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Manejo das queimaduras em pequenos animais

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Academic year: 2021

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Bruna Portolan Amaral – Programa de Pós-graduação em Medicina Veterinária da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Daniel Curvello de Mendonça Müller - Médico Veterinário, Doutor em Cirurgia Veterinária. Professor Associado I, Departamento de Estudos Agrários, Mestrado em Modelagem Matemática, Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (UNIJUÍ) cmdaniel@terra.com.br Andréia Sausen Rakoski – Médica Veterinária Autônoma

Paula Cristina Basso - Médica Veterinária, Doutora em Cirurgia Veterinária, Hospital Veterinário Universitário da UFSM.

Amaral BP, Müller DCM, Rakoski AS, Basso PC. Medvep - Revista Científica de Medicina Veterinária - Pequenos Animais e Animais de Es-timação; 2014; 12(41); 1-637.

Resumo

As queimaduras são síndromes texturo-humorais, que envolvem regiões superficiais e sistêmicas, causa-das por agentes térmicos, quentes ou frios. O conhecimento da fisiopatologia causa-das queimaduras torna-se imprescindível para a adoção de medidas que visem contornar os processos desencadeados e reverter quadros severos de lesões teciduais. Aborda-se nesta revisão as principais alterações desencadeadas no sistema cardiovascular, renal, gastrointestinal, imunológico, metabólico e endócrino. Desta forma busca--se fazer relação dos tratamentos empregados e as principais condutas clínico-cirúrgicas empregadas nos pacientes vítimas de queimaduras.

Palavras-chave: calor, feridas, cães, gatos.

Abstract

Burns are texturo-humoral syndromes, involving superficial and systemic regions, caused by heat, cold or hot agents. Knowledge of the pathophysiology of burns becomes essential to adopt measures to circu-mvent the processes triggered and reverse severe conditions of tissue injury. We discuss in this review the major changes triggered in the cardiovascular system, kidney, gastrointestinal, immune, metabolic and endocrine. Thus we seek to make regarding treatment of employees and key clinical and surgical approa-ches in clinical situations involving patients with burns.

Keywords: heat, wounds, dogs, cats.

Introdução

A pele é um órgão que limita o meio interno e o meio externo. Sua integridade é fundamental para a manutenção da homeostase hidroeletrolítica, flexi-bilidade, proteção e lubrificação da superfície, além de participar do sistema sensorial e exercer função no sistema imunológico. Dessa forma existem pa-râmetros físico-químicos necessários à manutenção dessa estrutura e sua funcionalidade, sendo a tem-peratura um dos principais (1).

As queimaduras ocorrem quando se aplica

ener-gia térmica em velocidade mais rápida do que o te-cido consegue absorver e dissipar. Fogo, almofadas de aquecimento, secadores de cabelo, água fervente, vapor, óleo de cozinha aquecido, sistemas de exaus-tão, canos quentes, ferros de marcação e radiação solar são as fontes comuns de queimaduras térmi-cas em animais domésticos. Menos comuns são as queimaduras provocadas pela corrente elétrica, transformada em calor ao contato com o corpo (2).

A queimadura química, comumente descrita em veterinária, por vezes é entendida como deno-minação imprópria, visto que as lesões cáusticas

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provocadas por agentes químicos, em que há dano tecidual, nem sempre resultam na produção de ca-lor (3). Entretanto, Cardoso et al. (4) descrevem as queimaduras causadas por agentes químicos sendo provocadas principalmente por ácidos ou álcalis.

Quando provocadas por ácidos são extrema-mente destrutivas e seus efeitos tornam-se notáveis imediatamente após o contato. Em contrapartida, as queimaduras por álcalis são enganosas. Em um primeiro momento, elas aparentam ser leves, mas posteriormente progridem por extensão direta. Os álcalis produzem dano tecidual resultante da necro-se de liquefação e os ácidos por necronecro-se de coagula-ção, provocando escara protetora que impede a sua penetração em camadas mais profundas. Assim, a lesão por álcalis é mais suscetível à contaminação.

O contato da pele com superfícies cuja tempe-ratura é inferior a 42°C, não promove alterações proteicas. Os processos de desnaturação da prote-ína celular iniciam a partir dos 50°C e a coagulação proteica, com posterior morte celular, ocorre em temperaturas superiores a 60°C, variando conforme o tempo de exposição (5).

