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Terreiro digital: uma análise da I Mostra Virtual Mestres da Tradição em Juazeiro do Norte, Ceará, Brasil

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Terreiro digital: uma análise da I Mostra Virtual Mestres da Tradição em Juazeiro do Norte, Ceará, Brasil

ALMEIDA, Regivania Rodrigues de Universidade Federal do Cariri (UFCA) regivania.rodrigues@aluno.ufca.edu.br RIBEIRO, Hévila Rayara Cruz Centro Universitário Paraíso (UNIFAP) hevilaribeiro.arq@aluno.fapce.edu.br SANTANA, Bibiana Belisário Universidade Federal do Cariri (UFCA)

bibianabelisario@gmail.com

Introdução

A cultura de um povo é composta por todas as ações pelas quais esses povos se expressam, englobando tanto a linguagem com que os indivíduos se comunicam, contam suas histórias e produzem seus poemas, quanto a forma como se organizam, preparam seus alimentos, constroem suas crenças, visões de mundo, saberes e fazeres (IPHAN, 2007).

No convívio cotidiano, os grupos sociais produzem bens culturais com significados e valores agregados e que ao longo do tempo formam o seu patrimônio cultural. Como coloca Prats (1997, p.19), o patrimônio trata-se de um processo simbólico de legitimação social e cultural, que confere a um grupo um sentimento coletivo de identidade.

Para Choay (2001), avançou-se do discurso patrimonial associado às grandes construções e monumentos artísticos do passado, para um pensamento referente às identidades coletivas de um povo, de forma a considerar o patrimônio como o conjunto de bens culturais. Numa perspectiva antropológica, buscou-se a partir de então, realizar estudos a partir da existência dos homens, de modo a contemplar os atores sociais e seus ambientes, nos quais se expressa a atividade humana, passando-se a valorizar as línguas, as crenças, os valores, as relações sociais, os ritos e os comportamentos, percebidos como referências culturais que necessitavam de instrumentos para salvaguarda (CHOAY, 2001).

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Juazeiro do Norte é um grande mosaico de fazeres, saberes e expressões culturais, constituídos a partir da chegada de levas de romeiros à cidade, vindos de várias partes do Nordeste brasileiro, movidos pelos acontecimentos do milagre da hóstia1,

envolvendo o Padre Cícero e a beata Maria de Araújo. É uma cidade cuja formação histórica se tornou alicerce para que essas manifestações ganhassem força ao longo do tempo e se constituíssem como patrimônio cultural.

É nesse contexto, que se insere o Mapeamento do Patrimônio Cultural Imaterial de Juazeiro do Norte, uma iniciativa da Secretaria Municipal de Cultura de Juazeiro do Norte (SECULT), em parceria com o Observatório Cariri de Políticas e Práticas Culturais da Universidade Federal do Cariri (UFCA), com o objetivo de documentar os bens culturais de natureza imaterial, através do registro dos brincantes, mestras, mestres e grupos tradicionais populares, tendo como propósito, a produção de conteúdos em diversos formatos (textos, fotografias e vídeos), e cujos resultados, possam colaborar para a criação de políticas públicas e planos de salvaguarda, destinados à preservação e valorização do patrimônio cultural, bem como fortalecer nos grupos sociais, o sentimento de pertencimento, no processo de reconhecimento de suas identidades culturais.

Segundo o IPHAN (2012, p. 20), para que se possa preservar um bem cultural, é importante saber não apenas que ele existe, mas também se a manifestação cultural é praticada pela população local, se as pessoas têm dificuldade ou não em realizá-la, que tipos de problema a afetam, como essa tradição vem sendo transmitida de uma geração para outra, que transformações têm ocorrido, quem são as pessoas que hoje atuam diretamente na manutenção dessa tradição, entre vários outros aspectos relativos à existência daquele bem cultural.

Este artigo objetiva propor algumas reflexões acerca da I Mostra Virtual Mestres da Tradição como ação de educação patrimonial em Juazeiro do Norte, no estado do Ceará. A mostra difundiu conteúdos acerca dos mestres e mestras de reisados, guerreiros

1 Em 1o. de março de 1889 na capela de Nossa Senhora das Dores no povoado de Joaseiro, ao receber a

hóstia das mãos do Padre Cícero, a beata Maria de Araújo sente a partícula transformar-se em sangue em sua boca. O fato ficou conhecido como o milagre de Joaseiro. Propagado por terceiros e bastante divulgado na imprensa nacional pelo jornalista José Marrocos, grande quantidade de pessoas se deslocou à localidade em busca do amparo do padre santo e de viver na terra onde Jesus teria derramado seu precioso sangue (CAVA, 2014).

