ANO LECTIVO DE 2003/2004
Prof. Carlos R. Paiva
Departamento de Engenharia Electrotécnica e de Computadores
Instituto Superior Técnico
Nota prévia
Neste capítulo estudam-se as cavidades ópticas de Fabry-Perot constituídas por dois espelhos planos paralelos. Não obstante tratar-se de uma estrutura muito simples, tem particular importância para o estudo dos lasers semicondutores. Embora se devesse analisar o campo electromagnético em termos vectoriais, as ondas planas TEM que se propagam entre os dois espelhos são paraxiais. Assim, designando por U
(
x,y,z)
a amplitude complexa da componente transversal do campo eléctrico, tem-se em valores instantâneos(
x y z t)
{
U(
x y z) (
i t)
}
ET , , , =ℜ , , exp − ω .
Porém, dado que as ondas são paraxiais – i.e., praticamente paralelas ao eixo óptico do sistema –, é possível reduzir as somas vectoriais a somas escalares. Pelo que se irá apenas considerar uma teoria escalar ao longo deste capítulo.
Notação
Nesta disciplina segue-se, ao contrário de outras disciplinas da área científica de Propagação
e Radiação, a convenção – usual em Óptica e Fotónica – de adoptar uma variação temporal da
forma exp
(
−iωt)
em vez de exp(
jωt)
. Deste modo, em termos de amplitudes complexas, as equações de Maxwell escrevem-seB E=iω × ∇ D J H = −iω × ∇ ρ = ⋅ ∇ D 0 = ⋅ ∇ B .
Em regiões sem fontes do campo, tem-se J=0 e ρ=0. Consequentemente os versores Rˆ e
Lˆ que caracterizam as polarizações circulares direita e esquerda, respectivamente, assumem a
forma
(
x y)
R ˆ ˆ 2 1 ˆ = +i(
x y)
L ˆ ˆ 2 1 ˆ = −i .Para recuperar a variação temporal, faz-se
( )
t = ℜ{
ˆ exp(
−i tω)
}
R R( )
t = ℜ{
ˆ exp(
−i tω)
}
L L . Assim, vem( )
1 ˆcos( )
ˆsin( )
2 t = ⎡⎣ ωt + ωt ⎤⎦ R x y( )
1( )
( )
Intensidade óptica
Em Fotónica usa-se, com frequência, o conceito de intensidade óptica. Nesta breve nota introdutória explica-se qual é a relação entre a intensidade óptica e o vector de Poynting. Definem-se, como é sabido, o vector de Poynting (instantâneo)
( )
t E( ) ( )
t H tS = ×
e o vector de Poynting complexo
∗ × = E H Sc 2 1 .
Nestas condições, resulta sucessivamente
( )
t =ℜ{
e−iωt} {
×ℜ e−iωt}
H E S( )
t =(
e−iωt + ∗eiωt) (
× e−iωt + ∗eiωt)
H H E E S 2 1 2 1( )
t(
e-2iωt e2iωt)
4 1 × ∗ + ∗× + × + ∗× ∗ = E H E H E H E H S( )
t =ℜ{ }
+ ℜ{
× e−2iωt}
2 1 H E S S c .Assim, o valor médio no tempo é dado por
( )
{ }
ScSt =ℜ .
A intensidade óptica define-se, então, como
{ }
Scℜ =
Bibliografia
• B. E. A. Saleh and M. C. Teich, Fundamentals of Photonics (New York: Wiley, 1991), pp. 310-322
• A. E. Siegman, Lasers
(Sausalito, California: University Science Books, 1986) • A. Yariv, Optical Electronics in Modern Communications
(New York: Oxford University Press, 5th ed., 1997), Chap. 4 • P. W. Milonni and J. H. Eberly, Lasers
(New York: Wiley, 1988), pp. 359-363 • M. Born and E. Wolf, Principles of Optics
(Oxford: Pergamon Press, 7th (expanded) ed., 1999), pp. 359-409 • P. Yeh, Optical Waves in Layered Media
(New York: Wiley, 1988), pp. 144-149 • H. A. Haus, Waves and Fields in Optoelectronics
1. Cavidades de Fabry-Perot
Vamos começar por analisar os modos de oscilação de uma cavidade óptica constituída por
dois espelhos planos paralelos – tal como se indica na Fig. 1. Este tipo de cavidade óptica é conhecida na literatura por cavidade de Fabry-Perot. Apesar de ser um dos tipos de cavidades
mais simples, este tipo de geometria tem particular interesse para os lasers semicondutores.
