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A contribuição da comunicação para o empoderamento de artesãs da palha de carnaúba em Juazeiro do Norte

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Academic year: 2021

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A contribuição da comunicação para o empoderamento de artesãs da palha de carnaúba em Juazeiro do Norte1

Samuel Macêdo do NASCIMENTO2

Leylianne Alves VIEIRA3 Rosane da Silva NUNES4

Universidade Federal do Ceará, Juazeiro do Norte, CE

RESUMO

Esta comunicação se propõe a apresentar a relação entre algumas ações do projeto de extensão “Mulheres da Palha: Empreendedorismo Social de Artesãs da Palha de Carnaúba em Juazeiro do Norte”, ganhador da 13ª. Edição do Prêmio Santander Universidade Solidária, com os conceitos de Comunicação Comunitária e Folkcomunicação. Um dos objetivos do projeto é contribuir para a melhora da comunicação do grupo de artesãs. A equipe extensionista é interdisciplinar e vem atuando nos âmbitos de Comunicação Social e Design de Produtos. A fim de ligar conceitos e práticas, apontaremos experiências como entrevista em profundidade; grupo-focal; e oficina. Os resultados apontam para a existência de um receio entre estas mulheres em expor suas opiniões, em usar da fala. Em contrapartida, identificamos que os artigos em palha produzidos pelas artesãs podem se constituir instrumentos de comunicação.

PALAVRAS-CHAVE: comunicação; folkcomunicação; empoderamento.

Apresentação

O projeto “Mulheres da Palha: Empreendedorismo social de artesãs da palha de carnaúba em Juazeiro do Norte” vem atuando, desde janeiro de 2011, na comunidade da Rua do Horto, localizada na cidade de Juazeiro do Norte, região do Cariri, no interior do estado do Ceará. Todas as mulheres atendidas pelo projeto estão ligadas à Associação dos Artesãos de Juazeiro do Norte, uma das parceiras nesse trabalho.

O grupo compreende mulheres de baixa renda, de comunidade carente, cujos maridos, na maior parte, não possuem emprego fixo. Utilizam a renda obtida a partir do artesanato em palha como acréscimo ao orçamento familiar. Além disso, recebem ajuda

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Trabalho apresentado na Divisão Temática Comunicação, Espaço e Cidadania, da Intercom Júnior – Jornada de Iniciação Científica em Comunicação, GP Comunicação para a Cidadania, evento componente do XXXIV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação

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Aluno do 3° semestre do Curso de Comunicação Social (Jornalismo) da UFC - Campus Cariri, E-mail:

samuelkariri@gmail.com

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Aluna do 3° semestre do Curso de Comunicação Social (Jornalismo) da UFC - Campus Cariri, E-mail:

leyliannealves@yahoo.com.br 4

Orientadora do trabalho. Professora do curso de Comunicação Social – Jornalismo na UFC – Campus Cariri. E-mail: rosane.nunes@cariri.ufc.br

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do Projeto Bolsa Família. Os produtos manufaturados pelas artesãs compreendem desde bolsas, leques e caixas até chapéus e embalagens para garrafas. A existência do grupo está fortemente ligada à influência do Padre Cícero5 na região do Cariri. A vinda de romeiros6 anualmente à cidade fez com que muitas mulheres aprendessem a trançar a palha e passassem a produzir chapéus para venda aos visitantes, conhecimento que vem sendo ensinado através de gerações, sendo um trabalho exclusivamente feminino.

Figura 1: Artesãs reunidas na casa da Associação de Artesãos de Juazeiro do Norte

Foto: Jeanine Geammal

As ações do “Mulheres da Palha” são todas interdisciplinares, aglutinando saberes das áreas de Comunicação Social, Design de Produtos e Administração de Empresas. A concepção do projeto contou com a participação do grupo de artesãs, as quais manifestaram o desejo de ter seu trabalho valorizado e identificaram que, para isso, seria preciso aprimorar os produtos e divulgá-los melhor.

