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Os rumos da reforma fiscal

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Academic year: 2020

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RSP

E N S A I O

O

S RUM OS DA

REFORMA FISCAL

F e r n a n d o R e z en d e

I n t r o d u ç ã o

cam in h o a ser p ercorrido para q u e uma am pla Reforma Fiscal seja implementada n o país ainda está cheio de percalços. A a d erên cia a algumas diretrizes gerais - redução do tamanho do Estado, racionalização do gasto público, simplificação tributária, com b ate à evasão e à sonegação - não é suficiente para alavancar um rápido e vigoroso processo de m u d anças. C o m o tem sido am plam ente demonstrado pelos fatos, a mobilização da sociedade civil c m to r n o d o p ro b lem a fis c a l a i n d a n ã o é s u f i c i e n ­ tem ente forte para contrarestar a p ressão de in teresses co rp o ra ­ tivos e o viés fiscalista que opõem resistências ao avanço das teses m odem izadoras.

A redução do tamanho do Estado e a s i m p l i f i c a ç ã o d o s is te m a t r i b u t á r i o sã o as p r i n c i p a i s diretrizes que hoje dominam o d e b a te sobre a Reforma Fiscal.

A

re d e fin içã o do p a p e l do Estado e a demarcação das responsabilidades do setor público constituem a base sobre a qual deve assentar-se a proposta da reformulação de seu padrão de finan­ ciamento. Neste sentido, o trabalho de­ fende um modelo de Reforma Tributária determinado pela redução do número de tributos, pela redefinição de suas bases de incidência, pelo respeito ao d ireito do contribuinte, pela esta­ bilidade normativa e pela recufxiração da ética tributária.

Argumenta-se, com propriedade, que a redução do ônus tributário q u e s u f o c a o c o n t r i b u i n t e b r a s i l e i r o só p o d e r á s e r e f e t i v a m e n t e a l c a n ç a d o p e l a re d u ç ã o das n e c e s s id a d e s de financiamento do setor público, fru to da r a c io n a l id a d e a d m i­ nistrativa, do corte do gasto (o de custeio, principalm ente) e da privatização de serviços. Do la d o d o f i n a n c i a m e n t o , a simplificação tributária c o n c e n ­ tra as esperanças de todos aq u e­ les que sofrem as con seqü ências perversas da m u ltip lica çã o de

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t r i b u t o s , da c o m p l e x i d a d e e instabilidade das normas, e da i n j u s t i ç a d o s i s t e m a fis ca l brasileiro.

Cabe indagar, entretanto, sobre o ru m o q u e o d esd o b ram en to dessas diretrizes poderá tomar, e s o b r e as c o n s e q ü ê n c ia s q u e a op ção p o r alternativas distintas acarreta, do pon to de vista dos in t e r e s s e s de cada um. T o d o s sabem as motivações e as causas q u e conduzem ao início de um p r o c e s s o d e R e fo r m a F is c a l. Ninguém é capaz de prever, no e n t a n t o , o d e s f e c h o d e s s e processo, uma vez que ele seja d e fla g r a d o . C o m o de h á b ito , cada uma das partes envolvidas t e m u m a v isã o p a r c ia l e particular do tema: o governo vê na Reforma Fiscal a saída para a solução da crise econômica e a r e c u p e r a ç ã o da c r e d ib ilid a d e p o l í t i c a ; o s c o n t r i b u i n t e s dividem-se en tre a pressão por m enores im postos e a demanda p o r m a i o r e s i n c e n t i v o s e s u b s íd io s. C o m o os c o n flito s, e n t r e u n i d a d e s da f e d e r a ç ã o (União, estados e m unicípios), c a t e g o r i a s d e c o n t r i b u i n t e s , setores de atividade, c regiões do país, são de grandes proporções, o re s u lta d o final do p ro ce sso pende para o lado daqueles que demonstrarem maior capacidade d e a r t i c u l a ç ã o e d e c o n v e n ­ cimento.

