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Mariana Martins Coelho Almeida Nunes 1 Maria de Jesus da Conceição 2

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TRANSTORNOS MENTAIS E O ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL DE ADOLESCENTES: desafios e reflexões sobre esta prática

Mariana Martins Coelho Almeida Nunes

1

Maria de Jesus da Conceição

2

RESUMO: O acolhimento institucional é um serviço da Política de Assistência Social que visa acolher crianças e adolescentes sob medida protetiva. Assim, este trabalho objetiva apresentar os desafios do acolhimento de crianças e adolescentes com transtornos mentais, com alto nível de sofrimento psíquico e promover reflexões quanto aos impactos destes acolhimentos na vida de outros que estão no mesmo espaço e que não apresentavam situações de ordem da saúde mental dentro de casas lares, bem como a profunda alteração de rotinas do ambiente institucional.

Palavras-chave: Acolhimento. Saúde Mental. Desafios. Sofrimento Psíquico.

ABSTRACT: The institutional reception is a service of the Social Assistance Policy that aims to accommodate children and adolescents under protective measures. However, this study aims to present the challenges of receiving children and adolescents with mental disorders, such as a high level of psychological distress and promotes reflections about the impacts of these children on the lives of others who are in the same space and who did not present health situations mental health within nursing homes, as well as the profound alteration of institutional environment routines.

Keywords: Reception. Mental health. Challenges. Psychic Suffering.

1. INTRODUÇÃO

1 Assistente Social, Coordenadora do Acolhimento Institucional e Familiar da Secretaria Municipal da Criança e Assistência Social de São Luís-MA, graduada pela Universidade Federal do Maranhão, Especialista em Elaboração e Gestão de Projetos Sociais pela Universidade Veiga de Almeida – RJ, Mestranda do Programa de Pós Graduação em Políticas Públicas da Universidade Federal do Maranhão. E-mail: nana_almeida10@hotmail.com

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Assistente Social, Coordenadora de Unidade de Acolhimento Institucional para adolescentes – Abrigo Luz e Vida, graduada pela Universidade Federal do Maranhão, pós graduanda em Projeto de Capacitação Para Profissionais Da Saúde Envolvidos Com A População Em Situação De Rua, Com Foco Na População Negra – Saúde Pop Rua – UNB. E-mail: mariah.mmjc@gmail.com

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Este artigo tem por objetivo apresentar os desafios do acolhimento institucional de crianças e adolescentes com demandas prioritárias de Saúde Mental, comb alto grau de sofrimento psíquico e com surtos psicóticos constantes dentro de Unidades que ofertam o Serviço de Acolhimento Institucional na cidade de São Luís-MA. Para apresentar tais desafios, foi realizada coleta de dados junto à instituição não governamental, Lar Calábria, que oferta o Serviço de Acolhimento para crianças e adolescentes, na modalidade casa lar.

Para que estes desafios sejam evidenciados, demarca-se a necessidade, inicialmente, da caracterização do Serviço de Acolhimento Institucional e da Política Pública de Saúde Mental, bem como o processo histórico destes. De forma que, no primeiro momento será realizada uma breve contextualização do Serviço de Acolhimento Institucional para crianças e adolescentes, conforme normativas e legislações específicas e sobre a Política Pública de Saúde Mental apresentando as reflexões que evidenciam a necessidade de um olhar para esta temática.

Em seguida será realizada uma abordagem sobre quais os locais de atendimentos para crianças e adolescentes com situações de saúde mental da comunidade em geral, e, sobretudo os que estão dentro de Unidades de Acolhimento, enquanto público prioritário para atendimento pelas Políticas Públicas.

Por fim caracteriza-se a Instituição que oferta o Serviço de Acolhimento Institucional para crianças e adolescentes, e os desafios vivenciados por esta no que tange ao recebimento de demandas de acolhimento com alto nível de sofrimento psíquico e os impactos destes acolhimentos para o quadro de profissionais e para os (as) demais acolhidos (as) nestes espaços, sobretudo quanto à profunda alteração da rotina da Unidade de Acolhimento.

2. ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL: breve contextualização histórica

A institucionalização de crianças e adolescentes faz parte de um processo que perdura desde o período colonial brasileiro. Sobre isto, Leite (2009) destaca que uma das primeiras e mais duradouras instituições de institucionalização foi a “roda dos expostos”

3que iniciou em meados de 1738 e durou aproximadamente até meados 1950.

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Segundo Leite 2009 nestas rodas dos expostos as crianças eram deixadas quase sempre à noite numa caixa que girava de fora para dentro, ao inserir a criança a roda, soava uma campainha para que uma ama fosse recebê-las.

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Enquanto esse sistema de institucionalização ainda estava em vigência foi sancionado o primeiro Código de Menores, em 1927 que por meio da Lei .17.943-A, definia quem seria o “abandonado” que o Estado iria proteger, a saber:

Os menores de 18 anos em situação de abandono moral e materialmente pela inércia dos pais ou responsáveis no cumprimento, de sua obrigação natural de educação ou de modo geral quando a família foge a sua missão, ou é incapaz ou indigna deles. (VERONESE, 1999, p. 27-28)

Para atender ao que era previsto no Código de Menores, em meados de 1930 algumas instituições foram criadas e uma delas foi o Serviço de Assistência de Menores (SAM) em 1940, com objetivo de organizar e normatizar as instituições públicas que desenvolviam algum tipo de ação com os “menores”. Porém, por não receber os recursos necessários para o funcionamento e devido também às denúncias de atuação repressiva e até de maus tratos neste Serviço, em 1965, houve a substituição deste pela Fundação Nacional do Bem-estar do Menor (FUNABEM), para que o atendimento aos “menores abandonados” passassem de um modo repressivo para uma concepção assistencialista, onde o “menor” seria analisado como fruto de carências psicológicas, culturais e sociais, SIMÕES (2009).

Em 1979 foi elaborado por um grupo de juristas o novo Código de Menores que trouxe a chamada Situação Irregular, a partir desta doutrina qualquer policial estava autorizado a recolher os adolescentes que encontrassem vagando em lugares públicos.

Segundo Alencar, Lopes (1982) este código trazia a ideia de que com isso os “menores” seriam protegidos, pois seriam levados à Delegacia de Menores, onde se analisaria a situação sócio – familiar deles. Todavia, essa análise resultou em novos estereótipos que substituiria os anteriores (vadios, libertinos, mendigos) por abandonados, carentes e desassistidos.

Somente ao final dos anos 1970 e início da década de 1980 a temática ganha maior visibilidade por parte dos pesquisadores, “pois havia um movimento que objetivava promover a mudança no modo de representação das crianças e adolescentes em situação de abandono no país”. (RIZZINI, 1998, p.19).

A partir de 1980 novos rumos do processo de institucionalização de crianças e adolescentes foram traçados. Estes passam a ser vistos sob nova perspectiva. Isto porque, como forma de contribuir para a diminuição dos danos causados aos adolescentes é que se

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cria em 1986 a Comissão Nacional Criança Constituinte, que após dois anos de um processo de encontros e reuniões, incluem-se na Constituição Federal de 1988 os artigos 227 e 230 que tratam o adolescente como prioridade absoluta da sociedade e do Estado, e que propõe a Proteção Integral a este público.

Sendo assim, crianças e adolescentes são tratados como sujeitos de direitos por parte da família, da sociedade e do Estado, devendo ser protegidos integralmente. Desta forma, a situação irregular cede espaço à Doutrina da Proteção Integral, tal como prevê o artigo 227 da Constituição Federal:

É dever da família, da sociedade e do Estado assegura a criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda a forma de negligencia, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão” (BRASIL, 1988, p,128)

Regulamentado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, o artigo supracitado se constitui como um marco fundamental para que fossem traçados novos rumos do Acolhimento de crianças e adolescentes no Brasil.

O Serviço de Acolhimento Institucional é fundamentado no artigo 101 do ECA, previsto como Medida de Proteção. E no artigo 98 do referido estatuto é previsto que “as medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos forem ameaçados ou violados, por ação ou omissão da sociedade ou do Estado; por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável”.