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e bacamarteiros, cuja programação aconteceu como um desdobramento do projeto Mapeamento do Patrimônio Cultural Imaterial de Juazeiro do Norte.

A Mostra, assim como o projeto de Mapeamento, foi uma uma iniciativa da SECULT, em parceria com o Observatório Cariri de Políticas e Práticas Culturais, vinculado à UFCA e foi realizada em ambiente virtual, no ano de 2020, diante da situação de emergência em saúde pública, decorrente da pandemia da Covid-19, com a proposta de criar espaços de visibilidade para as mestras, mestres e grupos da cultura tradicional popular se comunicarem, intercambiarem seus saberes e se apresentarem, fazendo das plataformas e canais virtuais, um grande terreiro para as expressões do patrimônio cultural imaterial da cidade de Juazeiro do Norte, no estado do Ceará.

A problemática se estrutura em torno das questões: os agentes da cultura tradicional popular e a utilização das mídias digitais. Nesse contexto, como a educação patrimonial pode ser utilizada?

Metodologia

Esta análise, por tratar especificamente de uma edição única da mostra virtual, pode ser enquadrada enquanto estudo de caso, ou seja, um tipo de pesquisa concentrada em um acontecimento particular, que pode ser considerado representativo para um conjunto de casos análogos posteriores (SEVERINO, 2013). O processo de levantamento e coleta é executado com o rigor necessário para a fundamentação da possível generalização de situações, bem como pode ser enquadrada em realidades semelhantes. Neste contexto, pode ser apresentado como ambientes análogos os programas e projetos que atuem junto ao patrimônio cultural imaterial e suas expressões, utilizando-se de ferramentas midiáticas e sociais para o fim da educação patrimonial.

Godoy (1995) afirma que o estudo de caso é a estratégia preferida dos pesquisadores quando procuram responder às questões "como" e "por quê" certos eventos ocorrem, principalmente quando são atuais, que é o caso analisado neste artigo. Para a coleta das informações aqui discutidas, utilizou-se das abordagens quantitativa e qualitativa. O uso de métodos mistos possibilitam um caminho para a elaboração de

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resultados combinando suas técnicas, objetivando a produção de inferências mais próximas da realidade (SEVERINO, 2013).

A pesquisa dividiu-se em duas etapas: na primeira, utilizamos como técnicas fundamentais o levantamento de dados e a observação, a partir da participação na programação da mostra e interação com os integrantes e público em geral. Na segunda, reunimos conceitos na revisão bibliográfica com enfoque exploratório e descritivo, estando abertas às descobertas que poderiam surgir a partir dos esquemas teóricos.

Dessa forma, inicialmente listamos a quantidade de dias, quadros programados e enumeramos os protagonistas, entre mestres, mestras e artistas visuais, a fim de compreender as formas de transmissão e sua eficiência como atividade de educação patrimonial. Analisamos os meios e veículos utilizados para a realização e divulgação, considerando os públicos envolvidos, assim como a facilidade dos participantes para uso das redes sociais por meio do conferido nas transmissões ao vivo.

Um fenômeno pode ser melhor compreendido no contexto que ocorre e do qual é parte, por isso, devemos sempre analisar dentro de uma perspectiva integrada (GODOY, 1995). A partir do olhar voltado com maior sensibilidade ao todo, compreendendo os déficits sociais e econômicos, assim como a não efetivação de políticas públicas de inclusão digital no conjunto analisado, demos início ao levantamento de atores das áreas do conhecimento de história, educação, comunicação e ciências sociais para a combinação aos dados e informações.

I Mostra Virtual Mestres da Tradição

Realizada entre os dias 20 e 30 de julho de 2020, a I Mostra Virtual Mestres da Tradição foi uma programação concebida e realizada pela SECULT de Juazeiro do Norte, que aconteceu através da plataforma Instagram, no perfil oficial da Secretaria. O evento teve como apresentação a Exposição “Etéreos”, com o objetivo de criar um grande encontro de culturas e tempos entre homens e mulheres que trazem a marca ancestral da cultura do Nordeste, do Cariri, de Juazeiro do Norte.

