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O que é um hit? - uma análise sobre música, sucesso e as transformações da indústria fonográfica

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Academic year: 2021

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Grupo de Trabalho: GT 6: consumo e cultura

O que é um hit? - uma análise sobre música, sucesso e as transformações da

indústria fonográfica

Yke Leon Universidade Federal do Rio de Janeiro

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Resumo

O presente trabalho analisa o conceito de hit radiofônico e a indústria da música por trás do que é considerado sucesso. A partir de entrevistas em profundidade feitas com especialistas da indústria, buscou-se responder à questão: o que é um hit e o que singulariza uma canção muito executada em relação as demais? Problemáticas tangenciais que também interessaram a essa pesquisa são: a) como as transformações tecnológicas e as mudanças no modo de se produzir, distribuir e consumir música, impactaram o hit? b) qual é a importância das mídias tradicionais (broadcasting) na consolidação de sucessos radiofônicos e de uma carreira de sucesso? Serve como fio condutor para o referido trabalho os conceitos presentes no livro Hitmakers, do autor Derek Thompson. Pela própria essência do tema, o artigo em questão é interdisciplinar e não esgota as possibilidades de abordagem das discussões apresentadas.

Palavras-chave: Hits radiofônicos; indústria da música; rádio; marketing; hitmaker;

Abstract

This paper analyzes the concept of radio hit and the music business behind what is considered success. From in-depth interviews with industry experts, we sought to answer the question: what is a hit and what singularizes a song performed many times in relation to others? Tangential problems that also interested in this research are: a) how technological transformations and changes in the way the way music is produced, distributed and consumed, have impacted the hit? b) what is the importance of traditional media (broadcasting) in the consolidation of radio successes and a successful career? The concepts presented in the book Hitmakers, by the author Derek Thompson, serve as a guiding thread for this work. Due to the own essence of the theme, the article in question is interdisciplinary and does not exhaust the possibilities to approach the discussions presented.

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O sucesso antes do hit

Houve um tempo em que compartilhar canções não era tarefa fácil. Imagine que você esteja na Europa no século XIX e tenha composto uma música. Para mostrar para um amigo brasileiro a sua criação, seria necessário que enviasse uma partitura contendo as notas, intervalos e toda informação sonora presente na sua obra, de modo que ela pudesse ser executada em outro local. O amigo que recebesse esse documento, teria que: a) estar apto para tocar um instrumento ou conhecer alguém que o fizesse; b) ter acesso a um local que tivesse esse instrumento. De acordo com o pesquisador Jairo Severiano, os primeiros pianos chegaram ao Brasil em 1808 na bagagem da Família Real (SEVERIANO, 2017, p. 21), mas foi a partir do final da década de 1820 que as vendas começaram a acontecer. Em pouco tempo, o interesse pelo objeto cresceu “de forma acentuada”, tornando-o “símbolo de status social, emprestando aos seus possuidores uma certa aura de bom gosto” (SEVERIANO, 2017, p. 22). Se esse amigo desejasse mostrar sua composição para um terceiro, o processo se repetiria. A experiência sonora era feita para ser executada in loco, o que dificultava sua disseminação e consolidação. Isso significa que não existiam hits musicais no passado? Depende do conceito.

Tomemos como hit a definição do dicionário: “O que faz sucesso; o que é moda.” (HIT, 2020). Existiam músicas que faziam sucesso no passado? Certamente que sim. A questão é o alcance desse sucesso, afinal, sem a possibilidade de falar com muita gente ao mesmo tempo, o sucesso acabava por ser local e restrito aos locais onde os artistas se apresentavam. O jornalista Derek Thompson, autor de “Hitmakers – Como nascem as tendências”, tenta capturar horizontes que ajudam a explicar o que torna algo muito popular, seja uma canção, um filme ou mesmo um quadro. E é lá onde ele afirma que:

“No século XIX, canções de compositores famosos pulavam de uma sala de concerto para a outra, mas não havia nenhuma tecnologia adequada para levar rapidamente uma canção para o mundo todo. (...) A obra [Nona Sinfonia de Bethooven] estreou em 1824 no Teatro Kaerntnertor, em Viena, quando, segundo os rumores, Beethoven estava surdo a ponto de não conseguir ouvir os aplausos retumbantes. Já a primeira apresentação da Nona Sinfonia nos Estados Unidos só ocorreu 22 anos mais tarde, na cidade de Nova York. Levou mais de nove anos para que a sinfonia fosse tocada pela primeira vez em Boston.” (THOMPSON, 2018, p. 13)

Fazer sucesso na corte e na nobreza, onde geralmente se apresentavam os músicos clássicos, poderia garantir alguma sobrevida e popularidade para a obra, mas isso estava bem longe de alcançar um grande conjunto da sociedade e, muito menos, de ultrapassar as barreiras de classe social existentes nela. Somente com a criação de dispositivos de gravação

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sonora, oriundos do fonógrafo de Thomas Edison e com a possibilidade de veicular estes fonogramas em veículos de comunicação de massa, como o rádio, é que hits, tais como conhecemos, passaram a ser possíveis1.

