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MODERNIDADE COMPOSICIONAL E CONTEXTO SÓCIO- HISTÓRICO DOS CONTOS NOVOS DE MÁRIO DE ANDRADE : UMA LEITURA DE PRIMEIRO DE MAIO E O POÇO

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MODERNIDADE COMPOSICIONAL E CONTEXTO SÓCIO-

HISTÓRICO DOS CONTOS NOVOS DE MÁRIO DE ANDRADE : UMA

LEITURA DE “PRIMEIRO DE MAIO” E “O POÇO”

Ketley Roberta Teixeira Natália Caroline Diógenes Tárcia Caires Saad1 Monica de Oliveira Faleiros

Introdução

O interesse em estudar os contos de Mário de Andrade “Primeiro de Maio” e “O poço” do livro Contos Novos (1947) surgiu a partir da observação de que suas temáticas abarcam questões relacionadas ao contexto sócio-histórico da primeira metade do século XX, quando os problemas do proletariado brasileiro estavam em discussão.

Contudo, além da abordagem sócio-histórica que primeiro nos chamou atenção, temos em vista, a partir do estudo sobre a teoria do conto, a observação sobre como os aspectos tradicionais dessa forma narrativa foram reapresentados por Mário de Andrade e, a partir disso, apresentar uma leitura (dos referidos contos) tendo em vista a crítica voltada às circunstâncias sócio-históricas construída por meio do narrador heterodiegético.

1.1 Modernismo Brasileiro e a trajetória de Mário de Andrade

A Semana de Arte Moderna ocorrida em 1922 foi não somente um marco na arte brasileira, mas uma reconstrução mais crítica do passado que outrora fora tratado de maneira diferente. Não podemos considerar que foi uma ruptura com o passado, mas sim uma quebra dos valores estéticos que vigoravam até então. A geração de 22 – composta por personalidades como Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral, Anita Malfatti entre outros – rompe com a forma e não com o passado.

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Alunas regularmente matriculadas no 5° semestre do Curso de Letras – Noturno do Uni-FACEF, Centro Universitário de Franca.

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Segundo Bosi (2006), a Semana de 22 foi o ponto de encontro de um grupo pertencente à burguesia culta do país, que gozava de condições especiais, como viagens à Europa, o que possibilitou que entrassem em contato com as vanguardas européias. Esse grupo ia revolucionar a literatura brasileira, que ainda centrava-se em Bilac e no estilo parnasiano de “talhar” a palavra e o poema.

De 1917 a 1922, os futuros organizadores da Semana travaram conhecimento com as várias poéticas do pós-guerra e constituíram-se como um grupo jovem e atuante no meio literário paulista (BOSI, 2006, p. 333). Porém, no início desse período, a obra de alguns desses jovens ainda não havia rompido totalmente com certas características tradicionais.

Somente em 1922, ainda segundo Bosi (2006), com a publicação de

Paulicéia Desvairada, de Mário de Andrade, é que se tem algo novo, um livro que

propõe uma revisão urgente dos valores que, até então, regiam a cultura nacional. Como um dos participantes da Semana, Mário se apresenta para o público declamando alguns de seus poemas que foram intensamente vaiados, mostrando a irritação e o descaso do povo quanto à nova “estética”, se é que podemos reduzir o Modernismo a esse conceito, pois os próprios modernistas não aceitavam muito bem a ideia de atribuir-lhes um rótulo e/ou etiqueta, fato que o próprio autor diz que não sabe como teve coragem de recitar seus versos no sarau. “Mas, de qualquer forma, havia sido realizada a Semana de Arte Moderna, que renovava a mentalidade nacional, pugnava pela autonomia artística e literária brasileira [...]” (BRITO apud BOSI, 2006, p. 339).

Para que as novas idéias literárias fossem consolidadas, várias revistas e manifestos foram criados, Mário participou das principais revistas da época:

Klaxon, Outras Terras, Estética e Terra Roxa. E nessa tentativa de solidificar o

Modernismo, tem-se chamado segundo os críticos, a “fase heróica” ou “tempos de combate” em que os escritores vivem o experimentalismo da forma, a introdução de novas temáticas à poesia, e, principalmente, a libertação dos modelos acadêmicos até então consolidados entre 1890 e 1920. Embora, seja tomado como nova estética ou movimento renovador, o Modernismo revela uma intrínseca adesão aos problemas e à história do Brasil, de tal modo que nenhum outro movimento refletiu tamanha fidelidade e, ao mesmo tempo, liberdade de criação.