A Mostra foi organizada de forma a trazer diferentes conteúdos em horários fixos durante o período de realização, para tal, foi proposto a publicação de ilustrações,

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colagens, vídeos e lives integradas ao Edital Cultura em Casa, promovido pela então gestão municipal (2016-2020), o qual teve como finalidade disponibilizar produções culturais e artísticas pela internet, viabilizando trabalho e renda para artistas e grupos culturais durante o período da pandemia.

Os grupos participantes da Mostra foram os vinte e um (21) mestres e mestras de tradição popular identificados através do Mapeamento do Patrimônio Cultural Imaterial de Juazeiro do Norte. De forma a apresentar suas histórias de vida e participação nas brincadeiras, utilizou-se de artes digitais para a transmissão dessas informações e conhecimentos, as quais foram produzidas por treze (13) jovens artistas cearenses, confluindo assim a tradição e o contemporâneo. No processo criativo, os artistas visuais adentraram no universo dos mestres e mestras, através de materiais como fotografias, biografias etc, em busca de referenciais para a construção estética de cada obra.

As postagens publicadas seguiam o seguinte padrão: (1) arte digital representando o mestre ou mestra, (2) foto do homenageado(a), juntamente com uma minibiografia, (3) informações sobre o artista convidado, (4) ficha técnica da mostra. A Figura 01 a seguir apresenta um dos modelos publicados.

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Figura 01 - Post em referência a Mestra Margarida. Fonte: Acervo I Mostra Virtual Mestres da Tradição, 2020.

Utilizando-se também do formato audiovisual, foi apresentado o quadro "Cantos e Peç as Populares", destinado à publicação de vídeos curtos dos mestres e mestras homenageados entoando peç as e cantos populares, produzidos através das gravações realizadas pelo projeto de mapeamento. Esse mecanismo também apresenta-se como uma ferramenta de fácil propagação e ensino de cantos para o público geral, visto que comumente concentra-se entre os brincantes e os aprendizes.

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Figura 02 - Captura de vídeo do Cantos e Peças Populares com o Mestre Luiz. Fonte: Acervo I Mostra Virtual Mestres da Tradição, 2020.

No período noturno, foram realizadas as lives com os oito (08) mestres contemplados pelo edital Cultura em Casa. Estas eram mediadas por um dos membros da comissão organizadora do evento e abordaram temáticas como a tradição do jogo de espadas, as brincadeiras nas renovações do Sagrado Coração de Jesus2 e quilombos3 tirados nas ruas de Juazeiro do Norte. Esta ferramenta apresentou-se como um importante elo de ligação entre os homenageados e o público geral que acompanhava o evento, pois através dela o próprio mestre podia relatar sua memória. O material produzido e disponibilizado virtualmente, mostrou-se além de uma grande apresentação cultural, uma importante fonte para a documentação da tradição popular local. A Figura 03 a seguir, apresenta os folders utilizados para a divulgação das lives temáticas.

2 Prática tradicional da religiosidade popular em Juazeiro do Norte, incentivada pelo Padre Cícero Romão

Batista, que consiste na entronização do Coração de Jesus nas residências. (SILVA, 2014)

3 Cortejo onde grupos tradicionais circulam pela cidade ao ritmo de zabumba e de pífano visitando

residências, pequenos comércios e igrejas, vestindo saiotes, meiões, peitorais enfeitados com espelhos e portando espadas e coroas. Em situações de encontro entre os grupos, acontece uma complexa

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Figura 03 - Banner de divulgação das lives com os mestres e mestras. Fonte: Acervo I Mostra Virtual Mestres da Tradição, 2020.

Por fim, com todo o material produzido pode-se construir um acervo, tanto em formato de texto, como imagens e vídeos, disponibilizados abertamente durante a programação, possibilitando também a consulta e o acesso posterior. Além disso, identificou-se que a Mostra permitiu não só o intercâmbio entre os Mestres e Mestras mas também com o público além dos limites do município de Juazeiro do Norte, pois devido a facilidade de acesso e compartilhamento de informações na rede social utilizada, notou-se a participação de pessoas de diferentes localidades que comentavam com saudosismo sobre a cultura de Juazeiro e suas visitas a terra do “Padim”.

