátrica recebendo outros diagnósticos (“obsessão da vergonha do corpo”, Janet) na ausência de um nome mais apropriado.25 Mas ainda, o caso de Ellen West

apre-senta todo o corolário de sintomas que hoje nos permitiria o diagnóstico, como medo de engordar, marchas exageradas (20-25 milhas por dia), apetite voraz alternando-se com dietas restri-tivas e abuso de tabletes tireoideanos para perder peso.

A sonhadora Ellen, que faz poesias, lê Rilke, Goethe, Tennyson e Mark Twain, apresenta períodos de melancolia, descreve-se como alguém com “compulsão de ter de pensar em comer” e, mesmo internada num dos melhores sanatórios da época, o “Kreuzlinger”, e atendida por Bleuler, a pedido de Binswanger, não obtém qualquer melhora, cometendo o suicídio com ingestão de veneno.

Inicialmente descrito entre pacientes com anorexia nervosa e posteriormente entre obesos (anos 50), em meados da década de 70, pesquisadores identificaram sintomas bulímicos entre mulheres jovens de peso normal.26 A descrição histórica de 30

casos por Russell, em 1979, sugeria que o quadro seria uma estranha evolução da Anorexia Nervosa e, particularmente, do subgrupo dos anoréxicos bulímicos. Essas pacientes possuíam um “impulso irresistível para comer excessivamente”, seguido de vômitos auto-induzidos como forma de purgação e um medo mórbido de engordar. A perda de peso mínima ou ausente, refe-re Russell, caracterizaria os piorefe-res medos das pacientes tornan-do-se realidade.22 Estudos posteriores demonstraram, no

en-tanto, que apenas 20% a 30% dos pacientes bulímicos apresen-tavam, em sua história pregressa, um episódio de anorexia ner-vosa, geralmente de curta duração.27 Nomes diferentes já foram

dados ao quadro, incluindo hiperorexia nervosa, bulimarexia, bulivomia, síndrome do caos alimentar, bulimia e, finalmente, Bulimia Nervosa, termo hoje, de aceitação geral.28

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Correspondência: Táki A. Cordás

Rua Capote Valente, 432, cj. 35 - 05409-001 São Paulo, SP, Brasil

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Critérios diagnósticos para os

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transtornos alimentares: conceitos em

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evolução

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evolução

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Diagnostic criteria for eating disorders:

Diagnostic criteria for eating disorders:

Diagnostic criteria for eating disorders:

Diagnostic criteria for eating disorders:

Diagnostic criteria for eating disorders:

evolving concepts

evolving concepts

evolving concepts

evolving concepts

evolving concepts

Angélica de Medeiros Claudino e Maria Beatriz Ferrari Borges

Programa de Orientação e Assistência aos Transtornos Alimentares do Departamento de Psiquiatria da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil

Introdução

Os transtornos alimentares são síndromes comportamentais cujos critérios diagnósticos têm sido amplamente estudados nos últimos 30 anos. São descritos como transtornos e não como doenças por ainda não se conhecer bem sua etiopatogenia.

Os atuais sistemas classificatórios de transtornos mentais, DSM-IV (Diagnostic and Statistical Manual, IV edition)1 e

CID-10 (Classificação Internacional de Doenças, 10ª edição),2

ressaltam duas entidades nosológicas principais: a Anorexia Nervosa (AN) e a Bulimia Nervosa (BN). Embora classificados separadamente, os dois transtornos acham-se intimamente re-lacionados por apresentarem psicopatologia comum: uma idéia

O presente artigo apresenta o “estado de arte” da discussão acerca dos critérios diagnósticos atuais dos transtornos alimentares: Anorexia Nervosa (AN), Bulimia Nervosa (BN) e Transtorno da Compulsão Alimentar Periódica (TCAP). Dentre os aspectos controversos da AN, destacam-se: a concepção da distorção de imagem corporal, a necessidade da presença de amenorréia para o diagnóstico e a possibilidade de manifestação de AN sem seu aspecto característico, o medo de engordar, em culturas não ocidentalizadas. Quanto à BN, discute-se especialmente a concepção de compulsão alimentar sua freqüência e duração necessárias para o diagnóstico. O artigo apresenta também os critérios sugeridos para o diagnóstico de TCAP e comenta sua difícil distinção com a BN não purgativa. As questões aqui discutidas possibilitarão o aprimoramento da nosologia da área. Anorexia nervosa. Bulimia nervosa. Transtornos alimentares. Diagnóstico. Classificação.

