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WALÉRIA BATISTA DA SILVA VAZ MENDES

CULTURA SURDA E JOVENS:

DESAFIOS E IMPASSES NO ESPAÇO ESCOLAR

Orientadora: Prof.ª Dra. Maria Tereza Canezin Guimarães.

GOIÂNIA – GO 2012

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS

PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU EM EDUCAÇÃO

WALÉRIA BATISTA DA SILVA VAZ MENDES

CULTURA SURDA E JOVENS:

DESAFIOS E IMPASSES NO ESPAÇO ESCOLAR

GOIÂNIA – GO 2012

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em

Educação da Pontifícia Universidade Católica de Goiás como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Educação, sob a orientação da Profa. Dra. Maria Tereza Canezin Guimarães.

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Mendes, Waléria Batista da Silva Vaz.

M358c Cultura surda e jovens [manuscrito]: desafios e impasses no espaço escolar / Waléria Batista da Silva Vaz Mendes. – 2012.

140 f. ; il.; 30 cm

Dissertação (mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Departamento de Educação, 2012.

“Orientador: Profa. Dra. Maria Tereza Canezin Guimarães”.

1. Surdos – cultura. 2. Surdos – integração social. 3. Surdos – educação. I. Título.

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FOLHA DE APROVAÇÃO

WALÉRIA BATISTA DA SILVA VAZ MENDES

CULTURA SURDA E JOVENS: DESAFIOS E IMPASSES NO ESPAÇO ESCOLAR.

Aprovada em __________ de__________________ 2012

BANCA EXAMINADORA

... Profa. Dra. Maria Tereza Canezin Guimarães (PUC/Goiás)

... Profa. Dra. Neuma Chaveiro (UFG)

…... Prof. Dr. Romilson Martins Siqueira (PUC/Goiás)

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em

Educação da Pontifícia Universidade Católica de Goiás como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Educação, sob a orientação da Profa. Dra. Maria Tereza Canezin Guimarães.

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Dedico este trabalho ao meu marido, Sérgio Vaz Mendes, cuja surdez me inspirou a buscar as respostas que este trabalho indaga. Às minhas filhas Isabella e Isadora, que não me acusaram no seu silêncio e sempre me aguardaram com sorrisos largos. Aos meus pais, Francisco Divino da Silva e Maria Batista da Silva, que nunca desanimaram

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AGRADECIMENTOS

Ao Programa de Pós-graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-Goiás), pela acolhida.

À professora Doutora Maria Tereza Canezin Guimarães, pela amizade, sabedoria, paciência e determinação com que me orientou nesses dois anos e meio.

À professora Albertina Vicentini, pela acurada revisão.

Aos colegas da turma 2010 do Curso de Mestrado em Educação, pela confiança e espírito de ajuda.

Aos componentes da banca examinadora, professores doutores Maria Tereza Canezin Guimarães, Neuma Chaveiro e Romilson Martins Siqueira, pela dedicação, revisão, interlocução e sugestões.

À Escola Estadual Colemar Natal e Silva, pelo apoio, confiança e estímulo à pesquisa.

À minha sobrinha Lídia e às minhas irmãs Valdirene, Valcilene, Valníria e Wiviany, que bondosamente fizeram as primeiras leituras de minha produção.

Ao amigo Lucas Faria que de forma fraternal se dispôs a fazer a tradução necessária na dissertação.

E aos jovens surdos que prontamente se colocaram como interlocutores de minha busca por respostas.

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“Eu mesmo tenho frequentemente lembrado que, se existe uma verdade, é que a

verdade é um lugar de lutas.”

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RESUMO

Esta dissertação de mestrado faz parte da linha de pesquisa Educação, Sociedade e Cultura do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação (PPGE) da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC Goiás). Analisa um agrupamento de onze jovens surdos do Ensino Fundamental, no espaço educativo da Escola Estadual Colemar Natal e Silva, situada no Setor Aeroporto, em Goiânia – GO, buscando apreender as suas características enquanto grupo com modo de vida (habitus e estilo de vida), num movimento de afirmação de uma cultura específica – a Cultura Surda. Utiliza os métodos da pesquisa qualitativa, como observação direta, entrevistas individuais e grupo de debates. O seu referencial teórico principal é constituído dos seguintes autores: Pierre Bourdieu (1998), Canezin Guimarães (2002), (2007) e (2008),Veiga-Neto (1992), (2002), Hall (1990), (1992),(2000) e (2005) e Wrigley (1996); Silva (1997) e (2003), Behares (2000), Skliar(1998), Sá (1999), (2004) e Perlin (2006-2009). Apresenta a realidade dos alunos a partir de sua classe social, espaço, condição juvenil e língua e discute os múltiplos processos de representação e marginalização que são impostos e constituem a comunidade surda, especialmente em relação à família, à escola, à autopercepção de si, aos movimentos de luta por direitos sociais e jurídicos, às redes sociais das novas tecnologias da informação, entre outros. Ênfase especial é dada à importância da Língua de Sinais nos relacionamentos, na constituição das identidades surdas, e, principalmente, na elaboração de uma Cultura Surda.

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ABSTRACT

This dissertation is part of the research Education, Society and Culture of Post- Graduation Program Stricto Sensu in Education, of Pontificia Universidade Catolica de Goias (PUC Goiás). Analises a gathering of eleven (11) deaf youngsters, in the educational space of the school, Escola Estadual Colemar Natal e Silva, situated in Setor Aeroporto, im Goiania- Goias, seeking to apprehend their characteristiscs as groups in a lifestyle (habitus and lifestyle), in an afirmation movement of a specific culture – the Deaf Culture. Using qualitative researching methods, as direct observation, individual interviews, and group debates. Its theoretical referencial is costituted of the following authors: Pierre Bourdieu (1998), Canezin Guimarães (2002), (2007) and (2008),Veiga-Neto (1992), (2002), Hall (1990), (1992),(2000) and (2005) e Wrigley (1996); Silva (1997) and (2003), Behares (2000), Skliar(1998), Sá (1999), (2004) and Perlin (2006-2009). Shows the reality of the students by their social class, space, juvenil condition and tongue, also discusses the multiple processes of representation and marginalization that are imposed and as well part of the deaf comunity, specially related to family, school, self-perception, the fight movements for social and legal rights, to the social networks for new information between others. Special emphasis is given to the importance of the Sign Language in the relationships, deaf identity constitution, and mainly, in development of a Deaf Culture.

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SUMÁRIO

RESUMO 07

ABSTRACT 08

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS 11

INTRODUÇÃO 12

CAPÍTULO I – JOVENS SURDOS NO ESPAÇO ESCOLAR 21

1.1 - Aspectos da Juventude. 21

1.2 - Escola como espaço social de convivência dos jovens surdos. 28

1.3 - Ser Surdo: uma identidade? 35

1.4 - Compondo os traços identificatórios dos jovens surdos pesquisados. 39

CAPÍTULO II – CULTURAS E CULTURA SURDA: IDENTIDADE, LINGUAGEM E

HABITUS 49

2.1 - O Papel da Língua de Sinais na Constituição Social dos Surdos. 53 2.2 - Cultura e culturas: há especificidades na Cultura Surda? 56

2.3 - A Cultura Surda e a questão da diversidade. 61

2.4 - A Importância dos Estudos Culturais para a compreensão de uma Cultura Surda. 65

CAPÍTULO III – JOVENS SURDOS EM ESCOLARIZAÇÃO E A CULTURA SURDA 71

3.1 - Relação jovem surdo e família. 71

3.2 - A Juventude surda e as marcas da deficiência. 79

3.3 - Jovens surdos: processo de inclusão e a trajetória escolar. 82 3.3.1 - O problema da distorção idade/série em jovens alunos surdos. 84 3.3.2 - O papel da Língua de Sinais nos processos educacionais do jovem surdo. 86 3.3.3 - Jovens surdos e a relação entre comunidade escolar e comunidade surda. 90 3.4 - O encontro surdo – surdo como expressão da Cultura Surda. 93 3.5 - Jovens surdos e modos de apropriação do espaço virtual como lugar de relações. 96