Queimaduras por eletricidade ocorrem quando a corrente elétrica toca um ponto do corpo havendo ou não um ponto de saída. Em pequenos animais a mastigação de fios elétricos é a causa mais comum desse tipo de lesão (6). As queimaduras elétricas diferem-se das outras etiologias de lesão térmica, pela tendência de acometer uma superfície corpo-ral relativamente pequena, mas causar invariavel-mente lesões em estruturas profundas. Estas lesões ocorrem no percurso da corrente entre os pontos de entrada e de saída (7).

A voltagem e a amperagem são os fatores mais importantes que determinam a extensão e a profun-didade da lesão tecidual. Quando uma corrente elé-trica passa através da resistência eléelé-trica, é liberada energia calorífica, denominado efeito Joule. Tam-bém há resistência nos tecidos variando conforme cada tipo estrutural (nervos, sangue, vasos, múscu-lo, pele, tendões, tecido adiposo e ossos). O osso, por exemplo, possui a maior resistência, gerando dessa forma, mais calor quando comparado aos ou-tros tecidos citados (7).

Os autores desse trabalho alegam que em quei-maduras por ebulição, são encontrados diferentes graus de lesões, pois conforme o líquido escorre pela superfície corporal, inicia seu resfriamento. Já em queimaduras por produtos cáusticos, tem--se apenas um grau de lesão, resultando na mesma

agressão para toda área atingida. Nesse caso, o me-lhor tratamento instantâneo é a de diluição do pro-duto com água corrente abundante.

A gravidade das queimaduras é diretamente proporcional à temperatura e ao tempo de exposi-ção do animal ao agente térmico, e assim são clas-sificadas em quatro graus. As queimaduras mais superficiais, classificadas como de primeiro grau, afetam somente a epiderme. A área afetada tende a ficar dolorida, espessada, eritematosa e escama-tiva. A cicatrização ocorre rapidamente, de três a seis dias, devido à reepitelização a partir do extrato germinativo ou de estruturas anexas à derme. Di-ferentemente dos seres humanos os cães não pos-suem um rico plexo vascular superficial, pois a pele canina não atua como fonte de dissipação de calor. Dessa forma os canídeos apresentam menos erite-ma em casos de lesões superficiais. Queierite-maduras de espessura parcial superficiais são úmidas, bran-queiam com pressão e são sensíveis a dor.

Geralmente cicatrizam em três semanas, devido à epitelização a partir de porções mais profundas dos apêndices cutâneos (3).

As queimaduras de segundo grau caracterizam--se por serem mais profundas e de espessura par-cial, sendo comum em humanos e suínos a presença de bolhas (8). Nessas lesões ocorre edema subcutâ-neo e inflamação notável, além dos pelos tornarem--se facilmente removíveis. Geralmente essas lesões cicatrizam sem a colocação de enxertos, podendo levar meses até a recuperação completa. Como con-sequência, podem deixar marcas extensas e eviden-tes. A cicatrização ocorre por epitelização a partir de anexos mais profundos e das margens da ferida. Durante esse processo é fundamental a proteção da ferida contra traumatismos e contaminação, tendo em vista que, a contaminação bacteriana eleva a gra-vidade da alteração e piora o prognóstico (3).

Nas queimaduras de terceiro grau ou espessura total, a lesão ocorre por completo, atingindo os te-cidos mais profundos (8). Há formação de crostas marrom-escuras, insensíveis e rígidas. Essas quei-maduras são menos doloridas tendo em vista que há destruição da inervação local. A trombose vascu-lar superficial e a permeabilidade vascuvascu-lar profun-da causam edema subcutâneo e necrose tecidual. A cicatrização ocorre por contração e reepitelização, a menos que a ferida seja reconstituída. Diferente-mente de queimaduras de primeiro e segundo grau, as crostas das queimaduras de terceiro grau não se quebram quando elevadas. Por isso, devem ser

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re-movidas tendo em vista que rapidamente são colo-nizadas tornando-se focos de infecção (3).