P r i n c í p i o s d a r e f o r m a fis c a l

eleição de alguns princípios básicos é pré-requisito para que as p r o p o s t a s e s p e c í f i c a s d e R e fo r m a F is c a l p o s s a m s e r c o n v e n i e n t e m e n t e a v a lia d a s . Propõe-se a adesão aos seguintes princípios:

a) Responsabil i dade - um dos o b je t i v o s i m p o r t a n t e s da R e fo rm a F is c a l d e v e s e r a recuperação da ética tributária. A deterioração das relações entre o cidadão-contribuinte e o Estado é fruto da indignação provocada p e l o m au u s o d o s r e c u r s o s p ú b l i c o s e p e l o s s u c e s s i v o s e s c â n d a l o s a s s o c i a d o s à corrupção e ao clientelism o. O s a c r i f í c i o q u e r e p r e s e n t a o pagamento do im posto tem que ser compensado pelos benefícios q u e a com u nid ad e, c o m o um tod o, e x tra i da a p lic a ç ã o d o s recursos públicos. A recuperação da ética do contribuinte depende d e um m a io r c o n t r o l e da sociedade sobre o gasto público. A m a n e ir a m a is e f i c a z d e fortalecer esse controle é associar o poder de tributar ao pod er de gastar. A decisão de au m entar o g a s to p ú b l i c o dá d iv id e n d o s políticos, mas a necessidade de a u m e n ta r trib u to s para fin a n ­ c ia r o a c r é s c i m o d o g a s t o é politicamente onerosa. A aderên­

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cia a esse princípio significa que o gasto público de cada instância d e gov ern o deve ser p re fe ren ­ c i a l m e n t e f i n a n c i a d o p o r recu rso s o b tid o s com base em t r ib u t o s de sua c o m p e t ê n c ia , reservando-se às transferências u m a f u n ç ã o e m i n e n t e m e n t e compensatória. A necessidade de o governante justificar perante a c o m u n id a d e uma p ro p osta de a u m e n t o n o t r i b u t o dá l e g i ­ timidade ao gasto c aumenta a responsabilidade conju nta com respeito ao sucesso da iniciativa. O c o n t r i b u i n t e re s p o n sá v e l é fruto de um governo mais do que resp on sáv el. A ética tributária não é restaurada pela punição. E la é u m a d e c o r r ê n c i a d o recon hecim ento da função social d o t r i b u t o e d o p a p e l q u e o E sta d o deve d e s e m p e n h a r no a t e n d im e n t o das n ecessid ad es coletivas da população;

b) Vi si bi l id ad e - a visibilidade do gasto público e dos tributos u tilizado s para finan ciá-lo são o u tros requisitos fundamentais para o propósito de restauração da responsabilidade. O máximo de visibilidade seria alcançado na hipótese absurda de que cada uma das d istintas e s p é c ie s de g asto fosse financiada p or um tributo especialmente instituído para aquela finalidade; no outro e x t r e m o , a a b s o l u t a in v is ib i­ lidade seria atingida na hipótese

igualmente absurda de um único i m p o s t o f i n a n c i a r t o d a e qualquer modalidade de gasto, d e t o d o s o s t r ê s n ív e i s d e governo.

Na prática, casos de vinculação d e i m p o s t o s e s p e c í f i c o s a determinadas espécies de gasto são conhecidos entre nós; alguns a in d a s o b r e x i s t e m ( s a l á r i o - e d u c a ç ã o , c o n t r ib u i ç ã o previ- d e n c i á r i a . . . ) , o u t r o s f o r a m e x t i n t o s em 1 9 8 8 ( i m p o s t o s ú n i c o s s o b r e c o m b u s t í v e i s , energia e com unicações, vincu­ la d o s aos s e t o r e s c o r r e s p o n ­ d e n t e s ) . A v a n t a g e m da v in ­ culação é a visibilidade do gasto (n ã o n e c e s s a r i a m e n t e a da contribuição); a sua desvantagem é a rigidez que provoca n o uso dos recursos públicos.

A visibilidade também dep end e da natureza dos im p o sto s q u e são utilizados para fin an ciar o gasto. Im postos sobre a renda, s o b r e o c o n s u m o e s o b r e a p r o p r ie d a d e p r e e n c h e m co m d i s t i n ç ã o o r e q u i s i t o d e visibilidade, o que não acon tece com os impostos e con tribuições q u e in cidem cu m u la tiv a m en te sobre a produção, as vendas, e as o p e ra çõ es financeiras. Q u a n to maiores forem a invisibilidade do t r i b u t o e a i g n o r â n c i a da s o c i e d a d e c o m r e s p e i t o a o m on tan te da co n trib u iç ã o que

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cada um faz para o governo, menor será a resistência ao aumento do gasto e ao desperdício. E claro que cm m om entos de aguda crise de credibilidade pública, como a que o país atravessa nesse momento, as manifestações contra os excessos fiscaüstas tomam-se mais intensas, mas a superação da crise tende a ofuscar esse fenômeno na ausência de uma percepção mais clara do contribuinte acerca do tamanhoeda repartição do ônus fiscal.