O Acolhimento Institucional é um dos 04 Serviços da Proteção Social Especial de Alta Complexidade do Sistema Único da Assistência Social -SUAS - que regulariza e organiza em todo território nacional as ações socioassistenciais, baseadas nas orientações da nova Política Nacional de Assistência Social (PNAS).

Esses Serviços estão tipificados por nível de complexidade na Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais (Resolução nº 109/2009 – CNAS). A Tipificação é uma normatização que fundamenta e descreve o Acolhimento Institucional como medida de proteção, reafirmando o caráter de provisoriedade e a excepcionalidade que possui. Ademais, é neste instrumento normativo que possui a descrição acerca da estrutura física bem como do público a ser atendido.

O Serviço de Acolhimento deve ser norteado pelas diretrizes, princípios e orientações das Legislações vigentes. Entretanto, destaca-se asOrientações Técnicas para os Serviços de Acolhimento para Criança e Adolescente. Este é o principal documento

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norteador que direciona o trabalho a ser desenvolvido com as crianças e adolescentes em situação de acolhimento.

Dentre os principais princípios destaca-se o da Incompletude Institucional que é citado como uma orientação metodológica quanto à articulação institucional em que se observa:

Sua atuação deve basear-se no princípio da incompletude institucional, não devendo ofertar em seu interior atividades que sejam da competência de outros serviços. A proteção integral a que têm direito as crianças e os adolescentes acolhidos devem ser viabilizados por meio da utilização de equipamentos comunitários e da rede de serviços local. BRASIL, 2009a

A partir deste princípio é possível compreender que o Serviço de Acolhimento Institucional não caminha sozinho e que implica na corresponsabilidade das demais políticas públicas, como Educação, Esporte e Lazer, Cultura, bem como a Saúde, que também é o foco desta discussão. Assim, adentra-se ao próximo eixo deste trabalho que é apresentar a Política Pública de Saúde, no que diz respeito aos aspectos da Saúde Mental.

3. SAÚDE MENTAL: breve linha do tempo

Considerando a interseccionalidade existente entre a Política de Assistência Social e a Política de Saúde, no que se refere às situações de saúde mental dos adolescentes acolhidos, entende-se a necessidade precípua de uma breve caracterização desta Política.

De acordo com as Orientações Técnicas para os Serviços de Acolhimento Institucional, esta articulação quanto o atendimento de crianças e adolescentes com transtornos mentais e/ou que apresentam problemas devido o uso ou abuso de substâncias psicoativas deve ser acionada à rede de saúde mental nos Centros de Atendimento Psicossocial Infanto Juvenil e demais equipamentos disponíveis para atendimento a estas demandas prioritárias em saúde mental.

Cita-se que, a história da assistência psiquiátrica no Brasil, de acordo com BARROS; EGRY, 1994, tem seu marco institucional na inauguração do Hospital Psiquiátrico Pedro II no ano de 1852 na cidade do Rio de Janeiro. A lógica neste contexto era a da exclusão e institucionalização dos “loucos”.

Estes hospitais psiquiátricos, pejorativamente identificados como “hospícios”, funcionavam apenas como depósito de pessoas, das ditas anormais. De acordo com ARBEX, 2013, o hospital psiquiátrico colônia ficara conhecido como um símbolo do higienismo e segregação social, pois parte dos pacientes não apresentavam características que estavam doentes física nem mentalmente. Alguns dos “pacientes” eram

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institucionalizados por serem órfãos, ou que a família não os desejava por perto, onde existiam diversas formas de negligência e sofrimento dos “crônicos sociais.”

Sobre isso, observa-se o documentário de Helvécio Ratton, “Em Nome da Razão”, filmado em Barbacena-MG, em outubro de 1979, no hospital psiquiátrico da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais, que denuncia tratamentos inadequados a que eram submetidos os internos de hospitais psiquiátricos e que aborda o preconceito da sociedade para com essas pessoas ditas anormais em entrevista com internos, familiares e funcionários do hospital.

