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Jovens Negros do Bairro da Paz Arte Política e Patuás

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Academic year: 2021

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Jovens Negros do Bairro da Paz

Arte Política e Patuás

Umeru Bahia de Azevedo

Introdução

Este trabalho acompanha a trajetória da ocupação espacial de Salvador para descrever a atuação política de jovens de um bairro popular, símbolo de resistência a desocupações policiais. As desigualdades traduzidas nos espaços urbanos, nas segregações espaciais, fomentaram a pobreza da maioria da população na capital baiana, a acumulação de renda de uma minoria, a violência, o racismo e desconfiança para com o poder público. As chamadas invasões de terra dão oportunidade de cooperação coletiva de pessoas e famílias para a defesa do território conquistado sob um enxame violento de mortes e estigmas. Gerando possibilidade de fortalecimento das ações coletivas dos grupos organizados. Este é ocaso do Bairro da Paz, bairro em que moram os personagens centrais dessa trama relatada, é fruto dessa grande cooperação coletiva e, hoje, apresenta uma faceta de sua natureza através de jovens sua capacidade de produção intelectual, artística e política. Orientados pelo poderoso ímpeto da militância negra, estes jovens são um grupo influente nas decisões comunitárias, representam o bairro em reuniões administrativas do município e do estado. Fazem questão de trabalhar com parceiros do bairro na mudança da imagem registrada popularmente que o Bairro da Paz é um “lugar de marginais invasores de terra”.

Este trabalho está organizado em quatro partes. A primeira parte do trabalho resume as transições urbanas da cidade de Salvador e sua região metropolitana. O livro Como Anda Salvador é uma oportunidade para entendermos a trajetória da economia de Salvadoras, expressa na segregação espacial de suas áreas. Este olhar sobre a urbanização da cidade permite um entendimento das invasões ocorridas na cidade de Salvador nos anos 80, data registrada pela grande invasão e conquista da legalidade do Bairro da Paz.

A segunda parte reconstrói a história do Bairro da Paz através das etnografias e relatórios realizados pelo ECSAS (Estudos de Ciências Sociais, Ambiente e Saúde) entre 2000-07, das primeiras famílias ocupando terreno público, da legalidade e encontramos o momento presente. Da criação do orgulho de resistente e batalhador e vencedores de uma luta desigual com o poder público e setores privados ao expurgo do estigma de “invasor”, “marginal”, logo, “perigoso” dos moradores e do bairro.

A parte seguinte abre caminho para visualizarmos a atuação dos jovens artistas e políticos do Bairro da Paz no campo político de Salvador. Construindo uma espécie de sobreposições, arte, política e religião orientam-se em atividades coletivas, que

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expressam a ampla rede estendida através da cidade, interligando pontos afastados e centrais, autoridades políticas, da militância e artística com anônimos agentes espalhados pelos bairros.

A última parte é a conclusão do trabalho. Estão reunidas algumas questões sobre o poder público e privado na sua relação com a juventude e a arte engajada politicamente na cidade. Assistencialismo, contribuição do poder público e privado ou fomentar um amplo mercado político e cultural que permita expressão e espaço para decisões comunitárias e municipais sobre o planejamento urbano da cidade de Salvador.

Iº parte. Uma Salvador de contrastes: dos monopólios à segregação espacial. Pequena história da economia baiana

O início do século 20 veio com uma estupenda valorização do cacau que enriqueceu a economia baiana. Muitas famílias enriqueceram neste tempo. Porém Já nas primeiras décadas, empresas da Inglaterra começaram a produzir cacau na África, limitando a amplitude global do cacau baiano. No sul do país, na década de 30, houve um crescimento da indústria paulistana e do Rio de Janeiro que incluía o cacau quebrou a frágil economia baiana que mesmo com um forte produto no mercado não possibilitou uma expansão do mercado regional para produtos industriais e serviços (Almeida, 2006).

O monopólio ou concentração de redes industriais, interligadas pelo cacau, desacelerou a economia baiana que estava cada vez mais se restringindo ao mercado interno e se tornando uma espécie de metrópole regional. No auge do principal vetor da economia baiana de então, em 1929, o cacau era apenas 6% das exportações do país (idem).

Havia pouco investimento e diversidade de empresas na capital do estado: em 1930 haviam 2.204. 61 tinham 12 operários. 158 contavam de 7 a 12 operários, 600 empresas possuíam em seu corpo somente 1 a 6 operários e nada menos do que 1.325 (60, 1%) empresas tinham apenas 1 operário. A cidade já estava a quase cem anos em decadência, de antigo centro econômico do Brasil até meados do século 19 a posição secundária, atrás de duas grandes metrópoles, em amplo processo de modernização econômica (ibdem).

Faltaram à Bahia redes econômicas e sociais que criassem um dinamismo interno como em outras cidades do país (no sul), que mobilizasse cidades médias, estimulando o crescimento regional do mercado e da produção para outras regiões, possibilitando investimentos e diversidade de serviços. Salvador se tornava a capital do Recôncavo, devido sua importância limitada nos mercados externos (ibdem).

Nas décadas (1960-80) seguintes uma transformação importante se estabeleceu na economia baiana. Novamente um monopólio se desenvolveu na economia do estado, produzindo um efeito semelhante ao do cacau (ibdem).

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Ações do Estado abriram caminho para a transformação na economia. Ampliação da geração e distribuição de energia pela hidroelétrica de Paulo Afonso. Construção da ligação Rio-Bahia pela Br116 que acelerou o comércio interestadual com o sul. Criação do Banco do Nordeste e da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste, possibilitando investimento para a indústria e infra-estrutura. Construção das avenidas de vale que interligam os bairros e facilita o trânsito pela cidade. Inauguração da Avenida Paralela (onde foram construídas a Rodoviária, o grande Shopping Iguatemi e a ligação com o litoral norte e aeroporto). Local hoje de grande especulação imobiliária). inauguração do Vilas do Atlântico o mais importante empreedimento imobiliário dessa época e que ditou a expansão de serviços e construção civil em sua região, o litoral norte. Serviços como faculdades privadas e expansão a Universidade Federal da Bahia. Bairro nobres se formavam no entorno do Shopping Iguatemi, região que estabeleceu como o novo centro econômico da cidade (ibdem).

Em 1973 surge a Região Metropolitana de Salvador (RMS). Sua criação aconteceu em meio a uma crise que acabou por descolar a cidade de sua importante região de auxílio, o Recôncavo. Descolada a se tornou uma colcha de municípios mal amarrados, com precários serviços públicos que pareciam mais atender as demandas da ditadura em centralizar para não se desmanchar em revoltas como as do ABC (ibdem).

