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O decorrer das aulas

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Academic year: 2021

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Narrativas para Alteridade por meio do gênero carta do leitor Introdução

Este relato tem por objetivo contar a experiência de estágio supervisionado de Língua Portuguesa, do curso de Letras Português/Espanhol da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE.

O relato apresenta uma sequência didática de aulas realizadas em duas turmas de nonos anos do ensino fundamental II de uma escola pública da cidade de Foz do Iguaçu, localizada na região central da cidade, que recebe alunos de diversos níveis sociais e culturais. O estágio supervisionado ocorreu durante o ano letivo de 2017 e totalizou 40 horas aula.

Assim, na turma A havia aproximadamente 30 alunos, turma bastante agitada, mas relativamente participativa. Já a turma B, também possuía em torno de 30 alunos, uma turma completamente desinteressada e desmotivada, na qual os casos de bullying e depressão eram visivelmente frequentes. Durante o período de observação, pude perceber que alguns alunos eram bastante interessados em trabalhar o gênero carta do leitor, tendo em vista a seleção que um colégio da região faz para novos alunos e que, como parte da prova, há uma prova de redação que frequentemente solicita este gênero em sua avaliação classificatória para ingresso dos novos estudantes. Diante disso, a professora regente solicitou que um dos conteúdos que deveriam ser trabalhados com esses alunos, era o gênero carta do leitor.

No contexto acima explicitado, juntamente com a minha professora orientadora, planejamos uma sequência didática tanto para trabalhar o gênero carta do leitor, quanto para discutir o tema Suicídio na Adolescência que resultou em um trabalho muito significativo tanto para os alunos quanto para mim no papel de professora.

O tema Narrativas para Alteridade por meio do gênero carta do leitor surgiu dessa necessidade de unir o conteúdo ao tema, cujo objetivo era que os alunos tanto aprendessem a produzir o gênero carta do leitor, quanto fazê-los discutir no ambiente escolar questões de sua realidade que, por muitas vezes é sofrida e hostil, e quais implicações a ideologia do bullying e a doença da

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depressão trazem para estes adolescentes ainda em idade escolar e tão jovens. O que significa, em nosso entendimento, pelo pouco tempo de convivência, que para esses estudantes, toda e qualquer questão pode ser motivo de desmotivação e sofrimento, levando-os, muitas vezes, a abandonar a escola.

Dessa maneira, mostramos aos alunos que as aulas de Língua Portuguesa servem, não somente para aprender os conteúdos curriculares sistematizados, mas também, para discutir questões políticas e ideológicas que permeiam toda nossa sociedade. Afinal, leitura e interpretação de texto trabalhadas nas aulas de língua portuguesa, precisam cumprir o papel a que se propõem os professores nos estudos da linguagem: o de ensinar o caminho da leitura das entrelinhas, do apagamento, do não dito; e em consequência, e não menos importante, desvendar as sutis armadilhas ideológicas que o texto/discurso apresenta para que o leitor preencha as inferências com vistas à uma leitura crítica e contextualizada, permitindo, assim, estabelecer as múltiplas relações dos conteúdos escolares com significação para a vida.

Assim, com os objetivos traçados e fazendo uso dos conteúdos curriculares sobre o gênero carta do leitor, estudamos, discutimos, aprendemos, pesquisamos e compartilhamos experiências e relatos sobre o suicídio na adolescência, para que então, ao fim das aulas que foram ministradas por mim, os alunos fossem capazes de escrever as suas próprias cartas em resposta ao site G1. Como síntese desse processo teórico-prático, as produções dos alunos foram publicadas no mural da escola.

Arcabouço Teórico

A DCELP – Diretrizes Curriculares Estaduais de Língua Portuguesa do Estado do Paraná (2008) especifica que, para as aulas de Língua Portuguesa, a prática de leitura, escrita e oralidade devem ser frequentes e com vistas a atender os gêneros textuais e discursivos para cada ano letivo. Ademais, também infere que o objetivo das aulas de Língua Portuguesa é considerar os aspectos sociais e históricos dos sujeitos que se utilizam dessa língua. Não

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somente isso, enfatiza que cabe ao professor de Língua Portuguesa propiciar a prática, a discussão e a leitura de diferentes gêneros linguagens e diversificadas esferas sociais da linguagem.

Assim, destinamos nossas aulas com ênfase nas palavras de Bianchi (2005, p.4) que postula que “o aluno não pode ser insensível aos problemas do mundo contemporâneo e deve contribuir com todas as suas forças para dar respaldo e solução, no que lhe compete, à sociedade em que atuará”. Isso significa que estabelecer relações dialógicas entre a realidade dos alunos e as aulas de Língua Portuguesa certamente contribui para incentivar os alunos a serem comprometidos com a sociedade na qual estão inseridos.

