MÁRCIO
ROBERTO
L-VOIGT
IMIGRAÇÃO
E
CULTURA
ALEMÃ
NOLVALE
DO
ITAJAÍ.
m›Uc.â.çÃo,
RELIGIÃO
E
socmnânns
NA
Hmónm
DE
TIMBÓ
(sc). 1sõ9-1939.Dissertação
apresentada
como
requisito parcial a obtençãodo
gran
de
Mestre.
Curso de
Pos-Graduação
em
Historia,Centro de
Filosofia eCiências
Humanas,
UniversidadeFederal
de Santa
Catarina. Orientador: Prof. Dr. Valberto Dirksen.
1fLonLâNÓPoL1s
V
1mUcAÇÃo,
1mL1G1Ão
E
socmmmns
NA
msronm
DE
TIMBÓ.
(sc)
1369-1939.Dissertação Apresentada por
Márcio
Roberto VoigtEsta dissertação foi julgada e
aprovada
em
suaforma
final pelo Orientador eMembros
Banca
Examinadora,composta
pelos professores:Prof
Dr. Valberto Dirksen - Orientador.(UFSC)
Prof
Dr. Jorge Luizàs
cum
(UFSM)
IV
A
meus
pais,Rolf
e Crista Voigt, pelo apoio e incentivorecebidos durante estes anos de trabalho.
À
Daniela, pela compreensão e companheirismo sempre presentes.-Agradecimentos V
Ao
orientador,Prof
Dr. Valberto Dirksen.Ao
Prof
JoãoKlug
pelas contribuiçõessempre
esclarecedoras, e por ter permitidoaceso
à
importante documentaçãodo Arquivo
Evangélico Central de Berlim.À
Pro£(a)Msc.
SuelyMaria
Vanzuita Petry, Diretorado
Arquivo
Histórico JoséFerreira
da
Silva, pela ajuda eempenho
durante as pesquisasem
Blumenau
À
colega CristinaFerreira, e
à
Kátia,Maria
e Mirele, fimcionárias, pela atenção recebidano
referido arquivo.À
Neusa, bibliotecáriado Arquivo
Público pelo atendimentosempre
presente.H ,z
A
Horst e Lúcia Evers ea
Sidney e família, pelo apoio durante minhas pesquisasem
Blumenau
À
Lonny
Voigt (InMemoriam),
Dorit, Eliane, Marlon: eWolny-pela
ajudaem
minhaspesquisas
em
Timbó.SUMÁRIO
Listade quadros
... _. Listade
figuras ... _.Resumo
... _.Zussamclnfassung
... ._ Introdução ... _.Um
enfoque regional ... ._Igreja, escolas e sociedades ... _.
Cultura
alemã
... _.O
problemas das fontes ... __A
historiografia timboense ... _.O
referencial teórico ... _.4 _
Capitulo 1.
A
Fundação
de
Timbó no
Contexto
da
Colonizaçãodo
Vale-do-Itajaí...1.1.
O
contexto migratóriono
séculoXIX;
os imigrantes alemães e o Brasil ... _. 1.2.As
colônias alemãsem
Santa Catarina ...1.3.
O
povoamento
e reconhecimentodo
Valedo
Itajaí antesda
fundação de Blumenau. 1.4.Fundação
deBlumenau
e expansãoda
colonização rio acima. ... ._ 1.5. Balanço populacionalem
1869
... __1.6.
As
origensdo povoamento
edafimdação
deTimbó
(c. 1864-1869) ... ._1.7. origens institucionais e
aevolução
politica (1869-1934) ... ._Capitulo 2.
0
Caráter
Germânico
Lnterano do
Povoamento
de
Timbó
... __2.1.
Germanismo
e religiosidade ... _. 2.2.O
serviço religiosoem
Timbó
antesda
criaçãoda Comimidade
Luterana. ..._.2.3.
A
estruturaçãoda
Comunidade
Luterana ... 2.4.A
construçãodo
primeiro templo ea
fimdação da
ParóquiaUnida
com
Indaial ... ..6S2.5. Separação
de
Indaial efimdaçâo
da
Paróquia Evangélica deTimbó
... ..702.6.
Evolução
institucionalda
Paróquia Evangélica deTimbó
atéo
finalda década
de20
.... ..7l 2.7.As
comunidades luteranasdo
interior deTimbó
(1890-1930) ... ..772.8.
Os
Anos
30. Filiaçãoa“Deutsche
Reichskirche” e criação da“Lel\rer Praparande” ... ..79Capitulo 3.
O
Ensino
Basico e aTransmissão da
Germanidade
Luterana
... ..823.1
A
escola germânica luteranacomo
núcleo étnico-cultural ... ..823.2.
O
vazio do.poder
público e afalta de escolas ... 3.3. O›.r_ne_iomral
e as dificuldades educacionais ... .Í ... ... ..893.4.
As
escolas coloniaisemTimbó
... ..903.5.
O
casoda“Deutsche
Lehrer Praparande” ... ..1003.6.
As
escolas públicasem
Timbó
ea
ofensiva nacionalizadora. ... ..l01 Capítulo 4. SociabilidadeGermâuica
e Instituições Culturais ... ..1094.1. Tradição e vínculos culturais ... ..109
4.2.
Algumas
referências às primeiras associações e festas tipicas germãnicas ... ..112
4.3.
Timbó
ea
imprensado
Valedo
Itajai ... Conclusão. . ... ..131Anexos
... ..l34VIII
LISTAS
Lista
de
Quadros.
Quadro
1. Imigraçãona
Colónia ParticularBlumenau
(1850-1860) ... ..29Quadro
2. Imigraçãona
Colónia ImperialBlumenau
(1860-1882) ... ..33Quadro
3.Moradores daRegião
de Timbó/1869. Sexo, Religião e ~n9 de Lotes Distribuidos..38Quadro
4. Habitantesda
Região deTimbó
In9
de Lotes e Estado Civil I 11” Absolutos eRelativos ... ..40
Quadro
5. Habitantesda
Região deTimbó
por ng de LotesOcupados
e Faixa Etária / 11” Absolutos e Relativos ... ..41Quadro
6. HabitantesdaRegião
deTimbó
porn9 de
Lotes Ocupados. Habitantespor
Lote/ 11”Absolutos e Relativos ... ..4l
Quadro
7. Habitantesda
Região deTimbó
e deBlumenau
em
1869
por Sexo, Estado Civil eFigura 1.
Mapa
da
ColonizaçãoAlemã
em
Santa Catarina ... _.Figura 2.
Mapa
daBacia
do
Rio
Itajaí-Açu ... ..Figura 3.
Mapa
da
Colonizaçãodo
Valedo
Itajai (1864) ... ._Figura 4.
Mapa
do
Municipio deTimbó
(1950) ... ..Figura S.
Mapa
do
Município deTimbó
(1969) ... ._Figura 6. Foto
do
Jubileuda Igeja
Evangélica deTimbó.