This article presents the “the state of art” of the discussion over the current diagnostic criteria for eating disorders: Anorexia Nervosa (AN), Bulimia Nervosa (BN) and Binge-Eating Disorder (BED). Within the controversial aspects of AN, it is outlined: the conception of body image disturbance, the necessity of amenorrhea fpr the diagnosis and the possibility of AN without its characteristic aspect, the morbid fear of weight, in not Westernized cultures. For BN, it is specially discussed the conception of binge-eating and the frequency and duration of episodes necessary for the diagnosis. The article also presents the suggested criteria for BED diagnosis and comments on its difficult distinction from non-purging BN . The issues here discussed shall improve the nosology in the field.

Anorexia nervosa. Bulimia nervosa. Eating disorders. Diagnosis. Classification.

prevalente envolvendo a preocupação excessiva com o peso e a forma corporal (medo de engordar), que leva as pacientes a se engajarem em dietas extremamente restritivas ou a utilizarem métodos inapropriados para alcançarem o corpo idealizado. Tais pacientes costumam julgar a si mesmas baseando-se quase que exclusivamente em sua aparência física, com a qual se mostram sempre insatisfeitas. Os critérios diagnósticos para AN e BN acham-se descritos na Tabela 1.

Dentre os transtornos alimentares sem outra especificação (TASOE) descritos na Tabela 2, ressaltam-se os quadros atípicos (parciais) de AN e BN, e o transtorno de compulsão alimentar periódica (TCAP). Os quadros atípicos representam

manifesta-Resumo

Descritores

Abstract

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Critérios diagnósticos para TA Claudino AM & Borges MBF

ções mais leves ou incompletas, muito mais freqüentes que as síndromes completas (5:1) e com risco de evoluírem para as mesmas. Sua correlação, tanto com essas quanto com a preocu-pação cultural “normal” com peso e forma, é objeto de discus-são dentro da concepção de possível existência de um “continuum” de preocupação com o peso, no qual as síndro-mes parciais estariam no meio caminho deste espectro.3,4

Ainda entre os TASOE, as classificações citam os quadros de ruminação e pica, mais comuns na infância, a hiperfagia reativa e algumas alterações do comportamento alimentar sem critérios específicos que parecem melhor representar sintomas do que síndromes propriamente ditas (ex. vômitos psicôgenicos).

Em-bora não citada nas classificações, a síndrome do comer notur-no também tem sido alvo de investigações recentes.5

No presente artigo, as autoras discutem os critérios diagnós-ticos atuais para a AN e BN segundo o DSM-IV e CID-10 e os critérios propostos para o TCAP (referidos no apêndice B do DSM-IV), ainda em fase de pesquisa para aprovação como uma nova categoria diagnóstica. Os outros TASOE não serão abor-dados no presente artigo.

Anorexia nervosa

A anorexia nervosa, caracterizada por uma recusa alimentar que leva à caquexia, chegou ao final do século XX, após

di-Critérios diagnósticos do DSM-IV e CID-10 para Anorexia e Bulimia Nervosa

DSM-IV CID-10

Anorexia Nervosa

Perda de peso e recusa em manter o peso dentro da faixa normal Perda de peso e manutenção abaixo do normal (IMC ≤17,5 kg/m2)

(≥85% do esperado)

Medo mórbido de engordar mesmo estando abaixo do peso Perda de peso auto-induzida pela evitação de alimentos que engordam Perturbação na forma de vivenciar o baixo peso, influência indevida do peso Medo de engordar e percepção de estar muito gorda(o)

sobre a auto-avaliação e negação do baixo peso

Amenorréia por 3 ciclos consecutivos Distúrbio endócrino envolvendo o eixo hipotálamo-hipofisário-gonadal (amenorréia) e atraso desenvolvimento puberal

Subtipos: *vômitos auto-induzidos, purgação e uso de inibidores do apetite e/ou 1.restritivo (dieta e exercícios apenas) diuréticos podem estar presentes

2.compulsão periódica/purgativo (presença de episódios de compulsão e/ou purgação além da dieta, exercícios)

Bulimia Nervosa

Episódios recorrentes de compulsão alimentar (excesso alimentar + perda de Episódios recorrentes de hiperfagia (duas vezes/semana por três meses), controle) preocupação persistente com o comer e desejo irresistível de comida Métodos compensatórios para prevenção de ganho de peso: indução de Uso de métodos compensatórios para neutralizar ingestão calórica: vômitos, vômitos, uso de laxantes, diuréticos, enemas, jejum, exercícios excessivos abuso de laxantes, jejuns ou uso de drogas (anorexígenos, hormônios

ou outros tireoidianos ou diuréticos)*

Freqüência dos episódios compulsivos e compensatórios: em média pelo menos Medo de engordar que leva a busca de um peso abaixo do limiar ótimo ou

duas vezes/semana por três meses saudável

Influência indevida do peso/forma corporal sobre a auto-avaliação *diabéticas podem negligenciar o tratamento insulínico (evitando a absorção da glicose sanguínea)