3.6 - Relacionamento na/com a diferença. 98

CONSIDERAÇÕES FINAIS 100

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APENDICES 116 APENDICE 1 117 APENDICE 2 119 APENDICE 3 121 APENDICE 4 123 APENDICE 5 125 APENDICE 6 137 APENDICE 7 139

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LISTA DE ABREVIATURA E SIGLAS

APNEE Alunos Portadores de Necessidades Especiais CEE Conselho Estadual de Educação

EJA Educação de Jovens e Adultos

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

L1 Primeira Língua

L2 Segunda Língua

LIBRAS Língua Brasileira de Sinais MEC Ministério da Educação e Cultura OMS Organização Mundial da Saúde PPP Projeto Político Pedagógico PUC Pontifícia Universidade Católica SEE Secretaria Estadual de Educação

SENAC Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial SENAI Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial SESI Serviço Social da Indústria

UFG Universidade Federal de Goiás

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho se propõe a investigar um agrupamento de jovens estudantes surdos como produtor de habitus e estilos de vida específicos, indagando se tal grupo é agente de uma Cultura Surda contraposta aos mecanismos vigentes de uma cultura legítima que se pauta por processos discriminatórios de exclusão social.

O meu interesse pelo tema começou quando da minha formação em Pedagogia pela Universidade Federal de Goiás (UFG), em 2001, e me levou a construir um trabalho de conclusão de curso com a temática: “Educação de Surdos: limites e perspectivas”. Durante meus estudos de pós-graduação em Psicopedagogia, ocorridos em 2003, também desenvolvi atividades de intervenção psicopedagógica junto a alunos surdos com déficit de aprendizagem e essas atividades culminaram em um artigo produzido ao final dessa especialização, intitulado “Alunos Surdos: desinteresse ou ausência de estímulos”. Em 2006, decidi cursar mais uma graduação na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC): um curso semi-presencial de Letras/LIBRAS, que me possibilitou conhecer ainda mais sobre os surdos e os seus processos de inserção social, porque trabalhamos tanto disciplinas que tratavam especificamente da Língua de Sinais quanto disciplinas que falavam do sujeito surdo e suas especificidades, como o seu processo de aquisição da linguagem, o processo de sua inclusão e sua relação com a sociedade. Antes e durante essa segunda graduação, frequentei também algumas matérias de pós-graduação stricto-sensu, tanto no Programa de Pós-Graduação do Mestrado em Educação da UFG quanto no Mestrado/Doutorado em Educação da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-Goiás), já com o firme propósito de entender melhor o universo do surdo e de cooperar nos estudos voltados a essa área.

Ainda é necessário destacar que sou professora de Língua de Sinais em universidades há mais de dez anos e também sou casada com um surdo.

Durante a realização do mestrado, de 2010 a 2012, solidificou-se em mim a possibilidade de pesquisar a Cultura Surda, sobretudo pelas discussões ocorridas na disciplina Cultura e Educação, quando surgiram as indagações: é possível falar em Cultura Surda? Será que os jovens surdos lidam com um tipo de cultura que se pode qualificar de específica? Se os jovens surdos tendem a formar agrupamentos com vínculos fortes entre seus membros, dado que essa fase da vida é um momento de decisão e de questionamentos em meio aos quais

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estão questões sobre a constituição de identidade e subjetividade na sociedade, nesses agrupamentos juvenis existe, realmente, uma Cultura Surda?

As sociedades ocidentais estão permeadas de um ideário que reafirma constantemente os indivíduos como iguais na medida em que são portadores de padrões comuns e homogêneos que se encaixam nos parâmetros pré-estabelecidos dos modelos de normalidade. É possível falar em homogeneidade em meio a tantas desigualdades e diferenças? Veiga-Neto (1996), ao expor os limites dessa afirmativa em termos dos processos culturais, afirma:

(...) falar em homogeneidade não é tanto falar em indistinção entre as partes de um todo, senão é falar de partes que se associam, se complementam, se entrechocam, se conflitam, justamente porque, de origem comum, participam, cada uma a seu modo, de um mesmo todo (p. 253) .

O entendimento de que aqueles que vivem condições similares, comuns, participam cada um a seu modo de um contexto social em movimento é, de certa forma, um ponto de partida para se pensar quem é e como se processa a formação do jovem surdo. O homem não é uma ilha, vive em sociedade, criando e recriando culturas, o que exige intermediação de suas ações como agente social. Constrói habitus, estilos de vida e exercita ou não a condição de cidadania por meio de um conjunto de práticas sociais e culturais. Em específico, a inclusão ou não dos jovens surdos em sociedade tem implicações diversas de dimensões culturais e socioeconômicas.

Em relação ao jovem surdo, reafirma o senso comum que “ele não fala”. Essa assertiva necessita ser repensada. Do ponto de vista científico, as palavras produzem sentidos e não podem ser entendidas apenas como ferramentas. Se o são, são como instrumentos da razão: “o homem não apenas utiliza as palavras, mas ele é a palavra”, diz Larrosa (2001, p.137). De outro lado, as palavras são instituintes de culturas e se realizam na construção de sentidos das práticas culturais, o que as inviabiliza de poderem ser investigadas como uma entidade em si.

Ao nosso entendimento, o jovem surdo é um ser humano multifacetado1. Quando tem acesso a uma língua, processos linguísticos e cognitivos torna-se capaz, produtivo e constituído de várias linguagens. Assim sendo, apresenta potencialidades para adquirir e desenvolver não somente processos gestual-visuais, mas também ler e (re) escrever o mundo

1 Multifacetado, ou seja, possui uma identidade multifacetada, isto é, com recortes de raça, gênero, idade, escolaridade, dentre outros. (PERLIN, 2004)

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ao seu redor. Isso significa pensar no surdo não reduzido ao chamado mundo surdo, mas como ser biopsicossocial.

Vários estudiosos, como Moura (1993, 2000), Quadros (1997), Goldfeld (1997), Sá (1999 e 2006), Skliar (1998-2000), Silva (1997 e 2003), Behares (2000 e 2004), Wrigley (1996), dentre outros, especificamente estudiosos da área dos Estudos Culturais2, reafirmam a existência de uma cultura surda, através da qual se representam valores, crenças, costumes e língua específicos de pessoas surdas.

Destarte, torna-se necessário considerar dois pontos de vista diferentes: os argumentos que postulam a existência de uma cultura surda e os que afirmam não haver subsídios suficientes para uma assertiva como essa.

As interpretações elaboradas a respeito da cultura, nos termos de Bourdieu (1998), passam pelas disputas de poder e pela capacidade de impor uma visão de mundo social pelo monopólio de formas de fazer ver as diferenças e desigualdades sociais como se fossem legítimas. O mundo social é objetivamente constituído por inúmeras representações que permeiam subjetivamente a vida dos agentes sociais. Sendo assim, tais interpretações derivam, antes de tudo, da preocupação em submeter a essa forma legítima de fazer ver os elementos do cotidiano, a partir de um recorte arbitrário.

Só que aceitar a existência de uma "cultura surda", tanto no interior da comunidade surda quanto no interior do campo de pesquisas universitário, implica também assumir uma separação entre surdos e ouvintes. Tal afirmação implicaria referendar uma

divisão social específica? Talvez. É por meio da constituição heterogênea dos grupos que se pode observar melhor a eficácia das representações que impõem esses princípios de separação social.

Para Kozlowski (2000), o surdo faz parte de uma cultura majoritária, mas, ao mesmo tempo, insere-se em uma cultura que o determina como sujeito de uma identidade específica, a surda.