(1915) ... ..Figura 7. Foto
da
Residência e Escola de Julius Scheidemantel (1912) ... ..Figura 8. Foto
da
Escolada
Comlmidade
da
Mulde Baixa
... ..Figura 9. Inauguração
do
Grupo
Escolar “Polidoro Santiago”.Timbó
(07/09/1935) Figura 10. Foto de Sociedade de Ginásticaem
Timbó
(1916) ... ..X
Resumo
Este trabalho
tem
como
objetivo, o estudo de algums aspectosda
Históriada
imigraçãoalemã
em
Timbó,
Santa Catarina,no
período de 1869-1939.`
1
Optou-se, portanto, pela análise
da
atuação edeenvolvimento
de três tipos deinstituições:
A
igreja,a
escola e as sociedades desportivas, recreativas e culturais.Este enfoque de natureza sócio-cultural, permitiu
uma
reflexão sobrea
manutençãoou
não por parte destas instituições, de aspectos
da
culturaalemã
originária dos antepassados.Possibilitou
também, obervar
até que ponto ocorrerammudanças
e rupturas culturaisna
História de
Timbó.
Dentro deste contexto, este estudo
pode
ser classificadocomo
de História regional e deZusammenfnmmg
.Diese Arbeit geschah mit der Absicht, die Geschichte der Imigration der Deutschen in
Timbó,
Santa Catarina, in der Zeitvon
1869-1939,von
einigen Gesichtspunkten aus zustudíeren.
Dafllr
wurdem
drei Institutionstypen wie: Kirche, Schuleund
Gesellschafl - Ietztere inSport, Unterhaltung
und
Kultur gegliedert - gewühlt. VDiese Heraushebung, naturgemàss gesellschafilich - kulturell, erlaubte eine
Reflexion
über die Instimtionen,
ob
sie in derLage
warem,
die Aspekte der originellen deutschen Kulturihrer Vorfiahren aufiecht zu erhalten
Ermöglichte auch zu beobachten, in
wieweit
es zuVerandeflmgen und Rupturem
derIâzúwf in âzr
ozschicme Tâmbónz
um
9
In diesem
Zusammenhang
kannman
dieses Studium als Regiongeschichteund
alsMikrogeschichte klassifizieren, ›
°
Introdução À-
O
presente trabalho pretende seruma
contribuiçãoà
História Vda
imigração e
colonização
alemã
de Santa Catarina.A
despeito desta temáticajá
ter sidoamplamente
abordada
pôr
diversos autores, parece ser importante ampliar eaprofimdar
questões aindanão
contempladas, e desenvolver abordagens que
apontempara
novos
enfoques. Este estudo,portanto, procura ater-e
a
um
contexto regional epode
ser entendidocomo
um
tentativa detrabalho de micro-História.
Um
enfoque
regionalA
Históriada
colonizaçãoalemã de
Santa.Catarina, atéa
atualidade, ateve-sebasicamente aos principais núcleos criados
no
século- passado;Assim,
temfiseconcentradoo
` .
esforço de pesquisa principalmente
em
Blumenau, Joinville eBmsque.
Existem,no
entanto,outras pequenas localidades, próximas ou não as anteriormente citadas, merecedoras de
registro e estudo.
Nos
últimos anostem
se multiplicado os estudos micro' regionais focalizandouma
pequena
localidadeou algum
aspecto especifico dealguma
comunidade.Em
termoteóricos, diversos historiadores
tem
apontado paraa
importância de se *privilegiar objetosmais ampla,.
ou
então, contribuir para que modelos. e:q›licativos de caráter geral sejamaplicados
a
situações particulares afim de serem confirmadosou nãof
De
qualquer forma, o historiador deve estar ciente de que nãohá
temas quedevam
sermenosprezados, e, felizmente vai prevalecendo -a necessidade de evitar generalizações que
pudessem
incluirem
um
mesmo
quadro, comlmidadescom
populações, tradiçõe, instituiçõesou
atitudes distintasem
relação ao processo colonizador.É
bem
verdade,também,
que muitosaspectos
acabam
pôr se repetir:a
Igreja, as escolas, as ociedades,a
relaçãocom
outrasetnias,
guardam
semelhanças,mas
“a
priori”,iso
não autoriza obras que se supõe conclusivas.Cada
comtmidade merece
ter suamemória
«preservada-euma
atenção particularizada Este éum
dos objetivos deste trabalho; perceber
como
ocorreua
colonizaçãoalemã
em
uma
comunidade
pequena, aparentemente isolada,
pouco
pesquisada atéo momento.
Neste intuito, ainda queTimbó
não
tenha tomado-seuma
das maiores cidades de Santa Catarina,não possua
um
território, população
ou economia de
grandes proporções, que estejmn entre as maioresdo
Estado, sua trajetória
merece
uma
cuidadosa investigação, pois, foiuma
das comunidadesem
que
a
culturaalemã
foi preservada pôr mais tempo;Ainda
hoje, destaca-se pôr seu perfilgennânico, que transparece
em
suas festas, sua arquitetura ena
“fisionomia” de seu povo. Neste contexto, fez-seuma
opção
pelo estudo das principais instituições sociais e de seurelacionamento
com
a
cultura.1
GINZBURG,
Carlo.A
Micro-História s Outros Ensaios. Lisboa: DIFÍEL, 1989. Essa coletânea de ensaiosprocura tratar do estudo de temas de micro-História.
A
despeito dos temas e do contexto de Ginzburg seremcompletamente distintos do presente trabalho, não há
como
negar que a atitude do autorem
privilegiar análises3
Igreja, escola e-sociedades
O
objeto central deste traballio repousa, portanto,no
estudoda
cultura germânicaem
Timbó
através das principais instituições estabelecidas pelos imigrantes, e que os congregaramno novo
país:a
Igrejaa
escola e as sociedades culturais, recreativas e desportivas.A
partirdeste tripé institucional, os colonizadore e seus descendentes organizaram sua vida,
cultivaram e mantiveram
a
memória
de seus antepassados.Da
segimda 'metadedo
séculopassado até o finalsda
década
de30 do
séculoXX,
limite cronológico deste trabalho, nãoaparecem
outras iniciativas institucionais relevantes quenão
seenquadrem
em
uma
das
trêcategorias anteriormente citadas. Corresponde assinalar, porém, que apreservaçäo
de
valoresculturais e tradições
não
deve ser entendidacomo
fimçäo
exclusiva das instituições. Observa-se que
a
lingua, principal lator mantenedorda
herança cultural, apreendida e sustentadano
âmbito
da
familia, assimcomo
outros diversos aspectos das relações cotidianascom
seusvínculos e contatos entre as pessoas de
uma
comunidade, propiciam trocas de experiênciasque
permitem manter e repassar,
ou
mesmo,
descaracterizar aspectosda
cultura originária.A
opção
pelas instituições passa, portanto, põr
uma
questão metodológica, pois foram estas associaçõesque
tomaram
possível as considerações aqui abordadas. Conscientesou
nãodo
caráter culturalde suas instituições, os imigantes fimdaram' :as
mesmas
agindocomoseus
antepassados fizeramna
pátriade
origem
Atravésdo
registros deixados pôr estas instituições, tomou-se possivelperceber
em
quemedida
as tradiçõesforam
mantidasou
-então inovadasno novo
contextoem
que os colonos se instalaram. Portanto,
a
própria disposiçãodo
trabalho reflete estaopção
de análise.O
primeiro capitulo trata deuma
breve perspectiva históricada
colonizaçãoalemã
de Santa Catarina, contextualizandoTimbó
no
referido quadro imigratório.Os
três capítulosseguintes tratam
da
evolução institucionalda
Comunidade
Evangélica, das escolas privadasalemãs e escolas públicas brasileiras e por
fim,
de algumas das diversas sociedades queforam
criadas
na
região de Timbó.O
corte temporal (1869-1939)baseia-e
em
duas datas básicas:a
fimdação
deTimbó
(1869), e o inícioda
Segrmda
Guerrailvlundial (1939-1945) durante cujoprocesso, as instituições sofreram violenta intervenção
do
Estado eum
abrupto corteem
suasatividades.