Por fim, nas queimaduras de quarto grau ou a carbonização, a alta temperatura gera redução parcial ou total dos tecidos, provoca fraturas de os-sos longos e de calota craniana, abertura da cavi-dade torácica e abdominal com exposição visceral, destruindo as extremidades dos membros e as par-tes moles superficiais. Cursa ainda com hematomas extra-dural e sub-dural (9).

Essa revisão objetiva retomar as alterações ocorridas nas queimaduras nos diferentes sistemas orgânicos dos animais, bem como revisar os trata-mentos utilizados para reversão das alterações de-sencadeadas por essa síndrome texturo-humoral.

Alterações Locais e Sistêmicas

Deve-se ter consciência que as lesões causadas pelas queimaduras, invariavelmente vão além da-quelas notáveis ao exame visual. Todo o organismo reage a essa agressão, sofrendo alterações diretas, como as queimaduras pulmonares pela inalação de gases quente, ou indireta, como os rins tentando compensar desequilíbrios hidroeletrolíticos gera-dos pelas lesões (9). Dessa forma, é possível divi-dir didaticamente as alterações locais e sistêmicas. Abaixo, descrevem-se características e particulari-dades de cada uma delas.

Alterações locais

As queimaduras comprometem a integridade funcional da pele, fazendo com que haja a quebra da hemostasia hidroeletrolítica, alterando a flexibi-lidade e a lubrificação corporal (10). Segundo Méle-ga (11) com o traumatismo térmico, ocorre exposi-ção de colágeno e consequente ativaexposi-ção e liberaexposi-ção de histamina pelos mastócitos. A histamina desen-cadeia aumento da permeabilidade capilar, que permite a passagem do infiltrado plasmático para o interstício dos tecidos ativados, causando edema te-cidual e hipovolemia. Simultaneamente há ativação do sistema calicreina, responsável pela produção de cininas, as quais auxiliam no aumento da permeabi-lidade capilar agravando o edema e a hipovolemia.

Esse mecanismo, juntamente com o colágeno, ativa o sistema fosfolipase ácido aracdônico, ori-ginando assim prostaglandinas (PGE2), o que po-tencializa a vasodilatação e ocasiona dor. Também

ocorre a ativação da via tromboxane, que juntamen-te com a plasmina e as trombinas circulanjuntamen-tes provo-cam um tampão nas paredes dos capilares e causam o aumento na pressão hidrostática, contribuindo para o edema tecidual.

Há uma zona de transição que separa o tecido desvitalizado do tecido íntegro. A área em con-tato direto com o calor apresenta as proteínas ce-lulares coaguladas, enquanto a zona de transição caracteriza-se pelo fluxo sanguíneo reduzido, for-mação de sedimento intravascular e dano tecidual potencialmente reversível. Sendo assim é possível ocorrer isquemia dérmica causada pela liberação de substâncias vasoativas, tais como tromboxano A2, histamina, leucotrienos, prostaglandinas e radicais livres de oxigênio (10).

A zona de transição é cercada por uma área de hiperemia onde ocorre dano mínimo e a cicatriza-ção é completa. As escaras são resíduos dos ele-mentos cutâneos coagulados pelo calor. Compõe-se quase totalmente de fibras colágenas desnaturadas e rijas. A crosta superficial é uma cobertura proteto-ra, composta por células mortas e uma fina camada de fibrina instável (11).

Alterações Sistêmicas - Sistema Cardiovascular

Grandes queimaduras são marcadas pelo estres-se da bomba cardíaca, ocasionado pelo aumento das catecolaminas. Caracteriza-se por taquicardia acentuada, aumento no consumo de oxigênio pelo miocárdio e aumento do débito cardíaco. Tais alte-rações continuam sendo um dos principais deter-minantes de sobrevivência, impossibilitando preci-sar o tempo de atuação do estresse cardíaco após a lesão (12).

Nos pacientes vítimas de queimaduras graves, em geral de segundo e terceiro grau, há perdas plas-máticas consideráveis, resultante da saída imediata de líquidos através da evaporação. Em geral, essa situação é agravada pela baixa ingestão de água das vítimas. Dessa forma a demora na reposição volê-mica expõe o paciente ao alto risco de desenvolver choque hipovolêmico por hemoconcentração (3).

