Introdução - O planeamento económico é um tipo de política estrutural. Segundo Amaral “é
uma forma intervencionista de realizar política económica estrutural” e baseia-se “na prepa-ração e execução de planos, ou seja, de conjuntos de medidas que constituem as principais actuações de PE a realizar num certo horizonte temporal”. As medidas associadas ao planea-mento, nas economias capitalistas, têm um carácter indicativo, isto é, não obrigatório para os agentes económicos privados.
O planeamento económico de tipo indicativo remonta ao pós II guerra nos países da Europa Ocidental e constituiu uma política muito importante até à década de 70. Caiu em de-suso a partir dessa altura, facto que é compreensível se tivermos em conta que a partir de en-tão ocorreram mutações rápidas das estruturas produtivas desses países e por outo lado que é um tipo de política que se baseia na análise de input-output e que esta pressupõe a estabilida-de das condições técnicas estabilida-de produção. Os choques estabilida-de oferta registados em 1973 e posterior-mente foram fatais ao planeamento económico.
Impõe-se nesta lição lembrar que em Portugal a utilização de quadros de in-put-output começou nos anos cinquenta. A elaboração de diferentes matrizes para a economia Portugue-sa, a cargo de diferentes instituições nacionais, ao longo de algumas décadas, é um exemplo de um serviço de grande qualidade elaborado por técnicos portugueses.
O objectivo desta lição é fundamentalmente a apresentação da metodologia do input-output que ao permitir análises desagregadas e quantificadas, a nível sectorial (ramo) e regio-nal, é um instrumento de análise muito “poderoso” para testes de coerência ao cenário macro-económico escolhido pelos decisores de política.
- Um dos testes de coerência dirá respeito ao Investimento. O objectivo de crescimen-to do producrescimen-to definido no cenário, traduzir-se-á numa dada evolução do Investimencrescimen-to global. É preciso indagar se essa evolução é possível, i.é., se não existem estrangulamentos a nível sectorial - os investimentos sectoriais por ramo de destino são compatíveis com o objectivo de crescimento do produto?
- Um outro teste de coerência diz respeito ao factor trabalho. A meta de crescimento fixada, sendo dada a tecnologia, exigirá uma dada estrutura de qualificação da mão de obra e uma dada dimensão dessa estrutura que permita satisfazer a procura de trabalho. Trata-se de novo de um exercício sectorial. No que se segue, ignoraremos este teste de coerência.
- Um outro teste de coerência dirá respeito às exportações. O cenário macroeconómi-co prevê a evolução do volume das exportações e a análise desagregada mostrará se essa evo-lução é exequível do ponto de vista sectorial. O mesmo poderíamos dizer para a totalidade da procura interna.
- O cenário macroeconómico escolhido pelos DP tem consequências ao nível da re-partição espacial da produção, dos factores de produção, da criação de riqueza e sua utiliza-ção. Assim e após se ter procedido à desagregação sectorial, o cenário macroeconómico es-colhido pelos DP pode ser lido a nível regional, para o efeito são elaboradas as matrizes regi-onais.
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Adelaide Duarte, Apontamentos de Política Económica, Coimbra, 2004 -1-
Breve história do input-output em Portugal- A primeira matriz Portuguesa foi elaborada em 1959. As matrizes de 59 e de 60 foram elaboradas pelo INII (Instituto Nacional de Investigação Industrial). As matrizes de 70, 74, 77 e 82 foram elaboradas pelo GEBEI (Gabinete de Estudos Básicos de Economia Industrial). As matrizes anuais de 77 a 82 e o sistema quinquenal de 1980 foram elaborados pelo INE no âmbito do SCNP (sistema de contas nacionais portuguesas).
A matriz de 59 foi da responsabilidade de João Cruzeiro e apresentou duas versões: uma com 40 ramos da procura intermédia a preços do consumidor e outra com 20 ramos da pro-cura intermédia a preços de produção.
A matriz de 64 foi da responsabilidade de Eugénio Borralho e a versão inicial apresen-tava 67 ramos da Procura intermédia a preços do consumidor. A última versão apresenapresen-tava já 60 ramos da produção a preços do produtor sendo compatível com as matrizes posteriores ela-boradas pelo GEBEI.