É
bem
verdade, que este corte temporalno
anode
1939, é apenasum
pontode
referência marcante dentro de
um
processo de progressivo cerceamento das atividadesassociativas que vinha ocorrendo
há
mais tempo,põr
causado
projeto nacionalizadorernpreendido pelo
govemo.
Cultura
alemã
Pode-se contra argumentar evidentemente, que aHistória de
Timbó
não implica sóa
deetnia germânica,
já
que contribuíramno
processo outras etnias paraa
formação edesenvolvimento
da
cidade.Os
italianos, poloneses, luso-brasileiros e seus descendentes,estiveram presente
em
diversos aspectos emomentos do
periodo colonizadora
partir dosseus inícios.
A
limitação pelo presente enfoque,não
implicaem
qualquer discriminação etno-histórica,
mas
uma
opção
práticade
pesquisa desta dissertação.Timbó
nasceucomo
um
núcleoetnicamente
alemão
e assimpermaneceu
pôr bastante tempo, atéa
chegada de contingentesitalianos (1875).
Ainda
assim, nota-se claramenteuma
divisãodo
espaçoem
que os italianos,a
despeito de suavizinhança, mantiveram-se aparte das linhas coloniais onde viviam os alemães
e seus descendentes.
A
atual distribuição dos municípiosda
regiãodo
Médio
Vale do
Itajaí,atesta
bem
essa divisão. Enquanto municípioscomo
Rodeio,Apiúna ou Rio
dosCedros
identificaram-se preponderantemente
com
a
imigração e tradição italiana,Timbó
ePomerode
-5
germüiica
Dentro deste contexto, atéa
festa celebrada atualmentena
cidade e que integra-seao conjimto de festividades que são realizadas
em
todo o Estadono
mês
de outubro,mantém
esta conotação, pois,
Timbó
festeja principalmentea
colonizaçãoalemã
e sua cultura.O
termo cultura, utilizadono
âmbito deste trabalho, possuium
sentido restrito e designaas representações vivenciadas nas instituições associativas teuto-brasileiras; os hábitos e
costumes herdados dos ancestrais, e as alterações dos
mesmos
no
novo
contextono
qual sefixaram
os imigrantes.Segtmdo
Willems, este componente cultural contribui paraa
socialização dos indivíduos
em
suas respectivasconumidadesz
Outro ponto que reforça esta identidade gem1ânica' de
Timbó,
é sua própria históriareligiosa
A
Igreja Católica, que prevalece claramente entre os italianos, poloneses e luso-brasileiros, só chegou
a
se instalarna
cidadena década
de trinta,mais
de60
anos após suafimdaçäo.
Timbó
permaneceu
luterana durante mais demeio
século, identificando sua germanidadecom
a
fé evangélicaPor
fim,
cabe referir que o presente trabalhotem
um
interesse especlficoem
veriiicarcomo
os alemães e seus descendentes preservaram suaculturaem
mnavrealidade concreta queparece ser distinta das colônias de
maior
envergadura;Em“Blumenau,
Joinville,ou
mesmo
Brusque, fatores
como
a
industrialização,3 o próprio crescimento populacional ea
decorrente 42
WILLEMS,
Emilio.
A
Aculturaçño dos Alemães no Brasil São Paulo: Companhia Editora Nacional. 1980.p. 3. “O ajustamento social do indivíduo, a sua socialização, dependeria, portanto, da incorporação de certos
valores culturais na personalidade. Ou,
em
outras palavras, a própria personalidade seriauma
'estrutura' devalores culturais, adquiridos e articulados entre si
em
forma de hábitos”.3 I-IERJNG,
Maria Luiza Renaux. Colonlmçtto o Indústria no Vale do Itajai.
O
modelo catarinense dedesenvolvimento. Blumenau: FURB, 1987. Para
uma
melhor compreensão da influência da industrialização naimportância que estes centros .adquiriram
na
realidade catarinense, levaram estas cidadesa
superar seu
iolameuto
inicial.Em
Timbó, a comimidade
parece ter-se mantidomais
isolada,não por
uma
intencional atitude de segregação,mas
enrfiiuçãoda
sua condiçãode pequena
cidade. Pretende-se portanto verificar se tal proposição é correta
ou
não, eno
que istoimplicou
naformaçäo
social timboense. '0
problem
das fontesO
estudoda
História deTimbó,
bem
como
de outras cidades congêneres apresenta,no
entanto, algmnas dificuldades.
Em
primeiro lugar,a
inexistência de instituições quetenham
preservado
a
memória da
cidade trouxe problemas paraa
compilação e análise dos documentos.As
fontes disponiveis estavam muito dispersas e foram “garimpadas”em
terrenoárido.
Em
fimção
disso,há
em
alguns períodosmais
lacunas que trechos documentados. Muitosaspectos dahistória timboense
permaneceram
obscuros,já
quea
cidade quasesempre
aparececomo
pano
defimdo
da
documentação consultada,o
que, evidentemente, dificultou estapesquisa
Por
outra parte, os fixndos documentais das instituições escolhidas para 0 presentetrabalho sofi'eram substancial prejuizo pôr ocasião
da campanha
de nacionalização que,principalmente durante
a Segtmda
Guerra Mundial,confiscou
e destruiua maior
parte dosdocumentos relativos às sociedades, escolas e sociedades.
Em
vista diso, e procurandoultrapassar estas dificuldades, o trabalho foi realizado principalmente
com
a consulta dosfimdos à
disposiçãono Arquivo
José Ferreirada
Silvada
Fundação
Casa
Dr. Blumenau.'7
mesmo com
um
caráter lacunar,o
material existente.Também
foram importantes asinformações obtidas
no Arquivo
Público de Santa Catarinabem
como
na
coleção de jornaisda
Biblioteca Pública
do
Estado.Os
documentodo
primeiro permitiramuma
melhor
visão dealgumas
ecolas
timboenses e, principalmente, dos aspectos concernentesa
ofensivanacionalizadora
do
Estado brasileiro durantea década
de 30.Os
jomais do. segundo,contribuiram
com
informações esparsas sobre as tres instituições aqui abordadas e permitiramurna
melhor
compreensão dosmomentos
festivos e civicos, privilegiadosna
coberturada
imprensa nas primeiras décadas deste século.