Sendo assim, o objetivo principal do projeto é fomentar o empoderamento econômico e social do grupo de artesãs da palha de carnaúba, bem como demonstrar o papel social dos estudantes universitários no compartilhar de saberes. Além disso, com relação à comunicação comunitária, podemos destacar os seguintes objetivos específicos: reforçar o sentimento de coletividade e de cooperativismo; consolidar a identidade de grupo de artesãs; e incentivar a comunicação interna (inter-grupal e entre o grupo e a comunidade). Já no tocante à comunicação externa, pretendemos alcançar a divulgação dos artigos em palha, por meio de ações no âmbito da assessoria de imprensa e comunicação institucional.

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Líder religioso fundador da cidade de Juazeiro do Norte. 6

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Desta forma, visando atingir tais objetivos, o grupo de Comunicação Social, até o momento, vem desenvolvendo ações que têm como base os conceitos da Comunicação Comunitária, uma vez que lidamos com um grupo fortemente influenciado pela folkcomunicação. Faz-se importante reforçar que todas as ações são interdisciplinares, no entanto, um dos grupos – comunicação ou design - coordena a ação, dependendo do foco da mesma.

Algumas reflexões conceituais

A sociedade atual gira em torno da comunicação. Os veículos comunicacionais visam à velocidade e não necessariamente à qualidade da informação. De acordo com Guareschi, o aparato da comunicação é “[...] um dos aparelhos ideológicos mais centrais e abrangentes de nossa sociedade [...]” (1986, p. 99). É baseado na atualidade desta afirmação, e tendo como pressuposto básico que “[...] a comunicação faz a realidade” (GUARESCHI, 1986, p. 99), que entendemos que este grupo de artesãs necessita de aperfeiçoar seus processos comunicacionais.

Tendo em vista que comunicação também é uma forma de poder, o exercício da comunicação eficaz entre as artesãs e entre elas e a comunidade também teria o poder de unir o grupo e o torná-lo mais resistente às intempéries do mercado. Também visamos à independência delas, entre si, incentivando a fala de cada uma, e a exposição de opiniões, tendo como premissa básica que “[...] quando alguém está dominado na alma, isto é, quando alguém já se considera inferior, nunca vai questionar os de cima” (GUARESCHI, 1986, p. 101).

Buscamos tornar reconhecido um trabalho ligado às raízes da nossa cultura por meio de ações comunicacionais, isso porque entendemos que vivenciamos uma época em que costumes e valores são legitimados, em grande parte, pelo suporte midiático, e, “[...] Indo adiante nessa trajetória, pode-se propor que se compreenda a contemporaneidade como uma sociedade estruturada e ambientada pela comunicação, como uma verdadeira “Idade Mídia”, em suas profundas ressonâncias sobre a sociabilidade contemporânea em diversos campos” (RUBIM, 2000, p. 29). Essa concepção norteia as ações do projeto, tanto no tocante às atividades relativas ao fomento da comunicação interna, quanto nas próximas fases, quando implantaremos estratégias de comunicação externa.

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O trabalho desenvolvido junto ao grupo de artesãs aproxima-se do ideário pertinente à folkcomunicação. Segundo Hohlfeldt (2002), esse termo é considerado de complexa definição e está em constante transformação e (re) construção. A folkcomunicação7 é um modo de se comunicar influenciado, direta ou indiretamente, pelas culturas populares e pelo folclore. Por sua vez, a cultura está ligada ao “[...] cotidiano, onde se apresentam os aspectos [...] físicos, simbólicos e imaginários. [...] no que se refere à cultura popular, é difícil separar a esfera material da espiritual, o novo do velho, o sagrado do profano, o original da réplica” (SCHMIDT, 2004, p. 6).