Uma vez definido a escolha do gênero discursivo carta do leitor, optamos por seguir a linha da sequência didática, segundo os pressupostos teóricos de Lopes-Rossi (2008) que propõe o trabalho com os gêneros discursivos na seguinte estrutura: leitura do gênero, produção escrita do gênero e divulgação ao público. Essa proposta de trabalho incentiva aos alunos a explorarem o gênero escolhido não somente como um conteúdo curricular, mas, sim, como uma forma de ação social que pressupõe um interlocutor real em uma ação social e um contexto sócio histórico. Deste modo, também se tornam capazes de analisar os elementos composicionais, estilos e marcas linguístico enunciativas que são próprias dos gêneros discursivos.

O gênero carta do leitor, foi trabalhado com intenção de conscientizar sobre o suicídio na adolescência visando à valorização da vida. Desta forma, foram destinadas aulas para a prática de leitura e reconhecimento do gênero, como seu conteúdo temático, estrutura composicional e estilo (ROJO; BARBOSA, 2015). De acordo com a DCE-LP (2008) ao ler, o indivíduo busca as suas experiências e conhecimentos prévios dentre outras vozes que o constituem socialmente como a cultura, religião e familiar e que praticar a leitura em diferentes contextos sociais requer que se compreenda as esferas discursivas em que os textos são produzidos e circulados. Já a parte final das aulas com o gênero carta do leitor foram destinadas para a revisão e reescrita do gênero bem como para a divulgação ao público.

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O decorrer das aulas

De acordo com a estrutura proposta por Lopes-Rossi (2008) para o trabalho com a produção de gêneros do discurso, as aulas de Língua Portuguesa foram divididas com vistas à: leitura do gênero, produção escrita do gênero e divulgação ao público.

As aulas foram preparadas e divididas de modo que os pressupostos supracitados fossem atendidos de maneira satisfatória para o trabalho com as turmas. Para a leitura do gênero, foram destinadas doze aulas divididas para as duas turmas nas quais os alunos tiveram a oportunidade de fazer a prática de leitura em Língua Portuguesa. A produção escrita do gênero foi ministrada em doze aulas, em que estudamos e aprendemos a estrutura composicional do gênero carta do leitor, com exemplos e prática escrita dos parágrafos de introdução, desenvolvimento e conclusão, além de aprender os recursos argumentativos que cabem ao gênero e como estes influenciam os leitores. Para a divulgação ao público, os alunos tiveram duas aulas nas quais montaram um painel com as cartas produzidas.

Para criar um diálogo amigável com os alunos já nas aulas inicias, conversei brevemente com os alunos sobre a série 13 Reasons Why (13 porquês) que naquele momento estava no auge de lançamento. A série trata de 13 motivos que levaram uma adolescente a suicidar-se e como as pessoas que estavam ao seu redor, principalmente no ambiente escolar, contribuíram de alguma forma para que a jovem cometesse o suicídio. Os alunos mostraram-se bastante interessados pelo tema, e já adiantei que o conteúdo das aulas seria o gênero carta do leitor.

Após as duas primeiras aulas, os alunos fizeram a leitura e reflexão oral por meio de questões que eu fazia a eles, e então, nas aulas seguintes passamos para a estrutura do gênero, fazendo a prática de escrita dos parágrafos que compõem o gênero carta do leitor, e fazendo comparação com os recortes que os alunos fizeram em um outro momento. Essa parte de comparar as pequenas produções dos alunos com as que eles pesquisaram

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nas revistas, jornais e internet, foi de fundamental importância para que eles visualizassem como eram capazes de produzir um bom texto, tanto quanto espera-se deles nas aulas de Língua Portuguesa.

Todas as aulas que foram ministradas, tiveram sempre como base algum tipo de carta do leitor, preferencialmente as que também foram escritas por outros alunos. Além disso, como o tema foi o Suicídio na adolescência com vistas à valorização da vida humana, cada aula era bastante reflexiva e foi possível quebrar alguns tabus com eles, especialmente no que diz respeito aos motivos que levam uma pessoa a suicidar-se e como cada um de nós, individualmente, pode ajudar alguém em depressão.

Nas aulas em que os alunos produziram o gênero, uma revisão de todo o conteúdo também foi de muita ajuda para os alunos. Antes de iniciar a produção escrita, houve uma conversa inicial com os alunos sobre o jogo Baleia azul, cujo objetivo final do jogo é a morte dos jovens que participam desse jogo. Por meio de relato oral, relembramos algumas regras do jogo e como essas regras levam ao suicídio de maneira implícita, aproveitando-se muitas vezes da inocência dos adolescentes.

Na sequência, foi apresentado aos alunos uma matéria do site G1 que abordava o jogo Baleia Rosa1, no qual o objetivo principal do jogo é a

valorização da vida humana. Muitos dos alunos nunca nem se quer tinham ouvido falar do jogo Baleia Rosa, por isso, levei algumas regras do jogo para eles e, após a leitura da matéria, os alunos se sentiram bastante motivados a escrever as suas cartas, relatando a importância da prevenção contra o suicídio e em como a iniciativa do jogo Baleia Rosa pode salvar muitas vidas.