Os
jornais de Blumenau, e principalmente os deRodeio
e Indaial, propiciaramtambém
um
melhor entendimentodo
processo dedesmembramento
deTimbó
(1936) e dos conflitos políticos locais latentes.A
historiografia timboenseOs
trabalhos realizados atéa
atualidade sobreTimbó,
com
apenasuma
exceção,não
são de caráter acadêmico,
mas
nem
pôr issomenos
importantes. Aliás, este parece serum
aspecto que
merece
uma
reflexão maisprofimda Os
trabalhos de naturezaacadêmica
dentreoutras coisas,
possuem ou
pelomenos
deveriam, o méritoda
organização,do
cuidadocom
asfontes,
da
redação clara e objetiva,da
análisecom
baseem
construções teóricasmelhor
elaboradas,
enñm, a
produçãodo
conhecimento,em
tese, deveria ser maisaprofimdada,
detalhada
No
entanto, muitas destas qualidades, as vezes,acabam
superadas pela vivência queum
escritor não especializado,mas
nem
põr issomenos
abalizado,tem
acercada
realidadea
ser analisada e que pôr vezes transmite mais direta e eficazmente. Assim,
a
experiência deum
pastor que
acompanhou
suacomlmidade
põr décadas e quetomou
contatocom
seus problemas,foi
formado
em
sua infancia;ou
ainda, deum
administradorou
homem
público
da
cidadeconstituem as vezes, testemunho mais eloqüente
do
que construções teóricas elaboradasna
fi'iadistância de
um
banco de universidade.Em
fimçäo
disso,a
atitudedo
presente trabalho fiaceà
historiografia timboense é de total respeito.
A
História deTimbó
foi basicamente escrita nas últimas três décadas, ligando-se oinicio
do
resgateda
memória
do
municipio,à comemoração do
centenáriodafimdação
no
anode 1969. Este contexto norteou apesquisa,
a
organização eaprodução
deuma
obra que de
uma
maneira bastante eclética procurou abordar
a
História das principais instituições timboenses.O
trabalho foi organizado pelo professor Gelindo Sebastião Buzzi, que coordenou
trabalhos de
diversos colaboradores, que escreveram artigos acerca
da
educação, das comunidadesevangélica e católica,
da
politica municipal, sociedades, biografias, curiosidades,além da
transcrição de trechos de documentos que tratavam de aspectos variados
da
Históriatimboensef
O
meritório propósitocomemorativo
da
obra nãoa
invalida, pelo contrário,oferece
um
exemplo
digno de ser seguido; pois se fossemais comum,
nmitas cidades elocalidades não estariam tão alheias ao seu passado.
A
comemoração
deum
passado distantecontribui para
a
preservaçãoda memória
e é sobre esteprisma
que tal trabalhodeve
sercompreendido
e analisado, relevando outros aspectos quedo
ponto de vista históriconão
seriam tão destacados?
4
BUZH,
Gelindo B. (org).Álbum
do Centenário da Timbó. Timbó: [s.n.], 1969.5
O
tomlaudatório e quase heróico do prefácio de
Buai
faz lembrar urna epopéia.É
bem
verdade que asdificuldades gigantescas do processo colonizador não devem ser minimizadas, mas deve-se evitar tambéma
gloriñcação exagerada deste processo histórico. Poucos historiadores concordariam hoje, por exemplo,
com
9
No
mesmo
anoeratambém
lançadaa
“Crônicada
Comunidade
Evangélicade
Timbó”,°na
qual o Pastorda
Paróquia,Nelso
Weingmtner, de acordocom
o espiritoda passagem do
centenário e
com
baseem
uma
parteda
documentação eclesiástica, salvada
destruição,produziu
um
trabalho muito importante sobre o desenvolvimentoda
Igreja Luteranaem
Timbó
earredores.
Ao
transcrever e interpretar' os documentos disponíveis, manifesta sua intenção depreocupar-se preferencialmente
com
a
prática fé evangélica, o que é perfeitamente naturalem
se tratando deum
ministroocupado
com
suafimção
eclesiástica. Weingartnernão
éhistoriador profissional,
mas
nem
pôr isso sua obra deixa de ter o méritoda
clareza deargumentação, cuidado
com
as fontes e espirito investigador.Anos
após, etambém
com
caráter comemorativo, foram lançadosem
série, trêspequenos trabalhos intitulados
“Timbó
em
Cademos,
sua História e sua Gente”, sobo
patrocínio
da
Prefeitura quecomemorando
o cinquentenário de emancipação política (1934-1984), procurou criar
um
veiculo para registrara
Históriada
cidade.A
longa série planejadainfeliznente não teve sequência, porém, trouxe importantes esclarecimentos acerca
da
Históriapolitica
do
numictpiof das escolas públicas e privadas,da
Sociedade deCaça
e Tiro Cedro, eaté dos hábitos, tradições e das dificuldades enfrentadas pelos primeiros colonizadores.
_
A
História das comunidades interioranas de
Timbó,
e suas respectivas sociedades,bem
como,
da
extensão ruralna
cidade foi o principal objetivo das duas obrasdo
engenheiro°
WEINGÀRTNER,
Nelso. Crônica da Comunidade Evangélica do Timbó. Blumenau: Gráfica 43, 1969.7 Relacionado a este tema está o artigo de Horácio Cristofolini, que preocupou-se
em
detalhar' as diversasfases da institucionalização timboense. CRISTOFOLINI, Horácio. Timbó e sua História Politica Timbó'
om
agrônomo
Sérgio Roberto Maestrellig Este,na
qualidade de fimcionárioda
Secretaria deAgricultura
do
governo estadual, preocupou-se detidamenteem
resgatara
memória
oral dediversas pequenas localidades
do
interior timboense, através de 'entrevistas que .permitiramo
conhecimento
do
passado dasmesmas.
Maestrelli, evidentemente, deu maior ênfase aosaspectos agrícolas e pastoris
na
região, relatandocomo, pouco a
pouco, os extensionistasda
./XCARESWC (Associação de Crédito e Assistênciakural
de
Santa Catarina) conseguiram vencera
reistência dos agricultoresem
recebê-los e aceitar seus ensinamentos.O
trabalho deMaestrelli é
um
excelenteexemplo do
quepode
proporcionar o contato direto e continuocom
as comunidades mrais.
Além
de prestara
estasum
serviço de grande importânciaem
suasatividades diárias, aproveitou sua condição para o resgate
da
História Bastantebem
ilustradas, as duas obras são
além
de tudo fontes de consulta para o conhecimentodo
passadoda
cidade, especialmente das comunidadesmais
distantes e isoladas,em
oposição às obrascitadas anteriormente que detiveram-se
àsede do
municipio,ou
então, às suas instituiçõesmais
conhecidas.
