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Os escravos que Saint-Hilaire viu

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Academic year: 2021

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F l á v i o R a b e l o V e r s i a n i

Departamento de Economia, Universidade de Brasília

Introdução

Relatos de viajantes que percorreram o Brasil, especialmente no sé-culo X I X , têm sido fontes amplamente utilizadas para o estudo da vida e c o n ô m i c a e social do País naquele p e r í o d o . Os trabalhos clássicos de Gilberto Freyre, Sérgio B u a r q u e de H o l a n d a e Caio Prado Jr., por

exemplo, valeram-se em larga medida dessas fontes.2

Em particular, o estudo das características do escravismo brasileiro t e m sido m u i t o influenciado por tais relatos. A visão de u m a escravidão relativamente benigna no Brasil — origem de tanta polêmica na literatura — foi c o m freqüência defendida c o m o apoio de citações extraídas da obra de observadores estrangeiros da época. C o m efeito, nos livros de viajantes c o m o H e n r y Koster, G e o r g e Gardner, J o h n Luccock, J o h n M a w e , J o h a n n E m a n u e l P o h l e Auguste de Saint-Hilaire, entre outros, não é raro encontrar m e n ç õ e s a um t r a t a m e n t o a p a r e n t e m e n t e p o u c o rigoroso, ou m e s m o benévolo, dispensado à m ã o - d e - o b r a cativa no Brasil. P o r outro lado, a fidedignidade desses testemunhos foi posta em dúvida p o r o p o n e n t e s daquela visão, desde o século X I X . N ã o faltou q u e m considerasse os Viajantes "verdadeiros agentes do governo

1 E s t e a r t i g o d e c o r r e d e p e s q u i s a a p o i a d a p e l o C N P q , a q u a l c o n t o u c o m a c o m p e t e n -t e c o l a b o r a ç ã o , c o m o a s s i s -t e n -t e d e p e s q u i s a , d e F á b i o S o u z a d e O l i v e i r a . O -t e x -t o s e b e n e f i c i o u d e c o m e n t á r i o s d o s p a r t i c i p a n t e s d e s e m i n á r i o s e m q u e v e r s õ e s a n t e r i o -res d o t r a b a l h o f o r a m a p r e s e n t a d a s , s e n d o d e s e d e s t a c a r o s d a P r o f ª M . T e r e s a R . O l i v e i r a . M a s , é c l a r o q u e s ó o A u t o r d e v e s e r r e s p o n s a b i l i z a d o p e l o p r o d u t o f i n a l . 2 V . e s p e c i a l m e n t e F r e y r e , 1 9 8 1 [ 1 9 3 3 ] , 1 9 6 1 [ 1 9 3 6 ] ; H o l a n d a , 1 9 8 9 [ 1 9 3 6 ] ; P o d o Jr., 1 9 8 1 [ 1 9 4 2 ] .

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brasileiro", prestando-se a veicular u m a tese que teria sua o r i g e m na propaganda antiabolicionista governamental, interessada em difundir

um quadro róseo da situação dos escravos.3

Nesse contexto, será útil procurar examinar de forma mais sistemática o que disseram os viajantes do século X I X sobre o escravismo brasileiro, i n d o além de meras citações pinçadas a propósito. Até que p o n t o se p o d e extrair desses relatos um quadro coerente, que traga subsídios efetivos ao e n t e n d i m e n t o das relações entre senhores e escravos? Q u e tipo de generalização p o d e ser sugerida p o r esse mosaico de observa-ções individuais, feitas em circunstâncias bastante variadas?

O presente trabalho pretende trazer u m a contribuição em tal sentido, e x a m i n a n d o os d e p o i m e n t o s , c o m relação à escravidão, de um dos mais importantes e freqüentemente citados entre aqueles viajantes: o natura-lista francês Saint-Hilaire, que percorreu extensamente o Brasil entre 1816 e 1822. O exame dos relatos de Saint-Hilaire será feito t o m a n d o c o m o referência algumas hipóteses e conclusões da literatura econômica sobre o escravismo.

A p r ó x i m a seção e x p õ e brevemente tópicos da análise e c o n ô m i c a da escravidão relevantes para a discussão que se seguirá. Trata-se, depois, da postura de Saint-Hilaire diante da escravidão e de sua visão geral q u a n t o às relações entre escravos e h o m e n s livres no Brasil. As seções subseqüentes e x a m i n a m as observações do Viajante sobre o escravismo na mineração, na cultura da cana-de-açúcar e em outras lavouras, e na criação de gado. Em seguida discutem-se alguns aspectos específicos do seu t e s t e m u n h o sobre as relações escravistas no Brasil. U m a seção final reúne as conclusões do artigo.

Mão-de-obra escrava: produtividade

e formas de utilização

Cabe referir aqui duas proposições desenvolvidas na literatura sobre economia da escravidão nas últimas décadas, e que se mostram relevantes para o e n t e n d i m e n t o de questões relacionadas c o m o desenvolvimento

da escravidão no Brasil.4 Primeiro, a idéia da produtividade diferente

3 C o s t a ( 1 9 6 6 : 2 8 1 ) , c i t a n d o o d i p l o m a t a i n g l ê s W . D . C h r i s t i e (Notes o n Brazilian

Questions. L o n d o n a n d C a m b r i d g e , 1 8 6 5 ) . P a r a u m v e r s ã o r e c e n t e d o a r g u m e n t o d e q u e a t e s e d a b e n i g n i d a d e t e r i a s e o r i g i n a d o n u m a c a m p a n h a p u b l i c i t á r i a d o g o v e r n o b r a s i l e i r o , v e r C o n r a d ( 1 9 9 4 : x i x ) .

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dos dois tipos de m ã o - d e - o b r a ; segundo, a distinção entre atividades ou tarefas que exigem apenas força bruta, de um lado, e aquelas que requerem do trabalhador habilidade ou esmero, do outro.

A proposição de que a m ã o - d e - o b r a escrava é, dentro de certos limites e mantidos os demais fatores constantes, mais produtiva que a livre, aparece de diversas formas na m o d e r n a literatura sobre escravismo. A superioridade do trabalho escravo t e m sido associada a causas variadas, desde economias de escala obtidas na organização do trabalho agrícola em equipes de escravos (Fogel & E n g e r m a n , 1974) à redução dos custos de transação derivados da rotatividade da m ã o - d e - o b r a livre (Hanes, 1996). Um a r g u m e n t o que parece ter g r a n d e generalidade decorre da idéia de que o que distingue fundamentalmente o trabalho escravo do trabalho livre é o fato de que, enquanto, no segundo caso, o t e m p o de trabalho é decidido pelo p r ó p r i o trabalhador, a partir de u m a avaliação dos custos e benefícios de u m a hora de trabalho adicional, na escravidão essa decisão cabe ao proprietário; e, nesse caso, o t e m p o de trabalho p o d e ser aproximado do m á x i m o biologicamente suportável, mediante o uso, efetivo ou potencial, da coerção física. Ao contrário, o dia de trabalho assalariado t e m u m a duração tipicamente inferior a esse máximo. Neste sentido, dado um m e s m o custo do dia de trabalho (dado, para o escravo, pelo custo de sua aquisição, descontado no t e m p o , mais o custo de sua m a n u t e n ç ã o e da coerção a ele aplicada; e,para o trabalho livre, p o r seu salário), o trabalho escravo é mais produtivo. A decisão "racional" sobre o uso de u m a ou de outra forma de trabalho basear-se-á, então, na comparação de seus custos, levando em conta essa produtividade potencial.3

O segundo desses p o n t o s acima foi explorado p o r Fenoaltea (1984), que distinguiu dois tipos polares de atividades produtivas. De um lado, as atividades "intensivas em esforço", que r e q u e r e m basicamente força, p o d e n d o a avaliação do d e s e m p e n h o do executante ser feita de forma quantitativa. São n o r m a l m e n t e associadas a u m a determinada forma de organização do trabalho, que facilite seu a c o m p a n h a m e n t o e fiscalização e a aferição do resultado. O remador de u m a galera, na Antigüidade, trabalhando sob os olhos de um patrão, exercia u m a tarefa desse tipo; cavar buracos, carregar pedras, capinar u m a roça são basicamente ta-refas intensivas em esforço. No o u t r o extremo, tata-refas "intensivas em

5 A r g u m e n t o s n e s s a l i n h a f o r a m d e s e n v o l v i d o s p o r v á r i o s a u t o r e s ; v e r p a r t i c u l a r m e n t e

D o m a r ( 1 9 7 0 ) e B a r z e l ( 1 9 7 7 ) .

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habilidade" são aquelas em que a qualidade da execução é fundamental; elas não p o d e m ser avaliadas apenas pela quantidade do p r o d u t o . A atividade de q u e m conserta um m e c a n i s m o c o m p l e x o ou delicado é um exemplo típico. E v i d e n t e m e n t e , entre os dois extremos há u m a gama contínua de misturas de força e habilidade.