O uso de mídias e a educação patrimonial

O mundo cada vez mais nos obriga a ideia da hiperconexão e a nova lógica opera no sentido de que você precisa ser visto para existir. Mediante o cenário pandêmico da Covid-19, processos que vinham sendo realizados de maneira especulativa ou com pouca precisão, foram acelerados, ligando todos os setores da vida humana à informação digital. Os artistas e trabalhadores da cultura tiveram seus trabalhos completamente modificados

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e foram levados a se inserir nas mídias sociais como espaço de expressão e trabalho. Especificamente aos integrantes das expressões da cultura de tradição popular, esse processo teve que se dar por sobre diversos déficits.

Para Prensky (2002), existem os denominados nativos digitais, crianças nascidas a partir da década de 1980 que apresentam familiaridade natural ao universo tecnológico e virtual, por terem tido durante o seu desenvolvimento a presença desses mecanismos. É fato que os contextos sociais, educacionais e econômicos interferem diretamente na consolidação deste termo de maneira mais abrangente. De acordo com o Mapeamento do Patrimônio Cultural Imaterial de Juazeiro do Norte (2020), são 222 de 337 brincantes mapeados, entre mestres, mestras e figurais, que nasceram após a década de 1980, contudo, a maioria cresceu e vive até hoje em bairros periféricos, não possuindo condições de renda e escolaridade que possibilitem o acesso à internet de forma segura e de qualidade.

Trazendo ao contexto específico da Mostra Virtual aqui analisada, a facilitação para o uso do Instagram por meio dos grupos de tradição popular em Juazeiro do Norte, tornou-se algo desafiador. Vale destacar a ausência de articulações e políticas públicas locais efetivas, de inclusão e de educação midiática destes, que para Kellner e Share (2008), vai além do uso da mídia, rede ou plataforma com propriedade, mas também do lido com a informação que cada um destes emitem. Além disso, a maioria dos participantes da realização eram idosos, que estavam sendo acompanhados por seus filhos ou netos que também são brincantes.

Na contramão disso, realizou-se através da equipe de produção o trabalho de elaboração de tutoriais para instrução aos participantes e o acompanhamento constante a cada mestre e mestra, estando sempre em contato com os responsáveis pelas redes sociais nos grupos de tradição, compartilhando o material da programação e os conteúdos publicados durante a realização.

A Mostra possibilitou a criação de diálogos entre gerações através das lives e promovendo a integração de públicos diversos como: integrantes da cultura popular, gestores públicos, trabalhadores da cultura, artistas e acadêmicos. Freire (1970), aborda que deve-se buscar a construção coletiva do conhecimento, identificando a comunidade

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como produtora de saberes que reconhece suas referências culturais e os significados associados à memória social do local.

Para Horta, Grunberg e Monteiro (1999) a educação patrimonial é um processo permanente e sistemático de trabalho educacional centrado no patrimônio cultural como fonte primária de conhecimento e enriquecimento individual e coletivo, possibilitando ainda, que o indivíduo possa fazer a leitura do mundo que o rodeia, promovendo a compreensão do universo sociocultural e da trajetória histórico-temporal em que está inserido. Não sendo nesta última conclusão, diferente da educação midiática, onde centra no processo de consciência do meio e se constitui como um conjunto de habilidades para o acesso, criação e análise para participação de maneira crítica do ambiente midiático e informacional em todos os seus formatos (EDUCAMÍDIA, 2020).

A participação da comunidade na estruturação, implementação e execução das atividades na educação patrimonial torna-se imprescindível, sendo um importante dispositivo no processo de reconhecimento e apropriação dos bens culturais, bem como nos aspectos de valorização, preservação e promoção do patrimônio cultural. Conforme Duarte Cândido (2007), o processo de instrumentalização para a leitura de mundo não deve partir apenas dos referenciais do que o educador considera cultura ou patrimônio, porque nesse contexto, deve prevalecer a ideia do que o grupo estabelece como referência para si, aquilo com o que se identifica. A educação patrimonial precisa se embasar em trocas e na construção coletiva do conhecimento. Ao favorecer a comunicação entre públicos para construção da dinâmica da programação, a Mostra constituiu-se como um importante canal de difusão dos saberes locais.

No patrimônio cultural imaterial, temos como provocação a criação e a manutenção de instrumentos que possam garantir sua salvaguarda e registro, assim como a definição de meios que possibilitem o acesso de públicos aos saberes, conhecimentos e práticas. As plataformas digitais e redes sociais vêm se aprimorando de modo a se tornarem ambientes propícios para a disponibilização de dados, assim como difundir conhecimentos, se popularizando quando ligados diretamente aos canais de maior alcance, como o Instagram.

