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Valquíria Araújo Sales 1 André de Araújo Vieira 2 Orientadora: Ângela Paula Nunes Ferreira 3

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Academic year: 2021

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AVANÇOS E DESAFIOS NA REALIZAÇÃO DA REVISTA ÍNTIMA DOS

VISITANTES DOS PRESÍDIOS: UMA ANÁLISE A PARTIR DAS

PENITENCIÁRIAS DO MUNICÍPIO DE CAMPINA GRANDE-PB.

Valquíria Araújo Sales1 André de Araújo Vieira2 Orientadora: Ângela Paula Nunes Ferreira3

RESUMO: No nosso sistema prisional, mulheres, crianças e idosos são submetidos à violação dos seus Direitos Fundamentais, ao se submeterem de forma vexatória à revista íntima na entrada dos presídios. Nestes casos, destaca-se o desrespeito às mulheres, crianças e idosos, grande maioria das pessoas que todas as semanas necessitam passar pela revista íntima para ter acesso aos seus entes que ali se encontram reclusos. Assim, surge como problema da nossa pesquisa o seguinte questionamento: De que modo à revista íntima realizada na entrada dos Presídios do Município de Campina Grande-PB se caracteriza como desrespeito à dignidade humana dos visitantes? Objetiva-se a partir desta pesquisa, examinar e debater, à luz do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, de que modo a revista íntima realizada nos visitantes na entrada dos Presídios do Município de Campina Grande-PB se constitui como afronta à dignidade humana destes. Para tanto, utilizamos o procedimento de pesquisa de campo, e como instrumento de coleta de dados a realização de entrevistas com 30 visitantes de presos com idade entre 18 e 75 anos que visitam encarcerados na Penitenciária Regional de Campina Grande-PB e na Penitenciária Regional de Campina Grande-PB(Máxima). A presente pesquisa nos permitiu concluir que da forma que é realizada atualmente, a revista íntima realizada na entrada dos Presídios do Município de Campina Grande-PB, sobretudo quando não se utiliza aparelhos eletrônicos, representa uma afronta a grande quantidade de Direitos, destacando-se o desrespeito ao Princípio da Dignidade Humana. Deste modo, cabe ao poder público disponibilizar os aparelhos que amenizam esses constrangimentos, como a aquisição do aparelho de scanner humano.

Palavras-chave: Revista íntima. Desrespeito. Dignidade Humana.

1 Graduanda do 4º período do Curso de Direito da Faculdade Reinaldo Ramos/FARR, do Centro de Educação Superior

Reinaldo Ramos/CESREI.

2 Graduando do 4º período do Curso de Direito da Faculdade Reinaldo Ramos/FARR, do Centro de Educação Superior

Reinaldo Ramos/CESREI.

3 Mestra em Letras pela UFPB, Especialista em Direito Constitucional pela UEPB e Especialista em Ciências Penais

pela Faculdade Anhanguera. Professora do Curso de Direito da Faculdade Reinaldo Ramos/FARR, do Centro de Educação Superior Reinaldo Ramos/CESREI.

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1 INTRODUÇÃO

No sistema prisional brasileiro, os visitantes são submetidos à violação dos seus Direitos Fundamentais, ao se submeterem de forma vexatória à revista íntima na entrada dos presídios.

Nestes casos, destaca-se o desrespeito às mulheres, crianças e idosos, grande maioria das pessoas que todas as semanas necessitam passar pela visita íntima para ter acesso aos seus entes que ali se encontram reclusos.

Assim, surge como problema da nossa pesquisa o seguinte questionamento: De que modo à revista íntima realizada na entrada dos Presídios do Município de Campina Grande-PB se caracteriza como desrespeito à dignidade humana dos visitantes? Objetiva-se a partir desta pesquisa, examinar e debater, à luz do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, de que modo a revista íntima realizada nos visitantes na entrada dos Presídios do Município de Campina Grande-PB se constitui como afronta à dignidade humana destes.