As matrizes de 70, 74, 77 foram elaboradas pelo GEBEI (de que foi seu responsável o eng. João Cravinho) e apresentavam 60 ramos da procura intermédia. A matriz de 1982, tam-bém elaborada pelo GEBEI, comporta 32 ramos de procura intermédia e constitui um verdadei-ro sistema porque permite a passagem a diferentes tipos de valorizações dos bens, bem como a passagem entre matrizes com diferentes conteúdos.
As Matrizes anuais de 77 a 93 foram elaboradas pelo INE e publicadas no SCNP. O número de ramos é 49 (compatível com a nomemclatura de ramos da SEC). É difícil a compati-bilização com as matrizes elaboradas anteriormente. O primeiro sistema quinquenal de matrizes foi publicado em 1980 no âmbito do SCNP.
Os modelos de input-output - Os modelos utilizados de input-output são classificados
como “fechados” e “abertos” que podem ser elaborados em estática ou dinâmica. A primeira distinção reporta-se ao tratamento das famílias que é considerada como um ramo da produção nos modelos fechados. Na versão aberta passa-se o contrário não estando por isso a procura final contida na matriz da produção inter-ramo. A versão dinâmica permite determinar o stock de capital necessário à produção bruta adicional.
Antes de apresentar um quadro genérico de input-output devemos relembrar que estes modelos partem de uma representação particular da estrutura da produção da economia. A produção está dividida por ramos, cada ramo produz um produto homogéneo, o que significa que existe uma relação biunívoca bem-ramo (exclui-se a produção conjunta). A representação da produção a nível de cada ramo é a seguinte: das condições de produção que se exprimem na combinação de bens que são consumidos no processo produtivo e de recursos primários, resulta a produção (bruta) do ramo j:
consumos interme´dios do ramo j / recursos prima´rios do ramo jt produc¸a˜o bruta do ramo j
Este ramo da produção pode também ser encarado noutra perspectiva. Já não como ramo utilizador de recursos, o que o caracteriza na sua actividade de produção, mas como ramo fornecedor da sua produção a todos os ramos da produção (procura intermédia) e à pro-cura final. Munidos da informação de quantidades que traduzem as relações normais entre ramos de produção, podemos construir o que é usualmente referido como modelo de input-output, e assim podemos determinar o total de empregos de cada ramo da produção.
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Representemos de forma genérica um quadro de input-output: ---= Procura Final ---=
Recursos ou Inputs Totais
= Inputs primários totais + + (... ... ... ) (4º Quadrante) + Recursos Primários (3º Quadrante) = Empregos Totais + Procura Final (2º Quadrante) Procura Intermédia (1º Quadrante)
No 1º quadrante estão representados os fluxos inter-ramos. No 2º quadrante a procura final, no 3º quadrante o contributo dos factores de produção e no 4º quadrante os fluxos aí re-gistados estão dependentes de hipóteses particulares sobre a matriz dos coeficientes técnicos, por essa razão nenhum título lhe foi atribuído.
Passemos a ilustrar diferentes utilizações das relações incluídas no quadro acima.
O modelo de quantidades - modelo estático aberto de
Leontief-Hipóteses tomadas para este modelo:
a) a função de produção de cada ramo de produção é uma função de produção de factores complementares,
b) os coeficientes técnicos de produção são constantes e aij m0 .
1)
jx
ij+ Yi
= Xi
para i =1,2,...,n onde Yi hC.Finali+F.BrutaCi+ExiCFihCPrivi+C.Colectivoi
FBCi hFBCFi+<existeˆncias
A equação 1) representa a equação dos empregos do ramo i. A produção bruta do ramo i é igual ao total dos fornecimentos intermédios deste ramo a todos os ramos da econo-mia mais a produção do ramo i que se destina a satisfazer a procura final. A equação 1) pode ser rescrita se tivermos em conta a definição de coeficiente técnico:
2)
ja
ijX
j+ Yi
= Xi
para i =1,2,...,nO sistema pode ser apresentado na forma matricial abreviada : 3) AX+Y=X
com as seguintes dimensões Anxn; Xnx1; Ynx1
e sendo
A m 0 .x I − A x! 0
A matriz A é a matriz dos coeficientes técnicos, cujo elemento genérico é o coeficien-te aij que representa a quantidade do bem do ramo i que é necessário para produzir uma
uni-dade da produção do ramo j. X é o vector da produção bruta e Xi representa a produção
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(bruta) do ramo i. Y é o vector da Procura Final, Yi representa a procura final do ramo i da
produção .