A
despeitoda
Paróquia Católica deTimbó
ter sidofimdada
num
periodo que seencontra fora dos limites cronológicos deste estudo,
não
sepode
omitir o importante trabalhosobre ela publicado
pôr
Horácio Cristofolinif põr ocasiãoda comemoração
dos 25 anosde
criação
da
primeira paróquia católicana
cidade (1963-1988). Pesquisando nos livros detombo de
localidades próximas acerca dos iníciosdo
catolicismoem
Timbó,
o autor procura8
~,
Sérgio Roberto. Fatos o Imagens doMeio
Rural do Timbó. Timbó: Tipotil, 1992; eMAESTRELLI,
Sérgio R.,BECKER,
Celina M. eHOLDERBAUM,
Virson.A
Extensão Rural na História daTimbó. Florianópolis:
ACARESC,
1 988.'
ll
traçar
um
quadro das primeiras ações missionárias, que levarama
criaçãoda
instituição,decrevendo,
ademais,a
vida dos três primeiros padres que estrutnrarama
comunidade.O
único trabalho de caráter acadêmico conhecido éa
dissertação de mest:radoem
Sociologia de
Ana
Angélica DantasAlves
Mayr, acercada
preservaçãoda
arquitetura telito-brasileira
em
Timbó,l°na
qual se procura esclarecer as diversas iniciativas políticasassumidas pelo
poder
público e pelacomunidade
paraa
preservação deste patrimônio teuto-brasileiro
da
cidade.Y
A
historiografia deTimbó
tem
estabelecido até omomento
importantes basespara
oconhecimento
do
passadoda
cidade.Os
objetivos, as fonteou
mesmo
as idéias acercada
História timboense são bastante heterogêneas,
mas
issonão
significa necesariamente conflito,pelo contrário, o presente trabalho pretende continuar este esforço,
com
o intuito de trazerà
tona aspectos desconhecidos
da
História municipal, ou, reinterpretar osjá
conhecidos.0
referencial teóricoO
historiador profissionalnão
pode
e não deve ignorar o que outros estudiososvem
desenvolvendo
em
termos de pesquisaO
presente trabalho,tem
a
aspiraçãoa
seruma
contribuição
à
História regionaldo
Valedo
Itajaí, e mais especificamente,um
estudo das1°
MAYR,
Ana Angélica DntasAlves. Condições Sócio-Culuuals da Preservação da Arquitetura Tsuto-
Brastlotra
em
Timbó
(S.C.). Florianópolis, 1993. Dissertação (Mestradoem
Sociologia Politica) - Centroinstituições: igreja, escola e sociedades
na
cidade deTimbó;
um
enfoque portanto, de naturezainstitucional e sócio-cultural.
'
A
referidaabordagem
sócio-cultural não exclui, evidentemente, os aspectoseconômicos e políticos,
já
quenão
parece ser possível dissociar estes últimosdo
primeiro,mas, metodologicamente pode-se privilegiar
uma
destas áreas, tendo consciência que os demais aspectosdevem
ser integrados ao texto,mesmo
quecom
importância secundáriaO
enfoque cultural portanto,toma
necessáriaa
citação das obras pelas quais se fez opção, poisde
umamaneira
ou
outra, estas contribuiram paraa
fundamentação deum
capítulo,ou
então deum
aspecto abordado.Emílio Willems,“ conhecido sociólogo
alemão
quena década
de30 do
séculoXX,
dedicou-se ao estudo
da
acultnração dos alemãesno
Brasil, foi de imensa valia pelaabrangência de seu trabalho e põr tratar detidamente de
cada
tuna das instituições aquiabordadas
em
capítulos específicos, procurandocomparar
as diversas situações existentesno
processo colonizador
alemão no
Brasil, e criandomodelos
de análise das mesmas.A
despeitodo tempo
decorrido desdea
publicação de seus trabalhos, continua sendo válidaa
suaabordagem
geraldo
motivosdo
processo imigratório,do
contexto colonizadorno
Brasil e ascausas e implicações
da
acultnração entre os teuto-brasileiros.Obra
sociológicageneralizadora, inspirou e alicerçou muitas considerações, principalmente sobre aspectos
aculturativos das sociedades desportivas e recreativas. Suas impressões ajudaram
a
traçarum
quadro comparativo e referencial
com
arealidade das instituições timboenses.13
Para o
capítulo acercada
religiosidade evangélica luterana, foi defimdamental
importância o trabalho de Martin Norberto Dreher, que analisa
como
temacentral de sua obraa
identificação entre Igreja e Germanidade, confessionalidade e identidade étnica.”
Obra
derigorosa análise e densa
em
suas considerações,a
caracterização queDreher
faz dosmomentos
diversos
da
atuaçãoda
Igreja Luterana, permitiu teórica e comparativamente, estabelecerpontos de apoio para melhor interpretar
a
Históriada
Igreja Luteranaem
Timbó.A
despeitodo
trabalho de
Dreher
ater-sefimdamentalmente a
realidade rio grandense, não pode-se negaro
valor de sua discussão teórica acerca
da
relação entre fé luterana e germanidade.Merece
destaque
também
a
detalhada exposição queo
autor fazda
relação das instituições religiosasalemãs
com
suas congêneresno
Brasil, ea
influência que isso trouxeà
caracterização teológicados Sínodos daqui, e
da
formação dos pastores.Timbó
integrou'-se regionalmentea
estecontexto
mais
amplo, o que justifica pôr si só referência aos escritosdo
autor supracitado. 'A
educaçãoem
Timbó,
em
especial nas escolas privadas alemãs ficou mais clarapfiooâpzimomo oo-ovéo
ao
obra do Lúoâo 1‹;rooâzz_.”A
óoopoizoao
oozúozzo otomo
ao
zefofâooobra serem distintos
da
realidadetimboene,
já que o autor ocupa-se dasecolas
alemãscatólicas
no
Rio Grande do
Sul eda
atuaçãodo
professor paroquial católico,a
exposição queo autor faz
da
estruturação das escolas comunitáriasna
Alemanha, foi extremmnente importantepara
a fimdamentaçäo
teóricado
capítulo.Se
o contexto geral ea
discussão centralda
obra
fogem
aos interessesdo
presente trabalho, as observações acercada
educaçãono
contextoalemão
foram
bastante úteis e importantes.Em
relaçäo às escolas públicas e ao processo de'Z
DREHER,
Martin Igreja o Germanidade. Estudocrítico da História da Igreja Evangélica de Confissão
Luterana no Brasil. São Leopoldo: Sinodal, 1984.