- Sistema Renal

A incidência de insuficiência renal aguda no pa-ciente queimado varia de 0 a 38% com índices de mortalidade de 73 a 100 % em humanos (13). Com

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a redução da volemia decorrente da gravidade das queimaduras, ocorre a diminuição da perfusão ca-pilar, com consequente redução no débito urinário. Dessa forma, com o intuito de poupar líquido, o organismo passa a liberar quantidades maiores de hormônio antidiurético (ADH) e ativa o sistema renina–angiotensina–aldosterona, ocorrendo reten-ção de água e sódio para auxiliar a expansão da vo-lemia. No entanto, para que o resultado seja eficaz, o sistema renina-angiotensina-aldosterona também promove vasoconstrição periférica, reduzindo a quantidade de sangue que chega aos rins. Em de-terminadas situações, o quadro pode evoluir para insuficiência renal aguda, manifestada por oligúria ou anúria (14).

- Sistema gastrointestinal

A perda acentuada de líquido no paciente gravemente queimado poderá evoluir para choque hipovolêmico. O intestino delgado sofre hipóxia isquêmica pela estimulação adrenérgica, que dimi-nui a produção de muco, ativa os leucócitos, induz necrose epitelial e desintegração da lâmina própria com ulceração e hemorragia. Aumenta a permeabi-lidade capilar, ocorrendo edema intersticial e diar-reia. Agrava-se com a perda de proteínas do plasma e produção e liberação de xantina oxidase na cir-culação. A estase na circulação intestinal permite proliferação das bactérias na luz do órgão, as quais translocam-se e atingem a circulação juntamente com os catabólitos absorvidos na mucosa, determi-nando endotoxemia e sepse (15).

As endotoxinas ou bactérias do lúmen intestinal são absorvidas através das áreas ulceradas na mu-cosa para a circulação portal e removidas pelo sis-tema histiolinfoplasmocitário quando funcionante. No entanto, no choque, o fígado que é o principal órgão de detoxificação, sofre acentuada depressão funcional causada pela intensa isquemia. Esta perda da capacidade detoxificadora permite que as bacté-rias efetuem livremente sua ação deletéria (15).

As queimaduras podem provocar desarranjos nos sinusóides hepáticos e a vacuolização dos hepa-tócitos (esteatose). Em humanos, laboratorialmente, se evidencia discreto aumento das transaminases (TGO e TGP), da fosfatase alcalina e das bilirrubi-nas, predominando a bilirrubina direta (10).

- Sistema Respiratório

Além dos danos causados pelas lesões térmicas

que causam traqueobronquites químicas, edema e pneumonia, outro fator que resulta em agravamen-to respiratório é a inagravamen-toxicação por monóxido de car-bono, a qual geralmente ocorre em ambientes fecha-dos. Os sinais clínicos começam a aparecer quando o CO2 encontra-se em níveis séricos superiores a 20%. Nesse caso, os intoxicados apresentam náuse-as, confusão mental, coma e até mesmo morte, con-siderando os níveis séricos acima de 60% (16).

O dano pulmonar provocado pela queimadura ocorre devido ao traumatismo direto, ao processo inflamatório desencadeado, aumento do líquido ex-travascular pulmonar e pela inalação do ar supera-quecido o que contribui significativamente para o aumento da mortalidade. As queimaduras nas vias aéreas superiores são consideradas críticas nas pri-meiras 4 a 48 horas. Esse é o período com maiores índices de ocorrência do edema da epiglote e estru-turas laríngeas (13).

- Sistema Imunológico

Pacientes queimados podem apresentar grandes prejuízos na resposta imunológica, havendo margi-nalização de leucócitos polimorfonucleares para a fagocitose. Resultam em dano no sistema retículo--endotelial nos níveis das imunoglobulinas IgG e IgA. Pode-se verificar também diminuição do nú-mero de linfócitos, redução da resposta de hiper-sensibilidade cutânea retardada e aumento da su-pressão pela prostaglandina E2 (17).

- Sistema Metabólico e Endócrino

As anormalidades metabólicas ocorridas em pacientes queimados, são consequências da libera-ção de mediadores inflamatórios juntamente com a resposta ao estresse. As principais anormalidades metabólicas que ocorrem são: aumento de cortisol, das catecolaminas, diminuição de hormônios ana-bólicos (GH e testosterona), aumento da taxa do metabolismo basal, aumento da temperatura cor-poral, aumento da demanda de glicose e de neogli-cogênese hepática, aumentando assim a secreção de insulina. Dessa forma há um considerável aumento no requerimento calórico (18).