c) E q u i l í b r i o - a transição de um m odelo baseado em um Estado in te rv e n cio n ista , cen tralizado, onipresente, para um paradigma d e o r g a n i z a ç ã o , b a s e a d o n os p rincíp io s do liberalism o e da d e s c e n t r a l i z a ç ã o , é um d o s importantes desafios da Reforma F i s c a l . A d e s i g u a l d a d e de s i t u a ç õ e s , q u e c a r a c t e r i z a a e c o n o m i a , a s o c i e d a d e e a federação brasileiras, acrescenta m a is c o m p l e x i d a d e a e s t e d e s a f i o . Q u a l o d e s e já v e l e q u i l í b r i o co m r e s p e i t o à p a r t i c i p a ç ã o d e p e q u e n a s , médias e grandes empresas na vida econôm ica nacional? Como e v i t a r q u e a R e fo rm a F is ca l acarrete prejuízos aos segmentos m ais d e s p r o t e g id o s da s o c i e ­ d a d e , c o m o c o n s e q ü ê n c ia da privatização de programas sociais e d o c a n c e l a m e n t o i n d i s c r i ­ m i n a d o de i n c e n t i v o s e subsídios? Qual a fórmula capaz

de assegurar uma mais equilibrada repartição de responsabilidade e de recursos financeiros entre as três entidades que compõem a federação b r a s i l e i r a , n o m a r c o d as dificuldades decorrentes de uma enorme disparidade regional? A a d e s ã o a o p r i n c í p i o d o eq u ilíb rio significa a b u sca de uma solução compatível com a heterogeneidade de situações a serem consideradas. Um trata­ mento diferenciado, conform e o tamanho, a renda, ou a localiza­ ção do contribuinte, não deve ser e n t e n d i d o n e c e s s a r i a m e n t e , c o m o a c o n c e s s ã o d e um in ju s t if i c a d o p r i v i lé g i o . U m a regra c o n h e c id a d e e q u id a d e fis c a l r e c o m e n d a q u e o s d e s i g u a i s s e ja m t r a t a d o s d e acordo com a natureza de suas desigualdades - isto é, os q u e podem menos, pagam menos, os q u e p r e cis a m m a is , r e c e b e m mais.

A obtenção do equilíbrio é uma tarefa d elicad a. No ca m p o da revisão do papel do Estado e da repartição das responsabilidades públicas entre a União, estados e m u n i c í p i o s , u m a s o l u ç ã o eq u ilib rad a n ão significa uma solução homogênea. O apoio do Estado ao desenvolvimento das regiões e c o n o m ic a m e n t e mais atrasadas p od e ser revisto, d o ponto de vista da natureza dos

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instrumentos utilizados para esse fim, mas dificilmente poderá ser dispensado. No que diz respeito à t r a n s f e r ê n c i a d e e n c a r g o s p ú b l i c o s p a r a e s t a d o s e municípios, uma solução equili­ brada é aquela que admite um p ro cesso gradual e assimétrico de estadualização e/ou m unici­ pal ização dos serviços.

A maior presença do Estado e do g o v e r n o fe d e ra l, n o a p o io ao desenvolvimento econômico e na provisão de serviços públicos nas r e g iõ e s mais p o b res, deve ter im p o r t a n t e s r e p e r c u s s õ e s n o cam po tributário. Do pon to de v ista d o a p o i o a o d e s e n v o l ­ vimento regional, a substituição d e i n c e n t i v o s f is c a is , de aproveitamento restrito, por um p r o g r a m a p r e f e r e n c i a l d e in v e s tim e n to s , v oltado para a m e l h o r i a da in f r a - e s t r u t u r a e c o n ô m i c a das reg iõ es m enos desenvolvidas, cujos benefícios são mais difundidos, é uma das a lt e r n a t iv a s a se re m c o n t e m ­ pladas. Do p o n to de vista da d e s c e n t r a l i z a ç ã o d e s e r v iç o s públicos, principalm ente os de n atu reza social, a participação supletiva do governo federal no financiam ento, em condições a serem m elhor definidas, é uma condição que precisa ser preservada; d) S o l i d a r i e d a d e - não deve haver espaços para antagonismos.