Fig. 1 Cavidade óptica de Fabry-Perot.
Sejam Γ1 e Γ2 os coeficientes de reflexão dos espelhos 1 e 2, respectivamente. Admite-se que Γ1Γ2 >0. Se se designar por α o coeficiente de atenuação (de potência) no s meio dieléctrico entre os espelhos, tem-se
(
) ( )
[
1 2]
01 exp d exp i U
U = Γ Γ −αs φ (1.1)
para o percurso indicado na Fig. 1. Note-se que
0 1 U U =Γ (1.2) d (1) (2)
U
0U
2U
1em que, de acordo com a Eq. (1.1),
( )
φ ρ = Γ exp i (1.3) onde se fez(
−αsd)
Γ Γ = ρ 1 2exp . (1.4) Naturalmente que x f f f d v f d k = π = π = φ 2 4 2 (1.5)onde se introduziu a frequência
d n c d v fx f 2 2 = = (1.6)
em que n é o índice de refracção do meio, vf =c/n é a correspondente velocidade de fase, tendo-se f v f c n k n k = 0 = ω = 2π (1.7)
para a constante de propagação entre espelhos.
Tal como na Eq. (1.2) vem U2 =ΓU1, U3 =ΓU2, etc., de modo que
(
l =0,1,")
0
U U l
l =Γ . (1.8)
∑
∞∑
= ∞ = Γ = = 0 0 0 l l l l U U U . (1.9) Porém, tem-se∑
∞ = −Γ = Γ 0 1 1 l l (1.10)desde que Γ <1. Logo, substituindo a Eq. (1.10) na Eq. (1.9), obtém-se
Γ − = 1 0 U U . (1.11)
Introduzindo as reflectividades R1 e R2 dos dois espelhos, com
2 1 1 =Γ R (1.12a) 2 2 2 =Γ R (1.12b)
infere-se da Eq. (1.4) que
(
d)
(
d)
R
R − αs = − αr =
ρ2 1 2exp 2 exp 2 (1.13)
onde αr representa o coeficiente de atenuação total. Assim, da Eq. (1.13), vem
2 1 m m s r =α +α +α α (1.14a) ⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ = α 1 1 1 ln 2 1 R d m (1.14b) ⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ = α 2 2 1 ln 2 1 R d m . (1.14c)
2 0 2 1 2 = −ρ φ = i e I Z U I (1.15)
de acordo com as Eqs. (1.3) e (1.11), em que Z =Z0 /n é a impedância do meio
(
Z0 = µ0/ε0)
e onde se introduziu I U /2Z2 0
0 = . Note-se, todavia, que
(
)
⎟ ⎠ ⎞ ⎜ ⎝ ⎛ φ ρ + ρ − = ρ − φ 2 sin 4 1 1 ei 2 2 2 (1.16) donde(
)
⎟ ⎠ ⎞ ⎜ ⎝ ⎛ φ ρ + ρ − = 2 sin 4 1 2 2 0 I I . (1.17)Como Imax = I
(
φ=0)
, tem-se(
)
2 0 max 1−ρ = I I (1.18) e ainda max 2 2 2 1 sin 2 I I φ π = ⎛ ⎞ ⎛ ⎞ + ⎜⎝F
⎟⎠ ⎜ ⎟⎝ ⎠ (1.19)em que se introduziu o parâmetro
F
(“finesse”) tal que1 π ρ ρ = −
F
. (1.20)Atendendo à Eq. (1.13), é ⎟ ⎠ ⎞ ⎜ ⎝ ⎛− α = ρ rd 2 1 exp (1.21) pelo que
(
)
(
)
exp / 2 1 exp r r d d π α α − = − −F
. (1.22)Nos casos de interesse prático tem-se α dr <<1, pelo que
(
−αr d)
≈1−αrd exp (1.23a) 2 1 2 1 exp d rd r α − ≈ ⎟ ⎠ ⎞ ⎜ ⎝ ⎛− α (1.23b) donde resulta rd π α ≈F
. (1.24)Para calcular αrd a partir de
F
, faz-se x=exp(
−αr d/2)
. Então, αr d =−2lnx e tem-se 2 1 2 2 x= − π + + ⎜⎛ π ⎞⎟ ⎝ ⎠F
F
. (1.25)Para
F
=10, vem x=0.8552 e, consequentemente, α dr =0.313. Agora, introduzindo a Eq. (1.5) na Eq. (1.19), obtém-se( )
max 2 2 2 1 sin x I I f f f π π = ⎛ ⎞ ⎛ ⎞ +⎜ ⎟ ⎜ ⎟ ⎝F
⎠ ⎝ ⎠ . (1.26)As frequências de ressonância f da cavidade correspondem a q I
( )