Mário Raul de Morais Andrade, como foi dito anteriormente, foi um dos responsáveis pela Semana de Arte Moderna (1922), publicando no mesmo ano da

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Semana a obra Paulicéia Desvairada, na qual o próprio autor diz ter criado o “desvairismo”: “[...] nessa poética aberta há afinidades com a teoria da escrita

automática que os surrealistas pregavam como forma de liberar as zonas noturnas

do psiquismo únicas fontes autênticas de poesia” (BOSI, 2006, p. 347-348). Autor fundamental do Modernismo brasileiro, nasceu em 1893 e faleceu em 1945 sem ver sua obra Contos Novos (1947) publicada, livro em que trabalhou durante anos de sua vida. Mario foi um “[...] garimpeiro da cultura popular e do folclore; músico e professor; autor de uma correspondência e crítica sobre a literatura, a música e a cultura brasileiras; crítico da própria obra e do Modernismo em geral” (JAFFE, 2001, p. 9).

Os contos de Mário, segundo Lopez (apud ANDRADE, 2003), possuem uma pulsação de humanidade tão forte que ultrapassa estéticas e programas. Desde modo, encontramos a marginalização em Contos Novos (1947), não somente em seu cenário, que é o subúrbio, mas na própria condição do narrador: “[...] tornado protagonista por força da sensibilidade e exceção que o caracteriza e determina um comportamento desmascarador da alienação e da hipocrisia presente na sociedade”.

Assim, para que possamos compreender melhor os aspectos inovadores de Contos novos, passaremos a apresentar as teorias sobre o conto literário, gênero ainda muito discutido devido a sua difícil definição.

1.2 O conto literário

Mário de Andrade, em um ensaio publicado em (2002), polemiza sobre a arte de “compor um conto”:

[...] O que é conto? Alguns dos escritores do inquérito se tem preocupado com este inábil problema de estética literária. Em verdade, sempre será conto aquilo que seu autor batizou com o nome de conto [...] (ANDRADE, p. 9, 2002).

Essa explicação gera dúvidas sobre esse gênero de difícil definição. Segundo Gotlib (2004), sua origem está na transmissão oral dos fatos, no ato de contar histórias, que antecede a escrita e nos remete a tempos remotos. Desse modo, o ato de narrar um acontecimento oralmente evoluiu para o registro escrito. Assim, pode-se dizer que o narrador também evoluiu de um simples contador de

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histórias para a figura de um narrador preocupado com os aspectos criativos e estéticos. É no início da Idade Média que o conto se consolida como literatura.

O conto literário não se refere só ao acontecido, já que ele não tem compromisso com o real. Conhecemos que entre a realidade e a ficção não há limites, há naturalmente graus de proximidade ou afastamento do real que, mesmo apresentando uma literariedade, o tom da narrativa oral foi conservado. Portanto, tratar da teoria do conto é aceitar a luta em que a força da teoria pode aniquilar a própria vida do conto:

[...] se não tivermos uma idéia viva do que é conto, teremos perdido tempo, porque um conto, em última análise, se move nesse plano do homem onde a vida e a expressão escrita dessa vida travam uma batalha fraternal, se me for permitido o termo; e o resultado dessa batalha é o próprio conto, uma síntese viva ao mesmo tempo que uma vida sintetizada, algo assim como um tremor de água dentro de um cristal, uma fugacidade numa permanência. Só com imagens se pode transmitir essa alquimia secreta que explica também por que há tão poucos contos verdadeiramente grandes [...] (CORTAZAR apud GOTLIB, p. 10, 2004).