Diagnóstico de AN ausente Subtipos:

1. Purgativo – vômitos induzidos, abuso de laxantes, diuréticos ou enemas 2. Não-purgativo –apenas jejum e exercícios para compensar ingestão calórica

Tabela 1 - Critérios diagnósticos para Anorexia Nervosa e Bulimia Nervosa pelo DSM-IV e pela CID-10.

Tabela 2 - Outros transtornos alimentares e critérios diagnósticos para TCAP.

Transtornos alimentares sem outra especificação

DSM-IV CID-10

1. Preenche critérios para AN exceto amenorréia 1. AN Atípica – um ou mais aspectos-chave da AN está ausente ou tem todos em grau + leve

2. Preenche critérios para AN com perda de peso, mas ainda dentro da 2. BN Atípica – um ou mais aspectos-chave da BN pode estar ausente. Ex. faixa normal Bulimia de peso normal - episódios de hiperfagia e purgação em indivíduos de

peso normal ou excessivo

3. Preenche critérios para BN exceto pela freqüência e cronicidade 3. Hiperfagia associada a outros distúrbios psicológicos (levando a obesidade) 4. Comportamento purgativo após ingestão de pequena quantidade de comida 4. Vômitos associados a outros distúrbios psicológicos

5. Mastiga e cospe fora os alimentos 5. Pica em adultos, perda de apetite psicogênica 6. Transtorno de compulsão alimentar periódica 6. Transtornos alimentares não especificados

Transtorno de Compulsão Alimentar Periódica

Critérios diagnósticos sugeridos pelo DSM-IV (apêndice B)

Episódios recorrentes de compulsão alimentar periódica (excesso alimentar + perda de controle) Comportamentos associados à compulsão alimentar: (pelo menos 3)

1. Comer rapidamente 2. Comer até sentir-se cheio

3. Comer grandes quantidades de comida mesmo sem estar com fome 4. Comer sozinho por embaraço pela quantidade de comida

5. Sentir repulsa por si mesmo, depressão ou demasiada culpa após a compulsão Acentuada angústia pela compulsão alimentar

Freqüência e duração da compulsão alimentar: média de dois dias/semana por seis meses Não se utiliza de métodos compensatórios inadequados (ex. purgação)

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Rev Bras Psiquiatr 2002;24(Supl III):7-12 Critérios diagnósticos para TA Claudino AM & Borges MBF

versas concepções, como síndrome específica com caracte-rísticas clínicas distintas, que se manifestam de maneira se-melhante em diversas regiões do globo.6 Diversos critérios

operacionais foram propostos para AN,7 a maioria deles

en-globando basicamente:

• comportamentos visando a perda de peso e sua manuten-ção abaixo do normal;

• medo de engordar;

• distúrbio de imagem corporal e • distúrbio endócrino (ex. amenorréia).

Embora os critérios diagnósticos da AN não sejam, a princí-pio, alvo de grandes controvérsias, algumas considerações merecem ser feitas. Há certo consenso de que a perda de peso auto-induzida é necessária para o diagnóstico, porém a linha que separa o que seria “minimamente normal” e “abaixo do peso” não é tão clara,8 em parte, em virtude da inexistência de

estudos que identifiquem o momento de instalação dos sinto-mas de inanição. Para padronização tem-se utilizado o Índice de Massa Corpórea (IMC = peso/altura2) <17,5 (critério utilizado

pela CID-10) ou percentual de adequação de peso inferior a 85% (critério utilizado pelo DSM-IV), considerando-se também a situação de pacientes em crescimento que apresentariam fa-lhas em alcançar o ganho de peso esperado para o período.

