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Parentalidade na Juventude e as Relações com a responsabilidade e o Trabalho

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Academic year: 2021

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V RAM

REUNIÃO DE ANTROPOLOGIA DO MERCOSUL

Antropologia em Perspectivas

Parentalidade na Juventude e as Relações com a

responsabilidade e o Trabalho

Nívea Silveira Carpes niveacarpes@bol.com.br

GRUPO DE TRABALHO XII

Sentidos do gênero: masculinidades, feminilidades, sexualidades

Coordenação Fabíola Rohden Flávia de Mattos Motta

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O artigo “Parentalidade na Juventude e as Relações com a responsabilidade e o Trabalho” teve como objetivo analisar como jovens de segmentos populares, médio -baixos e médios estruturam suas vidas a partir da experiência de parentalidade,1em Porto Alegre e Grande Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Analisei os eventos de ordem afetiva e sexual que influem na construção de tipos de conjugalidades que estão sendo estabelecidos por esses jovens nos anos de 2002 e 2003.

Para tanto, a metodologia utilizada nessa pesquisa é do tipo qualitativa com entrevistas semi-dirigidas e observações participantes. Foram entrevistadas 18 pessoas, sendo 09 mulheres e 09 rapazes, nas idades entre 15 e 24 anos. Percebe-se que a possibilidade de pensar e verbalizar suas histórias é reviver um pouco daqueles momentos passados, com as mesmas emoções ou com outras, dado o tempo decorrido. Conversamos sobre assuntos que produziam muitos sentimentos que se expressaram entre gargalhadas, seriedade, choro, frustração e satisfação. Conforme comentários de alguns dos sujeitos da pesquisa, eram momentos de relembrar suas experiências, era uma oportunidade de ter alguém que os ouvisse e tivesse interesse por essas histórias.

Quanto à classificação sócio -econômica, seguindo orientações de Bourdieu (2001), busquei considerar o trajeto social dessas pessoas, os acontecimentos que marcaram os altos e baixos da vida social desses indivíduos. Assim sendo, observei que dentre os entrevistados 6 pertenciam à camada popular; 5 pertenciam à classe média-baixa e 3 pertenciam à classe média. A categorização aqui apresentada não se pretende como definitiva, muito pelo contrário, essa discriminação está colocada na complexidade da análise de condições sociais, econômicas e culturais de uma pessoa para nomeá-la em termos de pertencimento de classe. Consideramos então, tanto as condições econômicas em termos de recursos financeiros adquiridos através do trabalho ou pensão, como aspectos relativos a projetos de vida, aspirações, escolaridade, como indicadores de classe.

Uma pesquisa desse tipo justifica-se por sua dimensão atual e futura. Temos como ponto de partida para essa reflexão, concordando com Minayo (et al., 1999), a imagem de juventude de músicas fortes, ritmos velozes, estilos pluralistas e movimentados, angústias, problemas, expectativas, sonhos, um leque de incertezas e tendências. Envolvidos nessas representações, preocupando os adultos, os jovens abrem alas para a sociedade do amanhã. Essa idéia orienta o estudo das relações que esses jovens estabelecem a partir da paternidade ou

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O termo parentalidade engloba a idéia de maternidade e de paternidade. O neologismo visa suprir a falta de uma palavra em português, correspondente a “parenthood” na língua inglesa (Heilborn, 1993 :69).

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maternidade, ou seja, o que essa dita “sociedade do amanhã” nos apresenta a respeito de suas relações afetivas/sexuais após a ocorrência de uma gravidez.

Para a elaboração deste artigo parti da discussão a respeito dos modelos familiares, da experiência da gravidez e das condições sócio-econômicas dispostas pelos jovens entrevistados. Analisei a conjugalidade numa perspectiva de estratégia de união de forças para ultrapassar dificuldades. Vi como alguns dos jovens expressam ter acostumado-se com a idéia da parentalidade e o que isso mudou em suas relações com o trabalho. Por fim, apresentei as questões de gênero e responsabilidade que estão sendo demonstradas através dos dados dessa pesquisa.