O petróleo fora o principal vetor da economia baiana e colaborou para o crescimento de algumas cidades do Recôncavo e incrementou a renda do estado aponto de em 1959 representar 59,9% do PIB industrial e 7,9% do PIB total. Em 1967 é inaugurado o Centro Industrial de Aratu (CIA) e em 1972 o Complexo Petroquímico de Camaçari (COPEC). Até então a Bahia era o principal pólo de petróleo do país. Ambos os projetos estão nas intermediações da cidade de Salvador (ibdem).

No ano de 1980 o pólo de Camaçari representava 80% (cerca de 3,7 bi) do PIB baiano com US$ 12 bi. Esta época havia uma espécie de boom do pólo que alimentava a economia baiana com investimentos (ibdem).

A falta de serviços industriais contribuiu muito para que a economia crescesse em ritmo cada vez mais lento. Em 1975-80 o estado crescia a 8,8%, na década seguinte somente a 2,4% e em 90 2,5%. Um grande desaceleramento. Assim o PIB também acompanha essa velocidade. Em 1970-75 o crescimento era de 9,1%, em 1978-80 houve um ligeiro aumento, foi para 11,3%, depois começou a cair, de 80-85 apenas 3,3%, 1985-90, cresce novamente pouco, 5,7% e em 1990-96 só cresceu 1% (ibdem).

A hiperconcentração industrial, não diversificou os investimentos, as empresas e os postos de trabalho. A grande quantidade de novos postos de trabalho (cerca de 50 mil) estava praticamente dividida meio a meio entre CIA e COPEC. Havia portanto uma grande concentração de renda que monopolizava os recursos e impedia o processo de diversificação das redes de empresas industriais. As industriais se limitavam ao sustento da petroquímica (ibdem).

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A recente implementação da Ford representa uma grande política de atração fiscal do estado para que indústrias de peso pudessem compor as redes industriais da economia. Calçados, eletrônica, plásticos, celulose (Monsanto) são industriais importantes mas alcançam Salvador, pois estão em outras regiões do estado. A economia da capital não aproveita os diversos efeitos dessas industriais para acelerar o crescimento econômico e a urbanização da cidade (ibdem).

Essas redes industriais não conseguiram ter tanta participação no PIB do estado como fora o cacau e o petróleo. Em 2003 os serviços correspondiam 75% do PIB baiano (hotelaria, alimentação, transporte, armazém, comunicações, serviços financeiros e empresariais) enquanto que se esperava tímidos . Novas edificações e regiões da cidade são ocupadas por essa invasão de serviços que se acumulam em pontos da cidade, sobretudo na orla atlântica (ibdem).

Segregação sócio-espacial

A cidade em 1600 limitava-se ao hoje chamamos de centro histórico ou cidade velha. Em 1900 houve uma expansão para a orla da Baía de Todos os Santos. Já 1940 ocorrem as grandes ocupações de vale por populações com baixa renda, há um crescimento da orla da baía e já vemos as primeiras ocupações na orla atlântica (Carvalho e Pereira, 2006).

No início da cidade a segregação se definia mais acentuadamente no interior do domicílio e no âmbito da edificação, escravos e agregados quase sempre em andares inferiores dos sobrados das famílias mais ricas (idem).

Em termos de inserção urbana, os primeiros sinais de segregação por estratificação de renda no espaço construído se manifestaram nas franjas da ocupação contínua, com as novas edificações no final do século 19 para famílias ricas, partindo do que era então o centro da cidade na direção sul (onde estão os bairros nobres da Graça, Vitória e Campo Grande) enquanto que as famílias pobres na direção norte (Lapinha, Soledade e Cidade Nova, no Subúrbio Ferroviário (ibdem).

Em 1946 ocorre a primeira “invasão” na estrada de Pero Vaz, na Liberdade, próximo ao Curuzu, sede do Ilê Ayê. Esta invasão foi chamada de Corte Braço (ibdem).

Em 1968 a Prefeitura transfere sua propriedade para mãos privadas através da Lei de Reforma Urbana. Neste tempo a construção das avenidas de vale extirpou um conjunto significativo de assentamentos de populações mais pobres que ocupavam tradicionalmente os fundos vales até então inacessíveis (ibdem).

O governo erradicou invasões populares localizadas na Orla Atlântica, área reservada ao turismo e lazer. Nessa mesma década, 1960 a ocupação da orla norte pelas classes mais nobres se consolidou, enquanto que no Miolo e Subúrbio limitou-se às populações mais pobres (ibdem).

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A ocupação do Subúrbio começou em 1860 com a instalação da linha férrea e se intensificou em 1940 com os loteamentos populares e invasões. Hoje é o local com mais violência da cidade e quantidade de sem-teto ocupando prédios abandonados (ibdem). Em 1980 com o pólo petroquímico e a Estrada do Coco o capital imobiliário começou a oferecer empreendimentos mais qualificados na orla norte. O mais importante deles foi o Vilas do Atlântico (vendido como um novo conceito de moradia, associado a uma vida mais saudável e integrada à natureza, com uma comunidade homogênea e longe do barulho, da poluição, da criminalidade e de outros males urbanos) (ibdem).

Situação de habitação na cidade de Salvador

As desigualdades se traduzem nos espaços da cidade, desenhando fronteiras que indicam diversas segregações sociais. Uma cidade formal – caracterizada por áreas de boa oferta de infra-estrutura regulada pelo mercado imobiliário e normalmente atendendo à legislação urbanísitca de condições de deificações e uso do espaço. Outra cidade, de moradias informais, geradas por loteamentos irregulares e clandestinos, bem como invasões de áreas públicas e privadas – ocupadas pela população de baixa renda em decorrência de sua impossibilidade de acesso ao mercado imobiliário e da pouca efetividade das políticas habitacionais de interesse social (Pereira e Gordilho, 2006). Há 651,293 domicílios (em 2000), sendo que 82 mil são ocupados por famílias com renda até 3 salários mínimos (SM). 60% da população vivem em 400 mil domicílios em áreas precárias quanto aos serviços públicos de infra-estrutura e com condições irregulares fundiárias (idem).