O medo intenso ou mórbido de engordar representa o aspec-to psicopaaspec-tológico central da anorexia, mantendo-se sem modi-ficações por décadas. Apesar de concebido como o critério que distinguiria a AN de outras síndromes psiquiátricas, alguns autores têm sugerido que diferenças transculturais poderiam levar à existência de AN sem fobia de peso.9 Discute-se se tais

quadros corresponderiam a síndromes atípicas ou a uma trans-formação cultural das características da AN. Outra possibilida-de resipossibilida-de na dificuldapossibilida-de possibilida-de se avaliar tal aspecto em algumas pacientes, que podem esconder o medo de engordar ou mesmo expressar verbalmente o desejo de ganhar peso, e exibir a fobia pelo seu comportamento e não pela palavra.10

Já o distúrbio de percepção corporal tem sido alvo de maior discussão entre os pesquisadores. Esse conceito tem demons-trado sua complexidade por não se ater apenas a avaliações neuroperceptivas do esquema corporal, mas envolver também dimensões afetivas (sentimentos em relação à imagem corpo-ral) e comportamentais (atitudes), dentre outros aspectos.11

Sabe-se que tais distúrbios não são patognomônicos da AN, ocorrendo também em outras patologias e em indivíduos nor-mais (especialmente em jovens e mulheres).12 Por estas razões o

DSM-IV incorporou nesse critério alguns aspectos psicodinâmicos como: a negação da gravidade da perda de peso (negação dos riscos) e a auto-avaliação excessivamente centrada no peso e forma.

A AN envolve também uma disfunção endócrina, especial-mente do eixo hipotalâmico-hipofisário-gonadal, identificada pela amenorréia (mulheres) e perda do interesse e potência se-xual (homens). Em pré-púberes, há retardo do desenvolvimento das características sexuais secundárias. A amenorréia, no en-tanto, permanece como um critério controverso, em risco de exclusão, pois parece contribuir pouco para a definição de caso devido a alguns fatores: a) até 30% das pacientes podem

apre-sentar todo o quadro característico de anorexia sem amenorréia;13

b) 20% a 30% das pacientes apresentam amenorréia antes de haver perda importante de peso;7,14 c) dificuldades em se colher

história menstrual confiável e; d) inexistência de um critério paralelo para homens.15 A manutenção do critério tem se

justi-ficado com base no fato de alertar para o distúrbio endócrino subjacente e suas seqüelas (osteoporose).

Diversos estudos demonstraram que pacientes com AN com comportamento bulímico/purgativo se distinguem daquelas que apenas restringem a alimentação em medidas de impulsividade, antecedentes de obesidade e aspectos de personalidade.16,17

Apesar de se parecerem mais com pacientes bulímicas nesses aspectos, diferenças fisiológicas entre indivíduos com com-portamento bulímico que mantêm um peso normal e aqueles que perdem muito peso (e apresentam complicações pela des-nutrição) parecem justificar a distinção.18 Estes aspectos

leva-ram o DSM-IV a criar subtipos de AN (restritivo e tipo compulsão periódica/purgativo), classificação esta apoiada por estudos prospectivos posteriores.19 A CID-10 optou por não

criar subtipos de AN, sendo que, nesta classificação, as paci-entes que apresentam episódios bulímicos e têm baixo peso recebem o diagnóstico de “bulimia nervosa”, o que representa uma divergência importante entre as classificações.11

Controvérsias também permanecem acerca da classificação de anoréxicas que apenas purgam, mas não têm episódios bulímicos, por apresentarem semelhanças com os dois tipos de AN.13 Segundo Beaumont et al20 (1995) a purgação representa

um importante marcador psicopatológico nos transtornos ali-mentares. Tais pacientes têm sido classificadas anoréxicas do tipo compulsão alimentar/purgação do DSM-IV e apenas como AN na CID-10 (que não discrimina purgadoras de restritivas).

Bulimia nervosa

O episódio bulímico refere-se à ingestão de uma quantidade exagerada de alimentos, comportamento que pode ocorrer even-tualmente em indivíduos normais e está descrito na AN desde o séc. VII. Corresponde ao aspecto central do diagnóstico da BN e do TCAP. Em pacientes com transtornos alimentares, a bulimia não visa apenas saciar uma fome exagerada, mas atende a uma série de estados emocionais ou situações estressantes. A lite-ratura inglesa utiliza o termo binge-eating para descrever este comportamento, traduzido para o português como compulsão alimentar periódica.

Russell (1979), em artigo clássico, foi o primeiro a definir e distinguir a BN como categoria independente da AN,21

propon-do três critérios básicos:

1. impulso irresistível de comer excessivamente;

2. evitação dos efeitos “de engordar” da comida pela indução de vômitos e/ou abuso de purgativos, e

3. medo mórbido de engordar.