Durante o momento de reflexão da temática, os alunos se mostraram muito interessados e até dispostos a tomar iniciativas para a prevenção do suicídio e do bullying na própria escola. Oportunizar aos alunos o seu momento da fala e ouvir o que eles têm a dizer, certamente foi um dos fatores que

1 Disponível em: <

https://g1.globo.com/sp/sao-carlos-regiao/noticia/jogo-da-baleia-rosa-estimula-corrente-do-bem-para-criancas-em-sao-carlos-sp.ghtml> Acesso em 30 de agosto de

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contribuíram tanto para o bom andamento das aulas, quanto para o incentivo e determinação dos alunos em produzirem o gênero e o painel para divulgação ao público das atividades desenvolvidas.

Assim, para Guedes (2005), a tarefa do professor de português é desprivatizar a língua escrita ensinando seus alunos a ler e escrever para que passem a participar da produção de conhecimento a respeito do Brasil, desenvolvendo com a língua escrita uma relação que o leve a descobrir e desenvolver a sua dignidade pessoal.

Consoante com as palavras de Guedes (2005), o momento de prática oral reflexiva nas aulas de Língua Portuguesa são para além de aprender a escrever e ler bem, são também para o desenvolvimento pessoal do aluno enquanto indivíduos críticos e conscientes do seu papel na sociedade e na Língua que se utilizam para a comunicação.

Após a produção escrita dos alunos, houve o momento de reescrita do gênero para a adequação do texto. Foram bem poucos desvios cometidos, pois nas duas turmas, a estrutura composicional do gênero estudado foi muito trabalhada, e, por diversas vezes, os alunos produziram parágrafos como atividade escrita, até chegar à escrita final da carta.

Após a reescrita os alunos produziram o painel do lado de fora da sala de aula, com as suas produções escritas. Os alunos se sentiram muito motivados e a criatividade deles para a produção do painel e divulgação ao público foi realmente gratificante. Além das cartas, colocaram algumas regras do jogo Baleira rosa bem como a matéria que lhes foi disponibilizada para a produção escrita das suas cartas.

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Figura 1 – Painel produzido pelos alunos

Fonte: Autor (2017)

O conteúdo das cartas produzidas pelos alunos mostrou como é significativa a filosofia da Alteridade, proposta por Emanuel Lévinas (2010) que sintetiza seu pensamento expressando que é fácil uma permanência na coletividade e na camaradagem, difícil e sublime é co-habitar com a diferença, é viver o eu-tu profundamente. Como consequência das diversas discussões e leituras em sala de aula, pude perceber no decorrer das aulas a mudança de postura e de olhar dos alunos sobre o tema suicídio que antes era visto como “frescura” e passou a ser vista como uma doença séria e que precisa ser discutida especialmente no ambiente escolar.

Como professora, pude perceber que o professor é o profissional que cria oportunidades para os alunos explorem suas ideias e valores morais, pessoais e que contribui de maneira direta por meio do uso da Língua para formar o pensamento. Neste sentido, Paulo Freire (2011) afirma que o educador não deve apenas transferir os conhecimentos curriculares, sem levar em consideração toda a bagagem de mundo que os alunos possuem. O que busco salientar nas palavras de Paulo Freire (2011), é que, durante o período de docência, pude reafirmar o fundamental papel do professor de Língua

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Portuguesa em ser também o questionador das práticas sociais que me atingem, mas que sumariamente atingem os alunos no ambiente escolar.

Referências

BIANCHI, A.C.M. Orientação para estágio em licenciatura. São Paulo: Pioneira Thomson, 2005.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática

educativa. 43. ed., São Paulo: Paz e Terra, 2011.

GUEDES, Paulo Coimbra. A formação do professor de Português. São Paulo, Parábola Editorial, 2005.

LOPES-ROSSI, M.A.G. (Org.) Gêneros discursivos no ensino de leitura e

produção de textos. São Paulo: Cabral Editora, 2002.

ROJO, Roxane Helena; BARBOSA, Jacqueline Peixoto. Hipermodernidade,

multiletramentos e gêneros discursivos. São Paulo: Parábola Editorial,

2015.

RUIZ, Eliana Donaio. Como corrigir redações na escola: uma proposta

textual-interativa. São Paulo: Contexto, 2013.

PARANÁ. Secretaria do Estado da Educação. Diretrizes Curriculares da

Educação Básica: Língua Portuguesa. Curitiba: Paraná/Jam3 Comunicação,

2008.

Jaqueline de Freitas Onofre é graduada em Letras com habilitação em Língua Portuguesa

e em Língua Espanhola e suas respectivas Literaturas, pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná. Atualmente, atua como professora em uma escola municipal de Foz do Iguaçu, no estado do Paraná.

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Hêlena Paula Domingos de Carvalho é professora de Língua Portuguesa do quadro

próprio do magistério da rede estadual de ensino- QPM, na cidade de Foz do Iguaçu, no estado do Paraná. Doutoranda pelo programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Sociedade, Cultura e Fronteiras- nível Doutorado. Atua nas áreas de Literatura, Cinema e Formação de professores.

Referências

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