'3
KREUTZ,
Lúcio.o
nacionalização
do
ensino, corresponde referir o trabalho deNeide Almeida
Fiori."A
autora,que
analiou a
estruturaçãodo
ensino público desde o Império até 1970, contribuiu paraa
compreensão da
educação pública local, especialmente quanto ao processo de criaçãodo
sistema de grupos escolares, e
àreforma da
educação implantada apartirdo
inícioda
primeiradécada do
séculoXX,
durante o governo VidalRamos
Jr. (1910-1914);a denominada
reforma“Orestes Guimarães”,
em
alusão ao seu principal idealizador e concretizador.Willems, mais
uma
vez, etambém
SueliMaria
V. Petry,” queem
sua dissertação de mestrado estudoua
criação, desenvolvimento e caracterização dos clubes de caça e tirona
região de Blumenau, contribuíram
à
elaboraçãodo
último capítulo.A
distinção que Petry fazentre os clubes elitistas
da
área urbana e os clubes interioranos, forneceu elementos decomparação
para arealidade timboense, que seguramente enquadrou-seno
segundo caso.Enfim,
todas estas obras permitiram que o presente trabalho tivesseuma
certaorientação
em
suas observações e analises.”O
interesse fimdamental,como
já foi referido,está centrado
na
temáticada
manutenção e preservação dafcultura-alemã
e importa portantoresponder alguns questionamentos fimdamentais. Quais as permanências e as rupturas culturais
que
Timbó
vivenciou ?Como
suas principais instituições secomportaram
?Como
a
população1°
FIORI, Neide Almeida. Aspectos da Evolução do Ensino Público. Ensino Público e Politica de
Assimilação Cultural no Estado de Santa Catarina nos Períodos Imperial e Republicano. 2 ed, Florianópolis;
UFSC, l99l. 15 PETRY,
Sueli Maria Vanzuita. Os Clubes de Caça e Tiro na Região de Blumenau. 1859-1981. Blumenau:
Fundação Casa Dr. Blumenau, 1982.
“S
Além
das obrascitadas, que serviram mais diretamente
como
fonte de inspiração, não se deve omitir outros trabalhos que tratam da colonização e cultura alemã no Brasil.ROCHE,
Jean.A
ColonizaçãoAlemã
e o Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Globo, 1969. 2 V.OBERACKER
Jr., Carlos.A
Contribuição Tenta àFormação
da Nação Brasileira. 4 ed., Rio de Janeiro: Presença, 1985. 2 V. e SEYFERTH, Giralda.Nacionalismo e Identidade Étnica.
A
ideologia germanista e o grupo étnico teuto-brasileironuma
l5
timboense procurou manter sua identidade cultural ? Foi este processo intencional e
direcionado ou não ? Espera-se que estas perguntas sejam convenientemente respondidas nas
páginas que se
seguem
Sem
mais delongas é hora de passar adiante e verificar se os objetivosCapítulo 1
A
Fundação
de
Timbó
no
Contexto
da
Colonizaçãodo
Vale-do-Itajai.A
atual cidade deTimbó,
localizadano
Médio
Valedo
Rio
Itaial-Açu, insere-senuma
das várias áreas de Santa Catarina que recebeu imigrantes europeus
a
partirdo
século XIX.Esse contingente foi
formado
fimclamentalmente por alemães,ao
qual vieram depois se agregaritalianos, poloneses e elementos de outras etnias.
Timbó,
portanto, foi criadacomo
uma
tipicacidade de imigrantes europeus,
em
especial alemães, encravadaem
um
valeonde
esseprocesso imigratório foi de
suma
importânciana
caracterização política,econômica
e sócio-cultural daregião. '
1.1.
O
contexto migratóriono
séculoXIX;
os imigrantesalemães
e o BrasilNão
há
como
dissociara
realidade deTimbó
deum
contexto mais amplo: odo
gigantesco
movimento
migratório que teve lugarna
Europa no
séculoXIX
Partir, emigar,näo
era
uma
agradável escolha cuidadosamente planejada, mas,uma
opção quase desesperadaem
fimção
de imperiosas necessidades materiais". Essencialmente, os imigranteseram
camponeses,
embora
muitos fossem artesãos, e oNovo Mundo
significoua
oportmlidade derealização de
um
grande sonho:a
propriedadeda
terra; aspiração, que,na
velhaEuropa
haviase
tomado
um
pesadelo.A
divisão das glebas agricultáveis por sucessivas gerações, levou"
~,
Emílio. op. ciLp 32-37. Para
uma
discussão mais completa das causas da imigração e do17
muitas famílas
a
deixarem para alguns de seus filhos íntimas porções de terras, queno melhor
dos casos, só permitiam tirar delas
um
minimo
sustento para si e seus herdeiros.Em
contrapartida,
a América
era descrita, nos relatoscomo
continente de terras ablmdantes, férteis,onde o enriquecimento rápido era quase
mna
certezaA
imagem
do
Novo Mundo
construídapelos agentes aliciadores de imigrantes, certamente excitou
a ambição
e aplacou o desesperodos que
pouco
possuiarn. Seduzidos por esta construção deuma
realidade tão distintada
queviviam, muitos lançaram-se
com
os mais diversos riscosna
travessiado
oceano.O
crescimentodemográfico
associado ao processo de industrializaçãotambém
foiresponsável pelo êxodo que fez de muitos paíse europeus, potenciais exportadores de pessoas.
Durante o século
XIX, a Europa
mudou
muito mais rapidamentedo
que nos três séculosanteriores. 'As antigas monarquias,
'mesmo
apósa
vitória sobrea
República fiancesaljá não
possuíam
mais
aforça politica e militar,nem
o respeito irrestritoda
população; acossadas pormovimentos
contestadoresda
velhaordem
quepoupo a pouco agravavam
a crise ie faziam prevermais
conflitos e transformações. Econornicamente, o processo de industrialização, antespraticamente restrito às Ilhas Britânicas, excpandia-se agora por
boa
parteda
Europa, e cobravaseu espaço
em
uma
sociedadecada vez
menos
parecidacom
a da
tradicional divisão socialdo
Antigo Regime.
O
enorme
crescimento dos grandes centros urbanos ea
evasãodo
campo
faziam parte de
um
fenômeno
que,além
de criaruma
nova
ordem
social, agravavao
conflitoentre as
novas
classes sociais emergentesno
novo
contexto industrial.A
falta de espaço físico,as guerras,
a
fome, todos esses aspectos individualmente consideradosou
conjugados,contribuíram para
um
quadro de péssimas condições devida
Tudo
apontava paraa
crise e oconflito
ou
então, para o outro ladodo
Atlântico.A
segunda opção foia
saida para muitos que,É
bem
verdade, que muitos imigrantes chegaram aquipor
outros motivos. Muitos fiigiramem
virtude de perseguição políticaou
religiosa. Outros, pertenciam às classesmédias
e altasda
sociedade européia, que paracá
vieramcom
intenções diversas. Alglms intentavama
realização de
um
empreendimento colonizador.Exemplo
disso é o casodo
Dr. Blumenau, queemigrou
em
condições completamente distintasda
maioria de seus compatriotas, após terconcluído seus estudos básicos e ter defendido sua tese de doutoramento.
Ao
que tudo indica,sua iniciativa vinha ao encontro
do
espiritoempreendedor
tipico deum
homem
movido
pelanova
realidade. Emigrar significava colocarem
prática as expectativas deuma
nova
existênciaem
um
mundo
novo
que devia ser conhecido.`
Enfim,
seja qual fosse o motivo, deve-se abordar o impactoda
imigraçãonão
sócomo
válvula de escape para os agudos problemas
no Velho
Mundo, mas também
como
alavancapara
uma
considerável alteraçãoda
vidaeconômica
e social nas novas nações americanas, que,paulatinamente desvencilhavam-se
da
antigaordem
colonial.O
iníciodo
séculoXIX,
presenciou as independências
da
maioria das ex-colônias, e os governos de alguns destesnovos Estados,
viam
com
muito bons olhosa
chegada de contingentes que permitissema
melhor
exploraçâoeconõmica
dos recursos de seus países,bem
como
da
“modemi2.açäo”, tãoem
voga
neste século de tantas transformações.A
Alemanha
ainda não existiacomo
Estado constituido quando paracá
vieram asprimeiras levas de imigrantes germânicos.