Assim, diversos segmentos da sociedade incomodados com a forma com que pacientes psiquiátricos eram tratados dentro destes hospitais é que se inicia o processo de solicitação por parte da sociedade de uma reforma psiquiátrica. E, de acordo com PINTO; FERREIRA, 2010 surge em 1978 o Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental.4

O primeiro Centro de Atendimento Psicossocial surgiu no Estado de São Paulo, somente em 1987, ano em que ocorreu a primeira conferência Nacional de Saúde Mental, um ano antes da criação do Sistema Único de Saúde-SUS. De acordo com o documento apresentado na Conferência Regional de Reforma dos Serviços de Saúde Mental, a cidade de Santos-SP, iniciou através da Secretaria Municipal de Saúde, a intervenção em hospitais psiquiátricos da região em que havia maus tratos e mortes.

É também nesta cidade que são implantados os primeiros Núcleos de Atenção Psicossocial (NAPS) que oferecia atendimento humanizado com funcionamento integral e residências para egressos da hospitalização. Isto apontava para uma possível substituição da hospitalização, ou uma segunda possibilidade de tratamento psiquiátrico. Desta forma, este foi um marco que deve ser considerado nesse processo da Reforma Psiquiátrica5 no Brasil.

Com a Constituição de 1988 é criado o Sistema Único de Saúde-SUS. Foi regulamentado em 1990, através das Leis 8080/90, e, a partir de então, a população brasileira passou a ter direito de acesso universal e gratuito à saúde.

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Este Movimento era formado por trabalhadores integrantes do movimento sanitário, associações de familiares, sindicalistas, membros de associações de profissionais e pessoas com longo histórico de internações psiquiátricas, que passaram a denunciar a violência dos manicômios; a comercialização da loucura; a supremacia de uma rede privada de assistência; e a criticar o modelo hospitalocêntrico na assistência às pessoas com transtornos mentais, de acordo com BRASIL 2005b.

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A Reforma Psiquiátrica é processo político e social complexo, composto de atores,instituições e forças de diferentes origens, e que incide em territórios diversos, nos governos federal, estadual e municipal, nas universidades, no mercado dos serviços de saúde, nos conselhos profissionais, nas associações de pessoas com transtornos mentais e de seus familiares, nos movimentos sociais, e nos territórios do imaginário social e da opinião pública. BRASIL,2005a.

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Somente nos anos de 2001 é que foi instituída a Política de Saúde Mental através da Lei nº 10.2016 que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas com transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental e que apresenta a hospitalização como medida extrema para casos em que as ações extra hospitalares não forem suficientes (BRASIL, 2004).

Nesta trajetória um marco interessante é a publicação do Decreto nº7508/2011 que estabeleceu a exigência da atenção psicossocial como um dos requisitos para instituição das Regiões de Saúde e para a organização das Redes de Atenção à Saúde- RAS. Nesse sentido, em 2012 instituíram-se as Redes de Atenção Psicossocial (RAPS) através da Portaria 3.088/2012 baseadas nas diretrizes do SUS e da Política de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas.

Através da Portaria 3.088/2012 a RAPS é constituída por sete eixos, sendo: I- Atenção Básica à Saúde; II-Atenção Psicossocial Especializada esta é constituída pelos Centros de Atenção Psicossocial em suas diversas modalidades; III atenção de urgência e emergência; IV- Atenção Residencial em caráter Transitório, neste encontram-se as Unidades de Acolhimento; V- Atenção Psicossocial Hospitalar; VI - estratégias de Desinstitucionalização, neste centra-se as Residências Terapêuticas e VI – a Reabilitação Psicossocial.

Especificamente quanto ao atendimento ao público infanto juvenil, é necessária a instituição do CAPS I, que deve atender crianças e adolescentes com transtornos mentais graves e persistentes e os que fazem uso de crack, álcool e outras drogas. Serviço considerado “porta aberta” e de caráter comunitário indicado para municípios ou regiões com população acima de cento e cinquenta mil habitantes. Além deste Centro, tem a Unidade de Acolhimento Infanto Juvenil destinada a crianças e adolescentes, sendo estes serviços executados a partir da quantidade habitacional do município.