Suscetibilidade a infecções

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susceptível a proliferação de microrganismos, se-jam endógenos, da flora normal do paciente, ou exógenos, proveniente do ambiente (19). O predo-mínio na primeira semana de internação de hu-manos queimados é de bactérias gram negativas (55,7%) tais como Escherichia coli, Kleibsiella e Pseudomonas, em relação as gram-positivas (Strep-tococcus spp, Corynebacterium spp, Clostridium spp, Staphyloccus spp) que aparecem em menor porcentagem (40,3%). Essa diferença aumenta na segunda semana, tornando-se 72,7% bactérias gram negativas enquanto 22,7% gram positivas (19).

Tratamento

O tratamento das queimaduras tem por objetivo garantir maior velocidade de restauração tecidual, redução da dor e da infecção, resultando aspecto estético aceitável após a recuperação (20). Diferen-tes causas determinam diferenDiferen-tes graus de lesões e o tipo de conduta para cada caso depende da su-perfície corpórea atingida, profundidade da lesão e local da queimadura (21). Um fato importante antes de iniciar o tratamento de queimaduras é verificar eventuais lesões concomitantes e inalação de fuma-ça na busca de alterações que resultem em maiores prejuízos do que os visíveis. Outro fator é a presen-ça de queimaduras na face e faringe, consideradas queimaduras graves, pois potencialmente, podem afetar a permeabilidade do trato respiratório (3).

Os primeiros socorros a serem prestados consis-tem no resfriamento da área atingida com água cor-rente, promovendo a limpeza de qualquer agente nocivo, aliviando a dor e interrompendo a progres-são do calor. Destaca-se que quando a queimadura é extensa requer o cuidado com a hipotermia, sendo contraindicado o resfriamento de queimados com mais de 15% da superfície da pele atingida (3).

A remoção da necrose e de corpos estranhos do leito da ferida é um dos primeiros e mais impor-tantes componentes a serem considerados no trata-mento tópico da ferida (22). Fatores como a presen-ça de corpos estranhos, infecção e edema interferem no processo de cicatrização das feridas e por isso, a tricotomia permite a visualização da área acome-tida e a aferição da viabilidade da pele, reduzindo o risco de contaminação. Outro ponto importante é evitar a auto-mutilação, aplicando-se o colar prote-tor ou colar cervical apropriado (17).

A limpeza da ferida deve ser realizada com solu-ção salina estéril, minimizando o traumatismo

me-cânico e químico. As soluções podem ser levemente aquecidas para evitar a hipotermia da região afeta-da e para estimular a mitose durante a granulação e epitelização, que ocorre à 37°C. A solução sugerida é a solução fisiológica, utilizando-se agulha calibre 12, seringa de 20 mL ou frasco de soro perfurado (23). Os autores desse trabalho recomendam que os curativos de pacientes queimados hospitalizados se-jam efetuados com o uso de material esterilizado e lu-vas cirúrgicas, reduzindo os riscos de contaminação da ferida com bactérias saprófitas da pele humana.

Algumas soluções utilizadas na antissepsia tem o papel fundamental de prevenir a colonização bac-teriana, porém muitas vezes podem ser utilizadas diluídas, sem ação tóxica às feridas. O hipoclorito de sódio, quando diluído à 1:1000, não apresenta to-xidade para os fibroblastos e possui atividade bac-tericida importante. Quando muito concentradas, soluções antissépticas podem apresentar efeito no-civo sobre a ferida, o que retarda a cicatrização, não consistindo mecanismo eficiente para a redução da contagem bacteriana (22).

O tratamento de queimaduras de primeiro grau é descrito como ambulatorial, consistindo-se basi-camente no controle da dor e cuidados locais, uti-lizando analgésicos via oral, compressas de água fria para aliviar a dor e proteção da luz solar a fim de evitar discromias residuais (3). Queimaduras su-perficiais devem ser tratadas com agentes tópicos, produtos naturais, clorexidine, sulfatiazina de pra-ta e antimicrobiano tópico (21). Indica-se pra-também o uso de corticoide tópico em loção ou creme para reduzir a inflamação (3).