Os
diversos Estados alemãeseram
bastantediferentes
no
que se refere areligiäo, educação, instituições políticas, e atémesmo
em
aspectoslinguisticos e dialetais. Isso fazia
com
que os imigrantes não se identiíicassemcomo
alemães,mas
sim,como
naturais das várias regiõesda
Alemanha
O
Estado alemão apenas surgiucom
a
19
imigrantes dirigiram-se para diversos lugares
do
Novo
Mundo,
em
especial,para
os EstadosUnidos
da
América”.Essa
tendência de imigraçãoem
direçãoa
América
do
Nortejá
era clarana
própriaépoca
em
que ela ocorreuO
historiador alemão HeinrichHandelmann,
contemporâneo desses acontecimentos,
com
muita perspicáciajá
percebia os problemasrelativos
à
imigração paraaAmérica
do
Sul.”A
saidada Europa
dava-se dos portosdo
norteda
Alemanha, especialmente deBremem
eHamburgo,
de onde os agenciadoresdespacharam
ogrosso dos contingentes.
O
papel destes foi bastante importantedo
ponto de vista prático,porém, por outra parte extremamente prejudicial
à
maioria dos imigrantes queeram
obrigadosa
aceitar as exigências dosmesmos,
sem
a
garantia de que as promessas feitasno
porto deorigem
ou no
Novo Mundo
fossem cumpridas.2°»
O
Brasil foi apenasuma
das diversas nações americanas que recebeu estes grupos.Até o
século
XIX,
mantivera-secomo
colônia portuguesa enenhum
tipo de imigração européianão
lusa de grande porte foi autorizada pelo
govemo
português.Com
a
independência politicaem
1822, passou por anos de
profimda
instabilidade politica,econômica
e socialf' Durante o18 SEIFERTH, Giralda Imigração e Colonização Alemã no
Brasil:
Uma
Revisão da Bibligaña. BIB. Rio deJaneiro: n. 25, p. 3, Jan./Jun. 1988. Calcula-se
em
tomo de5%
o número de alemães, que saídos do continente europeu, imigraram para o Brasil; número efetivaniente pequeno se comparado a grande massa que se dirigiuaos
EUA
*°
HANDELMANN,
Heâmzn
Históriaao
amu.
4 ze, sào PzulozEDUSP,
1982. v. 2, p. 344.A
obra deHandelmann foi publicada
em
1860 na Europa e faz parte deum
projeto mais ambicioso de estudar a Históriadas Américas. Handelmann nunca veio ao Brasil, apenas consultou todas as fontes que pôde a respeito, e,
em
suas últimas linhas, já antevia
com
indiscutível clarividência o problema da falta deum
projeto imigratórioadequado para o Brasil. “Que resta, então,
como
único recurso recomendável para o Brasil '?A
imigraçãoeuropéia livre e voluntária (espontânea),
um
ininterrupto afluxo de lavradores,como
o que agora, ano após ano,vai rolando para a América do Norte. Tal imigração, ainda não a obteve o Brasil; somente a entrada de
negociantes, artistas e operários estrangeiros, assim
como
de capitais estrangeiros, pode ser consideradaespontânea, e tem sido da máxima importância para o desenvolvimento do império; porém, quanto a lavradores estrangeiros, a imigração sempre tem sido artificialmente obtida e sempre deu pouco resultado e pouco
sucesso”.
2° RICHTER,
Klaus.
A
Sociedade Colonlzadora Hanseátlca de 1897 e a Colonização do Interior dePrimeiro
Reinado
(1822-1831) e as Regências (1831-1840), os conflitos internos e externosforam
uma
constante.”A
imigração estrangeira, evidentemente, sofreucom
essa situação.” 'Ogrande impulso que
a
imigração recebeu,começou no Segundo
Reinado,em
fimção
da maior
estabilidade política
a
partir de 1840.Nos
dez primeiros anos, aCoroa
iniciouum
longoprocesso de concessão de terras e financiamento de colônias”. Esse processo se acentuou
na
segunda metade
do
séculoXIX,
ea
aceleraçãoda
imigração configurou-sea
partir dai.Os
imigrantes instalaram-se principalmente
na
região suldo
pais, talvez por ser o clima desta maispróximo
de sua terra natal.Além
do
mais, o própriogovemo
via os imigrantescomo
uma
boa
maneira de colonizar muitas áreas
da
região sul não exploradas, efiacamente povoadas
peloseuropeus, habitadas por indígenas e próximas às fionteiras ainda incertas das Repúblicas
platinas.
Desde
o período colonial, o suldo
Brasil era região de conflitos de fronteiras e agoradeveria ser melhor integrado ao Estado brasileiro
recém
constituído]Os
imigrantesforam
assentados
em
regiões interioranas,em
áreas onde quasesempre
algum curso deágua
facilitavaa
penetração. Esta via de entrada fluvial proporcionava agua potável, irrigaçãopara
a
lavourae transporte de gêneros de todo tipo para
a
colônia, e desta para os portosno
litoral. Entre os21
Ligada a esses conflitos há urna importante leva de teutos que é contratada na condição de soldados
mercenários.
O
Brasil fez uso de tropas e oficiais de origem germânica não só na Guerra de Independência,mas também na Guerra da Cisplatina e nos conflitos internos. Muitos desses militares vieram se estabelecer
após o final dos seus serviços,
em
colônias alemãs na Provincia de Santa Catarina. Esse foi o caso da colôniaSão Pedro de Alcântara (1829), onde alguns destes integraram-se ao núcleo colonizador inicial. Para maiores
detalhes sobre os batalhões de mercenários alemães. consultar
PAULA,
Euripides Simões de.A
Organizaçãodo Exército Brasileiro.
HOLANDA,
8. B. de. História Geral da Civilização Brasileira. 6 ed, São Paulo:DIFEL, 1985. T. 2, V. 1, Livro 3, Cap. 1, p. 272; e para maiores detalhes sobre a instalação dos ex-mercenários
como
colonosem
São Pedro de Alcântara, consultar- tambémMATTOS,
Jacintho Antonio de. Colonisaçäo doEstado de Santa Catharina. Dados Históricos e Estatísticos. (1640-1916). Florianópolis: Typ. D'
O
Dia,1917. p. 41.
22
Em
relação a esse aspecto cabe lembrar
uma
lei orçamentária do Império de 1511211830, que aboliaem
todas as províncias do Imperio, o gastoscom
colonização estrangeira. Tal tipo de atitude atingiu os imigrantesque aqui já tinham chegado.
No
caso de Santa Catarina, isso foi extremamente prejudicial à Colônia São Pedro de Alcântara, fundada urn ano antes. PIAZZA, Walter F.A
Colonização de Santa Catarina. 2 ed.,Florianópolis: Lunardelli, 1988. p. 94.