No contexto brasileiro, o surgimento do rádio deu ainda mais força para o cenário musical brasileiro, já marcado pela presença de gravadoras no país (VICENTE; DE MARCHI, 2014). Sua penetração no cenário político, nacional e internacional, fez dele uma poderosa ferramenta de informação, incorporada à estratégia de governantes e vendedores (HOBSBAWN, 1995), tais quais os nossos fabricantes de música comercial. Reconhecendo tal poder, Getúlio Vargas estatizou a Rádio Nacional em 1940 e a emissora se tornou uma das principais do mundo (CUNHA; DINIZ, 2014). Com a criação do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), criado em Dezembro de 1939, Vargas passou a exercer influência e censura ao que era produzido e disseminado pelas ondas sonoras. Para se ter uma ideia, somente no ano de 1940, o órgão vetou 370 músicas, além de, aproximadamente, 100 programas de rádio (KRAUSHE, 1986, p. 31). A censura tratava não apenas dos temas das letras, mas também da linguagem utilizada, de modo a eliminar gírias e vícios de linguagem. É o que explica o professor e pesquisador Eduardo Vicente:

“(...) foi o período em que notórios boas-vidas dos morros cariocas passaram a exaltar os benefícios do trabalho e da vida regrada. Um exemplo emblemático foi a composição "Bonde de São Januário" (Ataulfo Alves e Wilson Batista, 1940). A letra original de seu refrão seria, segundo algumas versões, "O Bonde São Januário / leva mais um otário / que vai indo trabalhar". Após uma suposta interferência do DIP, a música teria adquirido a versão com que se tornou conhecida: "O Bonde São Januário / leva mais um operário / sou eu que vou trabalhar". Seja a versão do ocorrido verdadeira ou não, o certo é que a "regeneração" dos malandros, acompanhada da exaltação do trabalho e dos valores familiares, passou a ser tema corrente de sambas do período. Sob esse aspecto podemos citar as composições: "Eu Trabalhei", de Roberto Riberti e Jorge Faraj, e "O Negócio é Casar", de Ataulfo Alves e Felisberto Martins, ambas de 1941, além de "O Bonde Piedade", de Geraldo Pereira e Ari Monteiro, de 1945.” (VICENTE, 2006, p. 38)

1 Para mais informações sobre a história da indústria fonográfica no Brasil, ver: DE MARCHI, L.; VICENTE,

E. Por uma história da indústria fonográfica no Brasil 1900-2010: uma contribuição desde a

Comunicação Social. Disponível em:

<https://www.publionline.iar.unicamp.br/index.php/muspop/article/view/234> Acesso em 13 de Outubro de 2020.

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Com esse apoio do governo, o rádio possibilitou que a produção urbana de bens culturais chegasse aos pontos mais distantes do Brasil. A população brasileira adotou, definitivamente, o veículo para seu entretenimento e os programas de auditório fizeram grande sucesso (TINHORÃO, 2012). Desse modo, os cantores que se destacavam, acabavam por atrair o público consumidor para a produção fonográfica a partir dos anos 40. Muitos são os exemplos, como Cauby Peixoto, Emilinha Borba e Marlene. Artistas projetados pelo chamado star system, que tinham sua imagem e vida pessoal publicadas em revistas especializadas e consumidas pelos fãs (VICENTE; DE MARCHI, 2014).

E, como já se poderia deduzir, há uma relação direta entre esse veículo centenário e a indústria por trás das músicas de sucesso. O rádio possibilitou que uma obra sonora pudesse, não apenas, chegar em muita gente, como também, reincidir no cotidiano das pessoas. É o que nos revela Derek Thompson:

“Embora multidões tenham olhado boquiabertas para a arte exposta publicamente durante milênios, a maior parte das coleções de arte em toda a história era particular e guardada sob cuidados de membros da realeza. O moderno museu público foi uma invenção do Iluminismo e de sua noção radical de que plebeus comuns mereciam instrução. (...) Se museus públicos foram, durante vários séculos, as mais importantes propriedades em termos de arte, então, o rádio é o museu público da música pop, o grande salão de exposição em massa.” (THOMPSON, 2018, pág. 44)

O hit e o rádio

É pela similaridade com o assunto que o presente artigo relaciona a obra de Derek Thompson com entrevistas em profundidade feitas com profissionais de relevância para a indústria da música, afim de diagnosticar elementos que compõe a singularidade de uma música de sucesso, aqui denominada hit. Foram eles: Afonso Claudio de Figueiredo (Doutor em Música pela UNIRIO e Professor na UFRJ e na UNIRIO); Clemente Magalhães (Produtor Musical); Cristina Valente (Divulgadora Artística); Genésio Carvalho (Divulgador Artístico); Kassin (Produtor Musical); Leonardo Lichote (Jornalista e crítico musical); Luci Moret (Gerente Artística da rádio MIX FM); Luciano Gomes (Gerente Artístico da rádio Nova Brasil FM); Luka (Artista); Mauro Ferreira (Jornalista e crítico musical); Miguel Jost (Pesquisador musical e Professor PUC-Rio); Roberto Menescal (Compositor, cantor e produtor musical); Rodrigo Faour (Pesquisador musical e produtor cultural); Silvio Essinger (Jornalista e crítico musical).