3.1 Atendimento em Saúde Mental para Criança e adolescente em São Luís-MA

Os dispositivos que integram a Rede de Atenção Psicossocial na cidade de São Luís-MA, para atendimento da demanda de crianças e adolescentes com transtornos mentais, na esfera municipal são: o Centro de Atenção Integral à Saúde da Criança e do Adolescente (CAISCA), que funcionam em dois ambulatórios: CAISCA/ Farina, localizado no Bairro do Felipinho, no turno Vespertino e CAISCA/Clodomir Pinheiro Costa/Anjo da Guarda (turno matutino) que são ambulatórios que assistem crianças e adolescentes até 17

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anos e 11 meses, com transtornos mentais e comportamentais, além de usuários dependentes de substâncias psicoativas, e outros problemas psicossociais e o CAPS IJ - (Centro de Atenção Psicossocial Infanto Juvenil), localizado à Rua H, casa 5, quadra F, Jardim Atlântico, Turu.

De acordo com informações da Secretaria de Saúde do Município de São Luís-MA – SEMUS, através do seu site oficial, - a Saúde Mental no município de São Luís tem como principais objetivos: assegurar o direito e a proteção das pessoas acometidas de transtornos mentais para uma assistência humanizada, visando sua reinserção familiar, comunitária e profissional; prestar assistência psicossocial a usuários com transtornos mentais, dentre outros.

3.2 Adolescentes acolhidos em Unidade de Acolhimento Institucional com transtornos mentais moderados ou graves: desafios e reflexões.

Na cidade de São Luís existem apenas 03 instituições de acolhimento que recebem adolescentes em situação de risco e vulnerabilidades sociais que necessitam de medida de Proteção. Todavia, como análise amostral desta pesquisa, utilizaremos apenas as informações de uma Instituição, o Lar Calábria.

Pertencente ao Instituto Pobres Servos da Divina Providência, o Lar Calábria é uma Instituição não governamental, mas que faz parte da rede parceira do município, através da Secretaria Municipal da Criança e de Assistência Social.

O Lar Calábria executa o Serviço de Acolhimento Institucional através da modalidade de Casa Lar. Destaca-se que tal modalidade de acolhimento institucional se caracteriza por terem cuidadores residentes prestando os cuidados necessários a um grupo menor de crianças e adolescentes (até 10 acolhidos), visando a proteção e cuidados específicos necessários, conforme o artigo 101 do ECA.

O serviço de acolhimento do Lar Calábria é ofertado através de seis casas lares. Para este estudo foi realizada coleta de dados dos acolhimentos recebidos dentro do período de janeiro de 2018 a março de 2019, junto à Direção Executiva do Lar Calábria.

A partir da pesquisa realizada identificou- se que durante o período estipulado, ou seja, 15 meses, foram acolhidos 53 crianças e adolescentes, e deste quantitativo 22, apresentavam transtornos mentais, sendo: 4 crianças e 18 adolescentes.

Esta significativa demanda de acolhimento de crianças e adolescentes apresentando situações específicas e prioritária de atendimento em saúde mental é reflexo

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de um panorama nacional, pois cabe aqui destacar que de acordo com a Organização Mundial de Saúde, um em cada cinco adolescentes enfrenta desafios de saúde mental. A instituição estima que metade de todas as doenças mentais comece aos 14 anos e que o suicídio é a segunda maior causa de morte entre adolescentes. 6

Além disso, identificou-se também que destas 22 crianças e adolescentes, 13, ao chegar às Casas Lares já apresentavam características de transtornos mentais antes do acolhimento e 09 desenvolveram as características após o acolhimento.

