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MÍDIA E POLÍTICA NA ABERTURA DA DITADURA MILITAR: O TELECURSO 2º GRAU DA FUNDAÇÃO ROBERTO MARINHO ( ).

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MÍDIA E POLÍTICA NA ABERTURA DA DITADURA MILITAR: O TELECURSO 2º GRAU DA FUNDAÇÃO ROBERTO MARINHO (1977 – 1981).

Wellington Amarante Oliveira1

RESUMO

Estetexto tem por objetivo central apresentar os alguns dos resultados da dissertação de mestrado intitulada Telecurso 2º Grau: paradigma no ensino pela TV e legitimação política da Rede Globo (1977 – 1981), defendida no ano de 2011 no Programa de Pós-graduação em História da UNESP, campusde Assis, sob orientação do professor Dr. Áureo Busetto. A pesquisa buscou analisar historicamente o ensino na televisão brasileira durante o regime militar, tendo como eixo-central as relações sociais que tornaram possível a criação do programa Telecurso 2º Grau. Neste sentido, a pesquisa pautou-se não somente em remontar os debates e as ações sobre a utilização da televisão no ensino, mas, igualmente, em apresentar as primeiras experiências no setor e, sobretudo, as relações sociais que permearam a criação e o primeiro desenvolvimento do Telecurso, demonstrando como Roberto Marinho utilizou-se de sua posição privilegiada nos campos televisivo e político nacional para consolidar seu projeto de educação.

PALAVRAS-CHAVE: Telecurso; Rede Globo; Ditadura Militar; Televisão.

A principal característica do modelo televisivo brasileiro é a sua condição comercial. Desde sua inauguração no ano de 1950, por Assis Chateaubriand, o meio buscou conquistar audiência visando arrecadar verbas publicitárias. Obviamente, que esse processo foi complexo, lento e com suas particularidades, mas devemos reter essa informação inicial com vistas a compreender os motivos que levaram as emissoras brasileiras e investirem quase que exclusivamente em programas voltados para o entretenimento e a informação, com pouco

espaço para a educação,condição semelhante ao modelo estadunidense.2

Em outras partes do mundo como na Europa, a televisão sempre esteve alicerçada em

uma tríade sagrada: entretenimento, informação e educação.3 No Brasil, as emissões

educativas nos primeiros 27 anos da televisão brasileira foram poucas e pontuais. Situação que pode ser explicada pelo desprezo dos agentes ligados as emissoras comerciais a esse tipo

1Mestre em História pela UNESP/Assis. Professor Substituto da Universidade Federal de Uberlândia – UFU,

campus Pontal. Membro do Núcleo de Pesquisas Interdisciplinares de Memória, Mídia e Linguagem (UNESP/Assis). Contato prof.amarante@gmail.com

2JEANNENEY, Jean-Noël. Uma história da comunicação social. Lisboa: Terramar, 1996. p.244-245. 3BRIGGS, Asa; BURKE, Peter. UmaHistória social da mídia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004. p.193.

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2 de produção. Essa situação alterou-se parcialmente no final da década de 1970, com a entrada da Fundação Roberto Marinho (FRM) no setor.

O termotelecurso é conhecido por grande parte dos brasileiros. Mesmo aqueles que nunca assistiram sequer a uma edição do programa sabem do seu caráter educativo. No entanto, tornar o programa uma marcaconhecida e reconhecida obrigou o empresário Roberto Marinho a mobilizar importantes agentes e instituições que estavam no âmbito de suas relações sociais, em um período marcado pela abertura do Regime Militar.

Em 26 de setembro de 1977, Roberto Marinho criava sua Fundação, 4 com o objetivo

declarado publicamente de colocar os meios de comunicação a serviço da educação. 5 A partir

desse momento, o dono da TV Globo passou a atuar em uma área ainda pouco contemplada pelas emissoras comerciais de televisão no Brasil, e que lhe possibilitaria estreitar ainda mais as suas relações com diversos setores da sociedade e com o Estado, então governado pelos militares.