O tema do hit é um assunto que aflige a todos os profissionais que trabalham na indústria da música comercial hoje. Mais do que sobre como fazer uma música de muito sucesso, o presente trabalho busca responder o que é um hit e o que singulariza uma canção

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muito executada em relação as demais. Primeiramente, é preciso dar um passo para trás e olhar os hits radiofônicos a partir do conceito de indústria cultural, proposto na Escola de Frankfurt.

O ser de inspiração transcendental e o ser que é produto do mercado são manifestações artísticas modernas de naturezas distintas. De acordo com Adorno e Horkheimer (1985), esta dualidade aparentemente contraditória é interpretada da seguinte forma: o cinema e o rádio, como exemplos do mundo do entretenimento, “não precisam mais se apresentar como arte. A verdade de que não passam de um negócio, eles utilizam como uma ideologia” (ADORNO; HORKHEIMER, 1985, p.100). A identificação dos produtos culturais como resultados de uma indústria fez com que os autores explicitassem o caráter fordista e massificado da produção cultural dos anos 40. Assim, o termo indústria cultural foi inaugurado no âmbito acadêmico e, futuramente, já apropriado por diversas linhas do pensamento econômico e da cultura, possibilitando a integração do bem artístico com o estudo de mercado.

Essas questões entre o artístico e o comercial, como elementos de antagonismo e disputa, aparecem no presente trabalho por meio de diferentes vozes. Miguel Jost, por exemplo, dá sua contribuição para a temática:

“Há uma interrogação nunca resolvida sobre como nasce a expressão artística, como nasce a arte e como nasce uma expressão artística capaz de dialogar com um público que nunca termina e que só se amplia assim... traduzida, uma das traduções mais famosas disso é o Ezra Pound dizendo que “o poeta é uma antena da raça”, é alguém que captura alguma coisa que está pairando e transforma aquilo numa expressão poética. O hit é alguém que conseguiu produzir essa sintonia fina, com algo que está pairando, que faz parte já de algum nível de código reconhecido das pessoas e, ao mesmo tempo, coloca isso a partir de uma especificidade, de uma originalidade, de uma novidade. E aí o cara que capturou isso, conseguiu dialogar com o que você carrega de memória afetiva, de memória subjetiva sua e coloca isso num lugar de expressão que você não tinha previsto e aí as vezes parece que estava tão perto, né? É esse lugar dessa captura, né? Ele não é transcendental, porque ele não recebeu uma entidade, como muita gente acha que é um lugar da “a inspiração”, que vai cair e ele também não é uma resposta ao que existe na sociedade como um cronista. Ele é alguém que captura o que está pairando nesse lugar desse tecido social e consegue transformar isso numa expressão que comunica, com o estado de coisas e

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que mexe com uma sintonia fina que ele encontra com o sentimento das

pessoas.” (informação verbal)2

A investigação dos hits radiofônicos dentro da música brasileira contemporânea consiste, inclusive, na busca por definir as relações mercadológicas envolvidas neste processo, bem como identificar semelhanças no conteúdo desses hits que possam ser interpretadas de diferentes formas: pelo viés social, econômico, de qualidade artística etc. Os hits são um recorte do desejo de uma sociedade naquele determinado tempo histórico, de acordo com o jornalista Leonardo Lichote em entrevista concedida para este trabalho:

“O hit ele conversa com o que a sociedade tá pensando, o que a sociedade quer, o que a sociedade deseja. Deseja eu tô falando também de desejo sexual, desejos afetivos. Tá falando do nosso tempo, o hit é um termômetro muito preciso, muito sintético do nosso tempo. O que que a gente é, a gente

tá olhando para a gente quando a gente vê os hits.” (Informação verbal)3

Em 2017, as indústrias culturais foram responsáveis por 4% do PIB nacional, sendo a música um dos segmentos mais fortes4. Além disso, a análise da música como bem cultural inserido no contexto capitalista industrial, é pertinente para a consideração do tamanho do mercado e sua interação com a sociedade e seus fenômenos. Ainda hoje, mais de 1 milhão de pessoas ouvem regularmente rádio na cidade do Rio de Janeiro5, o que nos mostra que, mesmo diante de tantas novidades tecnológicas, a centenária caixa mágica ainda é um dos veículos de enorme impacto popular. Mas seu monopólio de divulgação está longe de ainda existir. Para Derek Thompson, embora o rádio convencional ainda detenha um grande poder de distribuição, ele não mais possui um monopólio sobre a exposição: “Todas as contas de mídias sociais, todos os bloggers, todos os sites da internet e todos os vídeos promiscuamente compartilhados são, essencialmente, uma estação de rádio.” (2018, p. 46)

A partir da Internet, as pessoas puderam se apropriar dos meios de comunicação não mais como receptores, mas agora também como criadores e transmissores de seus próprios conteúdos (JENKINS, 2008). Em seu Cultura da Convergência, Henry Jenkins (2008) explica a diferença entre as velhas mídias (Broadcasting6) e as novas formas de transmissão de conteúdos (Narrowcasting7). Enquanto no primeiro a difusão da informação é feita através dos

2 Entrevista concedida por JOST, Miguel. Entrevista I [12.2018]. Entrevistador: Yke Leon.

3 Entrevista concedida por LICHOTE, Leonardo. Entrevista II [12.2018]. Entrevistador: Yke Leon.

4 Disponível em

<http://agenciabrasil.ebc.com.br/cultura/noticia/2017-04/ministerio-estima-que-cultura-e-responsavel-por-4-do-pib> Acesso em: 11 de Outubro de 2020.