O surdo seria bilíngüe e bi-cultural. O biculturalismo designa o conjunto de referências à história dos surdos, o conjunto de significações simbólicas veiculadas pelo uso de uma língua comum, o conjunto de estratégias sociais e de códigos sociais utilizados de maneira comum pelos surdos para viverem numa sociedade feita por e para os ouvintes. É, portanto, uma cultura de adaptação à diferença e produtora de elo social. A realidade e a legitimidade desta noção de cultura é objeto

2 Estudos Culturais são estudos sobre a diversidade dentro de cada cultura e sobre as diferentes culturas, sua multiplicidade e complexidade. São também estudos orientados pela hipótese de que entre as diferentes culturas existem relações de poder e dominação que devem ser questionadas. Dentre os autores que trabalham nessa perspectiva podemos destacar Silva(1997) e (2003),Behares(2000), Skliar(1998), Sá(1999),(2004), Wrigley(1996), dentre outros.

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de grandes críticas, algumas vezes com razão, porque muitos aspectos da cultura surda se apresentam mais como um sistema derivado da cultura dos ouvintes do que como uma cultura realmente original e autônoma. (KOZLOWSKI, 2000).

Skliar (1998) ressalta que o problema não é a surdez, não é os surdos, não é as identidades surdas, nem é a Língua de Sinais, mas as representações dominantes, hegemônicas e "ouvintistas" sobre as identidades surdas, a Língua de Sinais, a surdez e os surdos. Segundo esse autor, “a nossa produção é uma tentativa de inverter a compreensão daquilo que pode ser chamado de normal ou cotidiano".3 (p. 30).

Cabe ressaltar que há pesquisadores, como Bueno (1998), que criticam essa postura teórica na qual o mundo passa a ser dividido em cultura ouvinte (dominadora) e cultura surda (dominada). Na opinião do autor, a surdez não pode ser suficiente para tornar iguais dois sujeitos, como uma mulher, pobre, latino-americana, vivendo em uma pequena localidade rural e surda e um homem branco, rico, europeu, vivendo em metrópole e surdo. Não existiria cultura ouvinte e dominante, mas relações sociais contraditórias de dominação de classe, gênero e etnia, que atingem as camadas populares seja o sujeito deficiente ou não. Apesar de suas críticas à generalização do termo "multiculturalismo", o autor não aprofunda a discussão sobre se há ou não uma cultura surda e em que posição ele se coloca.

O mesmo autor ainda ressalta que o surdo não pode ser considerado excepcional nem patológico. Entretanto, sofre uma restrição (sensorial). Nesse sentido, assim como outros indivíduos pertencentes a diferentes minorias, o surdo deve ser considerado membro de uma comunidade que sofre restrições. De maneira que procura distinguir a surdez como condição e não como uma doença.

Na construção de argumentos que referenciam a existência de uma Cultura Surda, Lane (1992) ressalta que, além da língua, os surdos produzem uma literatura específica, têm uma história construída ao longo do tempo, produzem contos de fadas, fábulas, romances, peças de teatro, anedotas, jogos de mímica etc.

Esse debate aponta argumentos polêmicos e, nos seus limites, podem-se inferir certas considerações: os surdos não vivem isolados no mundo. Estabelecem redes de relações diversas e certamente enfrentam dificuldades de comunicação. Aprendem crenças, valores,

3 Um exemplo disso é dado por Sacks (1998) quando comenta a história da ilha de Martha's Vineyard, Massachusetts (EUA). Nessa ilha, em razão de uma mutação, um gene recessivo posto em ação pela endogamia, uma forma de surdez hereditária, vingou por 250 anos a partir da chegada dos primeiros colonizadores, por volta de 1690. Em função dessa situação, toda a comunidade aprendeu a Língua de Sinais, havendo livre comunicação entre ouvintes e surdos. O autor ressalta que estes quase nunca eram vistos como surdos e certamente não eram considerados de modo algum "deficientes". Mesmo depois que o último surdo morreu, em 1952, os habitantes ouvintes preservaram a Língua de Sinais entre si e passavam involuntariamente para essa língua no meio de uma sentença, ou nela contavam piadas, "conversavam" consigo e até sonhavam.

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modos de agir e sentir imbricados nos espaços sociais e culturais de que fazem parte. E, nessa perspectiva, é necessário considerar que o entendimento da existência de uma cultura surda também se traduz em luta por direitos, em resistência à reprodução das desigualdades e em tentativas de autoafirmação coletiva dos sujeitos surdos.

Partir dessa premissa supõe discordar de um tipo de discussão assentada na afirmativa de que possuir uma cultura diferente das demais, como no caso do surdo, amplia as disputas e os conflitos com os sujeitos ouvintes. Ao não se considerar que ambos – surdos e ouvintes-, coletivamente, necessitam lutar por direitos numa sociedade desigual, estimulam-se ainda mais as diferenças e ampliam-se as desigualdades sociais. Os estudos de Sá (1999) sustentam essa perspectiva quando afirmam:

(...) nem estamos pretendendo incentivar a criação de grupos à parte, de minorias alheias à sociedade majoritária. Pretendemos, sim, que sejam reconhecidas as variadas “especificidades culturais”, manifestadas na língua, nos hábitos, nos modos de socialização e de funcionamento cognitivo que dão origem a uma cultura diferente. (...) O objetivo de considerar, no estudo da problemática do surdo, a questão cultural, não é o de incentivar a criação de grupos minoritários à margem da sociedade, mas justamente o contrário, ou seja, o de considerar a diferenciação lingüística como necessária para possibilitar o desenvolvimento normal da cognição, da subjetividade, da expressividade e da cidadania da pessoa surda. (p. 157-158)

O que está em jogo, portanto, não é o uso de uma modalidade diferente de língua, mas as suas implicações culturais. E a questão é mais ampla, dado que envolve indagar acerca da possibilidade de uma cultura surda nos espaços socioculturais em que o jovem surdo se movimenta.

Pertencer a um grupo supõe configurar o sujeito no contexto determinante de suas expectativas e ações. Por isso, a necessidade de apreender o jovem surdo a partir de seu pertencimento a um grupo que o represente em sua totalidade. Empenhar em conhecer o jovem surdo em seu cotidiano é a oportunidade de empreender uma reflexão sobre este e sua condição de sujeito cultural.

O jovem surdo possui traços que o identificam em um único grupo, mas é na heterogeneidade que as divisões se acentuam e vêm à tona. Portanto, é dessa forma que são reconhecidos, mesmo que ainda sejam segregados. Nessas condições, pode-se perguntar: nos agrupamentos jovens surdos onde prevalece a tensão heterogeneidade e homogeneidade, é possível gestar e manter uma cultura surda? Quais expressões da cultura surda estão presentes em jovens surdos em processo, por exemplo, de escolarização?

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Essas perguntas se desdobram em outras: como foi (é) a relação familiar desses sujeitos? Qual o papel das instituições socializadoras clássicas, como a família e a escola, na sua formação? Como lidam com a diferença? Como esses sujeitos se constituem ao longo da vida, sem falar uma língua de modalidade oral? Qual o sentido do espaço escolar para eles?

Assim, um dos propósitos deste estudo foi investigar um agrupamento de jovens surdos para apreender os mecanismos e as possíveis manifestações específicas da cultura surda. Tendo como referência essa problemática, o trabalho conceitua juventude e jovens surdos; investiga as conceituações da Cultura Surda presentes nos principais estudos sobre o assunto chamados Estudos Surdos4; e investiga empiricamente um agrupamento de jovens surdos em uma escola pública da cidade de Goiânia, visando apreender nele os sinais da presença de uma Cultura Surda.

O estudo é resultado de uma pesquisa desenvolvida com a intenção de analisar a realidade dos sujeitos surdos e sua cultura por meio da utilização de procedimentos metodológicos adequados para uma compreensão mais detalhada possível do objeto em seu contexto histórico. O primeiro desses procedimentos foi o estudo detalhado da literatura pertinente ao tema. A pesquisa bibliográfica é definida por Santos (2002) como sendo “o conjunto de materiais escritos (gráfica ou eletronicamente) a respeito de um assunto” necessário “para raciocínios e conclusões a respeito dos fatos/fenômenos” (p.28).

Também foram utilizadas as técnicas de observação, entrevistas e produção de vídeos dos grupos de debates. Posteriormente, foram analisados os dados, que são apresentados de forma descritiva e analítica ao longo da exposição.