Resolução do sistema - Trata-se de um sistema linear de equações e apresenta n equações
li-nearmente independentes e 2n incógnitas (as n produções brutas + as n procuras finais), o sis-tema é indeterminado. Pode-se resolver esta questão tomando as procuras finais como variá-veis exógenas.
4) X = [I − A]−1$ Y
ou X = F $ Y
com F = [I − A]−1, onde X>0.
A matriz F é a matriz inversa de Leontief e o elemento genérico desta matriz, e fij
re-presenta a quantidade do bem i que é necessária, quer directa quer indirectamente, para satis-fazer uma unidade da procura final do ramo j da produção.
Algumas questões que poderão ser analisadas a partir deste modelo:
I) Qual é o impacto de variações da procura final na produção dos ramos da economia ?
Simbolicamente: <Y = <Y& t <X ?
Como o sistema é linear podemos utilizar o sistema de equações 4) tendo o cuidado de substituir X e Y pelos respectivos acréscimos.
Precisemos a questão anterior. Como o sistema é linear, podemos isolar a influência da variação da procura final de cada ramo sobre a variação da produção de cada ramo e so-bre a produção total.
Façamos <Y1 > 0 e <Yi = 0, ≤i ! 1
e <Y(1) = <Y1 0 . . . 0
A nossa questão pode ser simbolicamente representada da seguinte forma: ?
<Y(1) t <X(1)
A resposta a tal questão passa pela resolução do sistema de equações:
5) <X(1) = [I − A]−1< Y(1)
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O que é equivalente a: <X(1)= f11 . . . fn1 < Y1
Neste caso, o vector dos acréscimos das produções brutas dos ramos da produção se-rão obtidos multiplicando a primeira coluna da matriz inversa de Leontief pelo acréscimo da produção bruta do ramo (1). A resposta será geral se substituirmos 1 por (j). O impacto da variação da procura final do ramo j sobre a produção dos ramos é igual ao produto da coluna (j) da matriz inversa de Leontief pela variação da procura final do ramo (j) da produção.
Poder-se-á determinar o impacto total, sobre a produção, da variação da procura final de um ramo da produção, o ramo j, basta somar os elementos da coluna (j) da matriz inversa de Leontief e multiplicar depois pela variação da procura final do ramo (j)
6) [1] <X(j)= [1][I − A]−1< Y(j)
6∏) [1]X(j)= [
ifi1...
ifin]Y(j)sendo [1]=[1...1] o vector soma, com n linhas O que é equivalente a :
com j=1, 2, ...,n 6∏∏)
i<Xi=
ifij< Yj
Suponhamos agora que a variação da procura final do ramo j é unitária. Podemos de-terminar o multiplicador parcial da produção do ramo (j), (xoj), que representa a quantidade
da produção bruta de todos os ramos que é necessária para satisfazer uma unidade da procura final do ramo j. A fórmula poderá ser obtida dividindo ambos os membros da equação 6’’) por ∆Yj:
7) x0j = <Yji<Xi
O impacto total sobre a produção de todos os ramos de uma variação das diferentes procuras finais poderá ser obtido somando os vectores dos acréscimos das produções brutas associados à variação das procuras finais de cada ramo:
8)
j<X
(j)= [I − A]
−1j<Y
(j)___________________________________________________________________________
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II ) Podemos querer estudar o impacto da variação de uma componente da procura final sobre
a produção dos ramos. Suponhamos que a componente da procura final que varia é o investi-mento e que queremos conhecer o seu impacto sobre a produção dos diferentes ramos:
9) <X = [I − A]−1 < I
Exemplifiquemos para uma matriz 2x2: 9) <X<X1 2 = kf1k< Ik kf2k< Ik com k=1,...,n. Generalizando: 9∏) <X1 $ $ $ <Xn = k f1k< Ik $ $ $ kfnk< Ik
Desta forma, (9’), passaríamos a conhecer os valores das produções brutas associados àquela variação do investimento.