Tais critérios e outros que se seguiram mostraram-se muito amplos e foram refinados, chegando às classificações psiquiá-tricas atuais com características mais restritivas e gerando, por conseqüência, um aumento do espectro de transtornos alimen-tares sem outra especificação (TASOE).8

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Critérios diagnósticos para TA Claudino AM & Borges MBF

questionamentos. Existe um consenso na literatura quanto à necessidade da presença da “compulsão alimentar” para o di-agnóstico de BN, mas não quanto à sua definição e freqüência. O DSM-IV descreve a compulsão com base em dois aspectos: 1) ingestão, em um período limitado de tempo (por ex., dentro de um período de duas horas) de uma quantidade de alimen-tos definitivamente maior do que a maioria das pessoas con-sumiria durante um período similar e sob circunstâncias si-milares e;

2) um sentimento de falta de controle sobre o comportamento alimentar durante o episódio (por ex., um sentimento de in-capacidade de parar de comer ou de controlar que ou o quanto está comendo).

Em virtude da variação individual para a quantidade conside-rada “grande”, há autores que propõem a definição de um míni-mo de calorias (ex. >1.000).22 Embora a maioria das compulsões

envolvam enormes quantidades de alimentos (geralmente entre 1.200 e 4.500 calorias), alguns dos episódios considerados pe-las pacientes como “excesso alimentar” correspondem à ingestão de quantidades normais ou até pequenas de alimen-tos (e têm sido concebidos como compulsões subjetivas). As-sim, autores como Beglin & Fairburn23 sugeriram que o

compo-nente “perda de controle” parecia identificar melhor a compulsão alimentar do que o “excesso alimentar” por si só. Trata-se de um sentimento de que o indivíduo não pode evitar a compulsão alimentar ou interrompê-la, uma vez iniciada. O episódio deve ocorrer num período circunscrito de tempo (média de duas ho-ras), mas não, obrigatoriamente, em um único lugar. A duração do episódio deixou de ser critério obrigatório, pois pode even-tualmente se prolongar por horas. O DSM-IV tem mantido a exigência da presença dos dois critérios (quantidade excessiva e perda de controle) para o diagnóstico da compulsão “objeti-va”. No entanto, sabe-se que, ainda assim, a definição de compulsão alimentar continua a manter certa subjetividade, que é inerente à avaliação feita por quem julga o episódio.11

O diagnóstico de BN exige o engajamento em métodos com-pensatórios inadequados seguindo-se aos episódios bulímicos. O vômito auto-induzido é o método mais freqüente, de mais fácil identificação e que melhor delimita o final de uma com-pulsão. O reconhecimento de que algumas pacientes buscam compensar a compulsão por meio de métodos não purgativos apenas (jejuns e exercícios excessivos), aliado a indícios de maior psicopatologia alimentar e geral em purgadoras (depres-são, ansiedade, abuso de substâncias e sexual) levou à distin-ção de grupos de BN pelo DSM-IV (vide Tabela 1), aspecto apoiado por estudos subseqüentes.24

A definição da freqüência e duração mínima dos episódios de compulsão e dos métodos compensatórios que os acompanha (duas vezes por semana durante três meses) é vista como arbi-trária. A definição da recorrência do comportamento se baseou nos padrões médios de freqüência extraídos de estudos clíni-cos e na comunidade25 e visa excluir situações de menor

gravi-dade (pacientes que apresentam uma freqüência menor). No entanto, em estudo na comunidade, Wilson & Eldredge26 (1991)

não encontraram diferenças importantes entre aqueles com um episódio semanal ou mais episódios, apontando a necessidade

de se esclarecer o melhor ponto de corte.

Vários estudos demonstraram a excessiva preocupação com o peso e a forma corporal na BN, aspectos que gerariam com-portamentos inadequados para controlar o peso (descritos em ambas as classificações). Garfinkel et al27 consideram a

necessi-dade de futuras alterações no critério para incluir o conceito de “insatisfação com o corpo”; tal aspecto envolveria a dimensão afetiva negativa ligada à imagem corporal e as deficiências na regulação da auto-estima - aspectos que parecem estar subjacentes ao julgamento excessivamente baseado no corpo que fazem de si mesmas.

A manutenção do peso normal, apesar da excessiva preocu-pação com o corpo, representa um dos aspectos básicos da diferenciação entre os diagnósticos de AN e BN para o DSM-IV. Já na CID-10, a questão do peso para o diagnóstico de BN não é clara, pois descreve em um dos critérios que “o pavor mórbido de engordar levaria a paciente a buscar um limiar de peso bem abaixo de seu peso pré-mórbido” (que constituiria o peso saudável). Assim, na CID-10, bulímicas de peso normal são classificadas como BN atípica.

Transtorno da compulsão alimentar periódica

Dentre as alterações do comportamento alimentar destaca-se também o TCAP. A descrição desta síndrome surgiu pela ne-cessidade de se discriminar indivíduos obesos com compulsão daqueles sem compulsão alimentar e dos bulímicos. Spitzer et al28 delinearam critérios diagnósticos para o TCAP (Tabela 2) e

realizaram um estudo multicêntrico para avaliação dessa nova proposta diagnóstica. As discussões dos critérios sugeridos envolvem alguns tópicos semelhantes aos da BN.

