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A importância de uma política marítima para Portugal

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Academic year: 2021

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A importância de

uma política marítima

para Portugal

A importância da definição de uma política marítima, que permita estabelecer, de forma clara e integrada, as principais linhas de orientação e metas a atingir, deve constituir para Portugal uma das suas prioridades, caso se pretenda valorizar e beneficiar de um dos principais recursos naturais existentes no nosso país. No entanto, para que tal desiderato venha a materializar-se em acções concretas é necessário que os principais agentes, públicos e privados, que se encontram ligados ao mar acreditem na utilidade de investir nos projectos com ele relacionados. Ultrapassada que se encontre esta primeira dificuldade, as metas a atingir com a política marítima, bem como a sua execução, podem assumir diferentes formas. Todavia, independentemente do tipo de política a adoptar, há a considerar a necessidade de garantir que a melhoria das condições sociais e económicas da sociedade deve estar presente, sempre no respeito pela conservação da biodiversidade e ecossistemas marinhos.

Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Europeus

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The importance of the definition of a maritime policy which enables the main guidelines and targets to be achieved in a clear and integrated manner should constitute one of Portugal’s priorities if we wish to enhance and benefit from one of the main natural resources in our country. However, for such a desiderato to be realised in concrete actions, it is necessary for the main public and private agents, who are connected to the sea, to believe in the utility of investing in projects related with it. As this initial difficulty has been overcome, the targets to be attained with the maritime policy, as well as with its execution, can assume different forms. However, irrespective of the type of policy to be adopted, one has to consider that the need to ensure that there should be an improvement in the social and economic conditions of society, always showing respect for the conservation of marine biodiversity and ecosystems.

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mbora exista uma noção mais ou menos generalizada de que será importante para Portugal ter uma política marítima integrada e coe-rente, onde se encontrem defini-das as orientações e objectivos a atingir, na prá-tica esta importância não encontra grande eco no investimento e na concretização de projec-tos ligados ao mar.

Na verdade, Portugal não tem conseguido definir ao longo das últimas décadas uma polí-tica marítima integrada, optando antes por es-tabelecer políticas sectoriais, que não permitem uma linha de acção consistente que integre as várias áreas em causa. Tal realidade é visível quan-do se efectua um estuquan-do das actividades ligadas ao mar e se verifica a inexistência de dados e a ausência de uma articulação efectiva entre os diversos sectores de actividade. Portugal tem, por isso, vindo a estabelecer com o mar uma relação mais de coexistência passiva do que pro-priamente de aproveitamento activo de todas as oportunidades que ele oferece, sem que be-neficie do potencial ao seu dispor.

A importância que o mar pode representar para Portugal advém não só da dimensão dos seus espaços marítimos, onde se inclui a plata-forma continental, mas também da sua quali-dade, nomeadamente no que se refere à vasta biodiversidade marinha e recursos geológicos, minerais e genéticos nele existentes. Este imen-so valor intrínseco que o mar português encer-ra encontencer-ra-se detalhadamente descrito na “Es-tratégia Nacional para o Mar”, que o Governo recentemente aprovou.

Tanto ou mais relevante do que sublinhar a importância do mar, ou a necessidade de uma política marítima integrada, é saber se este va-lor que lhe está associado, aparentemente evi-dente, é susceptível de despertar um verdadei-ro interesse nos agentes com capacidade de investir no mar. Se se vier a reconhecer que exis-te um efectivo inexis-teresse nesexis-te domínio, haverá então que encontrar mecanismos que levem os agentes económicos a investir nas actividades ligadas ao mar. Alguns sinais existem já nesse sentido, que permitem acalentar alguma espe-rança, como é o caso do projecto de aproveita-mento da energia das ondas do mar, recente-mente lançado na costa portuguesa.

Não basta por isso afirmar que Portugal é um País marítimo e que a sua história encontra no mar uma fonte de grandes realizações e pro-jectos. É preciso ter uma nova visão do mar, mais moderna, empreendedora e realista. Mas, como referi, é preciso que os vários actores acre-ditem que vale a pena “apostar” no mar.

Este trabalho de “dar credibilidade” ao mar é uma tarefa que não pode ser da exclusiva res-ponsabilidade do poder público, seja a nível nacional, regional ou local, mas terá que envol-ver as múltiplas entidades, públicas e privadas, interessadas nos assuntos do mar. Será neces-sariamente uma tarefa morosa e terá de passar por um conjunto de acções, devidamente arti-culadas entre si, como sejam a divulgação das oportunidades ligadas ao mar, a formação e educação, a investigação científica, a promoção das actividades marítimas, a valorização e a pro-tecção dos recursos, entre outras.

A actuação conjugada das diversas entida-des deve ser no sentido de, por um lado, meter aos decisores políticos um papel de co-ordenadores, facilitadores e reguladores, actuando de modo a criar as condições neces-sárias para que de forma célere e desburocrati-zada se possam materializar os projectos liga-dos ao mar. Por outro lado, deve ser atribuído ao sector privado um papel de dinamizadores e promotores dos projectos ligados ao mar. É através da efectiva realização destes projectos que será possível persuadir os mais cépticos de que o mar pode constituir uma aposta de sucesso e com futuro. No entanto, tal como em outras actividades, ambos os tipos de en-tidades, públicas e privadas, terão que realizar alguns investimentos.