O tratamento habitual de queimaduras de se-gundo grau superficial ou profunda é a utiliza-ção de curativo associado ou não a sulfatiazina de prata a 1% (20,24). A sulfatiazina tem a finalidade de desbridar tecidos necrosados e combater a in-fecção local. Esse agente tópico deve ser trocado duas vezes ao dia devido a oxidação da prata (25). Segundo Ferreira et. al (25) a sulfatiazina é efetiva contra uma ampla microbiota de gram-negativas como Escherichia coli, Enterobacter, Klebsiella sp e Pseudomonas aeruginosa, bactérias gram-positivas como Staphylococus aureus e também Candida al-bicans. Porém seu uso em queimaduras de segundo e terceiro grau abaixo de 15% de superfície corporal atingida deve ser evitada, pois poderá prejudicar a avaliação da área queimada a qual poderá progre-dir nas primeiras 48 horas (3).

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hidroalgi-dolorosos e de mais fácil manuseio melhoram a adesão ao tratamento (20). Quando nos membros, a imobilização do membro deve ser feita em posi-ção anatômica evitando a retraposi-ção tecidual, porém isso não impede sequelas funcionais ou motoras (21). Os curativos são necessários para manter o ambiente propício para a reparação tissular, man-tendo a umidade da ferida e favorecendo a remoção do exsudato e a troca gasosa, além de promover o isolamento térmico e propiciar proteção contra in-fecção. Curativos úmidos promovem a prevenção da desidratação do tecido e morte celular. Aceleram a angiogênese e o desbridamento autolítico, pois retém enzimas e água. Essas, auxiliam na fibrinó-lise e mantém as células viáveis liberando fatores de crescimento para proliferação (22). Os curativos úmidos podem ser compostos por gaze esterilizada adicionando-se vaselina ou hidrogel com alginato. Recomenda-se o recobrimento com atadura e espa-radrapo sem pressão (3).

Queimaduras graves de segundo e terceiro grau, atingindo mais de 15% da superfície total da pele, devem ser tratadas sistemicamente com medicação analgésica endovenosa e a assistência deve ser pre-ferencialmente em ambiente hospitalar, com con-trole da função respiratória, hemodinâmica, dor, suporte nutricional e controle de infecção. O prin-cipal objetivo em manter o paciente na unidade de tratamento intensivo (UTI) é limitar a progressão sistêmica das alterações, impedindo o aparecimen-to de insuficiência respiratória, cardíaca, renal e ce-rebral (3).

Queimaduras de terceiro grau precisam ser tratadas com excisão e enxertia precoce, para que haja melhor resultado estético, evitando o desen-volvimento de retrações cicatriciais (24). Ademais, requer desbridamento e em algumas situações, re-talhos locais ou a distância, recobrindo, sobretudo, tendões, cartilagem e ossos (21).

Em queimaduras químicas deve-se lavar a re-gião acometida com água corrente em abundância. Quando o agente causador for um ácido, recomen-da-se a utilização de substância básica, pois resul-tará em reação de neutralização. Cabe salientar que tais reações são exodérmicas e podem intensificar a queimadura e agravar a lesão. Nesse sentido, reco-menda-se o uso cauteloso de substâncias adicionais em queimaduras químicas, evitando maior dano tecidual (4).

Antibióticos sistêmicos não penetram nas escar-ras de pacientes queimados, isso porque a grande nato associado à prata, combinando a absorção do

alginato de cálcio e da carboximetilcelulose com o amplo expectro microbicida da ação dos íons de prata, o que evita o acúmulo de exsudado e previne a infecção secundaria (20).

