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Mucosectomia no tratamento de megaesôfago chagásico avançado: relato de caso

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Academic year: 2021

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1. Acadêmico da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo – 6º Ano do Curso de Graduação em Medicina 2. Médico 2º Assistente da Irmandade da Santa Casa de Misericór-dia de São Paulo - Departamento de Cirurgia

3. Professor Adjunto da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo – Departamento de Cirurgia

Trabalho realizado: Faculdade de Ciências Médicas da Santa

Casa de São Paulo - Departamento de Cirurgia

Endereço para correspondência: Danilo Gagliardi. Rua Dr.

Cesário Mota Jr, 112 – Vila Buarque – 01221-020 – São Paulo, SP – Brasil. E-mail: nilogagliardi@hotmail.com

Mucosectomia no tratamento de megaesôfago chagásico

avançado: relato de caso

Mucosectomy as a treatment of Chagas disease’s megaesophagus in advanced stage:

a case report

Catharina Cardoso Januário de Souza¹, Laís Yumi Sakano¹, Melanie Mayumi Horita¹, Vitor Ramalho Bardauil¹, Paulo Henrique Fogaça de Barros², Ruy França de Almeida²,

Celso de Castro Pochini², Danilo Gagliardi3

Resumo

Introdução: O Megaesôfago avançado é tratado cirurgi-camente, com a possibilidade da realização de diferentes técnicas; dentre elas, a mucosectomia. Ela é vantajosa em vista da eliminação de um tempo cirúrgico, a toracotomia, reduzindo complicações pulmonares. Relato do caso: Trata-se de paciente portadora de megaesôfago de etiologia chagásica, sendo optada pela realização da mucosectomia, reconstrução pelo tubo gástrico e jejunostomia. A paciente evoluiu com coleção mediastinal e invaginação jejunojejunal ao nível da jejunostomia. Discussão: Apesar de a mucosec-tomia ser uma técnica sem toracomucosec-tomia, que reduz a morbi--mortalidade, ela não é isenta de outras complicações, como as descritas no caso. A coleção mediastinal entre a camada muscular do esôfago ressecado e o tubo gástrico é uma das complicações mais raras desta técnica cirúrgica, assim como a invaginação jejunojejunal, infrequente após a realização de jejunostomias. Conclusão: O relato deste caso demonstra que a mucosectomia apresenta complicações que, raras ou não, devem ser diagnosticadas e tratadas precocemente para um resultado terapêutico satisfatório.

Descritores: Esôfago/cirurgia, Esofagectomia, Acalasia esofágica, Mucosa intestinal/ cirurgia, Mucosa gástrica/ cirurgia, Doença de Chagas/complicações

Abstract

Introduction: The advanced stage of megaesophagus is treated surgically, through several different techniques, such as Mucosectomy. This one is advantageous, once there is no need of thoracotomy, avoiding pulmonary complica-tions. Case Report: Pacient presenting megaesophagus by Chagas’ disease, treated with mucosectomy, gastric tube reconstruction and jejunostomy, evaluated to mediastinal collection and jejunjejunal invagination at jejunostomy site. Discussion: Despite the fact that mucosectomy is a technique without thoracotomy, which reduces morbidity and mortality, it is not free from other complications, such as those presented in the case report. The mediastinal collection between the resected esophagus’ muscle fibers and the gastric tube is one of the most rare complications of this surgical technique, such as jejunjejunal invagination is infrequent after jejunostomy. Conclusion: This case report illustrates that the mucosectomy technique presentes complications that, rare or not, must be diagnosed and treated precociously in order to obtain a satisfactory therapeutic result. Keywords: Esophagus/surgery, Esophagectomy, Esopha-geal achalasia, Intestinal mucosa/surgery, Gastric mucosa/ surgery, Chagas disease/complications

Introdução

Define-se Megaesôfago como uma dilatação e alongamento do tubo muscular esofágico, impedindo o correto trânsito alimentar. Apesar do megaesôfago existir na forma não chagásica, em enfermidades mais raras, o megaesôfago chagásico ainda é o de maior prevalência no Brasil, uma vez que o país apresenta sítios endêmicos da doença. Na doença de Chagas, ocorre a destruição dos plexos mioentéricos do esôfago pela ação parasitária direta ou indireta do Trypanosoma

Cruzi, agente etiológico da doença.