Somando aos baixos rendimentos da maioria da população e aos poucos investimentos públicos na produção habitacional, há ainda grandes áreas de reservas de mata atlântica com a presença de aqüíferos interligados que estão vulneráveis à pressão imobiliária. Sobretudo ao longo da extensa e importante Avenida Paralela, onde o Bairro da Paz está, existem muitas áreas de ‘mata’ valorizadas por sua capacidade de espaço, proximidade à Paralela que liga o centro ao lado norte da cidade, a BR 116, ao aeroporto e que vê, recebendo importantes empreendimentos (do centro administrativo do estado, Odebrecht, duas grandes faculdades privadas, condomínios nobres, um grande shopping e projetos comerciais de grande porte) (ibdem).

A cidade tem três vetores de crescimento: a Orla Norte, o Miolo, região que é o centro geográfico e o Subúrbio Ferroviário (ibdem).

A orla contém os bairros nobres e a maior concentração de serviços públicos e privada. São as pessoas mais abastadas, em sua maioria brancas, escolarizadas e ocupando os mais altos cargos nas hierarquias de trabalho. Bens como computador e carro estão mais concentrados nos domicílios de orla que de 80 a 100% são apartamentos (ibdem).

É o principal vetor de crescimento de serviços públicos e privados. Em algumas áreas há ocupações irregulares e baixa condição de vida ao contrário de seus vizinhos ricos,

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dentre estas áreas se destacam o Nordeste de Amaralina, o Calabar, Boca do Rio e o Bairro da Paz (ibdem).

Os dois outros vetores se caracterizam por grande pobreza de sua população. O miolo, região central, está ocupado por moradias de trabalhadores com renda baixa e em condições irregulares de moradia. Serviços públicos (luz, água, telefone, lixo e esgotamento) abarcam essas regiões com pouca qualidade de serviço, limitada capacidade de extensão, uma vez que muitas moradias são irregulares e as rendas muito baixas (até dois salários mínimos, metade da população dessa região, fonte IBGE Censo 2000). O Subúrbio Ferroviário ainda sustenta o título de lugar mais violento da cidade com cerca de 80% dos homicídios da cidade (ibdem).

Condições demográficas

Salvador é a terceira cidade mais populosa do país, comanda a 6º região metropolitana brasileira em termos demográficos. A cidade cresce populacionalmente e aumenta ainda que lentamente sua participação de residentes na Bahia (de 21,0% em 1991 a 24,2% em 2004). Fenômeno que é impulsionado pela migração de pessoas do interior para outros estados e regiões da Bahia (Fernades, 2006).

Lauro de Freitas da região metropolitana de Salvador, pela política de criação de serviços públicos e privados, como infra-estrutura, faculdades shoppings, lojas de atacada e varejo, condomínios e serviços turísticos e de lazer refletem o crescimento deste município. Muitos dirigentes empresarias optam por morar em Lauro de Freitas do que em Salvador. Esta cidade é caracterizada pela extensão da ocupação nobre na orla de Salvador (idem).

Enquanto o estado teve crescimento urbano de 59,0% em 1991 para 67,1% em 2000, a Região Administrativa de Salvador cresceu de 96,6% para 98,4% em 2000 e o municio de Salvador cresceu urbanamente muito pouco somente de 17,5% em 1991 para 18,7% em 2000. A própria participação da população residente na RMS diminuiu de 83,1% em 1991 para 80,9% em 2000 (ibdem).

A cidade está dividida por faixa etária também. É uma cidade que 26,13% de pessoas entre 0 a 14 anos e no chamado Miolo 33-40% das pessoas têm esta faixa etária. Enquanto que somente de 1 a 3,5% têm mais que 65 anos. Nas zonas mais ricas este número chega a 14% das pessoas (ibdem).

A conhecida ‘cidade das mulheres’, sejam em terreiros ou no trabalho doméstico representam 39,4% da proporção de responsáveis por família. Da totalidade de famílias (717,538) 17,55 são mães com filho, contra somente 2,1% de pais com filhos. Casal com filho é o mais freqüente 39,6% e casal sem filho conta com 9,2%. (IBGE, censo demográfico 2000) (ibdem).

A esperança de vida ao nascer no estado saltou de 65,73 anos em 1991 para 69,64 em 2000. Em Salvador estava em 69,6 anos em 2000 (ibdem).

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Salvador aparece com saldo negativo quanto à chegada de pessoas do interior. Lauro de Freitas através de suas políticas de atração recebeu 20.152 pessoas de uma totalidade de 30.150 para a toda a RMS (ibdem).

Violência e extermínio

Esta parte analisa alguns significados sociais dos homicídios em Salvador. Pela complexidade desse fenômeno e das dificuldades para uma definição absoluta, chamaremos violências e não mais no singular. Têm-se constatado o envolvimento de policiais na ocorrência de homicídios, mesmo sem evidências de intervenções legais. Excluindo-se as execuções sumárias e clandestinas, os massacres e atos de extermínio, no início da década de 90, representam 7% do conjunto de mortalidade por causas externas. Em Salvador uma entre cada dez mortes violentas de crianças e adolescentes são causadas por este tipo de homicídio. 855 dessas mortes foram com arma de fogo (Paim, 2006).

Neste tipo de violência apenas 1% das vítimas são brancas, já 67% eram negras e 22% considerados mulatos (somado este dois grupos encontramos os 89% dos mortos, entre 1991 e 1994 (idem).

A violência de homicídios também está marcada no espaço da cidade. Em áreas com melhoras condições de vida ouve uma redução de 20,1 (em 1991) para 13,5 (em 2000) óbitos por homicídio para cada 100 mil. Em áreas com piores condições de vida: 37,9 e 26,6% nestes anos. Apesar da redução há áreas (sobretudo do Subúrbio, com uma taxa de até 179,60 homicídios por 100 mil habitantes em 2000, em 1997 eram 431,30) que estão o número de homicídio vem crescendo, enquanto um sensível deslocamento para áreas com mais condições de vida (ibdem).

Segregação espacial e raça

Em 2000 54,8% se identificaram como negros e 20,4% como pardos. Historicamente estes grupos se encontram na base da pirâmide social (Carvalho e Pereira, 2006).

Neste mesmo ano 3,1% dos brancos era dirigentes e grandes empresários, 15,4% como profissionais de nível superior, 5,7% eram pequenos empregadores, 37,6% em ocupações típicas de classe média (ocupações técnicas, de supervisão e de escritório.10,4% estavam no setor secundário, 17% no setor terciário relativamente especializado, 10,2% como prestadores de serviços não especializados empregados domésticos, ambulantes e biscateiros (idem).