Neste último ponto cabe refletir aqui o processo de “influência” de adolescentes e que de acordo com FREUD, 1996 [1926] há um ganho secundário7 nos transtornos mentais, por outros sujeitos que desenvolvem e reproduzem comportamentos ao observar que há um ganho, ou benefício em permanecer nesta situação e dentro de Unidades de Acolhimento isto fica evidente, pois os olhares dos cuidadores residentes são direcionadas aos acolhidos (as) que sofrem com transtornos mentais. Desta forma, com todos os olhares focalizados, a atenção, quase que exclusiva, devido à necessidade de estar em vigilância a todo o momento para impedir, seja uma automutilação, seja tentativa de suicídio por esse público, pode ser, que ainda que seja inconscientemente, se perdure nesta mesma situação e que outros adolescentes reproduzam as mesmas atitudes para ter acesso aos mesmos “benefícios”.

Um terceiro ponto de reflexão diz respeito à alteração na rotina institucional da Unidade de Acolhimento, pois não deve se perder de vista que o acolhimento na modalidade casa lar, de acordo com as normativas e legislações que norteiam o serviço, acontece em uma residência, com a presença do educador/cuidador residente – pessoa ou casal que reside na casa lar juntamente com as crianças/adolescentes atendidos, sendo responsável pelos cuidados e pela organização da rotina da casa. E que nesta modalidade as crianças e adolescentes têm acesso a todos os ambientes da casa, pois é característica desta para que haja maior interação entre os cuidadores residentes e os (as) acolhidos (as), e para o fortalecimento da autonomia destes.

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Dados obtidos através na Folha informativa - Saúde mental dos adolescentes. Organização Pan Americana de Saúde. 2018. Disponível em Determinantes Sociais e Riscos para a Saúde, Doenças Crônicas Não Transmissíveis e Saúde Mental.

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Para a Psicanálise, a ideia de ganho secundário se refere às vantagens pessoais advindas da neurose, mas o conceito se espraiou pela Medicina como os benefícios que um transtorno ou doença podem fornecer ao paciente e que podem justificar o seu desejo de continuar doente. ABCMED, 2018. Ganho

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Ressalta-se, ainda, que o acolhimento de crianças e adolescentes com transtornos graves ou moderados apresentam impactos para o Serviço, sobretudo, dentro de Unidades na modalidade Casa Lar, em que há apenas um casal que realiza o cuidado diretamente com esses acolhidos, o que implica também no adoecimento deste profissional que não possui treinamento nem formação para conduzir as atividades direcionadas para este público.

4. CONCLUSÃO

O acolhimento institucional de crianças e adolescentes na modalidade Casa Lar no município de São Luís-MA, com transtornos mentais moderados ou graves, impacta de forma significativa na condução das demandas específicas de saúde apresentadas por este público.

A partir dos dados apresentados pela Direção do Lar Calábria, observa-se o significativo número de crianças e adolescentes com transtornos mentais dentro de casas lares em São Luís- MA, que há um processo de “influência” dos acolhidos que são inseridos no Serviço e que já apresentam comportamentos de mutilação e ideação suicida, por exemplo, e que estes são reproduzidos, ainda que inconscientemente, por outros adolescentes que não apresentavam estas demandas anteriormente.

Percebeu-se os desafios vivenciados pelos cuidadores residentes que estão diretamente com as crianças e adolescentes, e que precisam conciliar as atividades de organização, limpeza da residência, preparação da alimentação, somados à necessidade de vigilância integral para este público que a qualquer momento pode tentar contra sua própria vida, seja pela automutilação, seja pela tentativa de suicídio.

Ademais, identificaram-se os impactos na vida destes cuidadores que estão adoecidos física e, sobretudo emocionalmente, devido à demanda expressiva que está posta e que, infelizmente, tem sido crescente.

Portanto, como estratégia e encaminhamento sugere-se a implementação da Unidade de Acolhimento Infanto Juvenil, conforme previsto nas legislações que dispõem sobre a saúde mental, que se caracteriza como uma Unidade de Acolhimento no âmbito da Saúde para atendimento destas demandas que, por vezes, as Unidades de Acolhimento da Política de Assistência Social funcionam como retaguarda da Saúde para atendimento destas demandas, implicando em todos os desafios e reflexões apontadas neste trabalho, para que assim essas crianças e adolescentes acessem aos direitos previstos nas

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legislações específicas, sobretudo na Lei nº 10.216, de 6 de abril de 2001 que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental.

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