As artesãs da rua do Horto mesclam, por meio dessa mesma cultura popular, seu trabalho centenário com as atualidades requeridas pelo mercado, propagando informações, tanto por meio de seus produtos, que trazem todo um suporte de significado, quanto como líderes de opinião de sua comunidade ou grupo. No entanto, “[...] não é tão nova a estratégia de apropriação das tecnologias de comunicação pelos produtos de cultura popular para recolocar o local no mercado global.” (TRIGUEIRO, 2005, p.5)

O próprio Padre Cícero ensinou aos povos vindos para Juazeiro do Norte o hábito de trabalhar e usar as possibilidades existentes dentro da região para se estabelecerem economicamente. Com as artesãs não foi diferente. Inicialmente, os produtos de palha eram utilizados pelos poucos moradores da cidade. Com os supostos milagres acontecidos no município, então considerado uma espécie de “Nova Jerusalém do Nordeste”, muitos peregrinos saíram de suas terras e migraram para a região do Cariri. Tendo em vista que o clima local é quente, há a necessidade da utilização de alguma proteção contra o sol. A solução encontrada foi a utilização do chapéu de palha, hoje um dos principais produtos das artesãs. Contudo, isso nos mostra que a cultura popular não é algo engessado que possa ser preservado ou resgatado, mas permanece em constante dinâmica:

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“[...] estudo da cultura popular ou do folclore, é bom que se destaque com clareza. A folkcomunicação é o estudo dos procedimentos comunicacionais pelos quais as manifestações da cultura popular ou do folclore se expandem, se sociabilizam, convivem com outras cadeias comunicacionais, sofrem modificações por influência da comunicação massificada e industrializada ou se modificam quando apropriadas por tais complexos. A folkcomunicação, portanto, é um campo extremamente complexo, interdisciplinar - necessariamente - que engloba em seu fazer saberes vários, às vezes até contraditórios, para atingir seus objetivos e dar conta de seu objeto de estudo. (HOHLFELDT, 2002, p. 1)

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As manifestações populares (festas, danças, culinária, arte, artesanato, etc.) já não pertencem apenas aos seus protagonistas. As culturas tradicionais no mundo globalizado são também do interesse dos grupos midiáticos, de turismo, de entretenimento, das empresas de bebidas, de comidas e de tantas outras organizações sociais, culturais e econômicas. (TRIGUEIRO, 2005, p.5)

Os produtos de palha também se adéquam ao conceito do folkmidiático, pois atendem tanto aos anseios do massivo quanto aos do popular. Atendem interesse da indústria cultural e da tradição. A criação de um novo produto ou sua readequação mostra claramente esta relação, onde as artesãs, observando os produtos da moda ou da mídia, modificam e constroem novas alternativas para seus produtos.

Além da questão do produto, a folkcomunicação aborda uma forma de reconstrução da mensagem, “o comunicador pertence ao campo de interesse do receptor, não está acima deste, mas assume o papel de incorporador dos bens culturais midiáticos no seu cotidiano e os decodifica para o sistema de recepção folk-midiática” (NUNES, 2005), conforme mostra Beltrão no modelo adaptado de Schramm8 :

Figura 2. Modelo de comunicação adaptado por Beltrão para a folkcomunicação (Trigueiro, 2001, p. 8)

O trabalho desenvolvido no projeto “Mulheres da Palha” se propõe a despertar no grupo de artesãs a leitura crítica das mensagens que recebem, pois, na medida em que essas mulheres se empoderarem – como indivíduos e como grupo – poderão acreditar que suas opiniões devem ser expressas e ter valor. Desta forma, as ações de comunicação no projeto estarão contribuindo para o fortalecimento do trabalho dessas mulheres.

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O modelo de Wilbour Schramm é fundamentado nas teorias da Sociologia, com a preocupação de analisar o processo de comunicação no contexto cultural do comunicador e do receptor.

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Acreditamos na comunicação como ferramenta para o crescimento do grupo, tendo em vista que todos têm direito à palavra. Nisso se fundamenta a sociedade democrática na qual vivemos, posto que o exercício da fala e da paridade argumentativa constitui o primeiro requisito para que exista uma esfera pública na qual os cidadãos tenham poder de decisão (GOMES, 2008). Isso significa que todos têm direito a “[...] dizer, pronunciar a sua palavra, ouvir sua voz, escrever seu pensamento. Temos direito a uma comunicação ativa e não apenas passiva. Temos direito de sermos sujeitos e não apenas objeto de comunicação” (GUARESCHI, 1986, p. 117).