Na base do diagnóstico de TCAP estão os episódios recor-rentes de compulsão alimentar, que, como já referido, envolvem duas características principais: o excesso alimentar (para o tem-po de duração da ingestão) e a perda de controle. Também se discute aqui a necessidade da presença do excesso alimentar (primeira característica) com base no achado de inexistência de associação entre a quantidade de alimentos ingeridos e a gravi-dade do TCAP por alguns autores.29 O tempo de duração deve

ser delimitado, em torno de duas horas no máximo. Ressalta-se, no entanto, que pacientes com TCAP apresentam dificuldades para circunscrever os episódios de compulsão alimentar em virtude de não apresentarem o engajamento em métodos com-pensatórios subseqüentes aos mesmos (como ocorre na BN). Tal aspecto torna difícil a delimitação do final do episódio e, por conseguinte, a contagem do número de episódios apresenta-dos em um dia pelos pacientes. Assim, tem-se considerado a contagem do número de “dias” com compulsão por semana, ao invés do número de episódios por semana (critério da BN). Quanto à segunda característica, a perda de controle, esta per-manece fundamental para a definição de compulsão alimentar.30

No TCAP também se discute a arbitrariedade da definição de freqüência mínima de compulsão (duas vezes por semana), já que não se justifica em termos de gravidade clínica dos pacientes.31

Porém, a adoção de um limiar se faz importante para que haja padronização da população estudada e para evitar que se diag-nostique “doença” em indivíduos com episódios eventuais.

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Outro questionamento diz respeito à inexistência de associa-ção entre os episódios de compulsão alimentar e o uso sistemá-tico de métodos compensatórios inadequados. Destaca-se aqui a controversa distinção entre a BN não purgativa e o TCAP.32

Hay & Fairburn24 constataram que pacientes com bulimia

ner-vosa, tanto do tipo purgativo quanto do não purgativo, com-põem um grupo homogêneo em diversos aspectos (entre eles a estabilidade temporal das características clínicas), enquanto indivíduos com TCAP compõem outro grupo distinto. Esta di-ferenciação, no entanto, ainda necessita de mais investigações.

Por fim, um novo critério para o TCAP tem sido sugerido - a “auto-avaliação baseada no peso e na forma do corpo” - já que este aspecto parece diferenciar obesos com e sem TCAP.33,34

Sendo esta uma característica central dos transtornos alimenta-res, este critério possibilitaria um importante elo de ligação do TCAP com a AN e a BN. Espera-se que mais estudos em anda-mento, analisando características psicobiológicas de indivídu-os com TCAP e suas respindivídu-ostas a diversindivídu-os tratamentindivídu-os, forne-cerão mais informações sobre a indicação de se estabelecer esta nova categoria diagnóstica.

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Correspondência: Angélica de Medeiros Claudino

Escola Paulista de Medicina, Depto. de Psiquiatria

Rua Botucatu, 740, 3º andar - 04023-900 São Paulo, SP, Brasil Tel: (0xx11) 5579-1543

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Epidemiologia dos transtornos

Epidemiologia dos transtornos

Epidemiologia dos transtornos

Epidemiologia dos transtornos

Epidemiologia dos transtornos

alimentares: estado atual e

alimentares: estado atual e

alimentares: estado atual e

alimentares: estado atual e

alimentares: estado atual e

desenvolvimentos futuros

desenvolvimentos futuros

desenvolvimentos futuros

desenvolvimentos futuros

desenvolvimentos futuros

Epidemiology of eating disorders:

Epidemiology of eating disorders:

Epidemiology of eating disorders:

Epidemiology of eating disorders:

Epidemiology of eating disorders:

current status and future developments

current status and future developments

current status and future developments

current status and future developments

current status and future developments

Phillipa J Hay

Departamento de Psiquiatria da Universidade de Adelaide. Austrália do Sul, Austrália

Resumo

Descritores

Abstract

Keywords

Este trabalho foi apresentado parcialmente na Reunião Científica Anual da Sociedade de Pesquisa de Transtornos Alimentares em novembro de 2001 no Novo México.