J u n t a n d o agora os dois a r g u m e n t o s , é e v i d e n t e q u e a idéia da produtividade superior da m ã o - d e - o b r a escrava só terá aplicabilidade nos casos em q u e a coerção for viável; e ela só será viável em atividades intensivas em esforço. É difícil, ou impossível, garantir a execução de u m a atividade intensiva em habilidade mediante castigos ou ameaças; nesse caso, é imprescindível c e r t o grau de cooperação p o r parte do trabalhador. A falta de qualidade não é, em geral, facilmente aferível. Será necessário angariar tal cooperação; e a forma mais adequada de fazer isso será p o r m e i o de incentivos ou recompensas — em suma, de alguma forma de salário. 6

Um corolário dessas hipóteses é que o trabalho escravo é relativamente mais eficiente para a execução de tarefas intensivas em esforço do q u e intensivas em habilidade. N e s t e sentido, a escravidão seria primaria-m e n t e usada c o primaria-m o forprimaria-ma de s u p r i primaria-m e n t o de primaria-m ã o - d e - o b r a ali o n d e as atividades produtivas são caracterizadas pela predominância de tarefas intensivas em esforço — c o m o na agricultura organizada sob o sistema de plantation. Só secundariamente, de forma derivada, adviria o uso de escravos em outros tipos de atividade. Um outro corolário é que a coerção estará basicamente associada a atividades em que p r e d o m i n e m tarefas intensivas em esforço. Na agricultura de plantation, a organização do trabalho em equipes p o d e ser vista, assim, c o m o u m a forma de a d -ministrar a coerção mais eficientemente. Simetricamente, o n d e preva-l e c e m tarefas intensivas em habipreva-lidade (como na escravidão doméstica) a coerção seria m e n o s c o m u m , e a ocorrência de incentivos positivos (recompensas, inclusive alforrias) mais freqüente.7

Tendo em m e n t e esse arcabouço conceituai, passa-se agora a examinar as referências ao escravismo-brasileiro encontrados nos relatos de Saint-Hilaire.

6 P a r a u m t r a t a m e n t o d e s s e p o n t o s o b o â n g u l o d a t e o r i a d o a g e n t e , v e r K a h n

( 1 9 9 2 ) .

7 F e n o a l t e a ( 1 9 8 4 ) . P a r a i l u s t r a ç õ e s d e s s e s p o n t o s c o m r e f e r ê n c i a a o c a s o b r a s i l e i r o ,

v e j a - s e V e r s i a n i ( 1 9 9 4 ) .

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Saint-Hilaire e a escravidão

Auguste de Saint-Hilaire veio ao Brasil em 1816 c o m o D u q u e de Luxemburgo, embaixador francês, e aqui p e r m a n e c e u até 1822. N a q u e -les seis anos p e r c o r r e u cerca de 15 mil quilômetros, em cinco viagens, t e n d o a cidade do R i o de Janeiro c o m o base.

Sua primeira viagem, u m a excursão de cerca de um mês, l e v o u - o até u m a fazenda do vale do Paraíba. Na segunda, de quinze meses, percorreu e x t e n s a m e n t e a província de M i n a s Gerais, em especial a zona de mineração — inclusive o Distrito D i a m a n t i n o —, passando ainda pelo vale do j e q u i t i n h o n h a e alcançando a atual M o n t e s Claros, no n o r t e da Província. A terceira viagem, de aproximadamente três meses, l e v o u -o até -o ri-o D -o c e , pel-o lit-oral d-o R i -o de Janeir-o e Espírit-o Sant-o. Na quarta viagem, a mais longa, que d u r o u aproximadamente dois anos e meio, percorreu novamente Minas Gerais, agora ao sul da Z o n a M e t a -lúrgica, no sentido do vale do R i o G r a n d e , i n d o até Araxá; passando à província de Goiás, foi até a cidade de Goiás, voltou ao sul da Província, atravessou o atual Triângulo M i n e i r o e entrou em São Paulo, p r ó x i m o a Franca; passando p o r M o j i m i r i m e Campinas c h e g o u à capital da Província, de o n d e desceu, p o r Itapeva e Itararé, para o hoje Estado do Paraná; p o r Curitiba e Paranaguá atingiu a província de Santa Catarina e, pela zona litorânea, c h e g o u ao R i o G r a n d e do Sul, até P o r t o Alegre e R i o Grande; passou ao hoje U r u g u a i , r e t o r n o u ao R i o G r a n d e atravessando a Província até o n o r t e , voltando a Porto Alegre, de o n d e e m -barcou de volta ao R i o . O q u i n t o e ú l t i m o percurso, de cerca de quatro meses, levou-o n o v a m e n t e a Minas, até São J o ã o del R e i , e daí ao sul da Província, o n d e entrou em São Paulo, p e r t o de Guaratinguetá, p e r -c o r r e n d o então o vale do Paraíba até a -capital da Provín-cia e, em sentido contrário, de volta ao R i o . No todo, t e v e cerca de quatro anos e m e i o de viagens pelo País, dos quais quase dois anos em Minas Gerais.

Saint-Hilaire dedicou-se primordialmente ao estudo da flora brasileira, t e n d o publicado u m a obra b o t â n i c a d e e n o r m e i m p o r t â n c i a , c o m descrição de centenas de novas espécies. Seus relatos de v i a g e m revelam não só o naturalista minucioso, mas t a m b é m um observador arguto da realidade social que tinha sob seus o l h o s .8

8O s r e l a t o s d e v i a g e m d e S a i n - H i l a i r e f o r a m p u b l i c a d o s n a F r a n ç a e n t r e 1 8 3 0 e

1 8 8 7 . A q u i m e r e f e r i r e i à t r a d u ç ã o , e m n o v e v o l u m e s , e d i t a d a n a d é c a d a d e s e t e n -t a ( S a i n -t - H i l a i r e , 1 9 7 4 a ; 1 9 7 4 b ; 1 9 7 4 c ; 1 9 7 5 a ; 1 9 7 5 b ; 1 9 7 5 c ; 1 9 7 5 d ; 1 9 7 6 ; 1 9 7 8 ) . N o q u e s e s e g u e , e s s e s v o l u m e s s e r ã o c i t a d o s d e f o r m a a b r e v i a d a p o r D D (Viagem

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Em suas atitudes c o m relação à escravidão, nota-se, além das idéias de inferioridade racial de negros e mulatos, próprias da época, certo conflito entre a c o n d e n a ç ã o moral da instituição servil, várias vezes reafirmada, e aquilo q u e observava e anotava, c o m minúcia e espírito científico, sobre as condições de vida e de trabalho dos escravos.

O p r e c o n c e i t o racial transparece já na narrativa de sua primeira incursão ao Interior, do mês passado n u m a fazenda do vale do Paraíba. No r e t o r n o ao R i o , seu hospedeiro lhe dá m a n t i m e n t o s para a viagem e um escravo c o m o guia. " N ã o sabendo ainda o q u e são os escravos, e p r i n c i p a l m e n t e os de sangue mestiço", d e i x o u t u d o a cargo do guia,"o b o m A n t ô n i o " — o qual lhe furtou os m a n t i m e n t o s (MG, p. 34). I n ú -meras observações desse teor racista e n c o n t r a m - s e em suas narrativas. Em particular, ele usualmente atribui à predisposição indolente e p r e -guiçosa de negros e mestiços as dificuldades que encontra em engajar m ã o - d e - o b r a q u e o auxiliasse em suas viagens. 9

Mas, os preconceitos do naturalista — e a rígida moralidade que o fazia julgar obscenas e lúbricas as festas e danças dos negros, e atribuirlhes outros vícios morais — não o i m p e d i a m de ter u m a atitude c o m -passiva para c o m os escravos, e ver superioridades físicas na raça: " N ã o existe um só viajante que não tenha tido ocasião de observar que, para todos os exercícios em que são necessárias medida e precisão, os africanos são geralmente superiores aos povos da Europa. Seus cantos e danças são, sem dúvida, bárbaros; mas sabem executá-los c o m u m a perfeição geralmente desconhecida aos franceses de classe inferior." (MG, p. 18). O conflito entre suas idéias anteriores sobre a escravidão e o que e n c o n t r o u no Brasil é b e m ilustrado p o r um incidente de sua primeira viagem a Minas Gerais, que parece ter sido marcante para ele: trata-se de u m a passagem várias vezes referida em seus relatos posteriores. N ã o distante do então r a n c h o de j u i z de Fora, o Viajante, r e c o l h e n d o plantas

pelo Distrito dos Diamantes...), ES (Viagem ao Espírito Santo...), RS (Viagem ao Rio Grande do Sul), MG (Viagem pelas Províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais), SF (Viagem às Nascentes do Rio São Francisco), GO (Viagem à Província de Goiás), SV (Segunda Viagem do Rio de Janeiro a Minas....),SP (Viagem à Província de São Paulo) e SC (Viagem a Curitiba e Santa Catarina).

9 P o r e x e m p l o : " T a l v e z s e j a i m p o s s í v e l e n c o n t r a r n o B r a s i l u m a r r i e i r o q u e s e a p e g u e a s e u p a t r ã o . E s s e s h o m e n s , g e r a l m e n t e m e s t i ç o s , t ê m a i n c o n s t â n c i a i n a t a d o s n e g r o s e d o s í n d i o s . F a l t a m - l h e s p r i n c í p i o s m o r a i s b á s i c o s , e a m a i o r i a n ã o t e m f a m í l i a . " ( G O , p - 4 6 ) O u : " O s n e g r o s são. n a t u r a l m e n t e p o u c o a t i v o s ; q u a n d o l i v r e s s ó t r a b a l h a m o s u f i c i e n t e p a r a n ã o m o r r e r e m d e f o m e ; q u a n d o a m e d r o n t a d o s t r a b a l h a m m a l e c o m e x c e s s i v a l e n t i d ã o . " ( R S , p . 8 0 ) .