A principal característica clínica dessa afecção é a disfagia progressiva que pode evoluir em anos,

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diferentemente das disfagias que evoluem em menor tempo, mais relacionadas a processos neoplásicos. Além da disfagia, o paciente pode relatar regurgita-ção, pirose e perda de peso, pela dificuldade para se alimentar adequadamente. A doença de Chagas pode se manifestar de outras formas, podendo afetar o sis-tema cardiovascular e o colón. Contudo, quando há suspeita de acometimento esofágico, é importante a investigação do megaesôfago, por meio da Endoscopia Digestiva Alta, manometria, e das Radiografias de esôfago, estômago e duodeno contrastadas(1).

O megaesôfago é classificado de acordo com os resultados dos exames manométrico e radiográfico, sendo a manometria o padrão-ouro para diagnós-tico e classificação. No megaesôfago desaparece o movimento peristáltico coordenado, prevalecendo ondas sincrônicas de pressão por todo o esôfago, que impossibilitam a condução do bolo alimentar da fa-ringe ao estômago. Além da alteração da peristalse, há redução significativa da pressão do corpo do esôfago. Os padrões utilizados na literatura nacional para a classificação do megaesôfago (avançado e não avan-çado) são: o do HC-FMUSP, que considera avançado quando o corpo do esôfago apresenta pressão menor ou igual a 10 mmHg; e a do Professor Eduardo Crema (UFTM), quando a pressão é menor que 15 mmHg, classificação esta adotada pelo grupo do esôfago do Hospital Central da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo da FCMSCSP, na maioria das vezes(2,3).

O tratamento do megaesôfago é cirúrgico, a não ser nos casos onde a condição clínica do paciente não permita a intervenção. As alternativas cirúrgicas para o tratamento do megaesôfago são: a cardiomiotomia a Heller com valvuloplastia(4) para a forma não

avança-da; e, para a forma avançada, a esofagectomia subtotal, a cirurgia de Serra Doria, a esofagoplastia redutora ou a mucosectomia(5-7).

É importante considerar as características clínicas dos pacientes com megaesôfago antes da abordagem cirúrgica, uma vez que a doença de Chagas, como já citado, também afeta o aparelho cardiovascular, sendo importante balancear os riscos e benefícios do tratamento operatório de cada paciente.

Como em todos os procedimentos cirúrgicos, há chance de complicações e morbidade pós-operatória, além de recidivas(8,9).

A esofagectomia subtotal sem toracotomia, em-bora não seja a terapêutica cirúrgica ideal para todos os casos de megaesôfago avançado, é uma opção naqueles doentes com condição clínica para sua reali-zação, com a vantagem de evitar o comprometimento da dinâmica respiratória, reduzindo a frequência de complicações pulmonares. Quando comparada com a cirurgia transhiatal, a esofagectomia transtorácica resulta em um maior tempo de exposição do paciente à

ventilação mecânica no pós operatório e maior tempo de estadia hospitalar, incluindo permanência em UTI.

O procedimento transtorácico apresenta maior morbidade precoce, principalmente por causas pulmo-nares, e maior mortalidade. Dentre as complicações, são relatadas: mediastinite, quilotórax, fístula traqueal, paralisia do nervo laríngeo, sangramentos, infarto agu-do agu-do miocárdio, embolia pulmonar e causas gerais, como pneumonia e atelectasia(10). Entretanto, durante

o descolamento mediastinal do esôfago que, com in-tensa periesofagite acarreta aderências da víscera aos folhetos pleurais, pode ocorrer a abertura da pleura e, como consequência, o desenvolvimento de hemo ou hidropneumotórax, acarretando maior morbidade pós-operatória(11,12).

Além disso, é notório que, no megaesôfago avan-çado, a esofagite de estase predisponha a instalação de lesões pré-neoplásicas ou neoplasias propriamente ditas (carcinoma espinocelular)(7).

Tendo em vista tais considerações é que se cogitou a técnica da Mucosectomia, método que, do ponto de vista básico, consiste na retirada da mucosa e preser-vação do tubo muscular do esôfago, evitando a ma-nipulação da camada muscular intimamente aderida ás estruturas mediastinais. Desse modo, seria feita a profilaxia de lesões mucosas pré-neoplásicas, das le-sões intraoperatórias de vias aéreas e das complicações pleuroplumonares.

Para a realização da mucosectomia, o paciente é colocado em decúbito dorsal horizontal com o pescoço para a direita, já que o tempo cervical da cirurgia é feito do lado esquerdo do pescoço. Um coxim é colocado sob os ombros para proporcionar maior extensão do pescoço.

Primeiramente realiza-se a laparotomia mediana desde o apêndice xifoide até aproximadamente cinco centímetros abaixo da cicatriz umbilical. A seguir, é feita a exploração criteriosa da cavidade abdominal, prosseguindo com a dissecção e o isolamento do esôfago abdominal, com secção dos ramos anterior e posterior do nervo vago, facilitando a mobilização esofágica.