Os objetivos do presente trabalho foram: fornecer uma avaliação do progresso da epidemiologia na área de transtornos alimentares, desde estudos sobre incidência e prevalência até os estudos comunitários prospectivos, bem como estudos caso-controle; sintetizar o atual estado da incidência e prevalência dos transtornos alimentares; discutir os estudos epidemiológicos analíticos sobre os transtornos alimentares, enfocando estudos comunitários sobre fatores de risco e nosologia; e apontar as áreas de estudos futuros, especialmente sobre a carga social e econômica e o grau de “conhecimento sobre saúde mental” da população em geral a respeito das pessoas com transtornos alimentares. Apesar dos problemas para identificar e recrutar um número suficiente de pessoas com anorexia nervosa e os métodos variáveis de recrutamento de casos, os estudos sobre incidência e prevalência dos transtornos alimentares atingiram um consenso e em geral não corroboram uma incidência ascendente atual, exceto, possivelmente, por um pequeno aumento na anorexia nervosa em mulheres jovens. A aplicação de métodos epidemiológicos analíticos permitiu uma compreensão melhor dos fatores ambientais e genéticos, em comparação com os sociais e econômicos, quanto ao risco de desenvolvimento de transtornos alimentares, bem como ajudaram no refinamento da nosologia desses transtornos. Futuramente, a epidemiologia analítica terá potencial para responder a questões-chave sobre a natureza e os determinantes dos transtornos alimentares e para ajudar a decidir como auxiliar os que mais necessitem. Transtornos alimentares. Bulimia nervosa. Anorexia nervosa. Epidemiologia. Fatores de risco. Estudos longitu-dinais. Estudos comunitários de classificação.

The present paper aims were: to provide an overview of development of epidemiology in the area of eating disorders, from studies of incidence and prevalence, through to community based prospective as well as case controlled studies; to summarise the current status of incidence and prevalence of eating disorders; to discuss analytic epidemiological studies of eating disorders, with a focus on community-based studies of risk factors and nosology; and to point to future areas for study, notably the social and economic burden and general population “mental health literacy” of people with eating disorders. In spite of problems in identifying and recruiting sufficient numbers of people with anorexia nervosa and variable methods of case-ascertainment, studies of incidence and prevalence of eating disorders have reached a general consensus and do not in general support a current rising incidence, except possibly a small increase in anorexia nervosa in young women. The application of analytic epidemiologic methods has lead to a greater understanding of environmental and genetic factors, as compared with social and economic factors, to the risk of developing eating disorders, and as well aided the refinement of eating disorder nosology. In the future analytic epidemiology has the potential to answer key questions about the nature and determinants of eating disorders, and to help to decide how to help those who need it most.

Eating disorders. Bulimia nervosa. Anorexia nervosa. Epidemiology. Risk factors. Longitudinal studies. Classification community-based studies.

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Epidemiologia dos transtornos alimentares Hay PJ

Introdução

Estudos sobre incidência e prevalência

As estimativas sobre a prevalência dos transtornos psiqui-átricos baseiam-se no reconhecimento e delineamento preci-sos dos transtornos nos esquemas de classificação e no de-senvolvimento de métodos para os estudos epidemiológicos nas comunidades, tais como o estudo Epidemiologic Catchment Areas (ECA) em 1980.1 Embora a anorexia nervosa

tenha sido o primeiro transtorno alimentar a ser reconhecido a partir dos relatórios de Gull2 e Laségue3 no século XIX, as

síndromes bulimia nervosa, transtorno de compulsão alimen-tar periódica e o Transtorno Alimenalimen-tar Sem Outra Especifica-ção (TASOE) só foram descritas cerca de um século depois.4,6

Aceita-se hoje em dia que as primeiras estimativas de preva-lência pontual de transtornos alimentares na população em geral provavelmente superestimaram a bulimia nervosa. Estu-dos posteriores (por exemplo o de Bushnell et al7) concordam

em geral que a bulimia nervosa ocorre em cerca de 1% das mulheres jovens ocidentais e que as síndromes de transtor-nos alimentares parciais ou de TASOE, aplicando os critérios do DSM-IV,6 ocorrem em 2% a 5% das mulheres jovens.8 A

anorexia nervosa provavelmente ocorre em menos de 0,5 % dessa população e não é comum na população em geral, por exemplo, como foi constatado por Aalto-Setala et al.9