No que diz respeito a sua estrutura narrativa, a questão da brevidade é fundamental na construção do conto, importando também o número de personagens e episódios e eleger os detalhes primordiais a fim de evitar explicações em demasia.Um dos propósitos da brevidade seria para conseguir o máximo efeito com o mínimo de meios, excluindo tudo o que não for primordial para alcançar o efeito desejado (toda a informação que não convergir para o desfecho deve ser suprido), a questão é: provocar ou não maior impacto no leitor como diz Gotlib (2004). Se forem assim construídos, tendem a causar unidades de efeitos, favorecendo a simetria no uso do repertório dos seus materiais de composição.

Segundo Bosi (2006), o “efeito único” que o autor e crítico literário Edgar Allan Poe propõe de todo conto bem elaborado, é que não resida tanto na simplicidade do entrecho ou no pequeno número de atos e de personagens que o habitem; o sentimento de unidade dependerá, em última instância, de um “movimento interno” de significações, como em uma fotografia, já que o conto também necessita de selecionar o significativo, aproximando parte por parte, de um ritmo e um tom singular para manifestá-lo em efeitos a ser desejados, que seguindo a linha de raciocínio de Júlio Cortazar, conclui-se que o conto se caracteriza por seu teor fragmentário, uma vez que capta o presente, o momentâneo ou o instante temporário.

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Como afirma Gotlib (2004), pode-se dizer que a temática do conto é praticamente ilimitada. Quase tudo pode ser objeto para um conto. Mas em princípio a idéia de um conto esta ligada ao acontecimento, é preciso que algo aconteça, mesmo que o acontecimento seja o nada acontecer.

[...] a invenção do contista se faz pelo achamento (invenire = achar, inventar) de uma situação que atraia, mediante um ou mais pontos de vista, espaço e tempo, personagens e trama. Daí não ser tão aleatória ou inocente, como ás vezes se supõe, a escolha que o contista faz do seu universo [...] (BOSI, p.8. 2006).

É na esteira desses teóricos que propormos um estudo sobre a teoria do conto, observando como os aspectos tradicionais dessa forma narrativa foram reapresentados por Mário de Andrade e, a partir disso, apresentar uma leitura de “Primeiro de maio” e “O poço” do livro Contos Novos (1947), tendo em vista a crítica voltada às circunstâncias sócio-históricas construída por meio do narrador heterodiegético, sendo estes elementos essenciais para a nossa pesquisa.

Assim para o estudo desses dois contos, o narrador se torna peça fundamental para a realização deste trabalho, já que ele mostra evidências muito significativas na leitura dos contos marioandradiano.

1.2 Foco Narrativo

Narrar é fazer um relato de determinada sequência de acontecimentos, sejam eles reais ou inventados. O ser humano sempre sentiu a necessidade de narrar, contando histórias vividas, ou usando a imaginação. Portanto, a narrativa sempre esteve presente em todos os tempos e sociedades. A narrativa pode ser transmitida pela linguagem verbal, oral, escrita, sonora, gestual ou imagética.

Ficção ou realidade, a narração sempre tem a necessidade da verossimilhança, ou seja, tornar o texto crível, próximo ao real. O termo verossimilhança é importante porque a ilusão da verdade faz parte da estrutura narrativa; assim, a essência do texto da ficção torna-se verdadeiro para o leitor. Os fatos não precisam ser verdadeiros, mas verossímeis, ou seja, o leitor precisa acreditar naquilo que lê.

Alguns estudiosos divergem sobre como se constrói a narração. O escritor Henry James no final do século XIX e início do século XX, defende um ponto de vista único; para ele, o narrador deve ter uma presença discreta, para que o leitor

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tenha a impressão de que a história é contada por si própria James (apud LEITE, 2005). Nas palavras de Leite, o personagem deve ser “uma espécie de centro organizador da percepção, que tenha uma rica sensibilidade, uma inteligência penetrante (...)”.

Para Jean Pouillon (apud LEITE, 2005), há três possíveis relações entre narrador-personagem. Na chamada “visão por trás”, o narrador domina todo o saber sobre a vida e destino da personagem; seria onisciente. E como onisciente, uma espécie de Deus. A segunda relação, “na visão com”, o narrador sabe apenas sobre a personagem e acontecimentos. A última, “visão de fora”, o narrador limita-se a descrever acontecimentos.