Havia em 2000 0,8% de pardos entre dirigentes e grandes empregadores, 5,1% entre profissionais de nível superior, 1,7% entre os pequenos empregadores, 28,2% entre os que desempenhavam ocupações de nível médio, 19,1% entre os trabalhadores da indústria, 7,7% na construção civil, 23,4% entre os prestadores de serviço relativamente especializados, 21,2% não especializados (ibdem).

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Em 2000 somente 0,8% dos negros entre dirigentes e grandes empregadores, 5,1% entre profissionais de nível superior, 1,7% entre os pequenos empregadores, 23,6% tinham ocupações de nível médio, 21,7% trabalhavam na indústria (metade na construção civil), 23,1% estavam ocupados como prestadores de serviços não especializados e 34,1% eram empregados domésticos, ambulantes e biscateiros (ibdem).

A divisão por cor na cidade de salvador. Como a posição na estratificação social e a apropriação do espaço urbano são estritamente articulados, o território metropolitano acaba por assumir diferentes cores. Com a predominância quase absoluta dos brancos na Orla Norte e pretos e pardos no Miolo e Subúrbio (ibdem).

No ano 2000 a duração média do tempo de procura por trabalho chegava em São Paulo e Porto alegre à 10 meses; em Belo Horizonte durava 11 meses e em Salvador demorava cerca de 12 meses, enquanto que no distrito federal durava15 meses. Taxas muito alta para quem precisa de trabalho (Carvalho e Codes, 2006).

Os números de desempregados há mais de um ano em busca de trabalho no mesmo ano: Belo Horizonte, 21,0%, Porto Alegre, 21,6%, em são Paulo 21,8%, Salvador, 26,5% e no distrito Federal, 31,6%. Em 2003 em Salvador 47,5% dos trabalhadores não contribuíam com a previdência, enquanto que em Belém era 61,0%, em Fortaleza, 56,15 não contribuíam, 50,9% em Recife, 39,7% em Belo Horizonte, 38,2% no Rio de janeiro e em São Paulo 37,5% não tinham participação na previdência., 37,45 em Porto Alegre e 34,9% no Distrito Federal. O desemprego desde 1987-88 vem aumentando, de 8,9% neste ano, para 12,6% em 1997-98 e em 2003-04 já são 15,2%, a capital com mais desempregados. O desemprego chega a 26,0% quando abarcados àqueles que não procuram emprego por desalento. Cerca de 45% dos habitantes estão na informalidade segundo dados do IBGE de 2000 (idem).

Pobreza e Indigência

As estatísticas de salvador têm um caráter histórico acentuado pelas décadas de estagnação econômica. Na segunda metade do século 20 isso mudou. Ainda que a Petrobrás e o Centro Industrial de Aratu tivessem vínculos reduzidos com outros setores industriais, estimularam direta e indiretamente o surgimento de novas atividades e o a expansão de outras: a administração pública ganhou mais peso, o varejo acelerou sua renovação com a multiplicação de shopping centers, megastores e supermercados, houve crescimento da engenharia, sobretudo da construção civil, telecomunicações e transportes. A agropecuária perdeu importância. Nestas últimas décadas do século 20 a classe média cresceu por conta da expansão de empregos de escritórios e por conta de uma maior demanda de técnicos profissionais de qualificação superior (administradores, economistas, contadores, advogados, professores e profissionais de saúde (Carvalho e Codes, 2006).

De acordo com os novos padrões de organização e competitividade as empresas têm buscado uma maior redução de custos, cortes em postos de grande remuneração e ampliaram a contratação precária, sem carteira assinada. Salvador portanto está também

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inserida nesta época de precarização e terceirização do trabalho. O peso da Região Administrativa de Salvador é o subproletariado ao lado do elevado nível de desemprego. Todos ocupando as áreas do Miolo da cidade e do Subúrbio enquanto que na Orla Norte se encontram os grandes empregadores, dirigentes do setor público, profissionais autônomos e empregados de nível superior (idem).

O pobre é àquele que a renda mensal familiar não ultrapassa meio salário mínimo. Já o indigente tem apenas um quarto de salário mínimo na renda mensal familiar (ibdem). .

Os números de pobres e indigentes pelo Brasil. 30,4% de pobres em Belém, 36,6% em Fortaleza, em Recife há 31,8% e 30,9% em Salvador. Já em outras capitais: 18,7% em Belo Horizonte, 15,6% no distrito Federal, em Curitiba eram 13,7%, 11,6% no Rio de Janeiro, 11,5% em São Paulo e 11,2% em Porto Alegre (ibdem).

O rendimento médio mensal em Salvador é de 26,6% da população que tem 1 salário mínimo, 54,8% têm até dois salário mínimos, 67,0% tem 3 salários mínimos e acima Ed 3,5% 33,0% da população (ibdem).

Em 1991 havia 35,28% de moradores em situação de pobreza em salvador e 53,2% na Região Administrativa de Salvador (RMS). Em 2000 esse número se reduziu para 30,7% em salvador e 46,0% na RMS. A indigência em 1991, por sua vez, era de 14,98% em Salvador e 27,5% na RMS. Em 2000 o número teve uma sensível queda para 13,45% em Salvador e 23,1% na RMS (ibdem).

A concentração de renda tem aumentado. Em 1991 20% dos mais pobres tinham 2,7% da renda, em 2000 se reduziu para 1,7% da renda. Já 10% dos mais ricos em 1991 tinham 45,7% da renda enquanto que em 2000 esse número chegou a 48,3% (ibdem). Há muitas noções para pobreza, optamos deste modo a utilizar esta categoria em seu caráter tanto numérico (que corresponde à renda familiar) quanto no seu valor relativo. A pobreza é portanto produto de uma relação desigual em que há franca acumulação e concentração de benefícios sociais por parte de um grupo, normalmente muito pequeno nos países de terceiro mundo. A pobreza impede a competição, criação de estigmas e exclusão de serviços diversos, tanto públicos quanto privados, ainda que uma ampla rede econômica se aproveite dessa condição.