Estudos precisos sobre a incidência têm sido mais difíceis de serem realizados, mas estudos de incidência clínica e de coortes7,10 confirmam a existência de um aumento na

incidên-cia da bulimia nervosa desde seu reconhecimento nas últimas décadas do século passado. Pesquisas populacionais seqüenciais têm-se mostrado problemáticas e variáveis com relação à definição e seleção de casos, mas aquelas que foram realizadas não relataram um aumento desde o final dos anos 8011,12 (Hay, 2001, submetido). Os estudos sobre a incidência

clínica de anorexia nervosa identificaram casos prováveis, principalmente por meio de prontuários médicos dos pacien-tes que se apresentam com suas complicações físicas, como infertilidade e perda de peso inexplicada.13,14 Uma revisão

sis-temática de 12 estudos de incidência cumulativa relatou uma incidência média anual na população em geral de 18,5 por 100.000 (DP=21,01) entre mulheres e de 2,25 por 100.000 (DP=2,63) por ano entre homens.15 Há evidências limitadas de

alterações na incidência geral da anorexia nervosa no decor-rer do tempo, ainda que Pawluck & Gorey15 tenham relatado

um aumento significativo na incidência da síndrome entre mulheres jovens de 1950 e 1992. A incidência estimada da bulimia nervosa foi mais elevada, sendo de 28,8 (DP=29,7) entre mulheres e de 0,8 (DP=0,0) em homens por 100.000 a cada ano.

Esses estudos recentes também questionaram algumas cren-ças anteriores sobre o papel e importância de fatores sociais e culturais nos transtornos alimentares. Por exemplo, Hoek13 não

é o único a concluir que os transtornos alimentares não são um fenômeno puramente “ocidental”. Outros estudos (por exem-plo, Hay,8 1998) apontaram para uma distribuição

sócio-econô-mica mais ampla dos transtornos alimentares e para a presença de problemas de compulsão alimentar entre os homens.

A aplicação de estudos epidemiológicos analíticos em trans-tornos alimentares

Os estudos epidemiológicos analíticos aplicam métodos de pesquisa de área populacional a estudos sobre a etiologia dos transtornos tais como: estudos sobre fatores de risco e epidemiologia genética, carga social e econômica, utilização do sistema de saúde e pesquisas sobre história natural e desfecho, bem como estudos de classificação. O espaço reduzido nos impede de discutir todos eles neste artigo, que está mais focado nos estudos caso-controle recentes sobre fatores de risco, clas-sificação e história natural e no desenvolvimento adicional da sobrecarga econômica e social e da utilização do sistema de saúde a partir de estudos de base comunitária na área de trans-tornos alimentares.

Esta é uma revisão seletiva com base em estudos previamen-te identificados e em uma pesquisa na Medline entre janeiro de 1995 e março de 2002, utilizando os termos de pesquisa “epidemiologia” e “transtornos alimentares”. Cento e sessenta e um estudos foram identificados, dos quais cerca de metade eram relevantes para a área.

Estudos caso-controle e prospectivos na pesquisa sobre fato-res de risco

Os mais abrangentes estudos comunitários de caso-controle sobre fatores de risco são os descritos por Fairburn et al16,18 Os

pontos fortes desses estudos são que eles analisam uma varie-dade de fatores de risco em diversos domínios com uma avalia-ção do diagnóstico baseado em entrevistas. Os principais acha-dos foram publicaacha-dos em uma série de três artigos sobre 102 mulheres com bulimia nervosa, 67 mulheres com história de anorexia nervosa, 52 mulheres com transtorno de compulsão ali-mentar periódica, 204 “indíviduos-controle saudáveis” e 102 mulheres com outros transtornos psiquiátricos, em sua maioria com depressão, todas com idades entre 16 e 35 anos. Os diferen-tes grupos comparativos permitiram a diferen-testagem da especificidade dos fatores de risco. Na Tabela estão sintetizados os principais achados a partir das análises de regressão multivariada setpwise, avaliando a importância das relações entre cada condição de caso e a exposição aos fatores dentro dos três domínios de fato-res de risco ambientais, pessoais e da dieta. Um fator não incluí-do nos três incluí-domínios, a menarca precoce, surgiu também como um fator de risco específico para a bulimia nervosa. Como se pode observar na Tabela 1, alguns fatores de risco para transtor-nos alimentares, por exemplo, certos problemas com os pais, pa-recem ser específicos para a bulimia nervosa, e outros fatores como histórico de abuso sexual emergem como fatores de risco não-específicos tanto para transtornos alimentares como para outros transtornos psiquiátricos. Alguns fatores de risco foram compartilhados entre três transtornos, em geral em um continuum, de modo que fatores de risco para transtornos de compulsão alimentar periódica foram mais fracos e circunscritos. No entan-to, o domínio da obesidade (história anterior e dietas) emergiu como um fator de risco para a bulimia nervosa. Este fator de risco foi considerado menor para o transtorno de compulsão alimentar periódica e inexistente para a anorexia nervosa. Este achado ines-perado foi reforçado por outra pesquisa recente.19

Referências

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