Só depois de a importância do mar ser com-preendida, interiorizada e considerada credí-vel, o que implica muito mais do que a publi-cação de textos e a realização de conferências e palestras, é que será realista definir qual o ca-minho a trilhar, isto é, que política marítima deve Portugal ter.

Caso a aposta no mar venha a constituir uma verdadeira opção, os elementos enformadores de uma política marítima nacional, cuja necessi-dade e existência defendo, deverão estar em harmonia com aquilo que vier a ser estabeleci-do no âmbito da União Europeia.

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mente, tal como em outras matérias comunitá-rias, o princípio da subsidiariedade deve estar presente na definição da política marítima eu-ropeia. Com a presidência do Conselho da União Europeia, no segundo semestre de 2007, Portugal terá uma oportunidade ímpar para desempenhar um papel relevante neste domí-nio. Este papel poderá ser ainda mais impor-tante se atendermos a que Portugal desfruta na União de um evidente reconhecimento e consi-deração como um País que não só está intima-mente ligado ao mar, como também é conhe-cedor das matérias com ele relacionadas.

Ainda no que respeita à ligação da política marítima nacional com a da União, especial aten-ção deve ser conferida aos objectivos estabeleci-dos no “Livro Verde” (LV), quando refere que “uma política marítima inclusiva da União Eu-ropeia deverá visar o crescimento e a criação de mais e melhores postos de trabalho, contribuin-do assim para uma economia marítima forte, em expansão, competitiva e sustentável, em harmonia com o meio marinho. Deve procurar prevenir e minimizar os conflitos em torno da utilização do espaço marítimo e prever meca-nismos claros e consensuais para a sua resolu-ção. Deverá proporcionar uma maior previsibi-lidade para o sector e outros interessados e uma abordagem mais eficaz em matéria de conser-vação dos recursos marinhos”.

É na esteira desta abordagem que o LV as-senta a concretização dos objectivos estratégi-cos da União, no que concerne à existência de uma política marítima abrangente, em dois pi-lares que reputo de grande importância. O pri-meiro é constituído pela Estratégia de Lisboa e visa estimular o crescimento e a criação de mais e

melhores empregos na União Europeia. O segundo

é estabelecido com vista a manter e melhorar o

esta-do esta-do recurso em que se baseiam todas as actividades marítimas, a saber, o oceano propriamente dito.

Considero assim que, tanto a nível europeu como a nível nacional, o grande desígnio de uma política marítima deve ser o de contribuir para o desenvolvimento económico e social de forma sustentável. Uma política marítima deve, por isso, ser capaz de encontrar o justo equilí-brio entre as questões económicas e ambien-tais. Se Portugal pretender criar as condições para ter, no âmbito das actividades marítimas,

uma economia mais competitiva, tendo natu-ralmente sempre presente as questões sociais, teremos que promover a existência de um sec-tor marítimo mais moderno, dinâmico e em-preendedor.

Porém, a existência de uma economia mais competitiva só poderá vingar de forma susten-tada se for realizada no integral respeito pelo ambiente marinho, que se deve preservar e tor-nar cada vez mais saudável, para bem das gera-ções presentes e no respeito pela solidariedade intergeracional. Há, no entanto, que referir que a protecção do meio marinho contra todos os riscos e ameaças que diariamente impendem sobre o mar não deve constituir um fim em si mesmo, mas antes uma condição sine qua non do crescimento de uma economia marítima mais competitiva e robusta, retirando do mar todas as vantagens que ele nos oferece em prol do bem-estar da sociedade.

A preservação do meio marinho deve assim constituir uma preocupação permanente, sen-do no entanto necessário que as indispensáveis normas, que visam proteger a biodiversidade e ecossistemas marinhos, se encontrem sedimen-tadas em sólidos conhecimentos científicos. A investigação científica deve, por conseguinte, constituir uma verdadeira aposta não só em benefício das actividades directamente ligadas ao mar, como também na sustentação das nor-mas ambientais que devem enquadrar essas mesmas actividades. Na verdade, são os conhe-cimentos científicos previamente adquiridos e resultantes da observação, análise e estudos, que dão credibilidade às regras e normas regulado-ras das actividades marítimas, na medida em que só se pode proteger convenientemente aquilo que se conhece.

Complementarmente, a protecção do meio marinho passa igualmente por garantir a exis-tência de condições de segurança na gestão dos oceanos e mares. A este respeito uma das acti-vidades que mais directamente interage com o meio marinho é indubitavelmente o transpor-te marítimo. Se, por um lado, ele assume uma especial importância no dia-a-dia das socieda-des europeias, na medida em que 90% do co-mércio externo da União e mais de 40% do seu comércio interno é realizado por via marítima, por outro, o transporte marítimo é também

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23 fonte de alguns riscos. Refiro-me à poluição

atmosférica por ele causada que, como realçado no LV, continua a ser uma fonte importante de poluição na Europa. À poluição atmosférica acresce a poluição marinha que pode vir a ser originada pelo derrame de hidrocarbonetos re-sultante de acidentes marítimos.