O primeiro parceiro foi a Fundação Padre Anchieta (FPA) mantenedora da TV Cultura de São Paulo. Desde sua criação,em 1967, a FPA empenhava-se na produção de diversos programas instrucionais. De origem diversa de sua congênere carioca, nasceu da iniciativa do

governador paulista Abreu Sodré de criar uma emissora de TV pública.6

No dia 16 de janeiro de 1978, foi ao ar pela primeira vez a vinheta de abertura do programa. Enquanto no vídeo surgiam um a um os símbolos das instituições promotoras, em

off,7 uma voz masculinaanunciava: “Fundação Roberto Marinho em parceria com a Fundação

Padre Anchieta apresenta: educação permanente, Telecurso 2º Grau, atualização de conhecimentos, exames supletivos”. Há declarações de que as linhas telefônicas da Rede Globo ficaram congestionadas nesse dia, com o número expressivo de pessoas ligando para

saber mais informações sobre a novidade. 8

Com o início do Telecursopela televisão começou também a comercialização dos fascículos nas bancas de jornal. Para potencializar as vendas, as duas fundações investiram

4RIXA, Ricardo Xavier. Almanaque da TV – 50 anos de memória e informação. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002.

p. 255.

5FINGUERUT, Silvia; Sukman, Hugo (org.). Fundação Roberto Marinho 30 anos. Rio de Janeiro: Goal, 2008.p.

11.

6BARROS FILHO, Eduardo Amando de. Por uma televisão cultural-educativa e pública: a TV Cultura de São

Paulo, 1960-1974. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2011.p. 136.

7Recurso pelo qualo texto é lido sobre as imagens e o seu emissor/narrador não aparece na dimensão do vídeo. 8

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3 maciçamente em propaganda. Esse tipo de ação publicitária pôde ser constatada pelo leitor dos veículos da mídia impressa um dia após a inauguração do Telecurso.

A partir do dia 14 de julho de 1978,oTelecurso, que já era veiculado em São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Goiânia, passou a ser transmitido para todo o Brasil, via 33 estações. A ampliação do sinal esteve alicerçada na vasta rede de afiliadas à Rede Globo, nas emissoras educativas do governo federal e em alguns canais comerciais.O alcance nacional do Telecurso significava visibilidade às ações da FRM, e por extensão à Rede Globo, e de todos que faziam parte do projeto.

Parte do sucesso do Telecurso em seu primeiro ano de veiculação na televisão brasileira foi fruto de um amplo trabalho na produção audiovisual do programa, que resultou em boa aceitação da audiência e, consequentemente, seu reconhecimento no campo televisivo e em setores oficiais envolvidos com a política educacional. Para além disso, outra parte do sucesso deve-se à capacidade que a FRM teve de aproximar do projeto diversos agentes do campo político e educacional, característica que só foi possível porque o Telecurso estava em consonância com o regime militar. Pois,mesmo em um período notadamente marcado pela distensão política, um certo enfraquecimento do poderio dos militares eo crescimento dasforças de oposição, ter o apoio oficial do governo militar ainda era um dos objetivos principais a ser alcançado pela FRM, tanto para sobrevivência do Telecurso quanto da própria fundação em termos de financiamento público dos seus projetos.

Para tanto, o Telecurso teria de responder a algumas expectativas dos governos militares para a educação. Expectativas que tiveram seus delineamentos lançados já no início do regime, com os acordos MEC-USAID e as reformas no sistema de ensino. O objetivo da integração nacional, mencionado em grande parte dos documentos oficiais dos governos militares, era uma característica que convergia o Telecurso, e por extensão à Rede Globo, e os líderes do regime militar. Afinal, em uma iniciativa inédita, um programa instrucional era veiculado por uma TV comercial em nível nacional, e seus conteúdos eram os mesmos para todo o país, o que significa um modo de integração via teleducação. Ou seja, o Telecurso, ao seu modo, conseguiria aquilo que o regime militar esperava realizar com as emissoras educativas, uma ampla rede capaz de integrar o país, compartilhando suas ideias e seus valores educativos.

As relações de Roberto Marinho com o campo político mostraram-se cruciais para o sucesso do Telecurso. Com o trânsito que o empresário tinha entre as autoridades do governo,

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4 tornar o programa uma solução para os problemas educacionais brasileiros foi questão de tempo. Soma-se a isso, a utilização de toda estrutura de suas empresas de comunicação para dar visibilidade ao projeto. E assim, posicionar o Telecurso como o paradigma de teleducação pela televisão no Brasil.