Uma das preocupações subjacentes ao princípio da solidariedade é a de que a contribuição de todos, na medida de suas possibilidades para o bem comum, é a única maneira de obter-se uma carga m en or e mais distribuída. Se todos pagam, cada um pode arcar com um ônus mais reduzido. A abrangência das bases tributárias e a redução de alíquotas é a tradução desse princípio no jargão técnico da Reforma Fiscal. O p r i n c í p i o da s o lid a r i e d a d e estende-se ao exam e da questão fiscal n o c a m p o d o s d i r e i t o s sociais e das relações trabalhistas - uma das áreas mais delicadas da Reforma. O peso dos en cargos p reviden ciário s e dem ais c o n ­ trib u içõ es sociais n o cu s to de pro dução é um dos p rin cip ais fatores que afetam as con d ições de competitividade da empresa b r a s i l e i r a . A t e s e q u e g a n h a corpo a esse respeito, n o debate sobre a Reforma Fiscal, é a da lim it a ç ã o d o s d i r e i t o s p r e v i­ denciários (estab elecim en to de um t e t o p a ra o s b e n e f í c i o s concedidos pelo poder público e de um limite mínimo de idade para o b t e n ç ã o d e a p o s e n t a d o r i a ) , acompanhada da separação entre a previdência propriamente dita e os d e m a is p r o g r a m a s - s a ú d e e assistência - que são mantidos pelo sistema de seguridade social. As sugestões de privatização parcial da previdência podem não constituir

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u m a o p ç ã o viável p a ra os empregados de pequenas e médias empresas, em função do reduzido n úm ero de empregados em cada caso e dos menores níveis salariais. Nessa hipótese, a única opção para os trabalhadores desse universo de e m p r e s a s c o n t in u a r á s e n d o a previdência oficial, cuja base de fin a n c ia m e n to estará reduzida p ela e x p a n sã o da p revidên cia c o m p le m e n ta r . A c o n trib u içã o co m p u lsó ria de em pregad os c empregadores para a previdência pública ainda é, portanto, uma questão em aberto. A e v o l u ç ã o d a e s t r u t u r a t r i b u t á r i a : a n t i g a s c r e n ç a s , n o v a s t e n d ê n c i a s

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■ o r m u i t o s a n o s , as r e c o ­ m endações dos especialistas em finanças públicas, com respeito à adoção de mudanças tributárias c o m p a tív e is com os ideais de e f i c i ê n c i a , m o d e r n i z a ç ã o e ju stiç a fiscal, cen travam -se na ênfase da paulatina substituição de impostos indiretos sobre produção e vendas, por impostos diretos sobre a renda pessoal c empresarial. A preferência pelos impostos sobre a renda apoiava-se em argumentos sociais e eco n ô m ico s, além de s u s t e n t a r - s e , t a m b é m , em m o tiv a ç õ e s p o lítica s. Por não interferir nas decisões relativas à formação de preços nos mercados de

bens e serviços, o imposto sobre a renda seria uma forma de tributação s u p e r i o r às a lt e r n a t iv a s m ais u t i liz a d a s p ara t r i b u t a r a produção e com ercialização de bens e serviços, do ponto de vista d o p r i n c í p i o d e e f i c i ê n c i a econôm ica dos tributos. A esse a r g u m e n t o s o m a v a m -s e su a s vantagens, do ponto de vista da a p l i c a ç ã o d o p r i n c í p i o da capacidade contributiva (quem ganha mais deve pagar mais), e da v i s i b i l i d a d e d o ô n u s t r i b u t á r i o : c i e n t e d e q u a n t o contribui para os cofres públicos, o con trib u inte poderia ex e rc e r de forma mais efetiva seu papel cívico de fiscal da ação do Estado, no sentido d o ate n d im e n to ao bem comum.

A a d e r ê n c i a a e s s a v is ã o d o problema significava su bm eter a q u e s t ã o da m o d e r n i z a ç ã o tributária ao d e se n v o lv im e n to econôm ico, ao aperfeiçoam ento institucional, c à substituição de padrões culturais atrasados, típicos do subdesenvolvimento, por normas de conduta compatíveis com as encontradas nas sociedades dos países desenvolvidos. A substituição dos tributos maus (os indiretos) pelos tributos bons (os diretos) só poderia ocorrer à medida em q u e fo s s e m s e n d o c r ia d a s as c o n d i ç õ e s n e c e s s á r i a s a o s a t i s f a t ó r i o d e s e m p e n h o d o imposto sobre a renda, do p on to

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d e vista fiscal: ampliação de sua b a s e ( p r o p ic ia d a p e lo c r e s c i ­ m en to econôm ico, aum ento de ren d a e redu ção das desigual­ d a d e s ) , o a p e r f e i ç o a m e n t o administrativo, a educação cívica d o c o n t r i b u i n t e ( f r u t o d o d esenvolvim ento cultural), e o d e s e n v o lv im e n to p o l í t i c o (na l i n h a d o f o r t a l e c i m e n t o d o s id e a i s q u e c o m a n d a m as m o d e r n a s d e m o c r a c ia s r e p r e ­ sentativas).