Para tanto, utilizamos o procedimento de pesquisa bibliográfica, pesquisa de campo, e como instrumento de coleta de dados a realização de entrevistas com 30 visitantes de presos com idade entre 18 e 75 anos que visitam encarcerados na Penitenciária Regional de Campina Grande-PB e na Penitenciária Regional de Campina Grande-Grande-PB (Máxima). Além disso, foi adotado o método de pesquisa antropológico da etnografia através da observação participante, visto que inserir-se como pesquisadora e conviver de perto com esta realidade permitiu não só conversar com os visitantes passam por este processo, mas também, se submeter a este.

No momento da revista íntima realizada nos visitantes do Presídio Regional Padrão de Campina Grande-PB (Máxima), em que ainda não há aparelho de scanners, os visitantes, semanalmente, são submetidas a se despir totalmente perante duas agentes penitenciárias e como se não bastasse, na presença também das outras visitantes, pessoas desconhecidas, e tendo que obedecer às ordens de realização de uma performance corporal na busca por detectar materiais ilícitos escondidos no corpo destas pessoas.

2 FUNDAMENTOS DA DIGNIDADE HUMANA

De acordo com o inciso XLV, do art.5º da Constituição Federal brasileira, “nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido.” Acerca do tema a Convenção Americana sobre Direitos Humanos destaca que,

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Artigo 11. Proteção da honra e da dignidade

1. Toda pessoa tem direito ao respeito de sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade. 2. Ninguém pode ser objeto de ingerências arbitrárias ou abusivas em sua vida privada, na de sua família, em seu domicílio ou em sua correspondência, nem de ofensas ilegais à sua honra ou reputação.

3. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais ingerências ou tais ofensas.

De acordo com Barroso (2014), na cultura ocidental, o sentido inicial atribuído à dignidade, desde os romanos até o século XVIII esteve associado a um status superior ou posição social mais elevada.

Este conceito pré-moderno de dignidade tinha como pressuposto a existência de uma sociedade hierarquizada que categorizava os indivíduos a partir de determinados critérios. Desta maneira, se torna inadequado considerar que a ideia contemporânea de dignidade humana surgiu como evolução do termo romano “dignitas hominis”.

No entanto, é possível afirmar que de forma paralela a este conceito romano, desenvolveu-se o desenvolveu-sentido de “dignidade humana” adotado na atualidade, adotado na atualidade, a partir de origens religiosas e filosóficas que se desenvolve principalmente a partir da tradição judaico-cristã que prega a unidade de raças, tendo como marco o evangelho, do Iluminismo, a partir das contribuição de Hobbes, Lock e Rousseau, e o fim da II Guerra Mundial, marcado pelos horrores do nacional-socialismo e do fascismo.

Após o término da II Guerra, o Princípio da Dignidade Humana passou a ser recorrentemente utilizado nos Tribunais Nacionais e internacionais, tanto em lides que divergiam sobre o Direito à vida, aborto, tortura, como em situações inusitadas como no caso do arremesso de anões praticado na França como atividade recreativa.

Sarlet (2008,p.27), em obra intitulada “Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988”, assevera que

Justamente pelo fato de que a dignidade vem sendo considerada (pelo menos para muitos e mesmo que não exclusivamente) qualidade intríseca e indissociável de todo e qualquer ser humano e certos de que a destruição de um implicaria a destruição do outro, é que o respeito e a proteção da dignidade da pessoa (de cada uma e de todas as pessoas) constituem-se (ou, ao menos, assim o deveriam) em meta permanente da humanidade, do Estado e do Direito.

Sendo assim, podemos afirmar que constranger os familiares dos presos a se submeter a uma revista íntima na entrada dos presídios pode ser considerado inclusive uma afronta ao que dispõe o art.5°, XLV, que prevê que a pena não poderá passar da pessoa do apenado, por obrigar

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cidadãos que não infringiram a lei penal, apenas pelo motivo de ser parente ou visitante de um preso, ter que se submeter a tal situação humilhante, além de infringir tratados internacionais de Direitos Humanos, e sobretudo, desrespeitando a Dignidade da pessoa humana, elencada em nossa Constituição Federal de 1988 em seu art.1°, III, como fundamento da República Federativa do Brasil.