Os jovens entrevistados apresentam em suas falas representações de uma família, que nem sempre se confirma nas relações que conseguem estabelecer com o parceiro ou parceira atual. De modo geral, eles relatam a idealização de uma família composta por pai, mãe e filhos e que possa estabelecer um domicílio com uma certa independência da família de origem do casal de jovens. A idéia de que ninguém é perfeito adequa-se aos descompassos entre o modelo idealizado sobre família e o que é possível ser feito. Por isso, também a família não é algo que cumpre exatamente com os ideais. A maioria dos jovens manifestaram que desejavam ter seus filhos sob outras condições. Apenas dois rapazes e três moças apresentam histórias de escolha do momento para ter filhos. Entretanto, vale ressaltar que esse fenômeno não é incomum, como afirma Bott (1976), em seu estudo sobre “Família e Rede Social”, de modo geral, não existe uma “família normal”, assim como também ninguém é perfeito.

Sugiro que uma gravidez ocorrida na fase que abrange as idades entre 15 e 24 anos nem sempre é um “acidente”. Ela pode ser planejada, mas a condição sócio-econômica pode ser um dos marcos diferenciais. Um dos entrevistados, do sexo masculino, comenta que muita gente achou estranho o fato de eles desejarem um filho com pouca idade, “mas nós estávamos tri na boa, tri tranqüilos...”. Ou seja, os jovens demonstravam estar satisfeitos e com boas expectativas para o fato de tornarem-se pais. Essa justificativa do entrevistado relaciona-se com a questão de as pessoas, de maneira geral, com quem os jovens convivem, principalmente as adultas, não esperarem e não considerarem adequado2 para indivíduos muito jovens a paternidade e a maternidade. Nas palavras do entrevistado “no início, bah, teve uns amigos meus e umas irmãs

2 Segundo Heilborn (et al., 2002) “O fenômeno também ganha importância no cenário de mudanças operadas na

concepção social da idades e do gênero que redefinem as expectativas sociais depositadas nos jovens nos dias atuais, sobretudo nas adolescentes do sexo feminino. Parecem ser precisamente as chances abertas às jovens, no

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minhas que ficaram indignados, não faz isso, não sei o que, foi uma crise.” Nesse caso, a gravidez, mesmo para os irmãos e amigos, pessoas com mais ou menos a mesma faixa etária do jovem entrevistado, produziu momentos de desaprovação de suas decisões.

Não pretendo generalizar afirmando que a gravidez em períodos da juventude considerados de “pouca idade” não provoque conflitos familiares. Os dados dessa pesquisa demonstram que a parentalidade na juventude é experienciada de formas diferentes pelas diferentes classes sociais e pelos diferentes gêneros. Mas esse é um caso interessante porque ajuda-nos a desmistificar a idéia, que muitas vezes é veiculada pela mídia e pelas campanhas de prevenção à natalidade na adolescência, de que é uma situação indesejada e produtora de dramas na vida desses jovens. Então, pode haver mais de uma forma de vivenciar a parentalidade na juventude.

Devemos considerar as complicadas condições sociais que esses jovens têm à disposição. São observáveis as dificuldades que eles têm de dar continuidade a sua vida de maneira tranqüila, isso fica marcado no medo que eles passam a ter de ficarem desempregados. Ou seja, as condições sócio-econômicas desses jovens são complicadas pelas dificuldades gerais de entrada no mercado de trabalho para pessoas nessa faixa etária. Essa preocupação apenas é acentuada com a responsabilidade do provimento de um filho.

Quanto aos contratos conjugais, são variadas as formas de estabelecerem-se e essas formas dizem muito a respeito do contexto em que os jovens se encontram inseridos, quais as representações e significados que eles estão reproduzindo e atribuindo aos laços de paternidade e conjugalidade. Para os homens a paternidade constrói-se mais no nível de suas responsabilidades, o que também faz com que eles sintam-se ainda mais motivados e preocupados em trabalhar. Os relatos dos informantes mostram que os rapazes possuem uma trajetória de trabalho relativamente linear, enquanto as moças apresentam trajetórias mais recortadas por entradas e saídas do mercado de trabalho.