5 Disponível em <http://www.srzd.com/entretenimento/radio-pesquisa-ibope/> Acesso em: 11 de

Outubro de 2020.

6 São exemplos de Broadcasting: Rádio, televisão, mídias tradicionais.

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meios de comunicação de massa, atingindo assim um maior número de pessoas, no segundo é quando a informação se dirige apenas a nichos específicos.

Se por um lado há uma crise entre o modelo tradicional e o novo modelo, por outro eles convivem fornecendo subsídios e embasamento para tomada de decisões estratégicas. É o caso, por exemplo, de Luci Moret, gerente artística da rádio MIX no Rio de Janeiro, uma emissora dedicada ao seguimento pop. Para ela, a partir de depoimento gerado por este trabalho, não há exatamente uma guerra entre os dois media, mas uma retroalimentação de informações:

“Para eu escolher uma música para entrar na programação, eu primeiro checo o número de visualizações que ela tem no Youtube, como ela está no

Spotify, se está no ranking de viral ou não. A pesquisa de internet é

fundamental hoje em dia. Trabalha junto com o rádio, uma coisa não anda

sem a outra.” (Informação verbal)8

Mas se assim o é, qual é o papel que resta ao rádio? Existe algo que ainda o distinga dos demais canais de distribuição? Luci chama atenção para o papel de ratificador que os veículos tradicionais possuem:

“Eu acho que fazer um sucesso consistente, que não seja de moda, simplesmente, ou um sucesso de verão, sucesso de adolescente... fazer um sucesso com música de qualidade é estar nas plataformas digitais, é estar na rádio, é estar na televisão, é estar com música na novela, é ir pro Faustão... Sabe, o Faustão é um cara que chancela, assim como o rádio chancela. Se você faz sua música bombar na internet, quando você escuta ela no rádio, você vira para o seu amigo e fala: ‘- não te falei que era sucesso? Tá tocando no rádio!’ ou ainda, ‘- não te falei que esse cara era famoso? Tá tocando no Faustão!’ Tem coisas que ainda chancelam, por mais que a gente pense que

não.” (informação verbal)9

Sobre o caráter de validação que as mídias tradicionais exercem sobre o hit, Thompson faz coro com Luci:

“A exposição pública nas rádios pode ser até mesmo mais poderosa do que a “mera” exposição, porque a presença de uma canção em uma das quarenta principais estações proporciona outras pistas em relação à sua

8 Entrevista concedida por MORET, Luci. Entrevista III [12.2018]. Entrevistador: Yke Leon.

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qualidade, como a sensação de que os criadores de gostos e outros ouvintes já ouviram e endossaram essa obra.” (pág. 45)

O que é hit?

Indo adiante na análise dos hits à luz do conceito de indústria cultural, iremos retomar a crítica de Umberto Eco para a Escola de Frankfurt, feita em seu livro Apocalípticos e Integrados. Entre as diversas considerações feitas pelo intelectual italiano, está a acusação de anacronismo e a posição elitista de seus teóricos como Adorno e Horkheimer, a defesa da cultura erudita e a rejeição da cultura de massa.

O problema, para ele, estaria em pensar a cultura de massa como algo bom ou mau em si. O autor italiano acredita que o verdadeiro problema reside em aceitar que se vive em uma sociedade industrial na qual os meios de massa são uma realidade. A partir de tal premissa, o teórico questiona qual seria então o modo pelo qual os mass media poderiam servir para transmitir valores culturais. Trazendo para a nossa realidade de pesquisa, qual seria o modo pelo qual a música de sucesso, o hit, seria portador de um conteúdo relevante? Ou será que já não o é? Afinal, se ele consegue se conectar com tanta gente, não seria, por si só, portador de algo especial?

Em entrevista concedida a esta pesquisa, Kassin, um dos mais importantes produtores musicais do Brasil10 e responsável por alguns hits emblemáticos dos anos 2000, como “Ai, Ai, Ai” de Vanessa da Mata e “Anna Julia” de Los Hermanos, garante que músicas de sucesso são, em si, um grande trunfo:

“Na verdade, eu acho que você agradar o público é uma grande amostra de qualidade, sempre achei isso. Eu vejo gente que critica certos estilos musicais, mas trabalhando na indústria há tanto tempo, eu sempre que vejo uma música que tá fazendo sucesso eu falo assim: “Realmente, eu não vou ouvir esse negócio em casa, mas eu entendo por quê é um sucesso.” Tem alguma coisa que o fato de tanta gente aceitar, aquilo diz alguma coisa, diz alguma coisa sobre o momento que a gente vive, sobre o país que se localiza historicamente, sempre. Complexamente harmônico, complexamente

10 “Hoje, aos 37 anos, ele é o principal produtor musical do país. Se o conceito "melhor" soaria por demais subjetivo, Kassin pode ser chamado, sem erro, de "o mais requisitado". É também aquele com maior trânsito entre o universo independente e o mainstream.” PRETO, Marcus. “Principal produtor

musical dos anos 2000, Kassin lança CD solo”. Folha de São Paulo, 09/08/2011. Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/956482-principal-produtor-musical-dos-anos-2000-kassin-lanca-cd-solo.shtml> Acesso em: 16 de Outubro de 2020.