Depois de isolado o esôfago abdominal, é reali-zada a secção longitudinal da musculatura em sua face anterior desde a cárdia até o hiato esofágico, expondo-se a mucosa em toda a sua circunferência, da camada muscular, em uma extensão de cinco a sete centímetros.

No tempo abdominal ainda, é feito o preparo do estômago para a gastroplastia (tubo gástrico) e a rea-lização de jejunostomia para a alimentação a mais ou menos 20 cm do ângulo duodenojejunal.

É feita a cervicotomia lateral esquerda acompa-nhando a borda interna do músculo esternocleidomas-toideo, desde a fúrcula esternal até uma extensão de

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10cm, com isolamento do esôfago, junto à fáscia pré--vertebral e face anterior e lateral esquerda da traqueia. Em seguida, realiza-se a secção longitudinal da musculatura na face anterior do esôfago cervical com extensão de aproximadamente 5 cm ao nível da fúr-cula esternal, expondo a mucosa no mesmo princípio do tempo abdominal. Disseca-se a mucosa como no tempo abdominal, em toda a sua circunferência da túnica muscular.

Neste ponto da cirurgia, o cilindro mucoso já está isolado tanto no abdome quanto no pescoço. A partir de então, é realizada uma pequena abertura nas faces anterior e inferior da mucosa do esôfago abdominal para colocação de uma sonda nasogátrica em sua luz, com direcionamento no sentido da extremidade distal para proximal até exteriorizá-la, através de pequeno orifício realizado na face anterior e inferior da mucosa do esôfago cervical.

Em seguida, secciona-se a mucosa do esôfago cervical, em toda a sua circunferência, sendo a porção distal da mucosa esofágica amarrada na extremidade da sonda.

É feita a extração evertida do cilindro mucoso esofágico através da tração contínua e lenta da extremi-dade cervical da sonda no sentido craniocaudal. Após a retirada do cilindro mucoso, é feita uma secção trans-versal da transição esofagogástrica em todas as suas túnicas e fechamento da abertura gástrica, deixando a túnica muscular esofágica aberta no nível abdominal. Por fim, realiza-se a delimitação e reparo da porção do esôfago cervical remanescente para a anastomose com o tubo gástrico.

A ascensão do estômago previamente tubulizado (tubo de grande curvatura), já com piloroplastia re-alizada até a região cervical é feita através da passa-gem de nova sonda nasogástrica pelo tubo muscular remanescente do esôfago, no sentido crânio-caudal.

A anastomose esofagogástrica é executada em dois planos de sutura, preferencialmente executada na face posterior do tubo gástrico, tendo-se o cuidado de apor a mucosa gástrica à mucosa esofágica, sendo esta o plano mais importante de sutura.

Após revisão sistemática da cavidade abdominal e da região cervical, coloca-se em todos os pacientes dreno de Penrose, tanto na região cervical quanto na região abdominal, sendo nesta com a extremidade dis-tal do dreno junto ao hiato diafragmático do esôfago. A seguir é realizado o fechamento da parede por planos em ambos os locais(7,13).

Relato do caso

Paciente MJL, 44 anos, sexo feminino, natural de Pernambuco, residente em São Paulo há 25 anos, tra-balhando como auxiliar de limpeza. Procurou o serviço

médico com queixa de “dificuldade para engolir há aproximadamente 07 anos”, disfagia progressiva e regurgitação, com piora há 1 ano. Apresentou perda ponderal de 6kg neste período, negando outros ante-cedentes patológicos. Ao exame físico encontrava-se em bom estado geral, hidratada, eupneica, afebril, anictérica, boa perfusão periférica, murmúrio vesicu-lar presente bilateralmente, sem ruídos adventícios; abdome plano, flácido, indolor, sem visceromegalias palpáveis, com ruídos hidroaéreos presentes e nor-mais; peso de 50 kg (IMC = 21,09).

Foram realizados exames laboratoriais, que mostraram função renal, função hepática, eletrólitos, hemograma, TGO e TGP dentro dos valores de refe-rência, sendo a única alteração a sorologia para Chagas positiva.

A Manometria esofágica registrou: Pressão do corpo do esôfago de 12 mmHg, ondas peristálticas síncronas, ausência de relaxamento do esfíncter in-ferior do esôfago e esfíncter superior sem alterações. Diagnosticou-se megaesôfago avançado de etio-logia chagásica, sendo proposta a cirurgia de Muco-sectomia Esofágica com reconstrução do trânsito via tubo gástrico (ressecção da pequena curvatura), com piloroplastia e jejunostomia única.