Já Friedman (apud LEITE, 2005) propõe alguns tipos de narradores: narrador onisciente intruso, em que o narrador tem a liberdade de narrar, assim, predominam suas próprias palavras e pensamentos, ou seja, um “eu” que tudo sabe, analisa, critica. O segundo tipo seria o narrador onisciente neutro, na 3ª pessoa, em que o narrador descreve para o leitor as cenas e lugares. Aqui, mesmo o narrador sendo onisciente, evita tecer comentários. O “eu” como testemunha, ainda na classificação de Friedman é um “eu” interno à narrativa, portanto dá ao leitor uma visão mais verossímil.

Na categoria narrador-protagonista, a onisciência desparece, o narrador não tem acesso ao estado mental das personagens e se fixa às percepções, pensamentos e sentimentos. Podemos citar a obra “Grande Sertão: veredas”, de Graciliano Ramos, em que a história é narrada do ponto de vista da personagem Riobaldo.

O quinto tipo é a Onisciência seletiva múltipla, em que não há propriamente um narrador. A história vem da mente das personagens e das impressões que fatos e pessoas deixam nelas. A cena é predominante; o narrador traduz os sentimentos, percepções e pensamentos, enquanto que o narrador onisciente pode resumi-los depois de ter acontecido. Há a predominância do discurso indireto livre.

A Onisciência seletiva é semelhante à seletiva múltilpa. Os sentimentos, pensamentos e percepções da personagem central são mostrados ao leitor diretamente.

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Quando o narrador é eliminado, também se eliminam os estados mentais e foca-se na informação do que a personagem faz ou fala; deste modo, o leitor precisa fazer deduções das significações a partir das personagens.

A última categoria delimitada por Friedman exclui totalmente o narrador. Chamada de “câmera”, esse tipo de narração tenta transmitir ao leitor flashes da realidade, como se fossem apanhados por uma câmera. Pode ter um ponto de vista onisciente ou centrado numa ou várias personagens. Para Leite (2005), a falta de intervenção de um narrador é uma expressão que entra em crise no século XX.

Considerações finais

É importante observar que obras como as de Mário de Andrade influenciaram decisivamente a arte brasileira. Sendo assim, selecionamos como

corpus desta pesquisa, ainda em fase inicial, dois contos de Mário de Andrade, nos

quais é importante observar a inovação estilística e também o contexto social em que foram escritos, pois refletem os temas sociais e pensamentos vigentes da época.

O objetivo é apresentar uma leitura dos contos “O Poço” e “Primeiro de Maio” do escritor modernista, buscando esclarecer e contextualizar sua relação com o engajamento social a partir do estudo sobre a teoria do conto, iremos observar os aspectos tradicionais dessa forma narrativa traçando com o estudo do narrador, peça fundamental para a evidenciação de significados na leitura.

Referências bibliográficas iniciais

ANDRADE, Mário de. Contos novos. São Paulo: Villa Rica, 1947.

ANDRADE, Mário de. O empalhador de passarinhos. 4.ed. Belo Horizonte: Itatiaia, 2002.

BARBOSA, João Alexandre. A metáfora critica. São Paulo: Perspectiva, s/d. (coleção debates, 105).

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CAMPOS, Haroldo de. Metalinguagem e outras metas. São Paulo: Perspectiva, 1992. (coleção debates, 247).

GOTLIB, Nádia Battella. Teoria do conto. 10. ed. São Paulo: Ática, 2004. HELENA, Lucia. Sobre a história de 22. In:_______. História da Literatura:

Ensaios. Campinas: Unicamp. 2.ed., 1995.

LOPEZ, Telê Porto Ancona. Mário de Andrade. 7.ed. São Paulo: Global, 2003. PAULILLO, Maria Célia de Almeida. Contos da plenitude. In: ANDRADE, Mário de.

Contos Novos. São Paulo: Villa Rica, 1983.

POE, Edgar Allan. A filosofia da composição. Disponível em: < http:// www.ufrgs.br/proin/versao_2/poe/index66.html >. Acesso em 15 mai.2010. REIS; Carlos,LOPES; Ana Cristina.M . Dicionário de narratologia. Coimbra: Almedina, 2002.

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