O levantamento bibliográfico refere-se à literatura relevante e significativa sobre: juventude - Dayrrel (2003), Novaes (2006), Canezin Guimarães (2002), (2007) e (2008); cultura - Pierre Bourdieu (1998), Veiga-Neto (1992), (2002), Hall (1990), (1992),(2000) e (2005) e Wrigley (1996); e estudos surdos – Silva (1997) e (2003), Behares (2000), Skliar(1998), Sá (1999), (2004) e Perlin (2006-2009).

Para os conceitos de identidade, língua, posições de poder, diferença, habitus e educação, foram fundamentais os autores: Thomas e Lopes (2004), Bourdieu (1998),, Geertz (1989), Goldfeld (1997), Labourit (1994), Signorini (2001),, Skliar (1998), Quadros (1997), Sá (1999) e outros.

4 Os chamados estudos surdos são uma proposta de investigação, na perspectiva surda ou com ouvintes que são sensíveis aos olhares surdos, de temas que envolvem sua realidade dentro da perspectiva dos estudos culturais. (QUADROS, 2006).

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Em virtude da natureza do objeto, utilizamos a pesquisa qualitativa. A coleta de dados realizou-se mediante aplicação de um questionário com perguntas abertas e fechadas, diário de campo, realização de entrevistas e grupo de debates sobre temas que nos interessaram para a discussão. Como a língua utilizada para esses procedimentos foi a Língua de Sinais, realizamos todas as etapas gravadas em vídeo ora com câmera de notebook, ora com câmera de filmagem própria para esse fim.

Também a observação foi uma técnica e a partir dela conseguimos obter informações sobre a realidade estudada, com o registro e a análise dos fatos e fenômenos.

A observação foi do tipo livre, não estruturada e participante. Minayo (2000, p.100) observa que:

[...] com relação aos instrumentos para a OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE, é importante que o investigador tome algumas decisões nesse momento preparatório. Ou seja, será uma observação livre ou realizada através de roteiro específico? Abrangerá o conjunto do espaço e do tempo, previsto para o trabalho de campo ou se limitará a instantes e/ou aspectos da realidade, dando ênfase a determinados elementos na interação. (grifo nosso)

Como não existe observação neutra, durante o processo foram levadas em conta as reações dos jovens em relação à presença da pesquisadora, dado ser ela pessoa “estranha” ao grupo das pessoas observadas.

O aporte dos registros foi denominado de Diário de Campo.

Na perspectiva de orientar o desenvolvimento da investigação, a pesquisadora traçou alguns pontos relevantes à pesquisa:

• caracterização do espaço escolar, • perfil dos jovens surdos,

• linguagem,

• relacionamento surdo/surdo e surdo/ouvinte, • habitus.

Para realizar a investigação foi escolhida como escola-campo a Escola Estadual Colemar Natal e Silva da rede estadual de Goiânia, Goiás. O lócus investigativo é definido por Santos (2002) como o lugar natural onde acontecem os fatos, fenômenos e processos. A escola apresenta as seguintes características: espaço físico muito bem distribuído, organizado e limpo. Há 13 salas distribuídas entre o 1º e o 9º ano do Ensino Fundamental, nos períodos

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matutino e vespertino. Para atendimento de 401 alunos, a instituição conta com 23 professores regentes, 14 professores de apoio e sete intérpretes de Língua de Sinais, todos com formação ou cursando o nível superior de ensino. Desse contingente de alunos, cerca de 150 estão entre a faixa etária de 15 a 24 anos, classificados como jovens segundo a Organização Mundial da Saúde. O período de realização foi de 2010 a 2012.

Desses números obtivemos a informação de que estavam matriculados 245 alunos no matutino e 156 no vespertino. Desses, 34 são surdos, 27 do período matutino e sete do período vespertino. Para o universo de 193.000 pessoas com algum tipo de surdez no Estado de Goiás (IBGE, 2001), a escola-campo trabalha com um número razoavelmente pequeno de surdos.

O trabalho de inclusão dos alunos surdos realizado pela escola tem por base a Declaração de Salamanca, aclamada após discussão e emenda na Sessão Plenária da Conferência de 10 de junho de 1994, de onde partiram novas leis e projetos para tratar o deficiente com mais dignidade, assegurando-lhe os direitos de acessibilidade de qualquer cidadão.

O projeto de inclusão vem sendo desenvolvido pela escola desde 1999, quando, a partir do Decreto Federal n.º 3.298/99, o Estado de Goiás instituiu que todas as escolas deveriam ser inclusivas e disponibilizar recursos tanto materiais quanto humanos para o atendimento da diversidade.

A pesquisa de campo foi realizada no período de janeiro de 2010 a junho de 2012, com jovens surdos de 15 a 24 anos presentes nessa escola regular da rede pública de ensino. O grupo de jovens entrevistados assinou o termo de livre consentimento e autorização para a publicação dos resultados do estudo que se encontra em apêndice. A escolha da amostra obedeceu aos critérios qualitativos de pesquisa, cuja amostragem não é rigidamente quantificada, portanto dependente da qualidade das informações coletadas durante a incursão no campo. O presente estudo buscou dar voz aos sujeitos, incorporando elementos materiais e simbólicos da realidade objetiva e subjetiva dos jovens alunos. Por ser a realidade social complexa, composta de elementos materiais e simbólicos, a pesquisadora adotou como principal procedimento de comunicação a Língua de Sinais. Pretendeu, conforme sinaliza Minayo (2000), que os agentes pesquisados constituíssem uma parte significativa da “totalidade em suas múltiplas dimensões”.

Da pesquisa resultaram três capítulos.

No primeiro, denominado “Jovens Surdos no Espaço Escolar”, procuramos conceituar juventude e sinalizar as principais discussões que permeiam a temática;

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descrevemos a escola como espaço sociocultural; e traçamos um perfil identificatório dos onze jovens entrevistados com base no questionário aplicado e nas observações realizadas.

No segundo capítulo, cujo título é “Culturas e Cultura Surda: Identidade, Linguagem e Habitus”, discutimos a temática da cultura, inclusive a da cultura surda, buscando fundamentar, do ponto de vista teórico, a premissa de que, em meio à diversidade cultural, pode existir uma Cultura Surda.

No terceiro capítulo, cujo nome é “Jovens Surdos em Processo de Escolarização e a Cultura Surda”, apresentamos a pesquisa de campo realizada com os jovens surdos que estão em fase de escolarização e que apresentam marcas importantes para a caracterização inicial de sua cultura. Realizamos uma análise dos dados empíricos com base nos estudos teóricos sobre juventude, condição juvenil, surdez, Cultura Surda e sua relação com a sociedade.

O presente trabalho de pesquisa se alinha às atuais pesquisas que compreendem o surdo como sujeito ativo, constituído por relações sociais que o permeiam. Um de nossos anseios foi aferir o que tem sido produzido acerca da temática “Culturas e Cultura Surda”. Assim, o estudo desenvolvido pretende contribuir para a compreensão do modo de ser surdo na perspectiva do jovem que se encontra nessa condição. Pretende também apresentar subsídios que auxiliem na luta pelo reconhecimento dos jovens surdos e da legitimação da Cultura Surda.

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CAPÍTULO I

JOVENS SURDOS NO ESPAÇO ESCOLAR.

No presente capítulo, buscamos apreender aspectos relacionados ao desenvolvimento da temática juventude, delinear o espaço escolar onde os jovens surdos se inserem na condição de estudantes e caracterizar os sujeitos objeto de estudo da pesquisa.

1.1. Aspectos da Juventude.

As transformações tecnológicas, culturais e sociais ocorridas nas sociedades contemporâneas possibilitaram a emergência de inúmeros agrupamentos e culturas juvenis diversificadas, o que fez com que as representações sobre a juventude se modificassem, inclusive aquelas relativas à conquista dos direitos das pessoas com necessidades especiais.

Os estudos de Sposito (1997), Carrano (2003), Abad (2003), Canezin (2007) dentre outros apontam as dificuldades da definição do que significa ser jovem e afirmam a necessidade de pesquisas que aprofundem as referências conceituais que orientam as investigações.