III) Queremos determinar a variação do emprego por ramos decorrente de uma variação da
procura final do ramo (j). Como fazê-lo?
Comecemos por definir coeficiente de trabalho directo como a quantidade de trabalho directo do ramo j que é necessária à produção de uma unidade de bem deste ramo j.
Para responder à questão acima levantada, multiplicamos o vector linha dos coeficien-tes de trabalho directo, , pela matriz diagonal das variações das produções dos ramos neces-´ sárias à satisfação da procura final do ramo j.
10) L(j)= ´ < X(j)ou seja,´(j)= ´
1< X1(j) ... ... ´n< Xn(j)
onde ‘^’ se utiliza para representar uma matriz diagonal.
O mesmo raciocínio poderá ser aplicado à determinação das variações do VAB e das Importações.
Suponhamos agora que queremos deduzir os coeficientes parciais de emprego do ramo (j) da produção. Para tal vamos pré-multiplicar a matriz inversa de Leontief pela matriz diagonal dos coeficientes de trabalho directo:
D = ´F =
l1f11 ... l1f1n
... ... ... lnfn1 ... lnfnn
O elemento genérico da matriz D - dij representa a quantidade de trabalho do ramo (i)
que é necessária para satisfazer a procura unitária do ramo (j).
Seja d0j o multiplicador parcial do emprego do ramo (j). O seu valor é igual à soma
dos componentes da coluna (j) da matriz D:
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11)
d
0j=
i´i
f
ijIV) Podemos agora analisar a possibilidade de responder às questões colocadas em I, II e III
a nível regional. Para tal deverão ser elaboradas matrizes regionais.
Qual é a principal diferença a ter em conta quando elaboramos estas matrizes em re-lação às matrizes nacionais? A procura final de cada ramo terá agora três origens diferentes : na região, nas restantes regiões e no exterior do país. Vamos escrever o sistema de quantida-des da região r (r=1,2...,5) tendo em conta aquelas três origens diferentes:
12) X(r) = A(r)X(r) + Y(r) + Y(rr) + Ex(r), para r=1,2, ..., 5.
A matriz dos coeficientes técnicos de qualquer região deverá em princípio apresentar um maior número de componentes nulas, nem todos os ramos se encontrarão localizados em cada região. Por consequência, a matriz inversa da região apresentará também um maior nú-mero de componentes nulas. Compreender-se-á facilmente que um objectivo de crescimento do PIB real, a dada taxa, possa a nível de dada região não ser cumprido, se as empresas de cada ramo estão a produzir a uma capacidade normal ( ou entre a capacidade normal e a capa-cidade máxima) e se a maior parte dos ramos desta região não produzir bens de capital. Nesta situação, o crescimento do produto da região implicaria antes de mais a importação de bens de capital das restantes regiões e do exterior. Os efeitos de curto-prazo e em parte os efeitos de médio-prazo sobre a região serão extravertidos para o exterior ou para as regiões que pro-duzam bens de capital. É evidente que no raciocínio anterior está implícito que a procura fi-nal estimada para a região não constitui uma restrição ao objectivo de crescimento fixado a nível macroeconómico. Mas pode constituir, e neste caso o objectivo macroeconómico não é coerente porque a nível de uma região não poderá ser cumprido. A mesma conclusão poderá ser retirada se a restrição for a oferta de trabalho da região e existir uma imobilidade relativa do factor trabalho (qualificado) das regiões mais ricas para as regiões mais pobres.
Por último acrescente-se que a nível nacional o objectivo macroeconómico de cresci-mento poder-se-á não poder realizar devido à restrição dos recursos disponíveis. Os exercícios efectuados em I, II e III podem ser reinterpretados à luz de uma restrição dos re-cursos primários : exemplo - da oferta de trabalho.
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