IIº Parte. Uma breve história do Bairro da Paz

Veremos a história do bairro através das notícias de jornal. Relocações, investidas policiais e precárias situações são noticiadas pelos jornais até fins de 1980. São informações retiradas dso relatórios apresentados ao SEBRAP do projeto Inclusão e Exclusão Social, mecanismos de inserção

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O jornal A Tarde de 09 de agosto de 1982 noticia que a invasão intitulada de Malvinas iniciada “há alguns meses atrás” começa a chegar à Paralela, avenida de grande importância para a capital baiana, anunciando a grande proporção que começa a tomar. “Começando no bairro de Itapuã, a invasão se estende por trás das fazendas existentes na Avenida Orlando Gomes, chegando até a Avenida Paralela, ocupando uma área de milhares de metros quadrados, antigamente ocupada por uma fazenda”. Em diversas notícias aparece a referencia a ex-fazenda, onde então surgia as Malvinas em triste homenagem à guerra entre Inglaterra e Argentina, e, em muitas relata a deslegitimação da propriedade. Ainda na matéria do dia nove há uma referencia à presença de policiais do 5º batalhão para fiscalizar o local.

“Moradores resistem à mudança das Malvinas”, é o título da reportagem do A Tarde do dia 26/03/83. Nela está relatada uma divisão dos moradores, entre os que querem permanecer e os que prefeririam sair para a nova localidade, em Itinga. Alguns diziam que preferiam pagar pelo lote de terra a ter que deixar o local.

Em 26 de março de 1983 é publicado: “A ‘invasão’ das Malvinas existe há cerca de um ano e quatro meses e, nesse período, segundo os seus moradores, ocorreram 18 investias na área, a princípio por pessoas enviadas pelo proprietário do terreno para expulsa-los, depois, pela polícia ‘com metralhadoras, bombas de gás e até cães policiais’

Em 19 de agosto de 1983 o jornal A Tarde publica a desapropriação da área das “Malvinas”. Após 180 dias de administração de Manoel Castro, ele assina a desapropriação da área de 932.000 m2. O Prefeito foi homenageado durante o ato de assinatura da desapropriação e foi parabenizado “pelo trabalho desenvolvido até agora, inclusive a transferência dos invasores de Malvinas para o subúrbio de Coutos”.

Em 31 de janeiro de 1987, a Tribuna da Bahia publica duas pequenas matérias chamando a atenção apara o reaparecimento das Malvinas. Cerca de oito meses antes o mesmo periódico publicou a visita de candidatos a Deputados Federal e Estadual às mulheres que se organizavam. Estas matérias mencionam o reaparecimento da Malvinas cinco anos após a retirada das famílias para o bairro de Coutos. O terreno aparece agora arrendado a família Visco após sua transferência para a prefeitura em 1982.

Dois trechos da matéria da Tribuna da Bahia de 05 de fevereiro de 1987 chamam a atenção. Em um trecho aparece a diversidade da fauna da região. “Grande parte deles porta armas de fogo, mas apenas como meio de conseguir o que comer. ‘Nós matamos preás, cutias e teiús que tem aqui’, diz Renato”. No segundo há o temor que provocava a invasão das Malvinas atualmente sentido pelo Bairro da Paz, em larga escala: “Se para os novos invasores o local significa a possibilidade de ter onde morar e trabalhar, para os moradores das áreas vizinhas, a invasão, certamente, dá inicio a um pesadelo já bastante conhecido em Salvador: a ameaça dos marginais.

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No dia 07 de fevereiro de 1987, a Tribuna da Bahia publica a nova destruição dos barracos pela PM.

“Duas mil pessoas já estão nas Malvinas”, Tribuna da Bahia de 09/02/1987. Nesta edição o jornal parece trazer uma denúncia contra a prefeitura eleita que “prometeu mundos e fundos aos invasores”, mas passado o período eleitoral, a própria prefeitura já informou que seriam “erradicados” do local. “A solidariedade é uma constante nas Malvinas. Mulheres e crianças só têm um pensamento: construir seu barraco antes que a polícia apareça no local. Como fez na semana passada, derrubando os barracos em construção e o sonho de milhares que não têm onde morar.

Em 10/02/1987, o mesmo jornal publica uma foto de uma palhoça de seis varetas sustentando um pequeno telhado de palha com a seguinte legenda: “Tem sombra, mas não tem água fresca”. O título “Malvinas é problema que cresce todo dia” desta vez não está se referindo somente a chegada de novos invasores e ao aumento da quantidade de pessoal nas Malvinas, refere-se a falta de condições de vida dentro do terreno e disputa.

“Malvinas foi sitiada” é a matéria do dia 08/04/1987, que denuncia o plantão de policiais na

entrada da favela impedindo a entrada e a apreensão de material de construção. Segue falando do apoio de grupos organizados que chegaram para os moradores: “Malvinas que ressurge três anos após a sua transferência para Coutos, conta com o apoio de grupos organizados que prestam assistência jurídica e orientação técnica aos invasores, de modo que assentem as casas de acordo com desenho urbano estabelecido pela prefeitura”.

O desentendimento entre prefeitura e governo está relatado na tribuna da Bahia de 09/04/1987. Muitas pessoas aproveitando a tolerância do estado começaram a mudar para as Malvinas. Todavia, a prefeitura não respeitou a determinação do estado e começou e, na manhã do dia 08 de abril começou a de a funcionários da Limpurb escoltados por trinta e cinco policiais a derrubarem os barracos. O cadastramento que está registrado nesta matéria refere-se agora à permanência dos moradores no bairro.

Um dia após a reunião na Governadoria, o jornal A Tarde de 10/04/1987, publica que apesar da liminar de reintegração movida por Aída Rodrigues da Costa Visco, as famílias ainda não haviam sido retiradas. Nesta reportagem fala-se em 5.000 barracos e cerca de 20.000 pessoas.

Na Tribuna da Bahia de 26 e 27/04/1987, sob os títulos de primeira página, “Quinze mil disputam as Malvinas” e o da matéria, “Malvinas vive cotidiano de medo”, aparece uma contextualização do vivido no bairro. Na capa foi publicado o trecho: “Uma ilha de barracos e crianças famintas cercada de mato e policiais por todos os lados”.

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Em 13/06/1987 a Tribuna da Bahia, publicou uma pequena matéria apontando a situação da saúde nas Malvinas. Segundo amostras coletadas nas oito cisternas de água que abastassem a população sete deram alto grau de impropriedade para o consumo.

Em 24 de dezembro de 1987, o jornal A Tarde publica, encerrando aquele ano, que parece ter mudado a relação do poder público com as Malvinas, uma matéria que anuncia a doação de parte do terreno da família Visco a prefeitura.

Começa aqui, o afastamento do discurso das notícias de 1987, onde prevalece o noticiário da disputa pelo espaço, das notícias de 1988 onde prevalece a questão da urbanização do recém consolidado Bairro da Paz. Os chefes do executivo municipal e estadual colocam-se agora na postura de bem-feitores e não mais na de defensores da propriedade privada.