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p r ó x i m o à estrada, deu c o m um n e g r o que, à beira de u m a plantação de milho, comia p r ó x i m o de sua choça, e gentilmente lhe ofereceu u m a cabaça de tatu c o m angu. Indagado de suas condições de vida, o preto as avalia c o m otimismo, rebatendo as sugestões em contrário do N a t u r a -lista. N ã o se aborrece vivendo só no m e i o do mato? N ã o , pois sua casa não é distante, e ele t e m seu trabalho. N ã o sente saudade da terra, da costa da África? N ã o , acha m e l h o r aqui, veio m e n i n o e se a c o s t u m o u . Mas, é escravo, não p o d e fazer o que quer. Sim, mas o seu senhor é b o m , dá m u i t o de comer, b a t e u - o poucas vezes, deixa que ele trabalhe sua roça nos domingos, c o m o que arranja algum dinheiro. Vai casar c o m u m a conterrânea que sua senhora acaba de comprar; o s e n h o r lhe havia oferecido uma crioula, mas ele não a quis, as crioulas desprezam os negros da costa. (MG, p. 53).

Esse diálogo p e r t u r b o u os conceitos anteriores de Saint-Hilaire, m o s t r a n d o - l h e que "os negros não são sempre tão infelizes c o m o se diz" (ibid.). Diversas vezes depois, ele voltou a perguntar a escravos afri-canos se não sentiam saudades de sua terra, e recebeu sempre resposta negativa: lá há muita guerra, aqui é melhor; se voltássemos, seríamos vendidos de novo. O viajante racionalizava isso t a m b é m a partir da i m previdência natural da raça, no seu m o d o de ver: c o m o os escravos p e n -sam p o u c o no futuro, o presente, sendo suportável, é o que lhes parece suficiente. "A escravidão não é para eles o que seria para nós." (MG, p. 54).

Mas, Saint-Hilaire justificou t a m b é m essa atitude dos cativos a partir do fato de que suas condições de vida eram muitas vezes aceitáveis, ou boas:

" N o estado atual das coisas, devemos, para ser justos, fazer c o n -cessões aos partidários da escravidão. O n e g r o que cai nas mãos de um senhor b o m e sinceramente cristão é, devemos confessá-lo, mais feliz do que a maioria dos camponeses de certas províncias da França; trabalha m u i t o menos; não t e m as mesmas inquietações; a fome e a miséria não o ameaçam constantemente; vivendo n u m clima quente, t e m poucas necessidades, e aquilo de que carece o s e n h o r lhe dá [...]." (MG, p. 54)

Mas, logo em seguida, restringe a amplitude desse j u í z o favorável sobre a escravidão brasileira, advertindo: "Mas não é m e n o s verdade que o escravo corre maiores perigos de miséria que de felicidade, p o r que os senhores desumanos são mais numerosos do que os bons." (ibid.).

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T a m b é m o impressionou um fato o c o r r i d o na região de Minas Novas: um escravo, c o m u m a coleira de ferro ao pescoço, lançou-se a seus pés pedindo sua intercessão para livrá-lo do terrível castigo."Algumas palavras bastaram para p ô r t e r m o à punição desse infeliz", demonstrando " q u a n t o são brandos os costumes dos habitantes do Brasil [ . . . ] " . (MG, p. 283)

Em relatos subseqüentes — c o n v é m l e m b r a r que Saint-Hilaire só transformou suas anotações em livros já na França, anos depois de voltar do Brasil, e ao l o n g o de quase três décadas — o Viajante reafirmou mais de u m a vez, e agora sem qualificações ou restrições, o a r g u m e n t o de que os escravos tinham, nas regiões que percorrera, e especialmente em Minas Gerais, um tratamento relativamente brando. Nessa generalização m a i o r que dá a tal a r g u m e n t o , ele p o d e ter sido influenciado p o r outras narrativas de viajantes europeus no Brasil que apareceram depois de seu r e t o r n o à França, as quais lia cuidadosamente, cotejando-as c o m suas notas. Assim, na Viagem às Nascentes do São Francisco (cuja primeira edição francesa saiu em 1847), escreveu:

" A p r e s s o - m e a esclarecer q u e na Província de Minas Gerais [os negros] me pareceram tratados c o m bastante doçura, e é certo q u e m e s m o no P ã o de Janeiro o tratamento q u e r e c e b e m é b e m m e l h o r do que nos Estados do Sul da Confederação Americana. O c o n s -ciencioso escritor q u e acabei de citar [Ferdinand D e n i s ] , b e m c o m o Spix e Martius, Gardner e m e s m o o C o n d e de Suzannet, que mostrou tão p o u c a benevolência para c o m os brasileiros, são acordes em r e c o n h e c e r q u e estes são geralmente m u i t o indulgentes em seu trato c o m os escravos." (SF, p. 70)

E prossegue c o m u m a extensa citação de Gardner, em que esse afirma ter encontrado, em sua longa estada no Brasil, p o u c o s casos de " p u r a e simples crueldade"para c o m os escravos, os quais, na maioria das fazendas, "são b e m tratados e parecem bastante felizes" (ibid.). Esse autor tinha feito entre escravos africanos indagações similares às de Saint-Hilaire, c o m resultados análogos: r a r a m e n t e os cativos mostravam qualquer ressentimento p o r t e r e m sido trazidos da África para o Brasil, ou desejo de retornar ao país de o r i g e m .1 0

1 0 O l i v r o d e G e o r g e G a r d n e r , Travels i n the Interior o f Brazil, f o r a p u b l i c a d o e m L o n -d r e s e m 1 8 4 6 . E s s a -d a t a -d e i x a c l a r o , a l i á s , q u e S a i n t - H i l a i r e a c o m p a n h a v a c o m a t e n ç ã o o q u e s e p u b l i c a v a n a E u r o p a s o b r e o B r a s i l , p o i s s e u l i v r o s o b r e a v i a g e m à s n a s c e n t e s d o S ã o F r a n c i s c o , n o q u a l c i t a G a r d n e r , a p a r e c e u j á n o a n o s e g u i n t e .

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Mais tarde, em seu Viagem a Curitiba e Província de Santa Catarina (editado na França em 1851), Saint-Hilaire foi anda mais enfático:

" T o d o m u n d o sabe, de resto, q u e os brasileiros tratam geralmente os escravos c o m g r a n d e b r a n d u r a . A esse p r o p ó s i t o p o d e m ser consultados os trabalhos de Gardner ("Traveis") e mais recentemente os de B l u m e n a u ("Süd Brazilien"); finalmente, o q u e eu p r ó p r i o escrevi em m i n h a Viagem às Nascentes do Rio São Francisco." (SC, p. 173 n. 365)

Ainda que as observações de outros viajantes possam ter c o n t r i b u í -do para solidificar a posição de Saint-Hilaire a esse respeito, seria intei-ramente alheia a sua personalidade de cientista, de pesquisador cuidadoso e infatigável, a atitude de simplesmente reproduzir opiniões de terceiros. É evidente q u e a idéia de u m a escravidão "suave", da prevalência de u m a postura benigna dos senhores em relação à m ã o - d e - o b r a cativa que possuíssem, coincidia, no geral, c o m o que ele p r ó p r i o vira, em seus seis anos de andanças pelo centro-sul do Brasil.

Torna-se, assim, relevante perguntar: quais foram os escravos que Saint-Hilaire viu? As próximas seções deste artigo p r o c u r a m reunir elementos para u m a resposta a essa questão.

Escravos e homens livres

U m a primeira observação refere-se às repetidas m e n ç õ e s de Saint-Hilaire ao fato de que escravos e pessoas livres às vezes se misturavam c o m naturalidade, em lugares públicos ou m e s m o em atividades de produção. Isso, é claro, c o n t r a p u n h a - s e ao m o d e l o convencional de escravidão; e o viajante se refere ao fato c o m certa surpresa (e às vezes c o m mal disfarçado desgosto).

Escravos conviviam c o m h o m e n s livres nas vendas de beira de estrada. Ainda p r ó x i m o ao R i o de Janeiro, em sua primeira viagem a Minas, "a cada m o m e n t o nossos ouvidos e r a m chocados pelo ruído confuso que faziam nas vendas os escravos confundidos aos h o m e n s livres de classe inferior." ( M G , p. 36). E o moralista c o n d e n a severamente o grande c o n s u m o de cachaça nessas vendas, e outros males que aí se praticavam: "É lá que os escravos passam u m a parte dos m o m e n t o s de liberdade que se lhes c o n c e d e m e dos que p o d e m furtar a seus senhores; é para lá q u e levam o p r o d u t o de seus roubos, dos quais os proprietários das

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vendas não foram talvez os m e n o r e s cúmplices; é aí que eles acabam de se c o r r o m p e r , c o m u n i c a n d o - s e reciprocamente seus vícios, e que esquecem, na embriaguez, a escravidão e suas misérias." (MG, p. 40) A m e n ç ã o a isso se repete mais de u m a vez, em livros posteriores. P o r exemplo: "A cada m o m e n t o , passávamos à frente de alguma v e n -da apinha-da de escravos de envolta c o m h o m e n s livres." (SV,p. 15). (Ver t a m b é m D D , p. 138, o n d e o A u t o r insiste na idéia de vendas c o m o locais de receptação de roubos e bebedeiras de escravos, q u e aí " p r o l o n -gam suas estranhas palestras noite adentro").