No entanto, na prática, muitas vezes, os familiares dos presos são submetidos a situações tão desrespeitosas e vexatórias, em nome da segurança pública, reflexos das penas de algum ente querido, afrontando diretamente sua dignidade humana. É o que acontece no momento da revista íntima em que os visitantes são obrigados a ficar totalmente despidos, em frente não só aos agentes penitenciários como também diante de outros visitantes, terem seu corpo revistado, ter que se colocar em posições ultrajantes em cima de um espelho.

Acerca do tema, no Direito comparado, é importante mencionar julgamento realizado na Argentina, em que o país foi condenado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos por ter submetido mulheres e crianças a revistas íntimas similares as realizadas no Brasil. O caso específico objeto da condenação envolveu uma senhora e sua filha de apenas 13 anos de idade, que foram submetidas à revista vaginal.

Neste caso, a CIDH se posicionou no sentido de que

ao impor uma condição ilegal para a realização das visitas à penitenciária sem dispor de mandado judicial ou oferecer as garantias médicas apropriadas, e ao efetuar revistas e inspeções nessas condições, o Estado Argentino violou os direitos da Senhora X e sua filha Y consagrados nos artigos 5, 11 e 17 da Convenção, em correlação com o artigo 1.1, que dispõe pela obrigação do Estado Argentino de respeitar e garantir o pleno e livre exercício de todas as disposições reconhecidas na Convenção. No caso da menor Y, a Comissão conclui que o Estado argentino também transgrediu o artigo 19 da Convenção.

A revista íntima se configura como verdadeiro constrangimento ilegal, ultrapassando os limites do poder do estado sobre o cidadão.

3 A REVISTA ÍNTIMA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

O artigo 41, X da Lei de Execuções Penais, assegura como Direito do preso a “visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados”.

No entanto, para que os visitantes adentrem aos presídios brasileiros, na maioria dos estabelecimentos, os visitantes, independente de sexo ou idade, crianças, idosos, homens, mulheres, adolescentes, gestantes, portadores de necessidades especiais, passam por uma revista íntima vexatória para adentrar ao presídio a fim de visitar o presos. Esta revista tem como

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finalidade analisar se estes visitantes estão escondendo em seu corpo armas, drogas, celulares, ou outros objetos impedidos de entrar no presídio. È sob este argumento que as revistas são consideradas indispensáveis e destinada a todos, em nome da “segurança pública.”

No entanto, várias pesquisas apontam para o fato de que na realidade esta revista íntima vexatória, não alcança a sua finalidade de evitar a entrada de produtos ilícitos nos presídios, pois de acordo com estudos realizados, inclusive pela Rede de Justiça Criminal, tendo por base documentos oficiais oriundos da Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de São Paulo, somente 0,03% dos visitantes foram detectados no momento da revista íntima carregando objetos considerados proibidos, ou seja, uma quantidade de 3 visitantes no universo de 10 mil.

Considerando estes dados, vale a pena refletir, a luz do princípio da proporcionalidade, se diante destes dados é razoável submeter tantas pessoas a situações vexatórias no momento da revista íntima, em evidente afronta ao Princípio da Dignidade da pessoa humana.

Tendo em vista esta contestação, vários estados, a exemplo de São Paulo, proibiram a realização de revista íntima em seus presídios. Naquele estado, foi editada a Lei estadual n° 15.552/2014 que anunciou um prazo de 180 dias, a ser contado a partir de 12 de agosto de 2014, para que o governo adquirissem aparelhos de scanners, detectores de metais e equipamentos de raio-x, para todas as suas unidades prisionais. Após esta data, os agentes penitenciários ficariam proibidos de exigir que as visitas se dispam e sejam tocadas.