A gravidez geralmente é um dos momentos em que as moças estão fora do mercado de trabalho, mas em nenhum dos casos foi apontada a gravidez como motivo para a saída do emprego. Nos casos indicados pelas entrevistadas em que elas não estão trabalhando durante a gravidez, ocorre que elas já não estavam trabalhando fora no período que precedeu à gravidez.

que diz respeito à escolarização, à inserção profissional, ao exercício da sexualidade desvinculado da reprodução, que fundamentam uma nova sensibilidade quanto à idade ideal para se ter filhos.”

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As responsabilidades para as moças ficam mais no nível dos cuidados com a criança. A imagem da mãe está totalmente associada à sua dedicação no cuidado com seu filho, ou seja, o estado geral da criança demonstra a eficiência da mãe. Uma criança considerada mal cuidada suscitará observações diretas à incapacidade, despreocupação e relaxamento da mãe. Ela não será considerada uma “mãe mesmo, porque mãe que é mãe, é mãe 24 horas por dia e a vida toda”, nas palavras de uma das jovens entrevistadas. Portanto, a jovem ao tornar-se mãe incumbe-se de um papel de cuidadora que é vitalício, onde os filhos são o “espelho” da mãe.

O filho, nos casos analisados, ainda não é um instrumento de desvinculação da família de origem. Mas já possibilita tomadas de posições que dizem respeito ao mundo adulto e onde a pessoa se reafirma enquanto um novo adulto a partir da criança como “eu sou a mãe e eu sei o que eu estou fazendo, quero que as coisas sejam do meu jeito” ou “eu sou o pai e sei das minhas responsabilidades”. Segundo Sarti (1996) os filhos conferem à mulher e ao homem um estatuto de maioridade, devendo torná - los responsáveis pelos próprios destinos, possibilitando constituir um novo núcleo familiar.

Ficam marcados dois níveis de responsabilidades, um é o do marido que diz respeito à relação do lar com o exterior, com o mundo do trabalho, com o respeito e com a autoridade masculina. O outro nível é o nível de responsabilidade da jovem mãe, no qual ela está relacionada ao interior do lar como cuidadora tanto dos filhos como do marido, afetuosa, gerenciadora dos proventos da família, educadora e coordenadora da casa. Nenhum dos dois níveis deixa de ser avaliado socialmente, todas essas atribuições estão sob constante avaliação, nesse caso atribuindo títulos de “bom pai” e “boa mãe” a quem consegue enquadrar-se às determinações de maneira considerada adequada.

As moças que ainda permanecem na casa dos pais e não estabeleceram união com o parceiro pai da criança têm sua vida bastante pautada e avaliada pelos pais em relação à criança. Elas só podem passar a pensar em si, fazer coisas para si, depois que a criança foi atendida em todas as suas necessidades. Os desejos delas de trabalharem passam por essa relação, sendo um problema para elas conseguirem alguém que cuide do filho e que possa dividir certos compromissos como levá- lo ao médico. Elas consideram que a maternidade traz dificuldades para que elas continuem desenvolvendo suas atividades individuais como estudar e trabalhar. Uma hipótese possível é de que os desejos de trabalhar e estudar estão mais presentes principalmente entre as moças que não constituíram aliança conjugal com o pai da criança ou outro parceiro.

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Nos casos em que as jovens entrevistadas para esta pesquisa dependem muito das ajudas da mãe ou do pai nos cuidados com as crianças, isso passa a ser moeda de troca e muita vezes, motivo para discussões. Os pais passam a cobrar das jovens esses cuidados que dispensam aos netos. As jovens passam a ser mais exigidas pelos que dividem o domicílio com elas em vários sentidos, tanto no que diz respeito aos trabalhos domésticos, como de um planejamento e uma seriedade na vida. Há um forte discurso sobre sua nova condição de mãe, não sendo mais momento para brincadeiras e irresponsabilidades.

Podemos perceber que a cobrança no que diz respeito ao rapaz é de um outro nível, é da ordem do externo, da responsabilidade, do provimento, do trabalho. Os jovens entrevistados para esta pesquisa não demonstram cobranças que dizem respeito ao dia-a-dia no trato com as crianças. Diferentemente delas que devem responder por qualquer situação que venha a ocorrer com a criança, desde a sujeira, má alimentação até o adoecimento. O rapaz é responsável por não deixar faltar nada.