T a m b é m a religião trazia os negros para j u n t o dos brancos. Para as-sistir missa, "as mulheres, sem distinção de classe, colocam-se ao meio da igreja agachadas ou de j o e l h o s " — e m b o r a os negros "e a gente da classe baixa" ficasse à p o r t a (MG, p. 63). N u m a fazenda de Borda do C a m p o , em Minas, o viajante foi e n c o n t r a r o proprietário, um padre, fazendo as orações da tarde " e m m e i o a u m a trintena de pessoas, na maioria negros e negras." (MG, p. 60)

No trabalho agrícola, Saint-Hilaire n o t o u convivência próxima de escravos e senhores em particular nas fazendas da Z o n a da Mata, em Minas, voltadas p r i n c i p a l m e n t e à criação de gado, c o m o atividade lucrativa, e a culturas de a u t o - c o n s u m o . " [ N a comarca de São João del R e i ] os habitantes dos campos aplicam-se mais à agricultura. Trabalham c o m seus negros e passam a vida nas plantações, no m e i o dos animais, e seus costumes t o m a m , necessariamente, algo da rusticidade das o c u p a -ções." (SV, p. 37). Claramente essa convivência não lhe parecia m u i t o recomendável; atribuiu a ela o fato de que os habitantes da Mata lhe parecessem m e n o s cultivados e corteses do que os da Z o n a Metalúrgica, " q u e apenas v i g i a m os escravos, nada trabalham e t ê m mais ocasiões de conversar e pensar." (SV, p. 3 7 - 3 8 ) . Ele j u l g o u essa idéia suficiente-m e n t e i suficiente-m p o r t a n t e para repeti-la, quase c o suficiente-m as suficiente-messuficiente-mas palavras, esuficiente-m relato p o s t e r i o r (SF, p. 54-55). Viajando mais tarde p o r São Paulo, na região de Franca, p e r n o i t o u na casa de um fazendeiro originário da Z o n a da M a t a , e se espantou ao ver c o m o t u d o na fazenda era parecido c o m as propriedades dessa região de M i n a s — inclusive o convívio p r ó x i m o de brancos e negros. E escreveu, c o m algum sarcasmo:

" N a m a n h ã seguinte, [...] os filhos do d o n o começaram a ordenhar [as vacas], misturados c o m as negras. O pátio era m u i t o amplo e cercado p o r grossos m o u r õ e s , c o m o os de todas as fazendas da C o m a r c a de São João del R e i . Em resumo, eu encontrei na casa de

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m e u hospedeiro todos os hábitos dessa comarca." (SP, p. 95) Os brancos não só bebiam, rezavam e trabalhavam j u n t o dos escravos, mas às vezes dançavam c o m eles, e c o m o eles. Em Goiás, n u m a festa de São João, o viajante presenciou um batuque, " u m a dança obscena que os brasileiros aprenderam c o m os africanos". Era dançada só p o r h o m e n s — "e quase todos eram brancos", n o t o u ele, em evidente r e p r o -vação. O que o fez concluir, m a l - h u m o r a d o :

" O s brasileiros devem, sem dúvida, alguma coisa a seus escravos, aos quais se misturam tão freqüentemente, e que talvez lhes t e n h a m ensinado o sistema de agricultura que a d o t a m e a maneira de extrair o ouro dos córregos. A l é m do mais, foram os seus mestres de dança." ( G O , p . 47).

Ainda mais reprovável lhe pareceu o que presenciou p e r t o de Vila do Fanado (Minas Novas), em Minas Gerais: concubinato e promiscuidade: " U m c o l o n o nos arredores de S. João, em cuja casa me hospedei, tinha p o r escrava u m a mulata que, sem ser casada, se tornara m ã e de vários filhos. Um deles tinha p o r pai o p r ó p r i o senhor; os demais p e r t e n c i a m a vários pais e eram escravos do senhor. Toda essa gente vivia em promiscuidade, e costumes tais são tão generalizados que não espantam a ninguém." (MG, p. 203).

Mas, em alguns casos, o Viajante viu de forma positiva a proximidade entre senhores e escravos, na atividade produtiva. Se critica a recusa ao trabalho braçal p o r parte do h o m e m branco, que vê c o m o atitude p r e d o m i n a n t e nas regiões o n d e predominava a m ã o - d e - o b r a escrava (como na Z o n a Metalúrgica de Minas), considera positivo que alguns donos de escravos " n ã o se e n v e r g o n h e m de trabalhar", e o façam lado a lado c o m seus cativos. Foi o que n o t o u no R i o Grande do Sul, p e r t o de Santa Maria:

"Todos os proprietários cultivam a terra, ao m e s m o t e m p o que se dedicam à criação de gado. O d o n o da casa e seus filhos cuidam do gado e os negros tratam da plantação [referindo-se a seu hospedeiro]; nesta região, n i n g u é m se envergonha de trabalhar. Os proprietários menos ricos possuem vacas de leite e cultivam a terra por suas próprias mãos." ( R S , p . 179).

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Sem dúvida, as várias constatações de "mistura" entre os escravos e seus donos, em diferentes situações, contribuíram para c o m p o r o quadro mental que o Viajante f o r m o u do escravismo brasileiro. M e s m o que em muitos casos lhe desagradassem essas intimidades excessivas entre b r a n -cos e negros, o fato é que elas não se encaixavam b e m na i m a g e m de u m a escravidão sempre marcada pela crueldade e pela violência. A aproximação entre senhores e escravos, ainda que vista c o m o censurável, seria t a m b é m um o u t r o sinal da benignidade daqueles no trato de seus cativos.

Escravos na mineração

Foi nos trabalhos de mineração que Saint-Hilaire p ô d e p r i m e i r o observar, mais de perto, escravos entregues a u m a atividade produtiva. M e n o s de vinte dias depois de deixar o Rio de Janeiro, em sua segunda viagem, chegava a Vila R i c a ; na região circunvizinha teve o p o r t u n i d a d e de visitar várias lavras de ouro, especialmente nas cercanias de Itabira. No final do a n o seguinte, passou cerca de um mês no Tijuco, o n d e percorreu vários "serviços" da Intendência dos Diamantes.

Na mineração do ouro, especialmente nas maiores explorações, a m ã o - d e - o b r a escrava era usada c o m exclusividade; os h o m e n s livres só se dedicavam a fiscalizar o trabalho dos cativos. Os métodos de exploração pareceram ao Viajante m u i t o ineficientes; a não ser o sistema de captação e c o n d u ç ã o de água para lavagem do m i n é r i o , em que mostravam competência; "a arte de explorar minas não é entre os mineiros mais que u m a rotina imperfeita e cega." ( M G , p . 110).A operação inicial era o trabalho braçal, pesado, de extração do material aurífero nas minas de galeria ou de céu aberto (no caso da mineração " d e m o r r o " ) , ou o r e c o l h i m e n t o do cascalho c o n t e n d o o metal, no leito dos rios ou em outros locais (no caso da mineração " d e cascalho"). Em qualquer caso, vinha em seguida o p r o c e d i m e n t o básico da extração do metal precioso: a lavagem ("único processo de que se servem os brasileiros para separar o ouro das matérias c o m q u e v e m misturado, quaisquer que elas sejam.") (MG, p. 112). Consistia, em essência, de sucessivas passagens de água pela mistura aurífera, visando separar as partes de m e n o r t a m a n h o e nessas isolar, p o r gravidade, as partículas do metal. Estas ficavam deposi-tadas no fundo dos recipientes e c o n d u t o s usados no processo, ou eram retidas p o r couros de b o i ou panos felpudos pelos quais se fazia passar, nas fases finais do refino, a água c o n d u z i n d o material arenoso.

Os d i a m a n t e s , e n t ã o considerados p r o p r i e d a d e real, t i n h a m sua

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exploração controlada pela administração do Distrito dos Diamantes. O processo de extração não diferia fundamentalmente do usado na mineração do o u r o em cascalho, e era t a m b é m centrado na operação de lavagem, que exigia agora m e n o r v o l u m e d'água:"para a lavagem do ouro é necessário que a água seja abundante; mas para a dos diamantes basta que ela seja límpida e que permita descobrir essas preciosas pedras no meio dos calhaus". ( D D , p . 37—38). O serviço era feito p o r escravos, todos alugados a particulares; na época da viagem de Saint-Hilaire, a administração tinha cerca de mil escravos alugados (DD, p. 16.)

Essa descrição sucinta p e r m i t e perceber duas características i m p o r tantes dos trabalhos de mineração testemunhados pelo Naturalista. P r i -meiro, tratava-se de um processo que, para ter eficácia, exigia atenção e habilidade do operário. Sendo mal feita, a lavagem deixaria passar grande quantidade de ouro ou diamantes. De u m a forma ou de outra, algo passava, dada a ineficiência das técnicas usadas ( c o m o observou mais de u m a vez o Naturalista aos encarregados das lavras de ouro, os quais r e -ceberam suas críticas c o m indiferença); por isso m e s m o os rejeitos das lavagens eram c o m u m e n t e falseados ou garimpados p o r mineradores pobres. No entanto, para minimizar as perdas, seria indispensável que os encarregados da lavagem se aplicassem c o m atenção a seu trabalho. Separar o ouro da ganga, ou os diamantes do cascalho era, tipicamente, u m a tarefa em que o b o m d e s e m p e n h o se relacionava m u i t o mais c o m a qualidade do serviço do que c o m a quantidade do material processado; ou seja, u m a tarefa "intensiva em habilidade", na classificação vista a n t e -riormente.