De acordo com o novo procedimento, as visitas passariam a ser revistadas através da utilização destes aparelhos. No caso de ser detectado algum material suspeito, o visitante seria impedido de entrar na unidade, e persistindo o interesse do mesmo em adentrar no presídio, este seria encaminhado ao setor médico, para que assim fosse feita a verificação. Sendo localizado algum objeto ilícito escondido no corpo, o visitante seria encaminhado à delegacia para as medidas legais. Apesar do avanço que representa esta lei, no que diz respeito à proteção dos Direitos Humanos, até os dias atuais, passados em média dois anos, o novo modelo de revista, eliminando a revista manual íntima e vexatória ainda não está sendo plenamente cumprida naquele estado.

Acerca do tema, interessante analisar o julgado brasileiro (Apelação n 0006133-85.2011.8.26.0224), em que o Estado paulista foi condenado no mês de janeiro de 2016 a pagar indenização no valor de 10 mil reais por danos morais a uma mulher que, ao visitar o filho em uma penitenciária, foi submetida à revista íntima excessiva e vexatória por suspeita de portar entorpecentes.

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Ainda acerca do tema, é importante mencionar a resolução n° 05/2014 editada pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) recomendando a não utilização de práticas vexatórias para o controle de ingressos aos locais de privação de liberdade.

No Estado da Paraíba, seguindo uma tendência nacional de abolição das revistas íntimas vexatórias, e em cumprimento ao determinado na resolução n°05/2014 do CNPCP, alguns presídios do estado já adquiriram o aparelho de raio x e scanners e detectores de metais, como é o exemplo da Penitenciária Regional do Serrotão (Presídio do Serrotão) localizado no Município de Campina Grande-PB. No entanto, na mesma cidade, encontramos a Penitenciária Padrão da Cidade de Campina Grande-PB (Penitenciária Máxima), que conforme verificado in loco, as revistas ainda são realizadas sem os aparatos tecnológicos, ainda aos moldes antigos e vexatórios.

Ainda sobre visitas íntimas, não mais no âmbito dos presídios, mas aquelas ocorridas nas empresas privadas, em seus funcionários, no início do ano de 2016, foi editada a Lei n°13.271, a qual proibiu a revista íntima nas empresas privadas, e nos órgãos da administração pública, direta ou indireta. No texto original, especificamente no art.3°, a lei trazia a proibição desta modalidade de revista também nos ambientes prisionais, no entanto, o dispositivo foi vetado.

Resta a nossa interrogação: Se realizar a revista íntima em funcionários de empresas privadas, e nos órgão da administração pública foi considerado vexatório, e por isso, não permitido, porque tal proteção não se estende aos visitantes dos presídios, na maioria da vezes cidadãos de bem, que se dirigem aquele local em gesto de solidariedade a parentes que ali se encontram presos? Tal proteção não deve se aplicar a tais pessoas apenas pelo fato de serem parentes de presidiários? O fato destas pessoas estarem neste local para visitar detentos faz delas menos merecedoras da proteção do estado através da lei ou merecedores do respeito integral a sua dignidade humana? Não se constituem em seres humanos como os demais? Se já há um entendimento no sentido de que tal revista se configura vexatória, e, portanto, há um movimento no sentido de aboli-la, porque não permitir que a solução desta celeuma fosse dada de forma definitiva a partir da aprovação da lei sem o veto do art.3°? Fica aqui o nosso questionamento.

Infelizmente, diante da inércia do estado, este tema ainda continua sendo objeto de debates acalorados em nosso país, enquanto isso,centenas de pessoas, crianças, adolescentes, adultos, idosos, homens e mulheres, continuam sendo vítimas de revistas vexatórias no momento da revista íntima para entrada dos presídios em todo o nosso país.