Alguns relatos expressam que os direitos devem ser iguais quando não há filhos, mas a igualdade é condicionada pela parentalidade, os filhos impõem um outro tipo de relação mais ajustada aos papéis tradicionais de homem e mulher. Isso reafirma a idéia de que se o homem consegue sustentar adequadamente sua família não é ne cessário que a mulher trabalhe e o fato de a mulher não trabalhar pode ser um marcador de que este homem é competente em suas atribuições. Em muitos casos, uma avaliação possível para o trabalho feminino é a incompetência do homem em sustentar sua família, passando a ter um significado maior do que simplesmente mais uma renda familiar, passando a ter uma conotação moral pejorativa.

No estudo aqui apresentado é possível perceber como a parentalidade afeta os jovens de maneira diversa nas diferentes classes, com significados e implicações desse evento para os grupos sociais. Podemos refletir sobre as diversas expectativas lançadas sobre os homens quanto às expressões de suas capacidades de serem homens, pais e adultos. Todas essas qualidades bastantes imbricadas na sua relação com o trabalho e em algumas camadas sociais, também com sua formação escolar. Os eventos do casamento e da paternidade são significativos para a avaliação dessa eficiência masculina enquanto provedor.

De maneira geral, a jovem mãe que deseja conquistar uma posição diferenciada profissionalmente tem que travar uma luta contra os modelos sociais que tendem ainda muito às determinações estabelecidas a partir do masculino. Conquistar um espaço feminino, sem dupla jornada, com divisão das tarefas domésticas ainda é algo a ser negociado entre os casais de maneira

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bastante artificial. Analisando os relatos dos informantes percebe-se que os acordos partem sempre da idéia de que “naturalmente” as obrigações domésticas são da mulher, mas há a possibilidade de discussão para os casais que se dispõem de maneira menos tradicional.

Nos diálogos com os jovens entrevistados é possível perceber uma certa culpabilização das mulheres que trabalham fora quanto aos cuidados com as crianças no nível doméstico. De maneira geral, a família e o parceiro pai da criança tendem a considerar que a mulher estando em casa, a criança fica melhor atendida. Enquanto que se a mulher trabalha, muitas das situações como doenças ocorridas com a criança são vinculadas ao fato de a mãe trabalhar e a criança ser cuidada por outras pessoas que não cuidariam tão bem quanto a mãe. Isso também explica uma certa dificuldade que as mulheres encontram em administrar seu desejo de trabalhar, ter seu dinheiro e administrar a preocupação com os cuidados com a criança. A representação social a respeito da mulher, diretamente associada a um suposto instinto materno, perpassa as diversas classes. Badinter (1985), em seu estudo a respeito do mito do amor materno questiona esse sentimento que é concebido como algo da natureza das mulheres.

Os dados observados nesta pesquisa indicam valores de classe social e gênero que se sobrepõem à questão de fase de vida. Poderíamos considerar que independentemente de serem homens ou mulheres, jovens ou não, muitas das problemáticas apontadas pelos entrevistados e analisadas nesta pesquisa, estariam presentes da mesma forma para o caso de outras fases de vida. São questões sócio-econômicas que afetam todas as pessoas de uma mesma camada social.

Entretanto, não pretendemos desconsiderar que a fase da juventude é uma fase que contém suas peculiaridades, mas a questão é que mesmo uma faixa etária específica não consegue se desvencilhar dos condicionantes de classe e gênero. Quanto menos escolaridade o jovem tem, menores são as oportunidades de uma boa colocação no mercado de trabalho e mais dificuldades ele terá para passar por uma situação de parentalidade e por uma possível aliança conjugal. Situação essa que poderá acompanhá-lo pela vida toda ou por outras fases da vida, caso o quadro não se modifique no que se refere a acesso ao estudo e por conseqüência a oportunidades de emprego.

Por outro lado, também é possível perceber que muitas questões de gênero perpassam as classes representadas nessa pesquisa. Tanto as mulheres quanto os homens, em muitos aspectos, independentemente de classe, estão sob os mesmos determinantes sociais. Esses determinantes

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representam a mulher como contendo uma “natural” relação com o lar e os filhos, enquanto o homem é “naturalmente” associado ao trabalho e às questões de ligação do lar ao mundo exterior.

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