'
23 PIAZZA, Walter F.
op. cit., p. 113.
ALei
de terras devolutas de 1848 foium
bom
exemplo, pois permitia21
muitos núcleo criados
podem-se
referir, por exemplo, osdo Rio Grande
do Sul,a
partir deSão Leopoldo
(1824), eno
Paranáem
Rio Negro
(l829).24Mas
o interesse principal dessetrabalho está
na
Província de Santa Catarina, e concentra-sena
regiãodo
Valedo
Itajaí,na
qual se insere
a
localidade que motivouapesquisa
1.2.
As
colôniasalemãs
em
Santa Catarina.Em
Santa Catarina, aprimeira colôniaa
serfimdada
foia
deSão
Pedro de Alcältara,em
1829. Seguiram-se após isso, para citar apenas algumas, Santa Isabel (1847),
Blumenau
(1850),
Dona
Francisca (1851), Itajaí-Brusque (1860), (Figura 1, p.22).Todas
essas colônias,apesar de suas peculiaridades regionais, assinalaram
a
ocupação de grandesmeas
territoriais,25 que dai por diante ficaram
marcadas
pela presença dos teutos.A
fisionomia
econômica, política e social dessas regiões e dos núcleos de origem luso-brasileiramais
pñximos
foi sensivelmente alteradaA
fozdo
Itajai, por exemplo, quejá
estavaocupada por
luso-brasileiros, sofi'eu
a
influência teutaem
seu constante ir e vir pelo n`o. Mercadorias, levasde imigrantes, passageiros;
a
colônia interiorana seguramente influiuna
evoluçãoda
cidadelitorânea Observa-se que, neste século, algumas das principais lideranças itajaienses
procediam
de famílias de origem alemã; osKonder
por exemplo. 'i2*
W1LLEMs,E.
op. cia., p. 42.45.
25 Pelo menos
urna colônia fugiu a este modelo; foi a Colônia Piedade, que fundada no litoral
em
região\
i
, w
/
'HNEXO
E
/Mapa
da
ColonizaçãoAlemã
em
Santa Catarina.coLomzAçÃo
ALEMÃ
.mogmmwwm-
z I / _ I I I I ' I I I ,\
-' = nem' ul. › _ - ízãcgsco oosuu. mg .z‹ -.. . uy. _ _. .` . ' / ~ z ARAQJÁ ›. . ,Í I / / z I ' 1mw»
.-^‹ z mz"
f
_ Ieflšlâl , Pnssxefàl-_*
"
-1/
_ f _ V.: : ' I/ À TN° :wo nos z' . , I/v
‹ , Í I ` . I 8; OR0 ^ - .. ' Pfzzà - - esfeaao l a _r'_ r' ` Í ‹ _ ' V l _ I <. \. 6' \ -\ \ ~ ~\23
Novas
formas de ocupaçãoda
terra, instituições trazidasdo
país de origem,a
religião,e costumes dos mais variados tipos,
começaram a
diversificar sócio-culturalmentea
vida dasregiões atingidas pela imigração, caracterizando
com
rasgos peculiares oVale do
Itaiaí.Geralmente, tais núcleos coloniais, por estarem situados
no
interiorda
província, alterarama
forma
básicada
ocupaçãodo
território catarinense, que até então centrava suas atividadesno
assentamento litorãneo.
São
Pedro de Alcântara constituiuma
exceção.Fundada no caminho
entre o litoral e
a
regiãodo
planalto, onde se localizava Lages, foi apenasem
1820, que estadita região, havia sido incorporada ao território
da
Província de Santa Catarina. Lages,fimdada
por paulistas (1771), representava até então, o prolongamento deSão
Paulo.Os
alemães destinados àquela
nova
colônia vierama
sofrer diretamente o impacto deuma
resolução que desaprovava
a
aplicação de recursoscom
imigração estrangeira”.De
iníciochegaram
635 imigrantes; destes, aproximadamenteS00 embarcaram no
porto deBremem”
epouco
mais deuma
centenaeram
ex-soldadosda
LegiãoAlemã
que havia servido ao Exércitobrasileiro
na
Guerra Cisplatina e quejá
estavamno
pais.São Pedro padeceu
as consequênciasdecorrentes
da
má
qualidade das terras, e sofi'eu prolongada desorganização,má
administração,
bem
como
divergências internas que contrapuseram os colonos entre si,ou
osconfiontaram
com
os administradores designados peloGoverno
provincial.A
evasão derivadadestas dificuldades,
comprometeu
decisivamente o filturoda
colônia impedindo-a de alcançarocrescimento observado
em
outras.Os
maiores e mais característicos núcleos de imigraçãoalemã
em
Santa Catarinaficaram,
no
entanto, localizadosmais
ao norte; Blumenau, no Valedo Rio
Itajaí emais
ao26 Ver nota
22, deste
mesmo
capítulo.2”
Pmzzn.
W.
F.norte,
Dona
Francisca, depois Jonville. Fazia esta última parte deuma
concessão de terrasdadas
à
princesaDona
Francisca, irmã de D.Pedro
11, por ocasião de' seu casamentocom
opríncipe francês François Ferdinand Phillippe d* Orleans, que recebeu o título de príncipe de
Joinville. Parte dessas terras foi negociada
com
uma
companhia
de imigração,a
Companhia
Hamburguesa
que se responsabilizou pela vinda e ulterior desenvolvimento V deuma
comunidade de
alemães, noruegueses, austríacos, suíços e dinamarqueses.A
maior
parte dosseus primeiros imigrantes não era
formada
por camponeses,mas
por artesãos, que contribuiramcom
seus diferentes oflcios para 0 desenvolvimentoda
colônia” Esta colônia portanto,diferenciou-se neste aspecto das demais constituídas principalmente por agricultores.
De Dona
Francisca partiram por sua vez, posteriormente, contingentes de imigrantes que
ocuparam
entreoutras áreas,
Rio
Negrinho, Jaraguado
Sul eCampo
Alegreno
norte de Santa Catarina. Atémesmo
Curitiba recebeu imigrantes provenientesda
colôniaDona
Francisca1.3.
O
povoamento
creconhecimento
do Vale do
Itajai antesda ftmdação
deBlumenau.
Antes
da
chegada dos europeus, o Valedo
Itajaijá
era habitado pelos indígenas Xóklengs e Kaigangs, conhecidos pelos brancoscomo
"bugres".Eram
semi-nômades
e viviamde
uma
agricultura simples, coleta, caça epesca
Os
encontros travados por ocasiãoda
colonização destruíram grande parte desses grupos autóctones, e os que não foram destruídos
foram empurrados para as regiões mais inóspitas
do
vale.Por
fun, jáno
séculoXX,
quando
os28 FICKER,
Carlos. História de Joinville: Subsídios para a Crônica da Colônia
Dona
Francisca. 2 ed,Joinville: Imp. Ipiranga, 1965. TERNES, Apolinário. História Econômica de Joinville. Joinville: Meyer,
1986. TERNES. Apolinário. História de Joinville;