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4 A REVISTA ÍNTIMA NOS PRESÍDIOS DO MUNICÍPIO DE CAMPINA GRANDE-PB

A nossa pesquisa utilizou como instrumento de coleta de dados a realização de entrevistas com visitantes da Penitenciária Regional de Campina Grande-PB (Presídio do Serrotão) e da Penitenciária Regional Padrão do Município de Campina Grande-PB (Penitenciária Máxima). Ao todo, foram entrevistas 30 mulheres na entrada destes presídios, durante o mês de agosto de 2016. A entrevista partia da pergunta: “Como a senhora se sente ao passar pela revista íntima na entrada do presídio?”, a partir da qual as mulheres produziram suas narrativas e apresentaram suas impressões acerca da revista íntima. Para preservação da identidade das participantes da pesquisa, estas serão apresentadas neste trabalho, pelas letras do alfabeto, sem nenhuma relação com o nome delas, seguindo apenas a ordem em que foram entrevistadas, de modo que não seja possível nenhum tipo de identificação destas.

Na entrevista, as visitantes que se encontram na fila da Penitenciária Regional Padrão do Município de Campina Grande-PB, as mulheres relataram uma grande indignação coletiva, e em alguns momentos não se contiveram em demonstrar com lágrimas a verdadeira emoção ao falar sobre o processo de revista íntima, a invasão da privacidade e constrangimento as quais são submetidas. Inclusive, há relatos de muitas mulheres que não visitam seus entes reclusos por não conseguir se submeter ao processo de revista íntima, chegam até a ficar aguardando na fila, esperando outro familiar entrar e voltar com notícias dos parentes.

Ao responder a entrevista, a Senhora “Y”, viúva, de 74 anos, afirmou que não visita seu neto, pois por motivo de caráter, de respeito a sua religião, não fica despida na frente de pessoas que não conheça. Destacamos abaixo, trechos da narrativa da senhora “Y”:

Faz 1 (um) ano que meu neto está preso por acusação de homicídio. Só entrei uma vez, e numa mais. Eu nunca fiquei nua nem na frente da minha mãe, isso é um desrespeito ao ser humano, pra entrar pra ver meu neto ter que ficar nua, uma velha como eu. Venho e fico na fila esperando minha filha visitar meu neto e quando termina a visita vamos embora juntas. É pra ele saber que meu amor por ele é grande. Não entro por causa do constrangimento, mas fico lá fora representando o meu amor a ele. E aguardando no dia que mudar, trazer uma máquina de raio x, eu entro e visito ele. Fiquei com muita vergonha, ter que tirar a calcinha, ficar mandando tirar a prótese, tirar minhas vestes, é humilhante, levantar minhas mamas, e depois levantar as pernas para ver se tem algo nas partes íntimas. Eu fiquei muito triste, e com vergonha, me sentindo desrespeitada, e sem falar que entrei com três mulheres jovens e adolescentes que ficaram mesmo sem querer a observar uma senhora velha numa situação daquelas. Deus me livre! É contra meus princípios.

A senhora “Y”, apesar de ter passado pela revista íntima apenas uma vez, apresentou com riqueza de detalhes como a revista íntima representa situação aviltante, que afronta princípios individuais, gera constrangimento, e afronta diretamente a dignidade da pessoa humana. Na

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narração da senhora “Y”, percebemos também como a realização da revista íntima vexatória se transforma em uma forma de limitação ao direito de visita assegurado aos presos, pois em muitos casos, seus familiares, sobretudo crianças e idosos, deixam de realizar as visitas, para não ter que se submeter a situação de constrangimento e humilhação na visita íntima.

No momento da entrevista, a Senhora “B” de 34 anos, em tom de desabafo, afirmou: “Quando é dia de visitar meu filho, fico com crises nervosas um dia antes, sem conseguir dormir, ansiosa, e meu psicológico fica tão abalado que mesmo na fila, estando sem algo ilícito, choro e fico muito nervosa e revoltada com toda essa situação que passo para ver meu filho”.

A Senhora D, de 54 anos, relatou que “as agentes são educadas e nos tratam bem, mas o fato é ter que se despir perante elas, não sei explicar o porquê, nos dá um repúdio, por acharmos, no íntimo, que fomos violadas, uma sensação de que algo nos foi tomado, arrancado, uma sensação horrível.”