Em segundo lugar, parece evidente não só q u e haveria inúmeras oportunidades de furtos, dado q u e os processos e r a m todos manuais, c o m o essa possibilidade deveria parecer m u i t o atraente a indivíduos sem renda, c o m o os escravos — já que m e s m o pequenas pepitas, ou diamantes de t a m a n h o reduzido, representavam um valor considerável (principalmente os diamantes, m u i t o mais valiosos, pelo peso, do que o o u r o " ) . Em outras palavras, o custo de desviar partículas do metal e, mais ainda, p e q u e n o s diamantes, poderia parecer-lhes relativamente baixo, q u a n d o c o m p a r a d o c o m a probabilidade do ganho.

1 1 U m a c o m p a r a ç ã o d e v a l o r e s , a o s p r e ç o s d a é p o c a , i l u s t r a e s s a a f i r m a t i v a : e n q u a n t o

u m a o i t a v a d e o u r o ( 3 , 6 g ) v a l i a 1 $ 2 0 0 , u m q u i l a t e ( 0 , 2 g ) d e d i a m a n t e s p e q u e n o s e r a v e n d i d o p e l a C o r o a p o r t u g u e s a a 7 $ 2 0 0 ( M G , p . 4 9 ; D D , p . 1 8 ) . O u s e j a : u m a r e l a ç ã o p r ó x i m a d e c e m para u m , e n t r e o v a l o r d a g r a m a d e d i a m a n t e s e o d a g r a m a d e o u r o .

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Em decorrência, duas atitudes seriam de esperar, p o r parte dos donos ou arrendatários de escravos: a adoção de medidas visando diminuir os furtos e o contrabando, fazendo a u m e n t a r seu custo p o r m e i o de penalidades rigorosas; e, p o r o u t r o lado, o uso de incentivos positivos, mais do que a coerção, c o m o forma de maximizar a eficiência da m ã o -d e - o b r a . Isso p o r q u e , c o m o se viu acima, no caso -de tarefas intensivas em habilidade os métodos coercitivos são, em princípio, m e n o s eficientes, em comparação c o m o oferecimento de alguma forma de recompensa pela boa execução das tarefas. Os relatos de Saint-Hilaire c o n f i r m a m essas suposições.

As p r e c a u ç õ e s c o n t r a furtos registradas pelo Viajante e r a m mais rigorosas no caso dos diamantes, dado seu maior valor relativo. Na la-v a g e m do cascalho diamantífero, cada oito escrala-vos (ou seis, se o cascalho fosse m u i t o rico) trabalhava sob o olhar fixo de um feitor; "se alguém dirige a palavra a um desses rígidos vigias, ele p o d e responder, mas sem voltar a cabeça". (DD, p. 38). A roupa desses cativos era reduzida ao m í n i m o , " u m p e d a ç o de p a n o de algodão amarrado ao redor das ca-deiras"; se fizesse frio, permitia-se um colete, sem bolsos n e m dobras. Ao fim do trabalho, u m a revista minuciosa, incluindo a boca (ibid.). H a v e n d o suspeita de que um deles tivesse engolido um diamante,"fazem-no em seguida engolir três pedras comuns e não lhe restituem a liberdade senão depois de evacuadas as três pedras, sem que n e n h u m diamante tenha sido d e s c o b e r t o " . (DD, p. 19). A l é m destas precauções, havia cas-tigos rigorosos aos ladrões: chicoteados e postos a ferros os escravos (enquanto durasse o castigo, seus donos nada receberiam de aluguel); e degredados para a África, c o m os bens confiscados, os h o m e n s livres cúmplices do r o u b o , c o m o intermediários ou contrabandistas.

Apesar de t u d o , os furtos eram constantes, e nisso os escravos t i n h a m " u m a sutileza de causar inveja aos nossos melhores gatunos". (DD, p. 20). Um dos Intendentes dos D i a m a n t e s pretendera testar o escravo tido então c o m o o mais "sutil", e prometeralhe a liberdade caso c o n -seguisse, sob a vigilância do p r ó p r i o Intendente, surrupiar um diamante colocado no m e i o do cascalho. Poucos instantes depois de iniciar o trabalho de lavagem, o escravo tirou o diamante da boca e p r o c l a m o u -se livre, "-se -se p o d e acreditar na palavra dos brancos", (ibid.). No caso do ouro, o Naturalista retratou situação análoga. C o m relação à lavra de Itabira, p o r exemplo, n o t o u que " m a u grado a vigilância dos interessados, a pilhagem dos trabalhadores é tão considerável, q u e três quartas partes do o u r o que circula pelas tabernas da região p r o v é m dessa lavra". (MG, p. 121). Na vizinha mineração de C o n c e i ç ã o , os proprietários, r e c o n h e

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c e n d o esse fato, t i n h a m resolvido utilizar-se dele para minimizar seus prejuízos: "para recobrar u m a parte do q u e lhes era furtado, [...] esta-beleceram, na própria m o n t a n h a , vendas p o r eles mantidas, e a o n d e os negros levavam u m a parte do que furtavam". (MG, p. 124). S e g u n d o o Viajante, esse expediente atingira seus objetivos, pois, "seguros de p o -der roubar mais ainda, [os escravos] imitavam a prodigalidade de seus senhores, e dissipavam o fruto dos roubos", (ibid.). Em algumas lavras, a pouca água disponível fazia c o m que o cascalho recolhido tivesse que ficar um b o m t e m p o à espera da estação chuvosa para ser s u b m e t i d o à lavagem, o que facilitava os r o u b o s (MG, p. 126).

No Distrito dos D i a m a n t e s , os feitores e m p u n h a v a m chicotes, e ocorria a aplicação de açoites c o m o t e m i d o "bacalhau", c o m o castigo de faltas graves — o que era, no entanto, vedado aos feitores, e reservado aos "administradores particulares", responsáveis p o r u m a "tropa" de cem a duzentos escravos. Mas, havia t a m b é m recompensas, que variavam segundo o tamanho dos diamantes encontrados. Para diamantes de u m a oitava, dava-se alforria ao escravo, que passava a receber o equivalente ao aluguel antes pago a seu senhor. Para três quartos de oitava, u m a alforria diferida para um t e m p o futuro; para pedras m e n o r e s , chapéus, facas, coletes. (DD, p. 15-17).

As alforrias, c o n t u d o , e r a m raras; no ano anterior ao da viagem de Saint-Hilaire, 1816, houvera três (para um estoque total de cerca de mil escravos); em 1817, até o u t u b r o , n e n h u m a . Assim, é provável que o incentivo mais efetivo, para os escravos da mineração, fosse não tanto a perspectiva de alforria obtida diretamente c o m o p r ê m i o , ou de outras recompensas menores, mas sim a possibilidade de ganhos p o r m e i o do desvio subreptício das pedras ou do metal (o que podia t a m b é m , ao final, levá-los à alforria). Era isso, c o m toda probabilidade, que fazia c o m que — apesar do regime duro e das condições de trabalho e x t r e -m a -m e n t e penosas — "quase todos [os escravos preferisse-m] a extração dos diamantes ao serviço de seus d o n o s " . (DD, p. 16).

Em suma, o quadro da organização do trabalho na mineração traçado pelo Viajante tem algumas similaridades c o m o sistema de plantation (especialmente no caso dos diamantes), mas t a m b é m discrepâncias i m -portantes. Existia o trabalho em equipes sob a vigilância do feitor; mas a coerção estava mais voltada a inibir os furtos do que a maximizar o r i t m o e a intensidade do trabalho dos cativos. De fato, os senhores b r a n d i a m u m a mistura de incentivos e de ameaças de p u n i ç ã o , no propósito de maximizar a p r o d u ç ã o líquida (ou seja, a p r o d u ç ã o total m e n o s as perdas decorrentes de furtos). De sua parte, os escravos tentavam

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maximizar seus próprios ganhos: u m a mistura das recompensas recebidas e do resultado dos furtos que tivessem a habilidade de efetuar.

Assim, pelo visto, as relações senhor-escravo não eram, na mineração, dominadas pela violência unilateral. C o m efeito, se Saint-Hilaire faz m e n ç ã o , nesse caso, a punições físicas severas, não fala p r o p r i a m e n t e de maus tratos, de crueldades praticadas no dia-a-dia da vida dos cativos ( c o m o fará depois, no caso de alguns engenhos de açúcar).

O escravo na cana-de-açúcar

Da agricultura típica de exportação, Saint-Hilaire só viu, pratica-m e n t e , a da cana-de-açúcar. O café apenas então estava c o pratica-m e ç a n d o sua vigorosa expansão pelo Vale do Paraíba, e ele menciona isso de passagem, duas ou três vezes.1 2

Q u a n t o à cana-de-açúcar, o naturalista viu plantações e e n g e n h o s , de vários tamanhos, em todas as províncias que percorreu. Os melhores e n g e n h o s eram os fluminenses, e m b o r a seu processo de fabricação de açúcar lhe parecesse — c o m o aliás o da generalidade dos e n g e n h o s brasileiros — desatualizado e p o u c o eficiente (MG, p.26; D D , p. 200). A m a i o r concentração de p r o d u ç ã o açucareira, nas regiões que visitou, estava nas vizinhanças da cidade de C a m p o s , o n d e havia cerca de 400 e n g e n h o s (DD, p. 199).