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rítmico, uma letra trabalhada, isso aí, cara, tanto faz. Bate em um e em

outro não bate. E música é um pouco isso, né?” (Informação verbal)11

Em seu livro, Thompson recupera a trajetória de Raymond Loewy, considerado o pai do design moderno. O artista foi pioneiro em decifrar o gosto das pessoas. Desse modo, pode proporcionar uma verdadeira revolução estética no século XX: remodelou o carro esportivo e o trem moderno, redesenhou a fonte da Coca-Cola e criou o icônico maço de cigarros Lucky Strike. Sua empresa fazia desde apontadores de lápis a oficinas orbitais para a NASA12. (THOMPSON, 2018, p. 59) Para se ter uma ideia da influência de seu trabalho, em 1950, a revista Cosmopolitan escreveu: “Loewy provavelmente afetou a vida diária de mais americanos do que qualquer homem de seu tempo.”13

Loewy desenvolveu uma teoria grandiosa que explicava sua habilidade em farejar o gosto das pessoas e batizou-a de “MAYA”:

As pessoas gravitam na direção de produtos ousados, ainda que instantaneamente compreensíveis: Most Advanced Yet Acceptable [mais avançado, ainda assim, aceitável]. (...) Não se trata meramente da sensação de que alguma coisa é familiar. É um passo além disso. Trata-se de algo novo, desafiador ou surpreendente que abre uma porta para a sensação de conforto, significado ou familiaridade. Isso se chama ahá estético” (THOMPSON, 2018, p. 60)

Em seu livro, Loewy escreveu que “o consumidor é influenciado em sua escolha de estilo por dois fatores opostos: (a) atração pelo novo e (b) resistência àquilo com que não está familiarizado” (LOEWY, 2002, p. 201). É como se houvesse uma curiosidade radical dentro de uma mente conservadora e, por isso, dois polos antagônicos estivessem sempre disputando o leme do navio. E isso tem total relação com a ideia de “livre interação” que o filósofo Immanuel Kant propôs em um dos seus mais célebres trabalhos:

“Em seu tratado de 1790, Crítica do Juízo, Immanuel Kant propôs que o prazer pode surgir de uma “livre interação” da mente. Quando uma pessoa descobre uma ideia ou história atraente, isso dispara um gatilho de um diálogo entre a imaginação e o entendimento, cada um do qual anima o

11 Entrevista concedida por KASSIN. Entrevista IV [12.2018]. Entrevistador: Yke Leon.

12 NASA: National Aeronautics and Space Administration ou Administração Nacional da Aeronáutica e

Espaço (tradução livre)

13 GESENHUES, Amy. Raymond Loewy, Father Of Industrial Design, Gets Streamlined Google Logo For His

120th Birthday. Search Engine Land, 2013. Disponível em < https://searchengineland.com/google-logo-marks-the-120th-birthday-of-raymond-loewy-father-of-industrial-design-176070> Acesso em: 16 de Outubro de 2020

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outro. Segunda a interação livre, arte, música e ideias belas oferecem um tipo de provocação cognitiva: elas seduzem com a promessa de compreensão, mas em nenhum momento proveem a plena satisfação de obtê-la.” (THOMPSON, 2018, p. 54)

Diante disso, podemos afirmar que gostamos de descobrir ou de entender algo que, num primeiro momento, nos causa estranheza e desconforto por nos parecer desconhecido ou estranho. Essa sensação é quando a disfluência14 dá lugar a fluência e uma das mais importantes fontes de fluência é a familiaridade:

Uma ideia familiar é mais simples de ser processada e colocada no mapa mental. Quando as pessoas veem uma obra de arte que as faz lembrar de algo famoso, elas sentem a excitação do reconhecimento e atribuem essa excitação à pintura em si. Quando leem um argumento político que reflete suas propensões, isso se encaixa de forma aconchegante em sua noção de como funciona o mundo. Sendo assim, a familiaridade, fluência e fato estão ligados de forma inextricável. Pensamentos como “essa ideia me parece familiar”, “essa ideia parece certa” e “essa ideia é boa e verdadeira” mesclam-se em um mingau mental. (THOMPSON, 2018, p. 56)

Para Tina Valente, divulgadora artística, a sensação de familiaridade é um elemento importante para atestar o potencial de uma canção em se transformar em um hit:

“Concordo em gênero, número e grau! Porque todas as vezes que eu ouço alguma coisa que me remete a algum sucesso passado, eu digo: "Essa música vai estourar!". Por quê? Porque você viveu, você teve um passado. Você lembra o que foi que aquilo te trouxe. São memórias que trazem sentimentos. Então, essa é uma grande afirmação e que, com certeza, é a pura verdade. Um passado, um sucesso, ele pode se reinvestir, se transmutar, ter uma nova vestimenta e virar um hit. Eu acredito nisso sim.”