Dentre os produtos naturais, às substancias con-tendo açúcar vem sendo utilizadas com excelentes resultados clínicos, pois propiciam rápida diminui-ção da congestão passiva e edema local, estimula a epitelização e granulação tissular e possuem ação antibacteriana (25). O açúcar granulado possui grande osmolalidade, auxiliando na cicatrização, por reduzir o edema e atrair macrófagos. Também acelera a formação da crosta necrótica, fornece ener-gia às células e promove a formação de tecido de granulação saudável (17). No entanto, a fricção dos grânulos do açúcar poderá causar dor em determi-nados pacientes. Nessa situação, pode-se optar pela utilização do açúcar manipulado em forma de gel, tal como descrevem Serafini et al. (26), comprova-do ser tão efetivo na cicatrização quanto o açúcar granulado, além de facilitar o manejo nas trocas de curativo. Nesse mesmo sentido é descrito o uso do mel em feridas por queimaduras. O mel inibe o crescimento de cepas gram-negativas e gram-po-sitivas pelo seu baixo pH. Promove uma barreira viscosa que impede a invasão de microrganismos oportunistas e a perda de fluido das lesões. Possui enzimas como a catalase, que auxilia na cicatrização e promove o efeito osmótico, que inibe o crescimen-to microbiano (25).

A planta calêndula officinalis, conhecida popu-larmente como calêndula ou margarida, aumenta a epitelização de feridas e possui propriedades anti--inflamatórias, podendo ser utilizada para estimular a cicatrização de queimados (17). A planta conheci-da popularmente como Babosa, ou Aloe vera, é usa-da como medicamento há vários anos. Tem origem africana e pertence à família das liláceas, existindo mais de 300 espécies (27). Duas frações podem ser obtidas das folhas da babosa: um exudato amargo extraído das células do periciclo, rico em compostos antracênicos, e um gel mucilaginoso incolor, utili-zado em queimaduras, na cicatrização de ferida, no alívio de dores e como poderoso agente hidratante (28). Ademais, a babosa tem ação anti-inflamatória e antimicrobiana, inibindo o transporte de líquidos para a membrana da célula invadida pelas bactérias (27).

A escolha do curativo deve ser feita de modo a facilitar a aceitação do tratamento, pois os menos

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quantidade de tecido morto proporciona meio de cultura para o crescimento bacteriano. Adicionado à isso, oclui o suprimento sanguíneo local e prejudi-ca a ação dos meprejudi-canismos de defesa humoral limi-tando o uso de antibióticos a aplicação tópica (29). A terapia nutricional deve ser ponderada como um componente importante no tratamento de pacientes críticos, pois ajuda a prevenir a translocação bacte-riana, mantém o peristaltismo intestinal e, indireta-mente, previne as úlceras de decúbito. Como resul-tado, viabiliza o processo de cicatrização, recupera ou mantém o estado nutricional e combate a forma-ção de radicais livres (18).

Prognóstico

O prognóstico e a gravidade de uma queimadu-ra estão diretamente relacionados com a extensão corporal acometida. O mesmo torna-se desfavorá-vel quando a área atingida é superior a 50% (30). Queimaduras que afetem entre 12 a 15% ou mais da superfície corporal exigem internação hospitalar e consequente tratamento das alterações sistêmicas, pois a partir dessa porcentagem já podem ocorrer perdas significativas de líquido no momento da queimadura (por evaporação) (31). Nesse sentido, ressalta-se aqui a importância da prevenção às quei-maduras, atentando-se para medidas que evitem os episódios de lesões.

Na veterinária, alerta-se para o cuidado minu-cioso ao uso do colchão térmico em procedimentos cirúrgicos, que, após horas de contato, mesmo que em temperaturas aceitáveis, poderão resultar em le-sões tardias na pele. Com o mesmo fim, atenta-se para o aquecimento do paciente hipotérmico com secadores de cabelo ou aquecedores elétricos, os quais poderão acarretar queimaduras quando mui-to próximos do animal. Por fim, sugere-se cuidado com o uso de agentes químicos de limpeza (4), que por vezes, são cáusticos quando em contato com a pele do animal.

Conclusões

Como resultado do processo de queimadu-ra tem-se a perda das funções normais da pele, pro-vocando assim outras alterações fisiológicas, que incluem a perda da barreira protetora contra infec-ções e perda de líquidos orgânicos. A gravidade das alterações depende da extensão corporal afetada e

o tempo de exposição. Em posse dos mecanismos fisiopatológicos nos diferentes sistemas orgânicos, torna-se possível prever a extensão da lesão e es-tabelecer o correto tratamento, proporcionando ao paciente maior conforto durante o período de con-valescência e suporte para sua recuperação.

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Recebido para publicação em: 10/06/2011. Enviado para análise em: 13/06/2011. Aceito para publicação em: 15/06/2011.

Referências

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