A Senhora “G”, de 39 anos, descreve em sua narrativa, de forma detalhada, como se procede a visita íntima. Vejamos:

Bem, em um quarto com três mulheres, em seguida todas se despem na frente das agentes penitenciárias, tirando roupa, calcinha, ficando completamente nuas, em seguida, passamos por uma máquina que detecta metais, passamos uma de cada vez, então abrimos nossas pernas, abrimos a boca, soltamos os cabelos, em seguida nos vestimos. Me sinto impotente, humilhada, envergonhada, de ter que ficar na frente de outras pessoas que nem as conheço, tenho muita vergonha, quando termina fico chateada, pois é uma briga eu ir pro ginecologista, e duas vezes por semana ter que passar por isso é humilhante pra nós, como pra as agentes. Tenho uma mãe de 73 anos, e minha filha adolescente de 17 anos. Ela diz, “mainha, queria ver painho, mas ficar nua não quero” e minha mãe também não vem porque é constrangedor.

O relato da Senhora “G” nos mostra como a revista íntima realizada na Penitenciária Regional Padrão do Município de Campina Grande-PB (Máxima), se configura como afronta aos Direitos Humanos, dos seus visitantes, que na grande maioria das vezes, conforme verificado in loco, se constitui por mulheres, das mais diversas faixas etárias, adultas, adolescentes, idosas, inclusive por gestantes.

Em entrevista a Senhora “F”, a mesma enfatizou que no momento da revista íntima,

Tiramos toda a roupa, ficamos totalmente nuas, e agentes vão mandando a gente abrir a boca, abrir o cabelo com as mãos, passamos por um arco que detecta metal, isso em todas as visitas e entrando três mulheres de uma vez. Uma coisa constrangedora aconteceu comigo, as agentes cismaram comigo, por meu esposo ser preso por tráfico, acharam que eu estaria com drogas no interior da vagina, e me perguntaram: “Mulher, você está com algo ilícito?” Eu respondi que não! Aí, tem uma cama de solteiro no quarto, então me pediram pra deitar e eu me recusei, e disse não havia drogas comigo! Chamaram a escolta penitenciária e me levaram para o Presídio do Serrotão, pois lá tem o scanner, a máquina raio x. Chegando lá, fui submetida a passar pela máquina que mexeram e constataram que não havia nada de drogas, nem ilícito nenhum...chorei o dia todo, não quis nem ir visitar

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meu esposo, fui pra casa com muita revolta, depois disso, temo a visita. A revista ficou algo mais evasivo pra mim, é horrível! Fiquei com trauma, só venho, porque é o jeito.

A narrativa da senhora “F” nos mostra que, na nossa cidade, a revista íntima ainda ocorre no modelo já condenado inclusive por organismos internacionais, como a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que após análise de caso de revista íntima vexatória, condenou a Argentina por tal prática. Além disso, podemos perceber como as visitantes são julgadas, pelo crime cometido por seus companheiros, de modo a fazer com que, acabem sendo penalizadas pela conduta ilícita de outra pessoa, fazendo com que, explicitamente, as consequências da pena, em afronta a ditames constitucionais, acabe por ultrapassar a pessoa do condenado, tendo reflexos diretos na vida dos seus familiares.

Ainda nesta pesquisa, inclusive com o objetivo de comparação, a mesma entrevista foi realizada com visitantes na entrada da Penitenciária Regional do Serrotão, também no Município de Campina Grande-PB, que já realiza a revista a partir de scanners, aparelho de raio x e detectores de metal. Nestas entrevistas, percebemos que o grau de constrangimento e humilhação causado as visitantes é bem menor, inclusive em alguns casos narrados pelas entrevistadas, a revista não se configura mais como algo aviltante para estas. Vejamos o depoimento da Senhora “N”, de 46 anos, que visita o seu esposo condenado por tráfico de entorpecentes, entrevistada na entrada do Presídio do Serrotão:

A revista é algo que não agride, não tira as roupas. São estabelecidas apenas o único tipo de vestimenta, calça leg, sandálias de cor branca, blusas compridas para que não mostre suas curvas. Passamos por uma máquina de scanner corporal, não corre nenhum constrangimento, somos revistados na frente das outras, sem tirar sequer nenhuma peça de roupa, não tenho problemas nenhum em relação a entrevista.