O t r a t a m e n t o dos escravos pelos senhores de e n g e n h o , nessa região, i m p r e s s i o n o u - o m u i t o mal. J á p e r n o i t a n d o n u m e n g e n h o , p e r t o d e Saquarema, em sua viagem r u m o a Campos, fora alojado j u n t o à moenda, e mal pudera d o r m i r por causa do b a r u l h o do mecanismo, do vozerio dos escravos " e , mais fatigantes ainda, dos gritos dos feitores que a m e a -çavam incessantemente os escravos". (DD, p. 147). Mas, foi p e r t o de C a m p o s q u e o rigor e crueldade dos donos de escravos o surpreendeu:

1 2 N o s a r r e d o r e s d e M a c a é , n a p r o v í n c i a d o R i o d e J a n e i r o , v á r i o s p r o p r i e t á r i o s d e e n g e n h o s h a v i a m a b a n d o n a d o a c a n a p e l o c u l t i v o d o c a f é , q u e e x i g i a m e n o s b e n -f e i t o r i a s e m e n o s e s c r a v o s , e s e d a v a b e m n a r e g i ã o . N o v a l e d o P a r a í b a p a u l i s t a , n a r e g i ã o d e G u a r a t i n g u e t á , o s n o v o s f a z e n d e i r o s d e c a f é p r o s p e r a v a m , h a v e n d o n o t í c i a d e a l g u n s q u e p o s s u í a m a t é 1 0 0 m i l p é s . V i v i a m , e m g e r a l , d e f o r m a m o d e s t a , n ã o e d u c a v a m o s f i l h o s ; p a r e c i a m - l h e ( a o c o n t r á r i o d o s h a b i t a n t e s d e M i n a s ) i g n o r a n t e s e p o u c o i n t e l i g e n t e s ; e t e n d i a m a r e i n v e s t i r t o d o s e u l u c r o n a c o m p r a d e m a i s e s -c r a v o s , a f i m d e a u m e n t a r e m s u a s p l a n t a ç õ e s . P e r t o d e J a -c a r e í , o n d e h a v i a p o u -c o n ã o s e q u e r i a s a b e r s e n ã o d e c u l t i v a r a l g o d ã o e c r i a r p o r c o s , p l a n t a v a - s e a g o r a m u i t o c a f é ( D D , p . 1 8 5 e s e g s . ; S V , p . 9 3 , 1 0 0 e s e g s . ) .

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"Poder-se-ia supor q u e em C a m p o s , o n d e os proprietários não se e n v e r g o n h a m de se entregar aos trabalhos agrícolas manuais, os escravos, tornados de qualquer m o d o companheiros do h o m e m livre, fossem tratados c o m doçura; mas infelizmente tal não se dá. Q u e r e m fazer açúcar cada ano mais, e assim sobrecarregam os negros de tra-balho, sem se inquietar c o m o prejuízo que ocasionam a si próprios, abreviando a existência desses infelizes". (DD, p.201).

Verificou existirem, na área,"várias fazendas o n d e se v ê e m escravos doentes em conseqüência dos maus tratos recebidos, ao m e s m o t e m p o que há sempre pessoas à procura de escravos, evadidos em conseqüência da insuportável vida que levam". (DD, p. 201.). N ã o havia qualquer cuidado para c o m as escravas que tivessem dado à luz: logo após o parto, "eram obrigadas a trabalhar nas plantações de cana, sob um sol abrasador", o que fazia c o m que seus filhos tivessem uma alimentação defeituosa; e Saint-Hilaire perguntava:"como p o d e r i a m as pobres criancinhas resistir às cruéis misérias c o m que a avareza dos brancos cercava seus berços?"

(ibid).

Muitas fazendas, nessa área, adotavam o sistema tradicional de dar aos escravos, além do d o m i n g o , um dia adicional para plantarem suas roças e c o m isso produzirem seu p r ó p r i o sustento — em lugar de for-necer-lhes refeições diárias. (Em um dos maiores engenhos de C a m p o s , os escravos t i n h a m de fato não mais do que três dias p o r quinzena para cultivar o necessário a sua subsistência1 3). O viajante c o n d e n o u o siste-ma c o m o desusiste-mano para c o m "os negros recém-chegados da costa da África, para os preguiçosos, os viciados, aqueles enfim, verdadeiramente numerosos, aos quais não é possível induzir à previdência". (DD, p. 202).1 4 1 3 S u r p r e e n d e n t e m e n t e , o a d m i n i s t r a d o r d e s s a f a z e n d a g a b o u - s e a S a i n t - H i l a i r e d e q u e , c o m três d i a s d e c u l t i v o p r ó p r i o p o r q u i n z e n a , s e u s e s c r a v o s p o d i a m m e s m o p r o d u z i r e x c e d e n t e s p a r a v e n d a , a p o n t o d e a l g u n s d e l e s t e r e m , e l e s p r ó p r i o s , c o m p r a d o e s c r a v o s . ( D D , p . 2 0 9 ) . 1 4 £ i n t e r e s s a n t e n o t a r q u e v á r i o s o b s e r v a d o r e s d a é p o c a j u l g a r a m q u e a a d o ç ã o d e s -s e -s i -s t e m a — a -s v e z e -s v i -s t o , m o d e r n a m e n t e , c o m o u m a " c o n q u i -s t a " d o -s e -s c r a v o -s — d e c o r r i a d o p r o p ó s i t o d e m i n i m i z a r o c u s t o d e a l i m e n t a ç ã o d o s e s c r a v o s , e t e n d i a a p e n a l i z á l o s , e m l u g a r d e o s f a v o r e c e r . V e j a s e , p o r e x e m p l o , a s o b s e r v a ç õ e s d e K o s t e r a r e s p e i t o : o f e r i a d o a o s s á b a d o s n ã o b a s t a v a p a r a v i a b i l i z a r o a u t o -s u -s t e n t o d o -s e -s c r a v o -s , a m e n o -s q u e e l e -s d e d i c a -s -s e m a i -s -s o t a m b é m o -s d o m i n g o -s e o s n u m e r o s o s d i a s s a n t o s — q u e d e o u t r a f o r m a s e r i a m d i a s d e f o l g a . O u s e j a , o s e s c r a v o s c l a r a m e n t e s a í a m p e r d e n d o ( v . K o s t e r , 1 8 1 6 , p . 4 2 8 ) . A l i á s , a q u e l e s i s t e m a

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É interessante especular sobre a razão q u e fez um observador atilado (embora preconceituoso) c o m o Saint-Hilaire alimentar a expectativa ingênua de que os escravos fossem b e m tratados no vale do Paraíba, p o r serem aí " d e qualquer m o d o c o m p a n h e i r o s do h o m e m livre".

C a b e lembrar, em primeiro lugar, que, q u a n d o o Naturalista percorreu a zona fluminense do açúcar, no s e g u n d o semestre de 1818, já estava no Brasil havia mais de dois anos; nesse período, viajara principalmente por Minas Gerais, durante cerca de quinze meses. T i n h a m u i t o em m e n t e , assim, u m a comparação entre o que vira antes e que estava v e n d o agora. Ao dizer que os fluminenses não se envergonhavam do trabalho braçal, fazia um contraste c o m as atitudes que observara entre os m i n e i -ros. Na zona mineratória, o n d e os senhores "apenas vigiam os escravos e nada trabalham" — c o m o se viu acima — os tarefas manuais e r a m vistas c o m o coisa de escravo, abaixo da dignidade do h o m e m branco, do proprietário. Exercer tais tarefas era vergonhoso: "tal é o sentido de vergonha dado a certos trabalhos que, para pintar a pobreza de um h o m e m livre, diz-se que ele não dispõe de n i n g u é m para ir buscar-lhe um balde de água [...,]" (DD, p.33).1 5 M a s , o m e s m o não era verdade, julgava ele, na área rural fluminense. P e r t o de C a b o Frio, por exemplo, "os brancos, que f o r m a m quase toda a população, entregam-se sem a c a n h a m e n t o a serviços q u e um mineiro olharia c o m o desonrosos", c o m o buscar água e lenha ou carregar cargas. Ele atribuiu essa atitude, g e n e r a l i z a d a m e n t e , a t o d o s os fluminenses daquela área. Visitando, p r ó x i m o de C a m p o s , u m a grande fazenda que fora dos jesuítas, então em decadência, acreditava que sua inevitável repartição em pequenas propriedades seria benéfica, pois nessa região "o p e q u e n o proprietário não se acanha de trabalhar". (DD, p. 169, 207).

A parte dessas diferenças culturais, é i m p o r t a n t e notar u m a outra. Trata-se do fato de que foi na região de C a m p o s que Saint-Hilaire se viu, pela primeira vez, perante um autêntico sistema de plantation, c o m

j á f o r a , m a i s d e u m s é c u l o a n t e s , v e r b e r a d o p e l o j e s u í t a B e n c i , p e l a m e s m a r a z ã o : p r e t e n d e r q u e o s e s c r a v o s p l a n t a s s e m p a r a c o m e r s i g n i f i c a v a o b r i g á - l o s a n ã o g u a r d a r d o m i n g o s e d i a s s a n t o s , e e r a p o r t a n t o p e c a m i n o s o . " S e p o r faltar c o m o s u s t e n t o d o s e s c r a v o s , o s o b r i g a i s a p r o c u r á - l o n o s d o m i n g o s e d i a s s a n t o s : n ã o v e d e s q u e p e c a i s g r a v e m e n t e , c o n t r a o T e r c e i r o M a n d a m e n t o d a L e i d e D e u s ? " ( B e n c i , 1 9 5 4 [ 1 7 0 0 ] , p . 3 8 ) . 1 5 P e r c o r r e n d o a r e g i ã o m e t a l ú r g i c a , S a i n t - H i l a i r e h a v i a a v i s i a d o a l g u n s h o m e n s b r a n c o s g a r i m p a n d o o u r o , o q u e o l e v o u a c o m e n t a r : " S ó a p o b r e z a p o d e r i a t ê - l o s f e i t o c a l c a r o p r e c o n c e i t o q u e , p r i n c i p a l m e n t e n e s s a p a r t e d a p r o v í n c i a [ d e M i n a s ] , c o n d e n a à o c i o s i d a d e o s h o m e n s d a n o s s a r a ç a " . ( M G , p . 1 1 9 ) .