Dessa forma, o incentivo ao diálogo, à fala, vem sendo nossa premissa básica. Todas as nossas ações visam o apoio à exposição de opiniões, à crença nas próprias idéias. O emissor da mensagem na comunicação popular, que tem na comunidade todos os componentes da comunicação (emissor, receptor e meio), está todo o tempo mudando de função, no entanto, de acordo com Pena(2010), ele deve:

[...] enxergar com os olhos da comunidade. Mesmo que já pertença a ela, deve fazer um esforço no sentido de verificar uma real apropriação dos processos de mediação pelo grupo. Isso quer dizer substituir modelos padronizados e estereotipados de apreensão da realidade por estratégias simbólico-discursivas que ressaltem a visão da comunidade sobre si mesma, reforçando suas identidades e valores. (2010, p. 187-8)

Nesse sentido, apostamos no poder da fala advindo com a prática do diálogo, instrumento de comunicação para o empoderamento de comunidades. No próximo tópico, explicitaremos algumas ações, bem como apontaremos os principais resultados já identificados nesses seis primeiros meses de projeto.

Ações e resultados

A fim de explicitar como estamos atuando neste grupo, traçaremos um esboço das metodologias e dos resultados que estamos obtendo. A principio, aplicaram-se questionários semi-estruturados, visando a elaboração de um diagnóstico inicial do grupo. Em seguida, foi realizado um Grupo Focal, com o intuito de identificar problemas de comunicação e apontar soluções. Por fim, realizou-se uma oficina de Comunicação Comunitária, para as mulheres participantes do projeto, visando à construção do sentimento de grupo e a apresentação de conceitos comunicacionais.

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A primeira ação dos estudantes de comunicação no projeto “Mulheres da Palha”, implementada em janeiro de 2011, foi a criação de um questionário em forma de entrevista semi-aberta, cujas perguntas estavam divididas em cinco temáticas básicas: identificação; profissão; valorização da profissão; sustentabilidade; comunicação; e visão de futuro. A aplicação do questionário ocorreu mediante visita dos bolsistas às residências das artesãs, por um período de três dias. Nesse contato inicial, a comunidade e os extensionistas criaram os primeiros laços de convivência, além de serem detectados muitos problemas de relacionamento, além de problemas sociais, como carência nas áreas de educação e saúde.

As entrevistas aplicadas foram baseadas em um questionário semi-estruturado. Nesta metodologia, parte-se de um roteiro-base, onde o modelo de entrevista parte de uma matriz contendo questões-guia que atendem aos interesses da pesquisa (DUARTE, 2006). É importante frisar que esta metodologia de pesquisa visa à intensidade das respostas e não uma quantificação de dados (DUARTE, 2006). A elaboração do diagnóstico inicial nos proporcionou perceber os primeiros sinais da folkcomunicação, já que foi aqui que tivemos o primeiro contato com a história e a produção artística das artesãs da palha de carnaúba. Esses produtos, ao longo de décadas, adquiriram um teor comunicacional e transmitem mensagens tais como devoção e tradição, estando arraigados à própria criação e desenvolvimento da cidade de Juazeiro do Norte, tendo em vista que esta cresceu em função dos peregrinos e fiéis que crêem nos milagres do Padre Cícero. Todo o ar de fantasia, milagre e imaginação que cercam a história de Juazeiro são envolvidos na produção do artesanato.

Após a aplicação dos questionários, foi elaborado um diagnóstico que aglutinou todas as respostas semelhantes em um mesmo texto. Sendo assim, constatou-se que o grupo estava na seguinte situação inicial: parte das artesãs ainda não tinha conhecimento do que se propunha o Projeto “Mulheres da Palha”, apontando para a urgência em potencializar a comunicação interna no grupo; também identificamos a facilidade de pequenas discussões tomarem maiores proporções, rompendo a noção de coletivo e, tendo em vista que um dos nossos objetivos seja o incentivo à comunicação interna, buscamos novas maneiras de demonstrar a importância da comunicação; pois, de todas as mulheres entrevistadas, apenas duas concluíram o ensino médio, o que vem dificultando a nossa ação.