fq =Imax. Donde(
q=0,1,2,")
x q q f
f = . (1.27)
O valor mínimo da intensidade óptica, Imin, ocorre nas frequências min
q f tais que
(
q=0,1,2,")
(
2 1)
2 1 min = f q+ fq x (1.28) sendo max min 2 2 1 I I π = ⎛ ⎞ + ⎜ ⎟ ⎝F
⎠ . (1.29)Note-se que a separação entre frequências de ressonância é a mesma que entre mínimos e é dada por
x f f =
∆ . (1.30)
Definindo a largura de banda fδ de cada modo de oscilação de forma que
2 / max I I ≥ , tira-se que 1 2 sin 2 x f f π δ π − ⎛ ⎞ = ⎜ ⎟
F
. (1.31)Fig. 2 Intensidade óptica dentro da cavidade de Fabry-Perot em função da frequência.
Naturalmente que δf →0 quando
F
→ ∞. ParaF
>>1 pode-se escreverx f f
δ ≈
F
(1.32)o que mostra que a largura de banda é inversamente proporcional à “finesse” da cavidade. Na Fig. 2 representa-se a intensidade óptica, dentro da cavidade, em função da frequência.
É usual introduzir o conceito de semi-vida dos fotões na cavidade, τ , como sendo p
f r p v α = τ 1 . (1.33)
Assim, tendo em consideração as Eqs. (1.2), (1.3) e (1.13), vem então para a evolução temporal da energia armazenada na cavidade
p W dt dW τ − = (1.34) fq-1 fq fq+1 fx fx f I( f ) Imax Imax/2 Imin δf
pelo que
( )
( )
⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜ ⎜ ⎝ ⎛ τ − = p t W t W 0 exp . (1.35)A semi-vida τ dos fotões na cavidade pode relacionar-se com a largura fp δ de cada ressonância óptica. Com efeito, de acordo com a Eq. (1.33), tem-se
2 2 2 p r f x d d v f π τ α π π = =
F
⇒F
=2π fxτp. (1.36)Assim, atendendo à Eq. (1.32), obtém-se
π ≈ δ τ 2 1 f p . (1.37)
Na ausência de perdas (αr =0) seria
F
= ∞ e δf =0 pelo que, nesse caso limite, τp =∞. Define-se o factor de qualidade Q da cavidade para a frequência ω0 =2 fπ 0 como sendodt dW
W
Q=ω0 . (1.38)
Portanto, de acordo com a Eq. (1.34), vem
p f
Q=2π 0τ (1.39)
f rv f Q α π = 2 0 . (1.40)
Assim, das Eqs. (1.36) e (1.39), vem
0 x f Q f ≈
F
. (1.41)Na prática f0 >> fx, pelo que Q>>
F
. Note-se que – de acordo com a Eq. (1.32) – se pode escrever, ainda, a Eq. (1.41) na formaf f Q
δ
≈ 0 . (1.42)
Esta última equação explica, também, um facto importante: porque Q∝ f0, os factores de qualidade das cavidades ópticas são muito maiores do que os factores de qualidade das
2. Filtros de Fabry-Perot
Vamos agora analisar a cavidade de Fabry-Perot montada em transmissão – tal como se indica na Fig. 3. Seja It = Ut 2/ Z2 0 a intensidade óptica transmitida e Ii = Ui 2 / Z2 0 a intensidade óptica incidente.
Fig. 3 Cavidade de Fabry-Perot montada em transmissão Define-se a transmissividade da cavidade óptica como
i t I I
T = . (2.1)
Sendo τ1 (resp., τ2) o coeficiente de transmissão do espelho 1 (resp., do espelho 2), tem-se
i U U0 =τ1 (2.2a) U Ut =τ2 . (2.2b) = d (1) (2)
U
0U
1U
iU
t τ1 τ2.
.