Em 14 de janeiro de 1988 o jornal A Tarde anuncia: “Invasão Malvinas será um novo bairro de Salvador”. Cerca de mil pessoas recebem a comitiva do governador e do prefeito acompanhados de vereadores e líderes comunitários.

“Moradia une família” – O Secretário Lauro Assunção, que coordena o plano de habitação do governo, disse que o ato de ontem, nas Malvinas, era uma demonstração de que a questão das ocupações irregulares de terras em Salvador deixou de ser tratada como um caso de polícia, lembrando que as famílias que para lá foram compelidas são, na verdade, formada de trabalhadores, de certa forma penalizados por não terem acesso a uma moradia”.

A Tribuna da Bahia, também do dia 14/01/1988, anunciava “Moradores da Malvinas têm

garantia sobre a não transferência do bairro”. A prefeitura anunciou, ainda, que seria feita a transferência de algumas famílias para um novo bairro, contínuo às Malvinas, mas somente quando este estiver totalmente dotado de infra-estrutura. O prefeito reafirmou o compromisso de adotar o novo “Bairro da Paz” e dotá-lo de luz, água, esgoto, ruas pavimentadas, posto de saúde e casa comunitária.

Cada vez mais claro, a preocupação da sociedade soteropolitana com as Malvinas, já em 04 de abril de 1988, não era mais a ocupação de um terreno de grande valor imobiliário (apesar de aparecerem pequenas menções a uma possível transferência das Malvinas), mas a infra-estrutura de um novo bairro de extrema pobreza em Salvador.

Com o título “Malvinas rouba energia para barracos”, a matéria anuncia que a “Coelba ignora as necessidades da invasão, que para ter luz corre o risco de muitos acidentes”. “Nem todos os barracos das Malvinas têm energia elétrica.

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“Coelba regulariza Malvinas” está na tribuna da Bahia de 01/08/1988. “Até o final do mês, dos 15 mil moradores da favela das Malvinas terão postos de assistência médica-odontológica, policial e de vigilância, colocados no local pelo governo.

A entrega da urbanização das Malvinas aparece na tribuna da Bahia de 09 e 10/10/1988. “Os moradores da invasão das Malvinas dispõem agora de creche, escola, postos médicos-odontológicos e policial, lavanderias comunitárias, poste de luz, novos chafarizes e campo de futebol.

Em 11/10/1988, tribuna da Bahia e A tarde, respectivamente, publicam: “’Minha Casa’ começa a mudança nas Malvinas” e “Melhorias Chegam ao Bairro da Paz” (essa matéria do jornal A Tarde refere-se pela primeira vez ao “Bairro da Paz” num título). No jornal A Tarde aparece sob o sub título “Transferência do ‘gato’” a mudança dos gatos que vinham da avenida Paralela para os novos postes instalados dentro do Bairro da Paz.

A Tribuna da Bahia de 14/10/1988 anuncia que o “Governo começa construção do Bairro da Paz”. “Na próxima semana, o governo do Estado começa a construir com recursos próprios o novo Bairro da Paz, ao lado da invasão Malvinas, que terá três mil casas, serviço de infra-estrutura e equipamentos comunitários”.

Após a invasão e o retorno às Malvinas na década de oitenta, “hoje, o Bairro da Paz já respira dias melhores com luz elétrica, água encanada que chega em algumas casas construídas de bloco, escolas de primeiro grau do estado e do município, linha de ônibus. Mesmo assim, ainda carece de melhoras no tocante à infra-estrutura, como rede de esgoto, pavimentação das ruas, por exemplo”.

Quase dez anos após esta última notícia do início das obras, o jornal A Tarde de 09/02/1997, publicou: “Malvinas vira Bairro da Paz mas criminalidade permanece”.

“Na invasão, várias quadrilhas se formaram, aumentando a violência muito embora os policiais já admitam uma melhora, em razão das diligências efetuadas na área”. “Mesmo assim ainda ocorrem os casos de estupros, assassinatos, tiroteios, assaltos aos pequenos estabelecimentos comerciais, tráfico de drogas e as intermináveis brigas de vizinhos, todos estes acontecimentos contribuindo para aumentar as estatísticas da 12ª Delegacia”.

A década de noventa é encerrada nos jornais com uma matéria do jornal A Tarde de 15/06/1998. O título “Moradores do Bairro da paz estão muito apreensivos com a relocação”, mostra um antigo fantasma que atormenta os moradores do bairro.

Em 31/05/2000 a matéria “Principais ruas do Bairro da Paz serão urbanizadas”. Segundo censo de 2000, mais da metade da população residente no bairro, 56,9%, vivem abaixo da linha de pobreza, enquanto que a média da capital baiana é de 28%. Considerando como linha de pobreza a proporção de famílias com renda familiar per capita até meio salário mínimo mensal – critério comumente utilizado nos programas sociais de transferência de renda do governo federal.

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Com o jornal Correio da Bahia de 19/03/2002, inaugura uma nova fase na referência ao Bairro da Paz. Agora os jornais divulgam as diversas ações sociais que acontecem no bairro, bem como as obras e inaugurações de obras. A presença de políticos e autoridades que “freqüentam” o bairro para as diversas solenidades. Há uma mudança total no trato que é dado ao bairro e a seus moradores, que, agora, são cidadãos carentes e “responsabilidade do poder público”. A intervenção na localidade, que já foi iniciada com ações de topografia, engloba serviços de implantação de pavimento asfáltico na via principal e seis outras secundárias, assentamento de passeio e meio fio, obras de drenagem das águas pluviais, além do plantio de grama para proteção de taludes e o remanejamento de postes e tubulações de água”.

Em 03/05/2002, o Diário Oficial publica as obras entregues e as que estão em andamento e apresenta novos benefícios: “Também está sendo construída a escola Nova do Bairro da Paz, com 16 salas de aula, e feita a entrega de títulos de posse de terra aos moradores da região. Com mais de 50 mil moradores, o bairro terá novo ânimo com a construção do Centro de Convivência e Aprendizado. “Creche-escola auxilia famílias carentes” é o título da matéria do Correio da Bahia de 07/05/2002, que fala do trabalho da “Creche Espírita”, nas redondezas do Bairro da Paz. Os moradores passaram a contar com o a Creche escola Tereza batista.

O jornal A Tarde de 26/05/2003 publicou a chegada do programa justiça Itinerante, uma parceria entre o Tribunal de Justiça e a Faculdade Unyhana. Trata-se de um caminhão que leva o “tribunal” aos vários bairros da cidade, onde os moradores podem resolver de mais rapidamente questões como separação, reconhecimento de paternidade, pensão alimentícia, questões previdenciária, de FGTS, etc.