A exemplo, mais uma vez apresentamos o projeto de Mapeamento do Patrimônio Cultural Imaterial, que tem como objetivo a criação de uma plataforma digital, vinculada

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ao site da prefeitura municipal, para apresentação das informações coletadas e produções realizadas, por meio de textos, gráficos, fotografias, mapas interativos e produtos audiovisuais, estando ligado diretamente a um perfil na rede social Instagram, o @mapcultjdo, que vem sendo alimentado desde a concepção do projeto. Essa conexão de duas mídias para a efetivação do projeto, acontece pelo fato uma delas ser o local de exposição e a outra a de interação com uma maior diversidade de público, que pode inclusive estabelecer uma ponte até a plataforma.

Na Mostra Virtual o Instagram funcionou como suporte para a educação patrimonial, servindo de meio para fomentar e promover o patrimônio cultural e de espaço para intercâmbios e formações, considerando a dinâmica das atividades propostas e o material produzido, assim como documentou e disponibilizou de imediato as histórias, memórias e trajetórias dos mestres e mestras. Dentro do contexto da educação patrimonial, o IPHAN (2014, p. 21) afirma:

Qualquer que seja a ação implementada ou o projeto proposto, sua execução supõe o empenho em identificar e fortalecer os vínculos das comunidades com o seu Patrimônio Cultural, incentivando a participação social em todas as etapas da preservação dos bens. Nesse processo, cabe aos poderes públicos exercer o papel de mediador da sociedade civil, contribuindo para a criação de canais de interlocução que se valem, em especial, de mecanismos de escuta e observação. (IPHAN, 2014, p. 21)

Sendo assim, concluímos que o uso das mídias digitais e a educação patrimonial na Mostra Virtual, se encontraram na integração de metodologias que favoreceram diretamente a salvaguarda do patrimônio cultural a partir da produção do conhecimento dialógico, no qual a comunidade se apropria de suas referências culturais, participa efetivamente da ação e reconhece seus valores, gerando pertencimento (FERNANDES, 2009).

Conclusão

A realização de uma programação virtual mostra-se também como uma alternativa para ações educativas de preservação e valorização do Patrimônio Cultural, visto que pode ocorrer mesmo durante o período pandêmico, ampliando assim o leque de metodologias que podem ser empregadas nesse processo. Portanto, mesmo com o

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estabelecimento do vínculo entre as políticas públicas de patrimônio e cultura que favorecem o intercâmbio de ferramentas educativas para enriquecer o processo pedagógico da educação patrimonial, é possível uma otimização de abordagens, de forma a compreender a realidade como um lugar de múltiplas dimensões da vida (IPHAN, 2014, p. 25)

Dialogando diretamente com a arte e a comunicação para a transmissão de conhecimentos, a Mostra confluiu a tradição e o contemporâneo, através de exposições virtuais de colagens e ilustrações de artistas visuais cearenses, apresentação de cantos e peças populares em vídeos, e apresentações ao vivo, em formato de lives, a partir da temática das brincadeiras populares na plataforma digital Instagram. A repercussão se deu em nível nacional, contudo, percebeu-se que os maiores impactos foram nas comunidades onde residem os brincantes e na dimensão interna dos grupos de tradição, onde estes e seus agentes, passaram a ter maior interesse em se apropriar das redes sociais para transmissão de seus saberes e de suas tradições.

A Mostra contribuiu não somente para a utilização das mídias digitais por parte dos grupos tradicionais. Ao ocupar os espaços virtuais para apresentação de suas expressões e ganhar evidência e visibilidade, esses agentes afirmam seus valores e suas identidades como grupo social, diante da própria comunidade onde vive e em outros grupos culturais e sociais onde tiveram acesso. Com isso, percebe-se a ação fundamental da educação patrimonial como estratégia de preservação do patrimônio cultural, mas sobretudo, de afirmação e empoderamento dos grupos sociais, a partir do reconhecimento de seus valores e de suas identidades culturais, o que favorece diretamente a instrumentalização da comunidade em seus enfrentamentos e problemáticas cotidianas, para que se tenha desenvolvimento pessoal e coletivo, justiça social e equidade.

Referências Bibliográficas

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