Após avaliação clínica que permitiu a interven-ção cirúrgica, a mucosectomia foi realizada através da cervicotomia e laparotomia, tendo o trânsito sido reconstituído por tubo gástrico da grande curvatura, introduzido no tubo muscular esofágico, que perma-neceu.

A paciente recebeu alta no décimo segundo dia de pós-operatório sem intercorrências, recebendo dieta geral por via oral.

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Aos trinta dias do pós-operatório, a paciente passa a relatar disfagia, emagrecimento (perda de 5kg) e fraqueza. Ao exame físico encontrava-se desidratada e descorada. Optou-se, então, pela internação para compensação clínica e investigação diagnóstica. Fo-ram solicitados exames laboratoriais, radiografia de tórax, radiografia de esôfago, estômago e duodeno e tomografia computadorizada de tórax e abdome.

Na análise das radiografias pode-se observar a imagem do esôfago aumentado, como se o megae-sôfago não tivesse sido operado (fotografia 3), além do trânsito alimentar comprometido por provável compressão extrínseca do tubo gástrico (fotografia 4).

A endoscopia digestiva alta mostrou: Anastomose esofagogástrica a 18cm da arcada dentaria superior, pérvia, ampla e sem lesões aparentes. Estômago tu-buliforme com pregueamento regular, piloro centrado e transponível.

Na tomografia computadorizada do tórax visualizou-se grande coleção liquida preenchendo todo o tubo muscular esofágico, adjacente ao estô-mago, desde a região cervical até a diafragmática. Tal coleção exercia compressão extrínseca na carina e principalmente no brônquio do lobo superior direito, com importante redução do seu calibre (fotografia 5).

Na tentativa de realizar a drenagem de tal coleção guiada por ultrassonografia houve intercorrências, tendo a paciente evoluído com insuficiência respira-tória, pneumotórax hipertensivo e choque. Na punção descompressiva no segundo espaço intercostal na linha hemiclavicular direita e drenagem do hemitórax direito no quinto espaço intercostal houve saída de ar e secreção seropurulenta.

Após a drenagem ocorreu estabilização hemodi-nâmica, que permitiu realização de videotoracoscopia para diagnóstico e drenagem adequada da coleção (aspiração e drenagem pleural).

Evoluiu bem, tendo no trigésimo nono dia de pós-operatório, apresentado dor no andar superior do abdômen, náuseas, vômitos, distensão, e descompres-são brusca dolorosa à palpação abdominal. Realizada tomografia computadorizada de abdome que mostrou sinais sugestivos de suboclusão intestinal, a nível de delgado proximal e líquido livre na cavidade.

Indicada laparotomia exploradora, na qual foram aspirados 1500 ml de líquido sero-hemorrágico turvo

Fotografia 2 – Mucosa esofágica retirada.

Fotografia 3 – Radiografia de tórax em 30 dias de pós-oper-atório.

Fotografia 4 – Esôfago, Estômago, Duodeno Radiografia com contraste.

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da cavidade, contatando-se invaginação jejuno-jejunal ao nível da jejunostomia (fotografia 6). A cabeça da invaginação era a extremidade distal da sonda na-soenteral fraturada. Foi feita lavagem e limpeza da cavidade, redução da invaginação sem necessidade de ressecção intestinal e retirada de jejunostomia.

A paciente evoluiu bem, recebendo alta hospitalar no quinquagésimo quarto dia do pós-operatório da Mucosectomia com alimentação oral sem resíduos.

Discussão

A técnica da mucosectomia tem diversas van-tagens, sendo a principal delas evitar o compro-metimento do mediastino, reduzindo a frequência de lesão de vias aéreas e complicações pleuropul-monares. O epitélio da mucosa do esôfago é plano estratificado, resistente, e a submucosa tem poucas fibras colágenas e muitas elásticas, tornando-a mais flexível e solta, que facilita o descolamento do plano muscular. Além disso, na ressecção por inteiro do cilindro mucoso-submucoso, faz-se tanto a profilaxia

Fotografia 5 - Imagens tomográficas evidenciando coleção líquida entre camada muscular do esôfago e tubo gástrico.

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quanto a erradicação das lesões inflamatórias crôni-cas que se apresentam em vista da estase alimentar, que favorecem, a longo prazo, o desenvolvimento de afecções malignas.

Mesmo evitando o comprometimento do medias-tino, complicações pleuropulmonares são descritas em estudos sobre a mucosectomia, como o hemo--hidropneumotórax (aproximadamente 5% dos casos), e a infecção pulmonar associada a pequeno derrame pleural, ambos com boa evolução com drenagem torácica.