Canezin (2007) afirma:

No mundo contemporâneo, o modo de ser de determinados segmentos, como por exemplo, os jovens, é complexo, difícil de ser apreendido e decifrado em virtude, sobretudo, das mudanças operadas nas várias dimensões da vida social, em especial, as do mundo do trabalho, desencadeadas pelo avanço tecnológico e pela globalização da economia. (2007,p. 02).

A autora, apoiada nas referências teóricas de Bourdieu, considera que os jovens devem ser analisados como agentes sociais que se movimentam em vários espaços sociais, relacionando-se dialeticamente com as condições objetivas e construindo trajetórias particulares de existência. Nesse sentido, entende que

os jovens constituem-se em campos simbólicos diferenciados e não podem ser percebidos, simplesmente, com base no recorte etário, como se construíssem percepções homogêneas sobre si mesmos em contraposição ao mundo adulto. A

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condição juvenil é recoberta por uma pluralidade de situações e os jovens, como agentes, vivem essa fase da vida percorrendo trajetórias coletivas e individuais também diferentes. (2007, p. 02)

Ao tomar a juventude como fase da vida, é importante não pensá-la, como assinala Morin(1987), de forma rígida, evolucionista e cíclica. Alega, ainda, que cada ciclo da vida soma todos os outros vivenciados:

É agora, quando se misturam envelhecimento e rejuvenescimento, que sinto em mim todas as idades da vida. Sou permanentemente a sede de uma dialógica entre infância / adolescência / maturidade / velhice. Evoluí, variei, sempre segundo esta dialógica. Em mim, unem-se, mas também se opõem, os segredos da maturidade e os da adolescência. (p.255)

Entendidos dessa forma, os tempos da vida não são lineares, mas uma determinada fase contém a anterior. Isso significa também entender que o tempo social é complexo, contraditório e diversificado. Essa diversidade se concretiza nas condições sociais (classes sociais), nas culturais (etnias, identidades religiosas, valores), nas de gênero e mesmo na geográfica, dentre outros aspectos que compõem o momento histórico considerado.

Em geral, a juventude é tratada como um período de turbulência e de transição pelo qual todo indivíduo necessariamente tem de passar. Essa representação é próxima do senso comum e é ainda reducionista dado que essa fase da vida é vivida de forma diferente dependendo do tempo histórico e da organização social e cultural da sociedade. É necessário entender que a juventude não se limita a uma mera transição para a vida adulta, permeada por componentes biológicos como parte de um processo de crescimento num todo, mas ganha formas específicas no conjunto das experiências vivenciadas no contexto social.

A juventude constitui um momento determinado, mas que não se reduz a uma passagem, assumindo uma importância em si mesma como um momento de exercício de inserção social, no qual indivíduo vai se descobrindo e descortinando as possibilidades em todas as instâncias da vida social, desde a dimensão afetiva até a profissional. (DAYRELL, 2003, p. 6).

É nesse sentido que se sugere a noção de juventudes, no plural, para enfatizar a diversidade de modos de ser jovem existentes. Além de ser marcada pela diversidade, a juventude é uma categoria dinâmica, que se transforma na medida das mutações sociais que vêm ocorrendo ao longo da história. É com base nessa concepção que se afirma que há uma diversidade nos modos de “viver o ser jovem”. A juventude não é uma realidade homogénea. Ao contrário , a condição de ser jovem é permeada por diferentes trajetórias que pautam suas

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condutas sociais na vida cotidiana, em especial a família, a escola, a religião, as agências empregadoras etc. O “mundo jovem apresenta um leque de diversidades diante das condições materiais e simbólicas: formas de agrupamento e organização, classes sociais , diferenças étnicas , de género, religiosas e peculiaridades regionais”. (CANEZIN GUIMARÃES, 2007,p.02)

Ao longo da história, as sociedades têm construído diferentes modos de representar os jovens. Nesse sentido, a juventude constitui uma categoria sócio-histórica. Falar de juventude pressupõe entender que o conceito é construído histórica e socialmente. As representações de juventude têm mudado no tempo e no espaço e refletem disputas económicas, políticas, inclusive entre gerações.

Na sociedade brasileira, encontram-se diferentes modos de representar os jovens: promotores de mudanças, alienados etc. Nas últimas décadas, verificam-se algumas mudanças, vez que os jovens, antes vistos como agrupamento de risco ou vulneráveis, em específico no espaço das mídias e da gestão pública, passaram a ser considerados, ao menos nos campos científicos, como protagonistas que atuam em redes diversas de relações sociais e, sobretudo, desenvolvem práticas que interferem no espaço urbano. A nossa pesquisa procurou compreender os jovens de acordo com essa nova perspectiva.

Conforme Novaes (2006), em seu texto “Os jovens de hoje: contextos, diferenças e trajetórias”, nos últimos anos no Brasil, os jovens têm tido destaque nos meios de comunicação, ora como vítimas da violência, ora como atores de problemas sociais, desemprego, drogas, gravidez precoce, dentre outros. Segundo ela,

esta é a geração da imagem, na qual proliferam os meios de comunicação paralelos e simultâneos. Ora, se a juventude é a fase da vida mais marcada por ambivalências provocadas pela convivência contraditória entre padrões culturais diversos, os jovens são disputados por forças antagônicas que produzem tanto críticas quanto adesões à chamada “sociedade de consumo”. Nessa tensão, é preciso desafiar os jovens a fazer emergir sua criatividade, inventando novas formas de comunicação; e também é preciso convocar os governos para que assumam o papel de Estado nessa questão. O que quer dizer que encontrem mecanismos para garantir e promover a real ampliação do pluralismo na chamada “mídia”. (NOVAES, 2012, p.30).

Canezin Guimarães (2007) afirma que os jovens são considerados agentes sociais que ocupam um lugar no espaço social a partir do quantum de capital acumulado. A partir desse lugar, produzem representações sociais permeadas por relações de poder, conflitos e consensos, produzem formas de interpretação de mundo em relação dialética com as condições concretas em que estão inseridos.

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Em estudos de 2008 e 2009, Canezin Guimarães et al. também nos instigam a compreender os jovens de diferentes agrupamentos e as relações estabelecidas entre as dimensões da juventude, educação e cultura, que sinalizam, em tempos de transformações socioeconômico-culturais das sociedades contemporâneas, novos desafios, que são apresentados aos jovens e às instituições que se responsabilizam pela sua formação. Ainda chamam a atenção para os diversos universos socioculturais juvenis e a multiplicidade de condições materiais e simbólicas que são vividas pelos jovens se considerarmos os agrupamentos, classes sociais, religiões, etnia, gênero, e território.

Na atual conjuntura, esses estudos apresentam novas formas de ver e entender a juventude, ultrapassando formas historicamente preconceituosas de lidar e representar os jovens, deficientes ou não, que dificultaram uma real compreensão da atuação desses agentes em sociedade.

Essas novas interpretações apontam que, no contexto social do século XXI, os jovens têm entendido que seu lugar na sociedade pode e tem lugar de destaque. Por exemplo, quando fazem uso dos instrumentos das novas tecnologias para se manifestar e comunicar com seus pares. O que antes era entendido como uma forma de “anonimato” proporcionada pelas TI (Tecnologias da Informação) hoje é uma forma de manifestar habitus5, costumes e conquistas.

Os jovens, inclusive os de camadas populares, têm feito uso de forma significativa das novas tecnologias para se expressar.