O Correio da Bahia registra, em 28/04/2004 uma visita de vistoria de obras feita pelo prefeito Antonio Imbassahy, aos bairros de Pernambués, Baixinha de Santo Antônio e Bairro da Paz. “No Bairro da Paz, a prefeitura finalizou o novo Centro de Saúde, que vai atender mais de 45 mil moradores da região. Até o final de maio o posto deverá ser entregue a população”. O mesmo jornal em 18/05/2004 publicou uma longa reportagem sobre a rádio comunitária do bairro com ações desenvolvidas e os financiamentos que colaboram para que esteja no ar. Ecoando em 58 alto-falantes espalhados em pontos estratégicos do Bairro da Paz, a programação da rádio comunitária se faz ouvir em 90% dos 792 mil metros quadrados de área da localidade.

Em 26/08/2004. O diário oficial anuncia a construção da escola de ensinos fundamental (5ª à 8ª séries) e médio. “O Bairro da Paz, em Salvador, deve ter em 2005 uma nova escola para atender os alunos da comunidade da 5ª à 8ª série do ensino fundamental e do ensino médio.

“Bairro da Paz terá curso de inclusão digital”, publica o A Tarde de 30/09/2004.

A nossa última matéria, que encerra o panorama histórico do Bairro da Paz na mídia escrita de salvador, é da tribuna da Bahia de 08/06/2005, com o título “Bairro da Paz – Empresas”. “A Santa casa de Misericórdia vai construir um Centro Comunitário e uma escolinha de esportes no bairro da Paz.

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Uma nova reportagem reaparece no jornal à Tarde de 10 de dezembro de 2007, sem se limitar à violência mas à atuação de grupos de arte que retiram jovens do crime e colabora para reduzir a vulnerabilidade, uma vez que têm oportunidade de aprender atividades que podem profissionalizá-los.

À frente desse processo no Bairro da Paz encontramos um jovem que chegou ainda nos primeiros anos das séries de invasões. Ele formou em 2000 um grupo de percussão e dança africana. Cerca de trinta jovens são assistidos por esse projeto.

O bairro conta com grupos de rap, pagode e reggae, capoeira, dança, grafiteiros e desenhistas. O pessoal do hip-hop é desses grupos o mais atuante nas reuniões locais e fora do bairro. Participam de eventos do planejamento urbano da cidade, da agenda ecológica, sessões na câmara dos vereadores, alguns poucos são afilhados políticos de profissionais de partidos de esquerda, são formados em instituições de ensino voltadas para a população negra da cidade. A atuação desses jovens segundo eles próprios colaboram para a transformação da imagem do bairro que está, por demais, marcada pela invasão, repressão policial, tráfico de drogas, homicídios e roubo.

Há cerca de quinze anos começou a ocupação dos jovens com arte e ativismo político e desde este tempo essas ações só aumentam no Bairro da Paz. Estes jovens são líderes comunitários que estão sempre sob a mira de instituições de fora à procura de colaboradores no bairro. De faculdades privadas como a FTC, São Camilo à UFBA com o projeto ligado ao CEDECA e a construção do Forum de Entidades do Bairro da Paz. O SEBRAE e Banco do Brasil também já investiram recursos e pessoal nos projetos de cooperativas (cerca de dez em atuação no bairro; são geridas pelos próprios moradores). Todas essas investidas os jovens são convocados para parcerias e público alvo. Ainda há Petrobrás conta com o projeto Cidadania Mãe que se direciona aos jovens sendo que muitos dos professores desse projeto são moradores jovens do bairro.

Contudo, para um grupo pequeno mais muito influente nas decisões coletivas e iniciativas particulares voltadas à comunidade (eventos de arte e seminários por exemplo) esses grandes projetos e seus investimentos não colaboram para a integração dos grupos mais influentes, uma vez que poucos nem todas as vozes podem ser ouvidas ou a própria disputa local impossibilita uma integração desejada e mesmo eficiente desses grupos. Então a situação é de grande desarticulação e intrigas. Porém a atuação particular continua e fortalece a rede negra da cidade, identificada com a arte, política e candomblé.

Esses jovens estão em contato e parceria em projetos pela cidade com pessoas dessa grande rede negra que se estende pela cidade, atravessando bairro, grupos de arte, movimentos sociais, instituições de ensino superior, galerias e espaços de fomento à arte e funções do estado.

O Bairro da Paz passa a estar inserido ainda que muito timidamente no mercado cultural que desde o ano 2000 vem mobilizando a cidade do estado aos bairros. A interligação promovida pela circulação por esses jovens cria ligações do bairro com outros e com o próprio estado. Fortalecem as representações frente ao estado, intensificando as reivindicações e aproximando o estado ao universo civil.

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A ampla rede negra é heterogênea, irregular quanto ao espaço e encontros e mais do que instituição ou movimento uma rede se distingue por ser um conjunto diverso de ações realizadas por pessoas que podem nem se conhecer mas que estão inseridas em uma certa lógica de atuação. As redes tendem a atenuar as vulnerabilidades mesmo e possibilitar uma relação mais profícua com o estado e seus equipamentos e serviços. É pois uma intermediação entre indivíduo e estado.

Essa rede constituída por pessoas negras vindas de bairros populares se desenvolveu com amplitude a partir da década de 80, quando a arte popular recebeu grande atenção do estado e da sociedade em geral. Investimentos públicos e privados garantiram a manutenção e extensão de projetos de grupos até então marginalizados pelos serviços do estado para a arte (ou cultura). Os blocos afros – Olodum, Malê de Balê, Ilê Ayê, Timbalada surgiram neste tempo. Galerias para a arte de com temas relacionados à África e o negro no Brasil e Bahia também começaram a surgir e hoje vemos a proliferação desses espaços ainda que sejam poucos usados pela população. Na década de oitenta houve grande expressão da capoeira angola, vertente que se volta mais à negritude, africanidade e tradição. Ainda que estes movimentos que recuperam e coisificão processos históricos, como se eles tivessem uma forma e lógica homogêneos e cristalizados, como as defesas de uma pureza e originalidade, eles exemplificam um momento que poderíamos identificar como muito próximos da contracultura, só que este movimento surge nas periferias e localidades mais pobres dos centros urbanos do país, dentre eles Salvador.