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a característica forma de organização do trabalho a ele associada. Ou melhor, foi aí que ele se deparou, pela primeira vez, c o m u m a área em que esse sistema era preponderante, na organização da atividade produtiva. Isto era algo que não tinha visto em M i n a s — n e m , de fato, veria p o s t e -r i o -r m e n t e . É plausível supo-r, assim, q u e sua su-rp-resa, ao testemunha-r relações senhor-escravo baseadas p r e d o m i n a n t e m e n t e na coerção, na zona açucareira do R i o , decorria de que isso era uma novidade para ele. Ele já tinha visto, e veria ainda, grandes fazendas c o m e n g e n h o s de açúcar. Mas, em n e n h u m a outra área que visitou, a escravidão estava acompanhada dos outros dois elementos do t r i n ô m i o famoso — lati-fúndio, m o n o c u l t u r a — c o m o na região de C a m p o s .

É significativo que não se repitiu qualquer m e n ç ã o de Saint-Hilaire a maus tratos de escravos empregados na agricultura, fora da área dos grandes engenhos do Vale do Paraíba fluminense. Ao contrário, q u a n d o o Viajante escreveu algo a respeito, havia elogios. E m e s m o na área de C a m p o s , havia exceções. O g u a r d a - m o r A n t ô n i o Feliciano, d o n o de u m a m o e n d a e de u m a destilaria de cachaça (onde adotara "meios excelentes para diminuir a m ã o - d e - o b r a " ) , p e r t o de Vila do Príncipe, "parecia tratar c o m muita b r a n d u r a " seus escravos. O capitão-mor Francisco P i n t o , " h o m e m inteligente e b o m agricultor", que seguia os m é -todos de administração introduzidos na região pelos jesuítas, "tratava seus negros c o m h u m a n i d a d e " , em sua p r o p r i e d a d e p e r t o de Vitória, no Espírito Santo, o n d e plantava cana-de-açúcar e algodão. Aí, durante o primeiro ano após o parto, a escrava "ficava em casa tecendo algodão e a m a m e n t a n d o o filho recém-nascido". O c o m a n d a n t e J o a q u i m Alves, de M e i a - P o n t e (hoje Pirenópolis), em Goiás, que vendia algodão para o R i o e a Bahia, e produzia açúcar e cachaça para c o n s u m o na Província, adotava a n o r m a de alimentar e vestir b e m os escravos, tratá-los q u a n d o doentes — e jamais deixá-los ociosos. Em sua fazenda, as mães t a m b é m eram dispensadas de trabalhar nas plantações e n q u a n t o amamentavam os filhos; depois, as crianças ficavam todas a cargo de u m a só escrava. (MG, p.166; ES, p. 48; G O , p. 9 8 - 9 9 ) . Essa ausência de referências — quando se considera que o Naturalista sempre foi tão veemente na c o n -denação dos maus tratos que presenciou —, constitui um indício forte de que ele efetivamente não tenha chegado a ver, ao m e n o s na agricul-tura, outros exemplos de formas r i g i d a m e n t e coercitivas de escravidão.

Em Minas Gerais — o n d e se estimou haver, na época, cerca de mil e n g e n h o s1 6 — os relatos de Saint-Hilaire registram sua passagem por

1 6 C o s t a F i l h o , 1 9 6 3 , p . 3 0 7 .

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muitos deles. Todos, ou quase todos, eram tecnicamente inferiores aos e n g e n h o s fluminenses. Estes t i n h a m os cilindros da m o e n d a revestidos de chapas de ferro, e n q u a n t o que nos e n g e n h o s mineiros os cilindros eram de madeira; ele viu, em Minas, um só e n g e n h o — no atual m u n i -cípio de Itabira — c o m aquele tipo de revestimento (MG, p. 65; D D , p. 56; Costa Filho, 1963, p. 242). E eram, em sua maioria, engenhos p e -quenos, muitos deles fabricando apenas rapadura ou cachaça (o q u e envolve m e n o s investimentos e m ã o - d e - o b r a do que o fabrico de açúcar). Os d o n o s de e n g e n h o s vizinhos da zona mineratória, principalmente, achavam mais lucrativo dedicar-se à produção de cachaça, dado o grande c o n s u m o p o r parte dos escravos da mineração (MG, p. 167). Poucos e n g e n h o s mineiros eram movidos a água; a maioria, à força de bois.

De fato, entre os inúmeros engenhos de Minas que m e n c i o n o u , poucos teriam sido chamados por Antonil de "engenhos reais".1 7 Seriam c e r t a m e n t e dignos dessa classificação o e n g e n h o de Itabira, na fazenda do Sr. D o m i n g o s Afonso ("uma das mais importantes da Província", c o m 130 escravos); o da fazenda Itanguá, p e r t o de Vila do Príncipe (Serro); e talvez o da fazenda Santo Elói, p e r t o de Formigas (Montes Claros). M a s , devese notar que, nessas fazendas — c o m o , aliás, na g e n e -ralidade das propriedades agrícolas de Minas q u e o A u t o r descreve —, não se praticava a m o n o c u l t u r a . Exploravam-se, para geração de renda, t a m b é m outras linhas de atividade agrícola (além, é claro, da produção para a u t o c o n s u m o , universalmente disseminada). A fazenda de D o -mingos Afonso, c o m seus 130 escravos, produzia t a m b é m milho, vendido aos tropeiros e viajantes numa venda próxima,"uma das mais importantes [da] r e g i ã o " ; a de Itanguá tinha t a m b é m um e n g e n h o para extração de óleo de m a m o n a , movido a roda d'água (o que sugere escala de produção comercial); e o respeitável r e n d i m e n t o que a fazenda de Santo Elói proporcionava a seu proprietário provinha não só do açúcar, c o m o da criação de gado. (DD, p. 56; M G , p . 1 9 8 - 9 9 , 3 2 4 - 2 5 ) . No que se refere ao t r a t a m e n t o dado aos escravos, Saint-Hilaire não e n c o n t r o u nessas fazendas, q u e descreve c o m certo detalhe, nada que julgasse digno de m e n ç ã o . Indício de que não havia n e m coerção rigorosa, n e m b e n e -volência especial.

Em São Paulo, o n d e a cana-de-açúcar se difundira m u i t o nos anos precedentes — primeiro na região de Itu, depois em Campinas e Jundiaí —, os e n g e n h o s eram, regra geral, de p e q u e n o p o r t e . O A u t o r foi i n f o r m a d o de que as cidades de Itu, Jundiaí, Campinas, Sorocaba, Porto

1 7 C f . A n t o n i l 1 9 8 2 [ 1 7 1 1 ] , p . 6 9 .

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Feliz e a paróquia de Piracicaba t i n h a m exportado, em conjunto, 300 mil arrobas de açúcar em 1818. D a d o que apenas em Campinas e Itu havia cerca de 200 e n g e n h o s (e que um e n g e n h o de vinte escravos podia produzir 2 mil arrobas p o r ano), isso indica a existência de um grande n ú m e r o de p e q u e n o s e n g e n h o s na região (SP, p. 1 0 0 , 1 7 5 , 1 8 0 ) . Em Campinas, "as propriedades que à época de m i n h a viagem eram consideradas importantes empregavam cerca de vinte escravos." (SP, p. 110). O quadro que isso sugere é de u m a organização da produção açucareira distinta da do regime de plantation das grandes propriedades. Mas, o que mais surpreende nos relatos do A u t o r — à luz do paradig-ma corrente na literatura sobre a produção escravista de açúcar — é a referência a u m a categoria de engenhos de natureza diametralmente oposta à dos usualmente descritos: a dos e n g e n h o s " p o b r e s " , o n d e proprietários de p o u c o s recursos cultivavam e processavam a cana, em escala modesta, e tinham um nível de vida que não estava m u i t o distante do de seus próprios escravos. Em Goiás, dirigindo-se às termas de Caldas, Saint-Hilaire relata:

"Depois de ter p e r c o r r i d o 4 léguas a partir do Sítio de G r e g ó r i o N u n e s , parei n u m a propriedade denominada Sítio de Francisco Alves. Havia ali um e n g e n h o - d e - a ç ú c a r ao ar livre, c o m o são geralmente os dos colonos de poucas posses, e uma dúzia de casinhas esparsas. U m a delas pertencia ao proprietário e as outras eram habitadas p o r escravos e agregados. Todas, p o r é m , t i n h a m u m a aparência igualmente miserável, sendo impossível distinguir a do d o n o . Os trajes dos m o -radores desses humildes casebres c o m b i n a v a m perfeitamente c o m a miséria que eles indicavam. O mais b e m vestido trazia apenas calções de algodão e u m a camisa do m e s m o tecido, traje habitual dos h a b i -tantes mais pobres do i n t e r i o r do Brasil". ( G O , p. 110)

Nada poderia ser mais afastado do quadro da sociedade patriarcal do açúcar, tão a m p l a m e n t e retratado nos livros de Gilberto Freyre. O relevante, aqui, é que esse não era um caso isolado, mas sim um exemplo extremo de u m a realidade bastante encontradiça nas regiões percorridas pelo A u t o r ( c o m o se verá abaixo): a da p r o d u ç ã o agrícola escravista, c o m fins comerciais, fora do sistema de plantation.