Muito recentemente, a investigação volta-se para as relações que os jovens mantêm com as TIC e suas apropriações. Até pouco tempo, as tecnologias eram basicamente utilizadas por jovens da classe média e alta, em domicilio. Com a penetração das tecnologias nos bairros mais populares, sobretudo por meio das lan houses, os jovens da periferia estão acessando, em quantidade, o ciberespaço. (CAVALCANTE, 2010, p. 53)

Deve se considerar também, como indicam os estudos de Canezin et al.(2007), que os jovens se movimentam em diversos espaços sociais, fazendo uso de estratégias, aprendendo e recriando as regras do jogo, visando a apropriação e/ou domínio dos bens materiais e simbólicos presentes na sociedade, como forma de adquirir autoridade, legitimidade e prestígio. Intuem que o lugar em sociedade exige acúmulo de capital, seja ele

5 Para Bourdieu, o Habitus é o produto de uma relação dialética entre a situação e o habitus, entendido como um sistema de disposições duráveis e transponíveis que, integrando todas as experiências passadas, funciona em cada momento como uma matriz de percepções, apreciações e ações e torna possível cumprir tarefas infinitamente diferenciadas, graças à transferência analógica de esquemas adquiridos numa prática anterior. (BOURDIEU, 1972/1977, p. 261).

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cultural, econômico ou político. A respeito dessa movimentação dos jovens, destaca Cavalcanti:

O fato de as culturas e dos agrupamentos juvenis ganharem visibilidade social significa que jovens, nos diferentes espaços, procuram descobrir as estratégias de que necessitam para se movimentarem no mundo social e, nesse processo, se constituírem individual e coletivamente. (2010, p. 53)

Os jovens, como afirma Reguillo (2003), constituem uma categoria que expressa heterogeneidade e pluralidade e estão relacionados aos condicionantes sócio-históricos de cada sociedade, porque

a juventude é uma categoria construída culturalmente, não se trata de uma “essência” e, em tal sentido, a mutabilidade dos critérios que fixam os limites e os comportamentos do juvenil está necessariamente vinculada a contextos sócio-históricos, produto das relações de força de uma determinada sociedade. (REGUILLO, 2003, p. 104).

Essa visão mais ampla indica os limites do critério faixa etária para determinar a juventude pesquisada. Ele é somente um ponto de partida, pois entendemos com Bourdieu que juventude é apenas uma construção socialmente determinada, já que “somos sempre o jovem ou velho de alguém.” (BOURDIEU, 1983, p.113).

Compreendendo a limitação do critério faixa etária, já que existem diferentes formas de entender a juventude, salientamos que, para a realização do presente trabalho, utilizamos a delimitação etária adotada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que classifica como jovens aqueles que se situam entre 15 e 24 anos e cujas determinações regulam políticas públicas brasileiras sobre a temática juventude.

Para se falar em juventude, cabe ressaltar que não é possível considerar uma única forma de viver a condição juvenil. Os jovens vivem essa fase da vida de forma diferente e manifestam suas experiências subjetivas conforme o lugar que ocupam, inclusive expressando formas de pensar, agir e sentir a partir de experiências nos diferentes espaços sociais de formação.

Abramo (1994) afirma que, mesmo considerando a faixa etária fixada por outros órgãos da sociedade civil e da sociedade política, a representação da juventude é variável, porque constitui uma categoria socialmente determinada em função da “definição de tempo, de duração, dos conteúdos e significados sociais desses processos” e esses processos se modificam “de sociedade para sociedade e, na mesma sociedade, ao longo do tempo e através de suas divisões internas” (apud CARVALHO, 2002, p.28).

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Abramo (2005), Dayrell (2003) e outros autores concordam que as diferenças que aparecem na caracterização da juventude são decorrentes de fatores diversos e os modos de ser jovem expressam particularidades que não se resumem a um único modo de ser, mas refletem a diversidade juvenil.

Os jovens "modificam-se e se diversificam historicamente como produto das transformações da própria sociedade e de suas instituições.” (ISLAS, 2009, p. 18). Ainda, segundo esse autor, a juventude é um conceito que surge na disputa que se realiza em diferentes campos do conhecimento das ciências humanas.

Por muito tempo, a psicologia e a pedagogia trataram essa fase da vida por meio de uma visão biológica, o que reduziu a possibilidade que se tinha de compreender esse agrupamento de forma mais abrangente. Já a abordagem sociológica da condição juvenil, tratada como um segmento da população com características próprias e conforme os espaços sociais em que se encontra, possibilita uma análise mais legítima.

Segundo Leon (2009), os estudos sociológicos compreendem a juventude segundo duas perspectivas: aquela em que os jovens são analisados com base nas condições históricas e geracionais em que vivem, e outra na perspectiva classista, em que os jovens são vistos conforme o estrato ou a posição social que ocupam na sociedade.

Pais (2006), investigando os jovens nas tramas dos processos culturais, entende que eles são também produtores e não simplesmente consumidores ou puros admiradores dos gozos da cultura. Eles, nas sociedades contemporâneas, a todo o momento, inserem-se em novas redes de sociabilidade e constroem identidades. Segundo o autor, é possível identificar duas perspectivas de orientação dos jovens: os que se conformam com as prescrições da família, escola, igreja, agindo de acordo com as configurações culturais dos espaços clássicos de socialização e os que, pelo “viés da sua expressividade cotidiana”, transgridem o instituído, buscando romper com os modos tradicionais de as gerações adultas conceberem o mundo social. Daí a\a distinção entre espaços estriados e espaços performativos, como afirma Pais:

A ideia que ponho em discussão é a seguinte: nos tradicionais estatutos de passagem da adolescência para a vida adulta os jovens adaptavam-se a formas prescritivas que tornavam rígidas as modalidades de passagem de uma a outra fase de vida. Diríamos, então, que essas transições ocorriam predominantemente em espaços estriados. No entanto, entre muitos jovens, as transições encontram-se atualmente sujeitas às culturas performativas que emergem das ilhas de dissidência em que se têm constituído os cotidianos juvenis. Ou seja, as culturas juvenis são vincadamente performativas porque, na realidade, os jovens nem sempre se enquadram nas culturas prescritivas que a sociedade lhes impõe. (PAIS, 2006, p.7)

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O argumento sinaliza que as duas perspectivas relacionam-se com instituições e circunstâncias específicas e são vividas tanto em espaços urbanos informais quanto em campos institucionais formais. Quando se afirma que existem culturas prescritivas, como as transmitidas pela família e escola, e outras performativas, como as experimentadas pelos jovens em outros espaços sociais, não se pretende considerar que uma é mais adequada que a outra. Para pesquisar os jovens e sua condição juvenil, é necessário entendê-los para além dos estereótipos. Os jovens não podem ser estereotipados de forma maniqueísta, por exemplo: conservadores ou modernos, apolíticos ou promotores de mudanças, etc. Investigar os jovens supõe romper com atitudes apriorísticas e preconceituosas.

Um dos traços que mais caracterizam a atual condição juvenil é a situação de impasse vivida em relação ao futuro. Segundo Carrano(2003), independentemente de as fronteiras entre as várias fases da vida se encontrarem sujeitas a uma crescente indeterminação, continuam a ser valorizados determinados marcadores de passagem entre essas várias fases.

Um outro traço associado à juventude contemporânea é a questão da moratória. Dadas as transformações das sociedades contemporâneas, inclusive das instituições clássicas, a juventude tem sido interpretada como uma fase da vida acompanhada por uma moratória. Na transição para a vida adulta, os jovens não seguem o padrão anterior de ingresso no mundo do trabalho, de criação de um novo núcleo familiar, de autonomia financeira, mas permanecem vinculados à família. Daí a expressão que os denomina de geração canguru. Nessa visão, o jovem vive, na atualidade, um prolongamento para o ingresso no mundo adulto.

De outro lado, no entanto, isso não parece acontecer usualmente com o jovem de camadas populares, do que decorre que a propalada moratória deve ser investigada de forma mais apurada, ainda mais em se tratando de jovens surdos pertencentes às camadas populares.

A rápida incursão acerca dos fundamentos conceituais da temática juventude sinaliza que os jovens estudantes surdos pesquisados são interpretados como agentes sociais. Mesmo não sendo plenamente conscientes das motivações que pautam suas condutas cotidianas, são agentes atuantes no espaço social em que se localizam.

Também cabe destacar que esses jovens estudantes não podem ser vistos nos limites da condição de aluno, como pondera Williams (apud CARRANO, 2003). Segundo Carrano (2003, p. 130), “a hipertrofia do olhar da instituição escolar, em última análise, representa a perda da perspectiva da totalidade do ser social e cultural do jovem que se vê reduzido à monolítica dimensão identitária de aluno”.