Outras complicações descritas são a estenose e a deiscência da anastomose esôfago-tubogástrico. A primeira apresenta melhora após sessões de dilata-ção endoscópica, e a segunda tem boa evoludilata-ção com tratamento conservador. Ambas estão relacionadas à técnica de sutura (mecânica ou manual) e não à de ressecção da mucosa. Além das complicações citadas pode ocorrer ainda outras tardias, como a compressão do estômago interposto, a perviedade da transição gastroduodenal, a esofagite, a gastrite e a coleção líquida intramediastinal ou, como no caso relatado, entre a túnica muscular esofágica remanescente e o tubo gástrico. São diagnosticadas por tomografia computadorizada, endoscopia digestiva alta e/ou radiografia contrastada do esôfago.

Em estudo realizado no Serviço de Cirurgia do Hospital e Maternidade Celso Pierro – PUC-Campinas, que pesquisou complicações tardias da mucosectomia em 50 pacientes, 9,7% apresentaram coleção líquida entre o tubo gástrico e a capa muscular esofágica, porém, assintomáticos. O estudo relacionou essa alteração a duas prováveis complicações: a permanên-cia de fragmentos da mucosa esofágica à sua túnica muscular, promovendo secreção constante entre o tubo gástrico e a camada muscular esofágica remanescente, ou uma irritação constante da serosa gástrica sobre a túnica muscular esofágica associada ao peristaltismo do estômago, promovendo a criação de recessos que facilitam a formação da coleção(14).

Em discussão com a equipe que acompanhou o caso em questão, acredita-se ainda em uma terceira hipótese; a não abertura adequada do hiato esofágico no intraoperatório, visto que o megaesôfago da pa-ciente era gigante. Foi relatado também sangramento considerável da camada muscular durante a mucosec-tomia, que poderia ter facilitado a formação de uma coleção hemática entre o tubo gástrico e a camada muscular esofágica.

É necessário compreender que qualquer afecção esofágica tem influência importante na qualidade de vida dos pacientes, sendo essencial, portanto, realizar um bom acompanhamento pós-operatório. Deve-se avaliar a qualidade da deglutição, regurgitação pós--prandial com ou sem decúbito, evolução ponderal e

satisfação com a intervenção e retorno às atividades profissionais(14).

Em relação a outra complicação apresentada pela paciente, pode-se considerá-la tão rara quanto a pri-meira. As complicações da jejunostomia podem ser mecânicas, como deslocação, obstrução ou migração da sonda; infecciosas, tais como a formação de absces-sos intra-abdominais e peritonite; e metabólicas como hipoglicemia, hipocalemia, desequilíbrio hidroele-trolítico, hipofosfatemia e hipomagnesemia. As mais encontradas são a estenose ou a obstrução do intestino e a formação de pertuitos ou coleções extraluminais. A invaginação jejuno-jejunal após jejunostomia, por sua vez, tem um risco extremamente baixo de ocorrer, sendo referida na literatura incidência menor que 1%. A sinto-matologia pode variar, porém é comum a presença de vômitos de aspecto bilioso, dor e massa abdominal tran-sitória, podendo, ainda, ocorrer casos assintomáticos. A cabeça da invaginação pode ser induzida pela ponta da sonda dobrada ou fraturada; por um processo in-flamatório causado pelo tubo gerando uma hipertrofia da mucosa; por um peristaltismo retrógrado do jejuno devido a ocorrência de vômitos; ou até pela força de injeção durante a alimentação pela jejunostomia. Além disso, um tecido adiposo diminuído em pacientes com alterações de nutrição seria um fator de risco adicional, uma vez que permite um movimento mais livre do intestino, por ter omento e mesentério reduzidos(15,16).

No caso relatado, a paciente apresentava, na cabeça da invaginação, a sonda enteral fraturada, o que acredita-se que possa ter induzido tal complicação.

Os fatos ocorridos ressaltam a importância do acompanhamento pós-operatório e da identificação de possíveis complicações relacionadas ao tratamento. A mucosectomia é um procedimento bastante difundido, porém realizado por um número reduzido de profis-sionais. É essencial que se identifiquem as complica-ções mais comuns e mais graves, que podem acometer um paciente já debilitado por sua condição prévia, sendo de extrema importância que estas sejam registra-das na literatura. Ainda mais, que em procedimentos habituais como a jejunostomia, saiba-se diagnosticar uma alteração, mesmo que rara, tratando-a de forma adequada e evitando sua recidiva. Acredita-se que o relato deste caso seja importante na lembrança destas complicações no acompanhamento de portadores de megaesôfago avançado, submetidos à mucosectomia, assim como naqueles que se utilizam da jejunostomia como via alimentar.

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