Corroborando do mesmo entendimento, de que a revista íntima realizada com a utilização de meios eletrônicos não se configura como algo que afronta a dignidade humana, temos o relato da Senhora Z, de 38 anos, também entrevista na entrada do Presídio do Serrotão. Vejamos:

Visito meu filho há 4 anos, preso por homicídio. A revista não impede de visitar meu filho, pois não precisa tirar as roupas. Entra umas 20 pessoas de uma vez, somos bem tratadas pelas agentes. Me sinto a vontade de saber que não preciso tirar as roupas ou ficar nua, de se agachar e se expor as partes íntimas, com antes era realizada. Agora com esse equipamento, até estando menstruadas entramos, pois antes não era permitido e isso causava revolta, de não poder entrar pra ver nossos reclusos.

Apesar das visitantes do Presídio que já possui aparelhos eletrônicos do tipo scanners corporal e raio x, demonstrarem que a revista íntima não mais se configura como situação constrangedora e humilhante para elas, diferente daquelas submetidas a revista íntima manual,

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explicitamente vexatória, percebemos em algumas entrevistas, que há uma certa preocupação com as possíveis consequências que o uso desse aparelho raio x, semanalmente, possa acarretar, a longo prazo, para a saúde. Vejamos o depoimento da Senhora “M”, de 45 anos, abordando a preocupação:

A revista não é vexatória, não é constrangedora, é tudo muito rápido e não tem problema com a revista, porém, me preocupo com esse processo de passar toda semana por um processo radioativo, podendo desenvolver doenças como câncer, osteoporose, dentre outras. Sei dessas agressões a saúde, pois sou da área de saúde, e me preocupo com o tempo a se submeter a esse processo, mas tem que ser assim, infelizmente.

Ainda acerca do tema, destacamos o relato de outra entrevistada, a “P”, que visita seu pai há três anos:

Não gosto da revista, pois às vezes me sinto envergonhada, mesmo sem tirar roupa. Acho chato o processo, mas sei que poderia ser pior sem o scanner, mas fico preocupada com as crianças de braço, por passar na máquina. Só no futuro saberemos os problemas, as doenças que esses aparelhos vão causar nessas crianças, não é humilhante, mas preocupante.

Acerca do tema, entrevistamos uma visitante grávida, que nos deu o seguinte depoimento:

Visito o meu esposo há um ano, preso por tráfico de entorpecentes. Engravidei nas visitas íntimas e no começo passava pelo scanner, mas quando descobri que estava grávida, levei ao conhecimento das agentes, portando o exame BTACG, positivo, e de imediato passei a ser revistada só com um detector de metais, que não agride o feto, e me senti mais confortável de saber que há esse respeito por eu estar grávida e terem a preocupação pelo menos com a criança.

As entrevistas realizadas com visitantes da Penitenciária Regional do Serrotão foram bastante esclarecedoras no sentido de esclarecer como a utilização de aparelhos eletrônicos, a exemplo do raio x, scanner corporal, pode amenizar a situação de humilhação e constrangimento a que são submetidos os visitantes dos presídios, no momento da revista íntima, o que se configura como um grande avanço para a proteção dos Direitos Humanos destas pessoas. Por outro lado, percebemos que com a utilização destes aparelhos, surge uma nova preocupação referente a saúde destes visitantes, ao terem que se submeter semanalmente, a passar por aparelho radioativos, o que poderá trazer consequências graves num futuro próximo.