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1.2. Escola como espaço social de convivência dos jovens surdos.

Como salientamos no tópico anterior, os jovens transitam por diferentes espaços, sobretudo na cidade, buscando construir identidades. Nessa movimentação, um dos locos importantes é o espaço escolar.

A leitura do espaço no qual os jovens surdos pesquisados encontram-se inseridos leva-nos a perceber a escola como espaço cultural e a entender que “analisar essa relação mútua corresponde ao ato de contextualizar, ou seja, reconhecer as coisas conectadas e integradas umas às outras” (SOUZA, apud CANEZIN GUIMARÃES, 2002, p. 49). Na leitura, ainda é preciso considerar as questões micro e macro que envolvem o ambiente escolar em que tais jovens são situados como sujeitos da pesquisa.

Os jovens movimentam-se em diferentes espaços, buscando aprender a se relacionar com e no mundo social. E localizar-se em um espaço é, de certa forma, configurar o lugar onde são construídas identificações. Disso decorre a importância em definir o espaço como um produto materializado que representa o lugar onde acontecem as relações sociais, que são frutos de um dado momento da sociedade.

Segundo Carlos (1999), o espaço como produto espacial e como produto social manifesta historicamente as contradições, as tensões e os conflitos de uma sociedade. Afirma:

o espaço é o produto, num dado momento, do estado da sociedade, portanto, um produto histórico; é o resultado da atividade de uma série de gerações que através de seu trabalho acumulado têm agido sobre ele, modificando-o, transformando-o, humanizando-o, tornando-o um produto cada vez mais distanciado do meio natural. Suas relações com a sociedade se apresentam de forma diversa sob diferentes graus de desenvolvimento (p.32).

É no espaço social que o homem cria e recria a sua existência a partir de suas necessidades e de suas relações sociais. É nele que as diferenças e dicotomias sociais são expressas.

Pensar sobre o espaço, nesse caso o espaço escolar, é pensá-lo, como afirmamos, como um lugar onde acontecem relações sociais frutos de um dado momento da sociedade. Mas convém também afirmar que o espaço não é um mero lugar de ações e interações, pois contém representações coletivas, valores, sociabilidades, memórias, que se transformam com a atuação dos diversos agentes sociais envolvidos. (WIRTH, 1987).

Os agentes sociais, segundo Bourdieu (1985), são distribuídos no espaço social, dependendo do volume de capital que detêm e pela forma como o capital simbólico

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manifesta-se nas diferentes formas legítimas de existência. A posição que um agente social ocupa representa o poder que este detém em sociedade, pois essa é uma forma de prestígio e legitimidade.

Bonnewitz (2006) considera que Bourdieu constrói uma definição de sociedade a partir da noção de espaço social, quando enfatiza a “dimensão relacional das posições sociais”, isto é, “o espaço social como espaço multidimensional de posições tais que toda posição atual pode ser definida em função de um sistema multidimensional de coordenadas” (p. 53). Nesse sentido, os valores são redefinidos segundo “variáveis pertinentes”. (BOURDIEU apud BONNEWITZ, 2003, p.53).

O agente e seu lugar em sociedade estão associados diretamente às relações de poder que a estrutura social estabelece. Tudo depende muito da forma como foi distribuído o capital no campo social. É o espaço social que configura o poder real e potencial em diferentes campos e as chances de acesso aos benefícios específicos. Como afirma Nogueira (2006), “os indivíduos ocupariam posições diferenciadas e mais ou menos privilegiadas na estrutura social em função do volume e da natureza dos seus recursos” (p. 51).

O conhecimento das posições ocupadas nesse espaço social contém informações relacionadas com as propriedades intrínsecas dos agentes (sua condição) e das propriedades relacionais (sua posição). Trata-se, sobretudo, das posições intermediárias entre os polos extremos do campo, em uma posição neutra do espaço e que são equilibradas pelas duas posições extremas. (p.51)

O espaço investigado na pesquisa foi uma escola da rede estadual, conforme esclarecemos na introdução deste trabalho. A maioria dos seus alunos pertence ao que se denomina camadas populares e não mora nas proximidades da escola. O bairro em que se localiza é dividido entre comércio de compra e venda de carros, principalmente, e residências, classificado genericamente como “um setor de classe média”, próximo ao centro da cidade.

Observando a escola em relação aos princípios configurados e os agentes surdos, é possível sinalizar que, apesar de já estar por quase dez anos como co-participante do processo de inclusão da pessoa surda, ela ainda passa por muitas dificuldades. Alguns funcionários ainda não atentaram para a necessidade de conhecer e saber como trabalhar com as especificidades da comunidade surda e ainda não sabem e nem procuram conhecer a Língua de Sinais, meio pelo qual a maioria dos surdos que ali convive se comunica. Não se atêm que "(...) olhar a identidade surda dentro dos componentes que constituem as identidades essenciais com as quais se agenciam as dinâmicas de poder” (PERLIN, 1998, p. 217) é algo

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essencial, já que se deve considerá-la com o mesmo grau de importância que as demais. Ou seja, “a sociedade impõe limites, mas isso não significa que a cultura surda não tenha permissão para se desenvolver” (WIDELL, 1992, p. 96) e se fazer presente em todos os espaços de convivência de seus sujeitos.

Apesar dos limites institucionais, os surdos que frequentam a escola são parte da atual realidade da comunidade surda do Estado de Goiás. Eles são, em sua maioria, exemplos da mudança por que essa região do país passou e ainda passa e da nova visão de inclusão que está em processo de elaboração. As tendências das políticas internacionais e nacionais de educação direcionadas à inclusão dos APNEE (Alunos Portadores de Necessidades Educativas Especiais) no ensino regular têm se refletido nas reformas educacionais do Estado de Goiás, nos programas estaduais destinados à capacitação de professores e dirigentes escolares e na realidade das instituições de ensino. Entretanto, esse fato não deixa ainda a escola fora da postura de alguns que ainda tratam com indiferença aqueles que têm necessidades especiais. E mais, desconhecem suas particularidades como a pessoas surdas.

Mesmo com as dificuldades inerentes à realidade dos surdos, utilizando como exemplos os próprios alunos da escola, estes estão sendo inseridos no mercado de trabalho. “Não mais como era há alguns anos”, como aponta a Assistente Social da Associação dos Surdos de Goiânia, que desenvolve este trabalho há mais de 15 anos. Os jovens surdos são contratados como auxiliares administrativos, auxiliares de secretaria e outros, ligados, inclusive, a programas sociais, como o da Fundação Pró-cerrado6. Isso difere de anos anteriores, em que eram contratados apenas para serviços braçais.

Grandes centros de treinamento, como o Serviço Social da Indústria (SESI), Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC) e Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), têm organizado cursos de treinamento e aperfeiçoamento em diversas funções que o mercado de trabalho necessita e têm disponibilizado vagas. Cabe ressaltar que a Escola Estadual Colemar Natal e Silva tem sido parceira nessas frentes para inclusão dos jovens no mercado de trabalho. Também, essa instituição tem se colocado como corresponsável pela formação holística do discente. Mesmo não sendo ela a única oferecer cursos, é parte ativa no incentivo dado aos alunos surdos. Na formação educacional desses alunos, há sempre o entendimento de que “alunos com uma boa educação tendem a se sair

6 Criada em 1994, em Goiânia, Goiás, a Fundação Pró-Cerrado (FPC) se constituiu a partir de um grupo disposto a lutar pela preservação do Cerrado, um dos biomas mais ameaçados do mundo. Já em suas primeiras ações educativo-ambientais, a organização encontrou um parceiro potencial: o jovem. A FPC amplia seu compromisso social, dedicando-se a um público-alvo carente de políticas públicas de combate à evasão escolar e ao desemprego, responsáveis diretos pelo envolvimento do jovem no mundo do crime. (http://www.fpc.org.br/website/institucional/info_institucional.php?id=8 ,acesso em 11/10/2010)

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bem no mercado de trabalho, inclusive colaboram com o desenvolvimento da realidade que os cerca” - palavras da vice-diretora.