U
2Z U I 2 2 0 0 = (2.3a) Z U I 2 2 = (2.3b) pelo que i I n I 2 1 0 = τ (2.4a) I n It 2 2 1 τ = . (2.4b) Notando que i t i t I I I I I I I I 0 0 = (2.5)
infere-se, então, que
0 2 1 I I T T T = (2.6)
onde se introduziram os parâmetros
2 1 1 =τ T (2.7a) 2 1 1 =τ T . (2.7b)
Assim, de acordo com a Eqs. (1.18) e (1.26), tira-se da Eq. (2.6)
max 2 2 2 1 sin x T T f f π π = ⎛ ⎞ ⎛ ⎞ +⎜ ⎟ ⎜ ⎟ ⎝
F
⎠ ⎝ ⎠ (2.8) em que se fez(
)
2 2 1 max 1−ρ = T T T . (2.9)Uma primeira constatação é que a transmissividade dada pela Eq. (2.8) tem a mesma forma que a intensidade óptica (interna) dada pela Eq. (1.26). Isto significa que, quando montada em transmissão, a cavidade de Fabry-Perot pode ser considerada como um filtro cuja função característica (na frequência) tem o aspecto da Fig. 2. Os valores máximos da transmissividade são dados pela Eq. (2.9) e os valores mínimos por
max min 2 2 1 T T π = ⎛ ⎞ + ⎜⎝
F
⎟⎠ . (2.10)Um outro aspecto interessante, é o seguinte: a cavidade de Fabry-Perot pode, ainda, ser considerada como um analisador espectral ou como um filtro sintonizável. De facto, como a transmissividade é uma função da frequência dada pela Eq. (2.8), este tipo de cavidade pode funcionar como um analisador espectral. Por outro lado, também se pode entender o funcionamento deste sistema como um filtro sintonizável. Com efeito, uma pequena alteração na separação d entre espelhos (Fig. 1), permite fazer variar a função de transferência da Fig. 2. Sendo ∆d a variação provocada na distância d, obtém-se
d d v q fq =− f ∆ ∆ 2 2 ⇒ d d f fq =− q ∆ ∆ (2.11)
de acordo com as Eqs. (1.6) e (1.27). Também, concomitantemente,
d d f f x x =− ∆ ∆ . (2.12)
Note-se, porém, que – em geral – a variação ∆ é desprezável face a fx ∆ , uma vez que fq f
unívoco do filtro sintonizável (ou no analisador espectral) baseado neste tipo de cavidade: sendo B a banda de frequências a analisar, é necessário que se verifique que
x f f
B<∆ = . (2.13)
Caso contrário, dado que a transmissividade é uma função periódica, pode registar-se uma ambiguidade entre ressonâncias consecutivas. Por essa razão dá-se o nome de banda espectral
ADENDA
Reflectividade da cavidade de Fabry-Perot
Nesta adenda vai-se calcular a reflectividade da cavidade de Fabry-Perot representada na Fig. 3. Em tudo o que se segue admite-se que o meio exterior é o mesmo, i.e., supõe-se que
2 1 =Γ
Γ (logo, também, R1 =R2).
Comecemos por calcular o campo reflectido Ur. Naturalmente que
∑
∞ = = 0 l rl r U U (A.1) onde se introduziu l rl U U =γ (A.2) com( )
φ µ = γ exp i (A.3a)(
−αsd)
Γ τ = µ 2 2exp . (A.3b)Nestas condições resulta da Eq. (A.1) que
U
Ur =γ . (A.4)
A correspondente intensidade óptica reflectida será dada por
I n
Ir = 1 γ 2 . (A.5)
i r I I
R= (A.6)
infere-se da Eq. (A.5) que
0 2 1 0 0 2 I I T I I I I n R i γ = γ = . (A.7) Logo, como
(
)
2 1 2 2 2 2 2 2 exp T R d T R − αs =ρ = µ = γ (A.8) tira-se que max 2 2 2 1 sin x R R f f π π = ⎛ ⎞ ⎛ ⎞ +⎜ ⎟ ⎜ ⎟ ⎝F
⎠ ⎝ ⎠ (A.9) onde se introduziu(
)
max 1 2 1 2 1 2 2 max 1 R R T T T R = ρ ρ − ρ = . (A.10)Comparando as Eqs. (2.8) e (A.9), conclui-se que
T R T T R R 1 2 max max =ρ = (A.11) pelo que