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O Grupo Focal foi mais uma das atividades facilitadas pelos bolsistas de Comunicação Social - Jornalismo, tendo como objetivo principal a identificação dos problemas comunicacionais, a fim de que soluções fossem apontadas. Visando à imparcialidade, as mulheres foram identificadas por números e, ao passo que elas respondiam às perguntas, suas expressões subjetivas e faciais e corporais, também eram analisadas. Grupos focais são “[...] um tipo de pesquisa qualitativa que tem como objetivo perceber os aspectos valorativos e normativos que são referência de um grupo em particular” (COSTA, 2006, p. 181). Desta forma, visando identificar os principais problemas de comunicação, bem como incentivando a fala de cada uma das sete envolvidas nesta atividade, realizamos uma atividade com o intuito de identificar problemas, para posterior elaboração de atividades que suprissem aqueles percalços à formatação do grupo. Faz-se importante frisar que “o foco é buscar identificar as tendências sem expor os participantes” (COSTA, 2006, p. 190).

Aplicamos o referido Grupo Focal no mês de abril de 2011. Os alunos de comunicação dividiram-se entre as funções de moderador e documentadores. Após transcrição de todo o grupo, foi possível constatar que as “mulheres da palha” acreditam na importância da comunicação, especialmente com o público externo, no entanto, isso não impede que as mesmas não exercitem a fala, quando questionadas sobre algo, indicando que o não exercício do diálogo pode gerar problemas quanto à comunicação interna.

Semanas depois, a docente responsável no projeto pelas ações na área de comunicação, ministrou uma oficina baseada nos conceitos da comunicação comunitária para os bolsistas do projeto. Ao fim da mesma, os alunos formataram uma oficina para ser ministrada por eles às artesãs da palha.

A oficina, com carga horária de 12 horas, foi divida em três etapas. No primeiro dia, o grupo analisou a canção de Luiz Gonzaga “Nordeste pra Frente”, mote para debate sobre a importância do uso da mídia para o fortalecimento e conhecimento de grupo pela sociedade. Em seguida, utilizando-se de câmeras fotográficas, cada artesã fotografou sua comunidade, expondo lugares que representam fases importantes de suas vidas, dessa forma, procuramos reforçar a identidade com o local e contribuir para com a valorização do mesmo, por parte das mulheres que ali habitam. Ao fim desse dia, cada grupo de três artesãs, produziram um audiovisual onde puderam ser emissor, receptor e detentor do meio, ao logo de três “entrevistas”, cujo tema era escolhido por elas e

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variavam entre problemas estruturais da comunidade à dicas sobre a prática do artesanato.

Figura 3: Artesãs em oficina de comunicação (exercício de entrevista)

Foto: Rosane Nunes

Durante a oficina acima citada, as artesãs, inicialmente intimidades, ficaram surpresas e empolgados com a idéia delas mesmas construírem sua própria informação. A comunicação comunitária tem como premissa básica a alternância entre funções comunicacionais dentro da comunidade, de forma que emissor e receptor se encontram em constante permuta. Desta forma, o comunicador comunitário tem real conhecimento sobre a comunidade, bem como dos meios para transmitir as mensagens. Todas as mulheres estiveram como detentoras dos canais de comunicação, quer por meio de câmeras, quer por meio da palavra, fato não usual, pois como nos lembra Peruzzo (2004, p.73) “(...) pretender alcançar um grau de participação mais elevado é algo de difícil concretização. Em nosso caso, desde o período colonial, nos foi obstada ou até usurpada a possibilidade avançar nessa prática”. É neste sentido que vislumbramos a estruturação de um grupo a partir do exercício da comunicação como um meio de fortalecimento do indivíduo enquanto cidadão atuante na sociedade, empreendedor de ações que favoreçam o desenvolvimento pessoal e coletivo.