Na mesma região, p r ó x i m o do rio Paranaíba, o Naturalista d e p a r o u -se c o m outro exemplo disso, aparentemente n u m nível superior de p r o d u t i v i d a d e :

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"Ainda nas proximidades do [Sírio do R i a c h o ] , passei diante da Fazenda dos Casados, o n d e há um e n g e n h o - d e - a ç ú c a r . Ao redor da casa se agrupavam várias outras, p e r t e n c e n t e s aos agregados [...] Desnecessário é dizer que a casa do proprietário diferia p o u c o das outras, e m e s m o da senzala. Essa forma de igualdade, generalizada nessa parte da Província, nada provava senão uma uniforme rusticidade de hábitos. Os tropeiros e n c o n t r a m nessa fazenda as provisões de que necessitam, mas um m e r c a d o tão precário não seria suficiente, dada a i m p o r t â n c i a da propriedade. Seu d o n o enviava t a m b é m a Araxá açúcar, cachaça e outros produtos, em l o m b o de burro. A viagem não levava mais que doze dias". ( G O , p. 123)

T a m b é m na região da Serra da Mantiqueira, p e r t o da divisa entre Minas e São Paulo, o A u t o r refere-se a o u t r o " e n g e n h o p o b r e " ;

" M u i t o t e m p o antes de se alcançar a R a i z da Serra, passa-se p o r u m a casinhola. Aquela o n d e paramos é a primeira que se vê logo em seguida. D e r a m - n o s pousada n u m a construção m e i o desabrigada, mas nada temos que nos queixar, pois o nosso hospedeiro não está mais b e m instalado, e m b o r a possua negros e até um e n g e n h o de açúcar". (SV, p. 69)

O escravo em outras formas de agricultura

A grande maioria das fazendas mencionadas p o r Saint-Hilaire, na vasta região p o r ele percorrida, dedicavam-se a várias formas de cultivo e criação ( m e s m o se se consideram apenas as atividades que geravam p r o d u t o s comerciáveis). Isso é particularmente verdade para Minas G e -rais, a Província por o n d e viajou mais d e m o r a d a m e n t e . Nessas fazendas, ele viu escravos empregados em vários tipos de plantação além da de cana-de-açúcar: na de milho, mandioca, arroz, algodão, feijão, trigo, frutas e l e g u m e s .

Inúmeros fazendeiros c o m propriedades próximas a estradas plantavam m i l h o para venda aos viajantes e tropeiros, para alimento de seus animais. Era c o m u m que estabelecessem vendas à beira da estrada — o n d e em geral n ã o se oferecia mais do q u e m i l h o e cachaça — e ao lado delas, c o m o chamariz, construía-se um rancho, no qual os viajantes p o d i a m p e r n o i t a r sem custo. Foi, no mais das vezes, pousando em ranchos desse tipo que Saint-Hilaire percorreu seus 15 mil quilômetros pelo Brasil. Em certas localidades mais isoladas, o p o d e r de m o n o p ó l i o era

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piamente explorado, e o preço do milho subia m u i t o acima do praticado nas povoações, o que sugere que o negócio podia prover lucros subs-tanciais para seus produtores.

O escravo c o m q u e m manteve o diálogo, que tanto o impressionou, sobre o estado de espírito dos cativos (veja-se acima na p. 13), cuidava de uma plantação de milho, próxima à estrada e afastada da casa de seu senhor, e dormia, sozinho, n u m a choupana em m e i o ao milharal (MG, p. 53). Isso dpifica as condições de trabalho de grande parte da m ã o d e -obra escrava aplicada à produção do milho. Essa cultura não se coadunava, em geral, c o m o sistema de trabalho quase de "linha de m o n t a g e m " , característico do regime de plantation. Semeado em setembro, o m i l h o não exigia muitos cuidados até a colheita, em abril: em geral apenas u m a capina em o u t u b r o , outra em janeiro (quando se plantava j u n t o o feijão), e u m a final um mês mais tarde. A debulha era manual ou s e m i -manual, nos "batedores" (MG, p. 106). Nada q u e prendesse os escravos, ao longo do ano, n u m ciclo c o n t í n u o de atividades intensivas em esforço, c o m o era o caso nos e n g e n h o s e nos cafezais típicos (Versiani, 1994).

Vários exemplos do uso de escravos no cultivo do m i l h o p o d e m ser encontrados nos relatos do Naturalista. Por exemplo, p e r t o de Santa Bárbara, em Minas, ele viu escravos plantando m i l h o n u m c a m p o a d u -b a d o c o m esterco de gado, o que era excepcional e c h a m o u sua atenção (o proprietário tinha 700 cabeças de gado, e desenvolvera uma técnica simples de uso do estrume). As margens do Araçuaí, u m a plantação de milho e feijão, c o m duzentos escravos, fora destinada a fornecer alimentos para os escravos de u m a exploração de diamantes (MG, p. 92, 301).

Na Z o n a da Mata mineira, p e r t o de Aiuruoca, ele assinalou que a p r o d u ç ã o de m i l h o e feijão, c o m utilização de m ã o - d e - o b r a escrava, e m b o r a se destinasse ao c o n s u m o local, relacionava-se à principal atividade geradora de renda da região: a criação de gado e de porcos, para possibilitar a venda de derivados, queijo e toicinho, no R i o de Janeiro:1 8

"Entre S.João e Aiuruoca colhem-se principalmente milho e feijão; mas os gêneros não saem da região. A criação de gado e porcos

1 8 É i n t e r e s s a n t e n o t a r q u e essa p a s s a g e m d e S a i n t - H i l a i r e s u b s t a n c i a u m a h i p ó t e s e c o l o c a d a p o r S l e n e s : a d e q u e p a r t e d a m ã o - d e - o b r a e s c r a v a d o s é c u l o X I X , e m M i n a s , e s t a v a e n g a j a d a n u m a p r o d u ç ã o a g r í c o l a q u e , e m b o r a n ã o f o s s e d i r e t a m e n t e e x p o r t a d a para f o r a d a P r o v í n c i a , s e r v i a d e i n s u m o p a r a p r o d u t o s e x p o r t a d o s — c o m o o t o i c i n h o e o s q u e i j o s — e e r a , p o r t a n t o , i n d i r e t a m e n t e , u m a a t i v i d a d e d e p e n d e n t e d a d e m a n d a e x t e r n a ( S l e n e s , 1 9 8 5 ) .

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forma a principal o c u p a ç ã o dos agricultores e quase que sua única fonte de renda. Cada qual possui u m a tropa de burros e envia ao R i o de Janeiro [toucinho] e queijos. Na paróquia de Aiuruoca e arredores, [...] os escravos estão para os h o m e n s livres na proporção de um para três. Os escravos são c o m efeito m u i t o m e n o s necessários na região o n d e se cria g a d o do que naquelas em que se cultiva a cana-de-açúcar e o n d e se lavra o o u r o " . (SV, p. 54)

Em outras culturas comerciais, c o m o a do algodão, o A u t o r teste-m u n h o u igualteste-mente o e teste-m p r e g o de teste-m ã o - d e - o b r a escrava. C o teste-m o n u teste-m a fazenda na região de Peçanha, Minas Gerais, o n d e o p r o d u t o era vendido a comerciantes de Vila do Príncipe e de outras localidades, pago " e m dinheiro à vista" ( M G , p. 172). Ou na já citada propriedade do c o m a n -dante J o a q u i m Alves, p e r t o de M e i a - P o n t e , em Goiás, o n d e o algodão p r o d u z i d o era e x p o r t a d o para o R i o de Janeiro e para a Bahia (e o n d e o C o m a n d a n t e m a n t i n h a u m a venda c o m quinquilharias de agrado dos negros, a serem trocadas pelo algodão que estes produziam nos domingos — um m o d o e n g e n h o s o de mantê-los produtivos em seus dias de folga) ( G O , p. 9 8 - 9 9 ) . Naquela época, o cultivo do algodão, similarmente ao do m i l h o ou do feijão, n ã o exigia u m a organização de p r o d u ç ã o no regime de plantation. O algodoal requer p o u c o trato: u m a limpa de seis em seis meses, que; m e s m o assim, era um trabalho "feito c o m pouca canseira, pois em lugar de revolver a superfície do solo, c o m o se faz nos campos de m i l h o e trigo, c o n t e n t a m s e em cortar rente as ervas d a n i -nhas." (MG, p. 172). Dessa forma, podia-se e c o n o m i z a r m ã o - d e - o b r a escrava, usando-a s i m u l t a n e a m e n t e no cultivo do algodão, do feijão e do milho. " U m n e g r o encarregado de cuidar do espaço de t e r r e n o plantado de algodoeiros, que se semearia c o m um alqueire de milho, p o d e , ao m e s m o t e m p o , cultivar u m a igual extensão de terra em m i l h o e feijão." (ibid).

Em outras propriedades os escravos trabalhavam n u m a mistura mais complexa de cultivos, envolvendo rotação. Na fazenda do c a p i t ã o - m o r Francisco Pinto, no Espírito Santo — que, c o m o m e n c i o n a d o , tratava seus escravos " c o m h u m a n i d a d e " —, alternava-se algodão, cana-de-açúcar associada a milho e feijão, e algodão. Aí o Viajante viu escravos de ambos os sexos envolvidos n u m plantio de mandioca: os escravos preparavam o terreno, cavando b u r a c o s o n d e as escravas enterravam talos da planta (ES,p. 4 9 - 5 4 ) .

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