Estes riscos são no entanto minimizáveis mediante a implementação de um conjunto de requisitos, quer no que respeita à construção de navios, tornando-os mais seguros e respeita-dores do ambiente, quer em relação ao estabe-lecimento de regras ligadas à segurança da nave-gação marítima. É neste contexto de prevenção, bem como de actuação no combate à poluição marítima, que a Agência Europeia da Segurança Marítima, recentemente instalada em Portugal, tem vindo a desempenhar um importante pa-pel, contribuindo de forma clara para a segu-rança do espaço marítimo europeu e, comple-mentarmente, para uma maior visibilidade das questões marítimas no nosso país.

Inserem-se igualmente dentro do conceito de segurança a repressão das actividades ilícitas como sejam o terrorismo, o tráfico de seres humanos, o contrabando, a imigração ilegal e as actividades piscatórias à margem das leis e regulamentos. Neste domínio, a segurança pode ser conseguida por duas vias. A primeira é aque-la que resulta das acções que são realizáveis a partir da costa, utilizando, para tal, sistemas de vigilância e controlo do tráfego marítimo como sejam os satélites e o VTS (Vessel Traffic Sys-tem). A segunda passa pelas indispensáveis ac-ções de vigilância e controlo dos espaços marí-timos sob soberania ou jurisdição nacional que, não sendo possível realizá-las a partir de costa, têm obrigatoriamente que ser feitas no mar.

Neste âmbito, tal como referido no LV, as

economias de escala que é possível obter confiando aos poderes públicos a execução de múltiplas tarefas e a utilização dos recursos para finalidades diversas são consideráveis. É por isso aconselhável que

os diminutos recursos existentes para a vigi-lância dos espaços marítimos sejam rentabili-zados na sua máxima amplitude. É nesse sen-tido que o LV refere, ainda, que a convergência

das tecnologias civis e militares, em particular para vigilância do mar, poderá também contribuir para minimizar a duplicação de capacidades. No caso

nacional, este desiderato é singularmente con-seguido através do conceito de Marinha de duplo uso, sendo a capacidade sobrante das unidades navais, infra-estruturas e pessoal empregues nos mais diversos tipos de mis-sões que visam garantir a segurança e controlo dos espaços marítimos. Assim se consegue gerar consideráveis economias evitando a du-plicação de meios e serviços.

Por outro lado, um adequado ordenamento das zonas costeiras, espaços marítimos e activi-dades afins, à semelhança do que existe em al-gumas zonas do território nacional, estabele-cendo regras e consignando determinados espaços a certas actividades, contribuirá decisi-vamente para uma melhor compreensão e in-terligação das várias actividades ligadas ao mar. Definida a política marítima, o passo seguin-te será identificar as estruturas e os mecanis-mos indispensáveis à sua execução. Esta acção deverá ser concretizada através de um modelo de governação que terá necessariamente de as-sumir um carácter transversal às diversas áreas da acção governativa.

Embora o modelo de governação possa as-sumir diversas configurações, existe um aspec-to fundamental que deve estar sempre presen-te, independentemente do seu for mato. Refiro-me a um mecanismo de coordenação que permita congregar os diversos actores, muitas das vezes com interesses não totalmente con-vergentes, mas na sua maioria conciliáveis, em torno de um objectivo que deve ser comum. É para isso fundamental que as mentalidades se adaptem a uma visão mais conjunta e moderna dos assuntos do mar, em que o interesse co-mum tem muitas vezes de se sobrepor aos in-teresses sectoriais.

O modelo de governação, independentemen-te da sua configuração ou localização na estru-tura da Administração Pública, terá como prin-cipais funções, para além da articulação dos múltiplos intervenientes, garantir e acompa-nhar a implementação da política marítima de-finida e, concorrentemente, assegurar a repre-sentação e defesa dos interesses nacionais nos vários fora e organizações internacionais.

Finalmente, a definição de uma política marí-tima deve ter em consideração alguns princí-pios que avalio como de particular utilidade.

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Em primeiro lugar, como referi anteriormente, a política marítima deve ser inclusiva, isto é, deve envolver, quer na sua definição, quer na sua exe-cução, todos os agentes e actores que se encon-trem credivelmente ligados ao mar. Em segun-do lugar, deve ser ambiciosa, mas ao mesmo tempo realista. Em terceiro lugar, deve ser pro-gressiva, isto é, avançar por etapas, começando por consolidar e implementar as matérias que à partida surgem como mais consensuais.

Termino afirmando a minha convicção de que Portugal beneficiará se conseguir usufruir verda-deiramente de um dos seus mais valiosos recur-sos, ou seja, do mar. Acredito, por isso, na im-portância de uma política marítima para Portugal. Porém, para que esta aposta seja efectivamente consequente há que garantir que existe uma real convicção da sua utilidade, se envolvem todas as partes interessadas e se estabelecem os mecanis-mos necessários à sua execução.

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