A escola definiu para si e para a comunidade escolar uma identidade e um conjunto orientador de princípios e de normas que iluminam a ação pedagógica cotidiana. O Projeto Político Pedagógico (PPP) é uma ferramenta que configura a escola como um todo e não apenas em sua dimensão pedagógica. Gadotti (2000) afirma que o PPP deve ser apreendido como uma ferramenta de gestão e que as instituições de ensino, além de vê-lo como uma obrigação a ser cumprida, devem colocá-lo em lugar de destaque. Isso porque considera que ele auxilia a escola: a definir suas prioridades estratégicas e a converter essas prioridades em metas educacionais e concretas; a decidir o que fazer para alcançar as metas de aprendizagem; a medir se os resultados foram atingidos; e a avaliar o próprio desempenho.

A referida escola experienciou todas as prerrogativas de trabalhar o seu projeto no coletivo e, como exemplo de mudanças significativas, quebrou paradigmas no que diz respeito ao discurso político que envolve a concepção de escola inclusiva. Aqueles que ainda não aceitavam a nova política de educação Inclusiva passaram a admiti-la, pois se envolveram no processo de construção desse projeto. A instituição, desde esse momento, inferiu:

“a necessidade de ressignificação da educação especial contribuindo para uma educação mais justa, democrática, republicana e plural que atenda [esse] à diversidade dos alunos, buscando modos de inclusão social e educacional” (Resolução CEE Nº 07/CP (15/12/2006))

Mudou sua postura e forma de pensar, organizou os espaços e pensou numa formação profissional de atendimento às diferenças. O número de alunos com necessidades especiais se ampliou bastante e, provavelmente por esse motivo, o Projeto Político Pedagógico da escola mudou suas perspectivas e teve que seguir novas diretrizes. Particularmente nesse contexto, a escola, expressou mudanças em alguns de seus objetivos, que passaram a ser:

• Proporcionar ao aluno condições para integração e conscientização de seu papel na sociedade.

(...)

• Através da integração e inclusão (professores – alunos – universidades - participantes) buscar conscientizar o aluno, enquanto cidadão, pela sua própria condição de agente transformador da realidade em que vive, orientado para uma aprendizado vivencial hoje entendido como consequência das formas desse pensar (ensino – pesquisa – extensão).

(...)

• Promover aulas de LIBRAS para pais e comunidade, envolvendo-os no processo de ensino-aprendizagem e proporcionando um melhor ambiente de comunicação do DA e sua família.

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(...)

• Preparar a estrutura do prédio para receber alunos com necessidades especiais assim como capacitar toda equipe escolar para o mesmo fim.

• Promover a integração dos alunos com necessidades especiais a toda a comunidade escolar.

(...)

(PPP, Escola Colemar Natal e Silva, 2010)

A atual diretora, que atuou nesse processo de mudança, afirma que: “envolver e modificar a cultura da escola sobre esses aspectos foi algo extraordinário”. A escola procurou se adaptar às orientações e diretrizes das novas políticas educacionais e estimulou todos como sujeitos ativos e participantes do processo.

Entende-se, assim, que a direção da escola fez uma gestão preocupada em envolver todos no planejamento, na tomada de decisões, na definição do uso de recursos e necessidades de investimento, na execução das deliberações coletivas, nos momentos de avaliação da escola e, principalmente, na inclusão dos APNEE.

(...) a democratização do acesso e estratégias que garantam a permanência na escola, tendo como horizonte a universalização do ensino para toda a população, bem como o debate sobre a qualidade social dessa educação universalizada, são questões que estão relacionadas a esse debate. Esses processos devem garantir e mobilizar a presença dos diferentes atores envolvidos, que participam no nível dos sistemas de ensino e no nível da escola (MEDEIROS, 2003, p. 06).

A escola conta com uma sala de recursos e, em sua estrutura, com biblioteca, laboratório, um galpão e um pátio, este utilizado também como área para as aulas de Educação e Tecnologias que auxiliam na construção das preleções.

No discurso da escola, além desses recursos, disponibilizados a todos, a escola conta também com sete professores de apoio e quatro intérpretes de Língua de Sinais, tudo voltado para um projeto de uma educação com significado e de qualidade.

“Art. 15. As escolas da rede regular de ensino, públicas estaduais, municipais jurisdicionadas e particulares – confessionais, conveniadas e filantrópicas, devem prever e prover, na organização de suas classes comuns:

I – matrícula dos alunos com deficiências, com necessidades educacionais especiais e com altas habilidades e superdotação nas várias turmas da série, do ano, etapa ou ciclo escolar, respeitadas as normas do Sistema Educativo de Goiás, de modo que essas classes comuns se beneficiem da diversidade e das diferenças e ampliem positivamente as experiências de todos, dentro do princípio de educar na diversidade e para a diversidade em uma perspectiva inclusiva.

II – professores capacitados para o atendimento à diversidade étnico-racial, cultural, de gênero, de classe social e às necessidades educacionais especiais dos alunos. III - serviço de apoio pedagógico especializado, realizado nas classes comuns, mediante:

a) atuação de professores de apoio especializados ou capacitados em formação específica e de forma continuada e, ainda, de outros profissionais de áreas afins;

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b) atuação de professores-intérpretes, de professores-instrutores ou intérpretes das diferenças linguísticas e códigos aplicáveis;

c) disponibilização de outros recursos necessários à aprendizagem, à mobilidade, à comunicação e à acessibilidade.

IV - serviços de apoio pedagógico especializado realizados em salas de recursos ou escolas especiais, mediante:

a) a regência de professores especializados ou capacitados (itinerantes ou não), que realizem a complementação ou suplementação curricular;

b) a utilização de metodologias, procedimentos, equipamentos e materiais específicos adequados às necessidades educacionais especiais dos alunos.” (Resolução CEE Nº 07/CP (15/12/2006))

Como resposta à legislação que afirma o direito adquirido das pessoas com necessidades especiais, a instituição escolar investigada se orienta no sentido de respeitar a diferença. Busca ajustar-se aos princípios de uma escola pluralista, que ensina a viver em uma sociedade que também é heterogênea. No espaço escolar, estão alunos dos mais variados grupos e gêneros.

A escola, por meio de sua direção, possuiu um discurso com o qual afirma estar sempre atenta, da melhor forma possível, aos processos discriminatórios e trabalhar em benefício da inclusão social. Considera-se uma escola de referência para esse tipo de atendimento. Entretanto, há ainda uma enorme distância entre o dito e o instituído. Por exemplo, não há sequer momentos específicos para discussões mais aprofundadas sobre assuntos relacionados ao trabalho educativo e suas circunstâncias. Há indicações de que a escola se encontra no estágio constatado por Bites em seus estudos.

O MEC vem defendendo, de longa data e reforçado ultimamente, a necessidade de qualificação do professor para o trabalho educativo que leva em conta a realidade do aluno e todas as suas circunstâncias, no entanto, essas iniciativas ainda não se fizeram sentir suficientemente nas escolas. Os avanços detectados pelo governo, na educação escolar, entre os quais estão os relacionados à adoção da política de educação inclusiva, defendidos em todas as instâncias educacionais e veiculados na grande mídia não foram constatados no processo educativo da maioria das escolas pesquisadas. (2003, p.11)

Em relação ao trabalho desenvolvido com os sujeitos surdos - cultura, língua e outras necessidades –, pode se considerar que este fica restrito às atividades dos intérpretes7 de língua de sinais, que acabam por assumir total responsabilidade pelo sucesso ou fracasso do surdo. Com isso não se afirma que a escola não reconhece as especificidades da educação

7 O interprete de língua de sinais é um profissional presente em vários locais da sociedade devido à lei da acessibilidade. A escola é o ambiente onde mais vemos este profissional, mas infelizmente ele ainda não é reconhecido e pouco se sabe sobre ele e assim a confusão de papéis é frequente. Ser interprete educacional vai além do ato interpretativo entre línguas. (QUADROS, 2004)

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