(informação verbal)15

Mauro Ferreira, jornalista e crítico musical, apresenta um contraponto para artistas que apelam tanto para a familiaridade a ponto de basearem a carreira em regravações:

“Olha, se ele faz isso como uma alavanca pro sucesso, eu acho isso mais perigoso. Eu acho assim... me vem à cabeça quando a Gal gravou o Balancê em 79. Ninguém mais lembrava que essa era uma música que tinha estourado nos anos 30. Virou um grande sucesso, um dos maiores da

14 “Nem todos os pensamentos vem com facilidade. Algumas ideias, imagens e alguns símbolos são mais

difíceis de serem processados e ‘disfluência’ é o termo para o pensamento difícil.” (THOMPSON, 2018, p. 56)

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carreira da Gal. Então eu acho assim, se você pega uma música que está esquecida e é uma música interessante, eu acho que você tem ali uma possibilidade de um hit. Você não pode fazer disso uma muleta. Você não pode ficar sempre nisso. Aí cabe também o faro do artista, também. Ele tem

que ter um faro dele, entende?” (Informação verbal)16

Mas essa sensação de familiaridade também está ancorada na ciência. Um estudo lançado em 2012 por pesquisadores espanhóis analisou 464.411 gravações populares pelo mundo entre 1955 e 2010 e descobriu que a diferença entre novos e antigos hits não estava em estruturas de cordas mais complicadas. Pelo contrário, era nova instrumentação trazendo um som diferente a “progressões harmônicas comuns”.17 Afonso Claudio, doutor em música e professor da UFRJ e da Unirio corrobora com essa ideia:

“A forma canção ela já está aí há muito tempo: A A B A A B C, o refrão, o coro. Inclusive, se você pegar as músicas... quantos modelos melódicos tonais a gente pode fazer? Não tem nada que você crie que já não tenha sido feito de algum jeito por alguém em algum momento. Eu não tô falando nem de plágio não. Você tem um intervalo de uma nota para outra, por exemplo. Os intervalos são esses. Na história da música já teve tantas composições que começaram com esse intervalo que a nossa sensação de familiaridade está presente em qualquer coisa que você ouvir. O que acontece é que nem sempre é pela mesma coisa: algumas vezes são a embalagem, outras o arranjo pode remeter a alguma coisa, as vezes é a melodia. Mas eu acho que a música é uma experiência temporal passada, né? Você tá ouvindo e o que você tá sentindo é o que já passou, a sensação que ela te causa é o que passou. Então eu acho que a gente está sempre tentando fazer sentindo do que a gente tá ouvindo. E quando essa sensação de familiaridade vem de uma peça nova, acho que dá um conforto sim.”

(Informação verbal)18

O autor de Hitmakers reforça a fala de Afonso ao afirmar que:

“O truque é aprender a emoldurar novas ideias como se fossem ajustes a ideias antigas, mesclar um pouco de fluência com um pouco de disfluência, para fazer com que seu público veja familiaridade atrás da surpresa”. (THOMPSON, 2048, p. 75).

16 Entrevista concedida por FERREIRA, Mauro. Entrevista VI [01.2019]. Entrevistador: Yke Leon.

17 THOMPSON, Derek. The Shazam Efect. The Atlantic, Dezembro de 2014. Disponível em

<www.theatlantic.com/magazine/archive/2014/12/the-shazam-effect/382237/> Acesso em 27 de Setembro de 2020

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Para Derek Thompson, “o poder de exposição é uma das forças mais poderosas na popularidade. A exposição dá à luz a familiaridade, que faz nascer a fluência, e a fluência frequentemente faz nascer o gostar.” (THOMPSON, 2018, p. 69). Isso significa que a exposição de uma canção seria um fator mais determinante para seu sucesso do que, propriamente, a sua qualidade? Talvez sim. “Até mesmo nos primórdios dos negócios da música americana, para fazer com que uma canção virasse um hit, uma melodia memorável vinha em segundo plano – em primeiro vinha uma engenhosa campanha de marketing” (THOMPSON, 2018, p. 45).

“Críticos e público podem preferir pensar que os mercados são perfeitamente meritocráticos e que os produtos e as ideias mais populares são obviamente as melhores” (THOMPSON, 2018, p. 49), explica o autor americano, mas:

“para cada grande canção que chega às paradas musicais e fica sendo tocada nas rádios durante meses, há uma centena de outras simplesmente tão boas quanto, se não melhores, que, se fossem cantadas pelo artista certo e com o marketing certo, seriam tremendos hits” (THOMPSON, 2018, p. 48)

Rodrigo Faour, pesquisador musical e produtor cultura, acredita que as músicas que fazem muito sucesso, de maneira geral, têm elementos que lhes garanta sobrevida, mas que nem sempre estes são a devida qualidade:

“A música popular ela tem, normalmente, um prazo de validade. Ela é feita pra ser consumida num determinado local. As que transcendem a sua época e ficam, elas já marcaram mais, tiveram uma qualidade ou alguma coisa divertida ou alguma coisa interessante que fizeram elas se perpetuarem no tempo. Tem muita música que foi muito sucesso num ano ou dois e depois sumiram. Sucesso de ocasião, a vida inteira foi assim. E acho que a tendência contemporânea é ser cada vez mais assim. Porque como a gente tem muito mais lançamento, é tudo muito mais massificado, né? Milhares de pessoas lançando clipe, milhares de pessoas lançando singles... E é tudo meio parecido. Acho que a tendência é essas músicas serem mais esquecíveis a longo prazo. Mas sempre vão ter aquelas que vão marcar. E isso independe da qualidade. Às vezes a música pode ser ruim, mas ela tem alguma coisa ali, ou na interpretação, ou no arranjo, alguma coisa que

marcou.” (Informação verbal)19

“Parece que, para o sucesso, qualidade é um atributo necessário, porém insuficiente” (THOMPSON, 2018, p. 49) e Tina Valente, que atua na indústria da música há mais de 30 anos,

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concorda com essa afirmação: “Vamos a La Playa, do Menudo, é um caso desses, de massificação pura. A música é horrorosa e todo mundo cantou! Se tem muita exposição, não tem como. Nem sempre sucesso é música boa, né?”20 Genésio Carvalho, divulgador musical com décadas de experiência na indústria da música, reforça o coro de Tina, mas chama atenção para os riscos de uma exposição em massa e para a importância de perceber que os grandes centros urbanos absorvem com mais facilidade uma novidade do que um lugar mais distante da capital:

“A medição de rádio sempre foi: aceitação e rejeição. Uma música muito tocada é também uma música muito rejeitada, né? É aquela coisa “não aguento mais, não aguento mais”, mas irmão, a verdade é: “quando tá tocando e você tá de saco cheio, aí é que tá batendo no povão”. A galera demora um pouquinho mais de entender essa história. Não por burrice, de maneira nenhuma. Mas tem que bater, tem que bater, tem que bater e, quando vê, você tá cantando sozinho. Pegou a molecadinha? Já era! Isso são as coisas de mercado que a gente aprende com o tempo. “Ih, agora foi!” Quando você vê a garotinha cantarolando a música, agora já foi, irmão.”

(informação verbal)21

Mesmo diante de novos e poderosos agentes responsáveis por difundir informações, “até mesmo no nosso século, a transmissão onipresente de músicas em rádios é crucial para a criação de um hit” (THOMPSON, 2018, p. 45). Luciano Gomes, gerente artístico da rádio Nova Brasil FM, detalha que, mesmo com tantos dispositivos capazes de levar canções até o ouvinte, a rádio ainda é responsável pelo fator surpresa e é essa sensação que leva milhões de pessoas a essa caixinha mágica:

“Programação de rádio nada mais é do que você ter aquele fator surpresa. Hoje em dia tem o Spotify, o Deezer e é maravilhoso aquilo ali, mas o rádio ainda é um complemento importante na carreira de um artista, porque tem a história do inesperado. No Spotify você vai programar aquela música, pode até botar no modo aleatório, mas você sabe que ela está ali e que vai chegar o momento de ouvi-la. No rádio é diferente, são outras pessoas que você tem que atingir com seu gosto musical. (...) Você vai colocando assim “midback”, que é uma música que estourou, teve seu valor, aí tem aquela sucessão, que é independente da época do ano e aí você cola com uma nova. Então você tem sempre uma música que é aquele sucesso estrondoso pra colar com uma nova, pra dar realmente um peso bacana para aquela

20 Entrevista concedida por VALENTE, Tina. Entrevista V [01.2019]. Entrevistador: Yke Leon.

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música nova ali, para realmente começar a se encaixar.” (Informação

verbal)22

Apesar de fazer a programação de uma rádio de perfil totalmente diferente da Nova Brasil FM, Luci Moret, da MIX FM, revela que sua estratégia na hora de montar a programação é a mesma:

“Concordo muito com isso. Muito. Eu acho que, quando eu penso em montar a programação da rádio, eu penso exatamente nisso: as pessoas querem cantar junto, elas querem ligar o rádio e elas não querem ficar descobrindo coisas o tempo inteiro; se elas quiserem descobrir coisas o tempo inteiro, elas vão pra internet e vão pesquisar artistas novos. Se ela está ouvindo rádio, ela quer cantar junto. Vai ter música nova na programação? Claro! Senão a gente vai fazer a mesma rádio a vida inteira. Mas ela tem que estar calçada com sucessos. Eu coloco antes um sucessão, aí coloco uma música nova e logo depois um sucessão de novo. Claro que a música nova vai ser algo que tenha pertinência com o resto da programação, né? Então eu concordo muito com isso, as pessoas gostam muito pouco de muita novidade ao mesmo tempo. Elas gostam de

novidades, mas em doses homeopáticas.” (Informação verbal)23

Derek Thompson confirma a estratégia de Luciano e Luci Moret, afirmando que “os ouvintes querem ser surpreendidos, por isso sintonizam no rádio ao invés de tocar um CD ou uma playlist; no entanto, eles querem ser surpreendidos pela sensação de familiaridade.” (THOMPSON, 2018, p. 79)

Quanto mais avançarmos na direção de novos e diferentes modelos de produção e distribuição, mais difícil será “prever o futuro da popularidade conforme o poder de exibição do rádio e da televisão for democratizado e os canais de exposição crescerem” (THOMPSON, 2018, p. 54). Mauro Ferreira relaciona os novos tempos com a consolidação dos nichos, independente de seus tamanhos:

“Eu acho que agora, quando eu falo nicho, não é nicho necessariamente de pequenas quantidades. Eu acho melhor falar segmento. Assim, o sertanejo é um segmento que mobiliza milhões de pessoas. O funk também. O rap também. Então são segmentos. Que a gente pode chamar de nicho, mas é que nicho tem uma conotação de bolha, daquela coisa assim que não necessariamente é o caso. Por exemplo, tem aí uma Anitta e não tem como dizer que você desconhece a Anitta. Eu acho que ela conseguiu fazer um

22 Entrevista concedida por GOMES, Luciano. Entrevista X [03.2019]. Entrevistador: Yke Leon.

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crossover aí geral, mas não quer dizer que as pessoas consumam o som da Anitta. Todo mundo sabe quem é Anitta, mas quem ouve o som é um segmento específico. Eu acho difícil que você não conheça quem é Luan Santana. A figura do Luan Santana. Agora, ouvir o Luan Santana, ouvir um disco do Luan Santana ou ver um show do Luan Santana, isso eu acho que é mais segmentado. É a diferença para antigamente, entende? Quando você ligava uma rádio nos anos 80, você ouvia Paralamas do Sucesso, Marisa Monte, a balada do Sullivan e Massadas, todo mundo na mesma emissora, tudo misturado. E agora até as rádios que ainda resistem são segmentadas. Então, assim, a palavra é essa. É cada um no seu quadrado.” (Informação

verbal)24

Genésio Carvalho chama atenção para a relação dessa descentralização com a consolidação do comércio de singles:

“Então tá pipocando artistas por todo lado. Ao mesmo tempo que democratizou e é perfeito e ótimo que você tenha oportunidade agora de ter um talento surgindo nos seus próprios nichos, o outro lado moeda é que virou uma coisa descartável. A descartabilidade hoje é muito grande. Se você disser que o diretor artístico hoje vai criar um produto... não! Ele já vem praticamente pronto. O cara hoje em dia não cria, o cara é um caça talentos que vai buscar aqui, vai pinçar ali e tudo mais e tal. E a gravadora hoje em dia e o mercado hoje em dia tá preocupado com o volume. Não existe mais o físico. A venda, a situação toda é no streaming, é no digital. Então quanto mais volume eu tiver, melhor. Entendeu? Não importa se o artista vai ter cinco anos de carreira, dez anos de carreira, ou um dia ou uma semana de carreira. Porque tem artistas hoje em dia que você ouve aqui a música... e não tem mais artista, você tem single. Entendeu?” (Informação

verbal)25

A dificuldade de apreender o hit parece residir, precisamente, no equilíbrio perfeito entre as forças opostas que competem no cabo de guerra do sucesso: neofilia versus neofobia, o amor pelo novo versus a preferência pelo antigo; a necessidade que as pessoas têm de estímulo versus sua preferência pelo que é passível de ser entendido. É diante dessa complexidade que Derek sentencia: “Um hit é como um vinho novo envelhecido em um antigo carvalho, ou um estranho que, de alguma forma, parece um amigo: uma surpresa familiar” (THOMPSON, 2018, p. 69)

24 Entrevista concedida por FERREIRA, Mauro. Entrevista VI [01.2019] Entrevistador: Yke Leon.

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Referências

ADORNO, T.; HORKHEIMER, M. Dialética do Esclarecimento: Fragmentos filosóficos. Rio de Janeiro: Zahar, 1985.

DINIZ, André; CUNHA, Diogo. A República cantada: Do Choro ao Funk. Rio de Janeiro: Zahar, 2014.

ECO, Umberto. Apocalípticos e integrados. 5ª ed. São Paulo: Perspectiva, 1993.

JENKINS, Henry. Cultura da Convergência. São Paulo: Aleph, 2008. (trad. Susana Alexandria). HOBSBAWM, Eric. Era dos extremos: O breve século XX. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

HIT. In: HIT, Dicionário Online de Português. Porto: 7Graus, 2020. Disponível em: <https://www.dicio.com.br/risco/>. Acesso em: 11/09/2020.

KRAUSHE, Valter. Música Popular Brasileira. Coleção Tudo é História. São Paulo: Brasiliense, 1986.

SEVERIANO, Jairo. Uma história da música popular brasileira: das origens à modernidade. São Paulo: Editora 34, 2008.

THOMPSON, Derek. Hitmarkers: Como nascem as tendências. São Paulo: Harper Collins, 2018. VICENTE, Eduardo. A música popular sob o Estado Novo (1937-1945). Versão Revisada do Relatório Final da Pesquisa de Iniciação Científica PIBIC/CNPq realizado na UNICAMP em 1994. São Paulo: USP, 2006. Disponível em: http://www.usp.br/nce/wcp/arq/textos/37.pdf. Acesso em 11/10/2020. Acesso em 11/10/2020.

VICENTE, E; DE MARCHI, L. Por uma história da indústria fonográfica no Brasil 1900-2010.

Campinas: ano 3, v.1, 2014. Disponível em:

<http://www.publionline.iar.unicamp.br/index.php/muspop/article/download/234/271>. Acesso em: abr. 2019.

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