Já no que diz respeito aos métodos de revista íntima realizados na entrada da Penitenciária Regional Padrão da Cidade de Campina Grande-PB (Máxima), podemos concluir que o método utilizado neste Presídio, submete os visitantes a situações vexatórias e humilhantes que desrespeitam a dignidade humana destas pessoas. Portanto, cabe ao poder público disponibilizar os aparelhos que amenizam esses constrangimentos, como a aquisição do aparelho de scanner humano.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A realização desta pesquisa nos permitiu concluir que já existe um movimento no nosso país no sentido de abolir a revista íntima vexatória, realizada de forma manual e arcaica na entrada dos presídios. É o que é possível afirmar a partir da análise da Lei nº 15.552 de 12 de Agosto de 2014 do Estado de São Paulo e da Resolução nº. 05/2014 que proíbe a revista vexatória para o controle de ingresso aos locais de privação de liberdade e dá outras providências.

Em que pese estes avanços, e ainda considerando dados que apontam que a eficácia de tais revistas íntimas é ínfima comparando-se aos prejuízos causados aos visitantes, em evidente afronta a dignidade da pessoa humana, este modelo de revista ainda é uma realidade em muitos presídios brasileiros, a exemplo da Penitenciária Regional Padrão do Município de Campina Grande-PB.

Defendemos que o estado brasileiro tem a obrigação de adquirir aparelhos tais como scanners corporais, raio x, detectores de metais, em todas as unidades da federação, para que a revista vexatória seja substituída no menor prazo possível por uma revista humanizada, em respeito aos Direitos e Garantias Fundamentais do indivíduo, sobretudo em consonância com a dignidade da pessoa humana, destes cidadãos que na maioria das vezes tem como única “culpa” o fato de, em ato de solidariedade, não abandonarem seus entes queridos a própria sorte, infrigidores da lei penal, que cumprem suas reprimendas nos diversos presídios espalhados pelo Brasil, realizando-lhes visitas semanais ou mensais, na esperança de que um dia estes possam retornar ao convívio social.

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REFERÊNCIAS

BARROSO, Luís Roberto. A construção da Pessoa Humana no Direito Constitucional Contemporâneo: A construção de um Conceito Jurídico à luz da jurisprudência Mundial. Belo Horizonte: Fórum, 2014.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acesso em: 10 jul. 2016.

BRASIL. Lei nº 13.271, de 15 de abril de 2016. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Lei/L13271.htm. Acesso em 10 jul. 2016.

BRASIL. Lei nº 15.552 de 12 de Agosto de 2014 de São Paulo. Disponível em: http://governo-sp.jusbrasil.com.br/legislacao/133410963/lei-15552-14-sao-paulo-sp. Acesso em 10 jul. 2016.

Convenção Americana sobre Direitos Humanos. Disponível em: https://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/c.convencao_americana.htm. Acesso em 10 jul. 2016.

Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7210compilado.htm. Acesso em 10 jul. 2016.

Parecer técnico ao PLS 480/2013: sobre a revista vexatória de visitantes em unidades prisionais. Disponível em: http://redejusticacriminal.org/2016/wp content/uploads/2016/03/14.01.28.Parecer-RV-final.pdf. Acesso em 10 jul. 2016.

Relatório anual n38/1996-Caso 10.506 de 15 de outubro de 1996 (Argentina). Comissão

Interamericana de Direitos Humanos. Disponível em:

https://www.cidh.oas.org/annualrep/96port/Caso11506.htm. Acesso em 10 jul. 2016.

Resolução nº. 05/2014 - Proibição de revista vexatória para o controle de ingresso aos locais de privação de liberdade e dá outras providências. Disponível em:http://www.criminal.mppr.mp.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=685. Acesso em 10 jul. 2016.

SARLET, Ingo. Dignidade da pessoa Humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. 3 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado. 2008.

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TJ-SP - Apelação : APL 00061338520118260224 SP 0006133-85.2011.8.26.0224.Disponível

em:http://tj-sp.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/270104195/apelacao-apl-61338520118260224-sp-0006133-8520118260224/inteiro-teor-270104232. Acesso em 10 jul. 2016.

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