Esta rede tem forte manifestação intelectualizante, discursivo e preocupado com o reconhecimento que as heranças africanas também são válidas para compreender o mundo e não, apenas, folclore como já foi e ainda é entendido as expressões negras, sejam religiosas ou artísticas. Instituições de ensino como Steve Biko (pré-vestibular para negros que oferece cursos também outros, como sobre gênero em Salvador, desigualdade racial ou o candomblé na Bahia). Outra instituição influente é o Ceao, Centro de Estudos Afro Oriental da UFBA. Alguns desses jovens do Bairro da Paz estudaram nessas instituições e ainda têm contatos com pesquisadores deles.

A participação dos jovens negros do Bairro da Paz na ampla rede intelectualizada, artística, política e religiosa negra contribui para sua própria vitalidade e inserção no mundo urbano de Salvador. Algumas dessas pessoas integram secretárias do estado e abrem frequentemente espaço para a atuação desses jovens na cidade sendo em apresentações artísticas ou em reuniões sobre a administração da cidade (planejamento urbano, segurança, saúde, meio ambiente, reparação dos direitos negros, da mulher, sobre orientação sexual e religiosa...), terminam por inserir o bairro da Paz nas agendas diversas da cidade.

Esses jovens fazem parte da grande população de trabalhadores na informalidade, quase todos já têm filhos desde os primeiros anos dos vinte), têm parentes vivendo no bairro, participam ou são membros de casas de santo. Participam de diversas redes que contribuem para reduzirem os impactos da pobreza, mas o desemprego impediu-os de desenvolverem suas vocações de arte e políticas, pois devem dispor de muito tempo para realizarem seus bicos.

O contato com tantas personalidades da rede política negra da cidade resultam em remunerações, mas isso é tão precário quanto seus trabalhos informais. Assim as

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políticas públicas de incentivo à arte não surtem efeito, pois se restringem a grupos e pessoas com renome, ou aos chamados ‘figurões da arte”. Assim, excluídos de qualquer incentivo do estado à sua arte acabam por recorrer às empresas privadas que normalmente virão às costas para eles, exceto algumas ONGs que lhe dão suporte de para realizarem seus projetos, mas pouco de dinheiro sobra ao final tendo muito dos custos em transporte e pagamento de despesas de instrumentos, pagamento de convidados (os chamados ajuda de custos) e alimentação. A arte encontra barreiras na segregação radical da cidade.

Com o grande oportunismo ou mesmo falta quantitativa de produtores culturais na cidade, os artistas dos bairros populares ou se enquadram nas ONGs, Pontos de Cultura ou nas iniciativas privadas de fomento à arte, porém devem realizar um trabalho que não o deles ou que não corresponde com o ambiente do bairro. Por exemplo, o projeto da Petrobrás no Bairro da Paz não realiza amostras dos trabalhos feitos e não procura desenvolver uma política de fato profissionalizante, pois não aproveita sua rede para inserir os jovens artistas, ficam deste modo, restritos ao bairro e dependendo da própria iniciativa para prosseguir suas escolhas na arte.

O pequeno mais ativo grupo não estão inseridos neste projeto no bairro, já participaram mais discordam das suas políticas. Com as grandes personalidades do mundo negro de salvador nutrem as mesmas opiniões, exceto em alguns casos, mas em geral afirmam que essas pessoas apenas contribuem para a propaganda de suas instituições e não colaboram diretamente com o esforço de redução da pobreza e marginalidade da maioria dos habitantes da cidade.

ONGs, investimentos de empresas privadas e incentivos do estado para a juventude e arte não conseguem se desenvolver a todo vapor, encontram rapidamente, logo nos primeiros momentos de contato com o bairro popular alvo dos projetos uma realidade muito dura, de pobreza e violência. O esforço das associações comunitárias diversas (conselhos de moradores, centros religiosos, feira e grupos de arte, por exemplo) atenuam a pobreza, mas não expurgam de uma vez. Estes esforços devem continuar na medida em que o desenvolvimento da integração interna e externa desses bairros progridam com o tempo.

Vale-nos refletir sobre as políticas públicas para os jovens e para a arte na cidade de Salvador. Os grandes investimentos do estado e de empresas privadas têm aumentado a produção cultural da cidade, mas ainda a exportação e o turismo dominam essas atividades. A grande “indústria” da arte que monopoliza a produção e distribuição de diversos produtos artísticos reduz a qualidade, concentra os artistas em poucos espaços e impossibilita a diversificação artística da cidade. Assim para os jovens as políticas públicas de inserção no mercado de trabalho limitam-se aos postos menos remunerados e subalternos. A histórica segregação e concentração de renda de poucas famílias resultaram na redução das possibilidades da maioria da população. Para os jovens e artistas que iluminam palcos, galerias e eventos pelo mundo, apenas poucos deles desfrutam de seus esforços na arte, para a maioria há condições primeiras que devem ser resolvidas antes da produção artística.

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Referências

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CARVALHO, Inaiá Maria Moreira, CODES, Ana Luísa Machado. Condições Ocupacionais, Pobreza e Desigualdades. In: CARVALHO, Inaiá Maria Moreira, PEREIRA, Gilberto Corso. Como Anda Salvador e sua Região Metropolitana. Salvador; Edufba, 2006, 180 p.:grafs e mapas.

CARVALHO, Inaiá Maria Moreira, PEREIRA, Gilberto Corso. Segregação sócio-espacial e Dinâmica Metropolitana. In: CARVALHO, Inaiá Maria Moreira, PEREIRA, Gilberto Corso. Como Anda Salvador e sua Região Metropolitana. Salvador; Edufba, 2006, 180 p.:grafs e mapas.

FERNADES, Claúdia Monteiro. Condições Demográficas. In: CARVALHO, Inaiá Maria Moreira, PEREIRA, Gilberto Corso. Como Anda Salvador e sua Região Metropolitana. Salvador; Edufba, 2006, 180 p.:grafs e mapas.

PAIM, Jairnilson Silva. Condições de Vida, Violências e Extermínio. In: CARVALHO, Inaiá Maria Moreira, PEREIRA, Gilberto Corso. Como Anda Salvador e sua Região Metropolitana. Salvador; Edufba, 2006, 180 p.:grafs e mapas.

PEREIRA, Gilberto Corso, SOUZA, Ângela Gordilho In: CARVALHO, Inaiá Maria Moreira, PEREIRA, Gilberto Corso. Como Anda Salvador e sua Região Metropolitana. Salvador; Edufba, 2006, 180 p.:grafs e mapas.

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Referências

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