Na segunda etapa, as mulheres utilizaram as fotografias para embasar uma roda de histórias, onde estas possibilitam a criação de um enredo ora real, ora imaginário. O objetivo aqui foi incentivar, novamente, a fala das artesãs sobre si mesmas, a fim de consolidar a identidade do grupo, primeiro passo para a comunicação externa. Na ocasião, os vídeos feitos no primeiro dia de oficina foram exibidos para as mulheres.

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Figura 4: Aplicação da Roda de Histórias no segundo dia de Oficina de Comunicação Comunitária

Foto: Leylianne Alves

Por fim, na ultima etapa da oficina, unimo-nos ao cordelista Hamurábi Batista e demos inicio à feitura de um cordel9 contando a história das artesãs e de sua arte, bem como a relação das mesmas como a comunidade e o meio ambiente local. O resultado da última oficina foi a escolha em conjunto – artesãs, estudantes e docentes - das temáticas a serem abordadas no cordel – aspectos culturais, históricos e ambientais do artesanato em palha, assim como a elaboração de 12 estrofes. A seguir, os versos iniciais do cordel ainda em construção.

Eu vou contar a história/Das artesãs e sua lida/Seu trabalho, o artesanato/E a beleza desta vida/Tenha o leitor paciência/É uma história comprida./Começou com Padre Cícero/O labor desse trançado/Fazendo chapéus de palha./Pro sertanejo aplicado/E depois para o romeiro/O seu povo devotado (...) Na palha da carnaúba/Divulgou-se o aprendizado/Entre as mulheres do Horto/O costume bem formado/Trabalho e renda, garante/Bem comum configurado. (Fonte: arquivo do projeto)

Tendo em vista que o propósito final da oficina de comunicação comunitária foi a criação de um cordel contando a história da vida e da arte das artesãs de palha de carnaúba, mais uma vez encontramos o conceito de folkcomunicação, posto que a literatura de cordel é um produto da cultura popular e circula pelo cotidiano do povo, independentemente da mídia massiva. Embora a maior parte das mulheres seja analfabeta, o propósito do cordel também abarca a via da oralidade, já que pode ser

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cantado e facilmente decorado. O artesanato de palha de carnaúba sendo retratado em cordel, junto à história de suas protagonistas, pode ser considerado um fenômeno duplo da cultura popular, posto que envolva duas modalidades culturais e folkmidiáticas.

Considerações finais

A comunicação comunitária tem pontos de contato com a teoria da folkcomunicação. Em especial se tratamos de uma comunidade fortemente ligada à produção de artesanatos em palha e que vive em uma localidade que nasce em função da religiosidade do povo nordestino, vários são os aspectos que tornam esta comunicação tão necessária e complexa.

A relação ligada por meio de laços fraternos entre as “Mulheres da Palha” não facilita a comunicação entre elas. O diálogo vem sendo dificultado em função dos constantes impasses que envolvem o aspecto pessoal e profissional. No entanto, em momentos de debate sobre os conceitos de comunicação, a maior parte delas acredita no poder da palavra e admite que deveria expor suas opiniões, apenas não o fazendo por timidez. Além disso, outro passo importante é que elas vêm admitindo que devam tentar expor suas opiniões, diferente do que se dava no início do projeto.

Por fim, pode-se perceber que a relação entre os produtos e as mulheres é bastante intensa. Tendo em vista que estes produtos são um reflexo de anos de experiência, bem como de toda uma história de vida, eles comunicam tanto quanto as mulheres. Quando as artesãs deixam de comunicar, o fazem por meio de seu trabalho. No momento em que as próprias mulheres identificam os problemas com o diálogo, quer externo, quer interno, já dão mostras de que a comunicação é importante para melhorar seus produtos e vendas. Nesse sentido “(...) Quem detém a comunicação constrói uma realidade de acordo com seus interesses, justamente para poder garantir o poder.” (GUARESCHI, 1986, p.101). Ao tentarem mudar sua atual forma de comunicação, as artesãs ganham empoderamento para construir as redes que trarão o tão sonhado reconhecimento pela sua arte.

REFERÊNCIAS

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Métodos e técnicas de pesquisa em comunicação. 2 ed. Rio de Janeiro: Atlas, 2006.

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