Considerações Finais

A pesquisa original, matriz para esse texto esteve permanentemente alicerçada nas

perspectivas teórico-metodológicas da sociologia da prática de Pierre Bourdieu9e da história

cultural de Roger Chartier.10A partir desses autores buscamos realizar o que propõe Áureo

Busetto:

um estudo histórico da TV envolvendo a compreensão, ao mesmo tempo, de seu aparato de funcionamento (em termos tecnológicos, organizacionais e regulatórios) e das práticas e representações dos agentes integrados ao campo televisivo, tanto em termos de relações internas desse campo quanto nas relações mantidas com outros domínios sociais específicos que compõem a sociedade, uma história da TV calcada na busca por conhecer e entender feixes do conjunto de relações que geraram um campo de possibilidadeshistóricas a processos de manutenção e mudança do meio.11

Podemos concluir que dentro de um quadro televisivo com alguns experimentos educativos pouco duradouros e sem abrangência nacional, o surgimento do Telecurso 2º Grauacabaria por impor um paradigma à programação educativa no Brasil. Naquele momento e dado o quadro televisivo nacional, a Rede Globo era a única que dispunha de condições para investir recursos tecnológicos e profissionais adequados e, modernos à produção e veiculação de um programa educativo da magnitude alcançada pelo Telecurso.

A constituição e a dinâmica do modelo televisivo comercial tornaram-se, no Brasil, um fator estruturante das práticas desenvolvidas pelos agentes do campo televisivo em termos de produção. O exemplo do Telecurso 2º Grau auxilia a compreensão de que apenas quando programas educativos passaram a ser pensados e experimentados por profissionais formados

9 BOURDIEU, Pierre. O Poder Simbólico. Lisboa: Difel, 1989; Sobre a televisão. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,

1997.

10CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Lisboa: Difel, 1990.

11 BUSETTO, Áureo. “Sintonia com o contemporâneo: a TV como objeto e fonte da História.” In: BEIRED,

José Luís Bendicho; BARBOSA, Carlos Alberto Sampaio. (orgs.). Política e identidade cultural na América

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5 dentro da lógica televisiva comercial, em nítida consonância com novos experimentos da linguagem audiovisual televisiva, foi possível se avançar na busca e construção sistemática de um modelo de produção de telensino.

Apesar da parceria inicial realizada pela FRM com a FPA, durante a produção do programa o que se observou foi que a condução e a participação dos profissionais ligados às empresas de Roberto Marinho ganhavam corpo e começavam prevalecer em detrimento daqueles vinculados à emissora pública paulista. Direção expressa na adoção de práticas como a seleção de produtores e roteiristas oriundos da emissora comercial, com o fito de adequar as telaulas à linguagem mais propriamente televisiva, a qual, então, era experimentada mais largamente pelos profissionais da Rede Globo. A escolha de José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, para acompanhar o andamento dos trabalhos não deixava sombra de dúvidas sobre aquela direção, além de ser um atestado do desejo de Roberto Marinho ter um programa com a cara de sua emissora. E isso significava dizer que o “Padrão Globo de Qualidade”, que passou a orientar toda a produção da emissora a partir da década de 1970, devesse finalmente ser aplicado na teleducação.

Assim, a Rede Globo que já dominava desde o inicio da década de 1970 a produção do entretenimento e da informação no Brasil, conquistou com o Telecurso 2º Grau o terceiro elemento sagrado da produção televisiva: a educação.

Referências Bibliográficas

BARROS FILHO, Eduardo Amando de. Por uma televisão cultural-educativa e pública: a TV Cultura de São Paulo, 1960-1974. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2011.

BOURDIEU, Pierre. O Poder Simbólico. Lisboa: Difel, 1989. ______. Sobre a televisão. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997.

BRIGGS, Asa; BURKE, Peter. UmaHistória social da mídia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004.

BUSETTO, Áureo. “Sintonia com o contemporâneo: a TV como objeto e fonte da História.” In: BEIRED, José Luís Bendicho; BARBOSA, Carlos Alberto Sampaio. (orgs.). Política e identidade cultural na América Latina. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2010. pp. 153-175.

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6 FINGUERUT, Silvia; Sukman, Hugo (org.). Fundação Roberto Marinho 30 anos. Rio de Janeiro: Goal, 2008.

JEANNENEY, Jean-Noël. História da comunicação social. Lisboa: Terramar, 1996.

NISKIER, Arnaldo. Educação à distância: a tecnologia da esperança. São Paulo: Loyola, 1999.

OLIVEIRA, Wellington Amarante. Telecurso 2º Grau: paradigma no ensino pela TV e legitimação política da Rede Globo, 1977-1981. Dissertação de Mestrado. Assis: UNESP, 2011.

RIXA, Ricardo Xavier. Almanaque da TV – 50 anos de memória e informação. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002.

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