Uma lei geral de evolução das estruturas tributárias, construída a partir dos argum entos acima m en cio n ad o s, foi proposta cm um in t e r e s s a n te trab alh o que a l c a n ç o u n o t o r i e d a d e na segu n d a m etade da década de sessenta (Ilinrichs, 1966). "A Lei Geral de Evolução das Estruturas Tributárias durante o Processo de Desenvolvimento Econômico", p ro p o sta p or Harley Hinrichs, b u s c a v a d a r u m a r o u p a g e m científica à tese de que o aumento da participação do Im posto de Renda no orçamento público seria um resultado natural do próprio desenvolvimento.

A argum entação racional, supor­ tad a p e la e v id ên cia em p írica, e s c o n d i a u m a b o a d o s e de p re co n c e ito s. A suprem acia de c u l t u r a a n g l o - s a x ô n i c a , em c o m p a r a ç ã o c o m a la tin a , do p o n t o d e vista da a t it u d e do

contribuinte perante o fisco, foi freqüentemente citada co m o um atributo importante para explicar as d ife r e n ç a s e n c o n t r a d a s na c o m p a r a ç ã o i n t e r n a c i o n a l de países ocidentais, com respeito às r e s p e c t iv a s e s t r u t u r a s d e trib u tação . O c o m p o r t a m e n t o civ icam en te irresp o n sáv e l d o s cidadãos latinos seria a causa da m enor ênfase nos tributos sobre a r e n d a e a p r o p r i e d a d e e n c o n t r a d a em p a ís e s la t in o - am erica n o s su b d e sen v o lv id o s, vis-à-vis aqueles q u e sofreram a i n f l u ê n c i a c o l o n i z a d o r a d e outras culturas. (Tabela 1).

Na década dos oitenta, a ênfase q u e a l i t e r a t u r a o c i d e n t a l atrib u ía ao p ap el d o im p o s to s o b r e a r e n d a c o m e ç o u a a r r e f e c e r . S o b a p r e s s ã o das c r í t i c a s q u e d e n u n c i a v a m os efeitos daninhos provocados pela pesada taxação dos lucros e dos rendim entos familiares sobre as condições de competitividade das economias ocidentais, frente a seus parceiros orientais, tradicionais cânones da política tributária foram duram ente abalados. As n e c e s ­ s i d a d e s d e i n v e s t i m e n t o na e x p a n s ã o da p r o d u ç ã o e na modernização tecnológica forçaram a redução do ônu s im posto ao capital, ao mesmo tempo em que a atenuação da progressividade do t r i b u t o q u e o n e r a a r e n d a p e s s o a l foi vista c o m o in d is

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Tabela 1

PARTICIPAÇÃO DOS IMPOSTOS SOBRE A RENDA E A PROPRIEDADE NA RECEITA TRIBUTÁRIA TOTAL (GOVERNO CONSOLIDADO)*

I m p o s t o s s/ Impo stos s/ C a r g a PAÍSES A N O S r e n d a P r o p r i e d a d e Total

% PIB PARTIC. % PIB PARTIC. % PIB PAÍSES L A T I N O S BRASIL ARGENTINA COLÔMBIA MÉXICO CHILE PAÍSES N Ã O L A T I N O S ÁFRICA DO SUL KENYA INDONÉSIA TAJLÂNDIA 1987 4.3 1 9 0 1987 2.4 11.0 1984 23.0 1984 4.5 25.0 1987 3.5 15.0 1986 13.3 54.0 1986 5.9 32.0 1988 9.2 60.0 1988 3.2 21.0 0.3 1.0 22.3 1.8 8.0 21.4 0.4 2.0 11.4 0.1 1.0 18.2 0.4 2.0 23.2 1.4 6.0 24.6 0.5 3.0 18.5 0.4 3.0 15.4 0.4 3.0 15.5

Fonto. FMI - Jonathan Lcvin

* O bs.: Media para os 3 úliimos anos com dados disponíveis, sendo o último ano indicado

p c n s á v c l à r e c u p e r a ç ã o d o e s fo rço de trabalho c da ética profissional. De uma perspectiva dinâmica, a elevada dependência do orçam ento público dos impostos sobre a renda passou a ser vista como um fator adverso. Tomava-se n e c e s s á r i o a liv ia r a p r e s s ã o suportada pelos rendim entos do capital e do trabalho para que os e s t í m u l o s à p r o d u ç ã o e à produtividade daí d eco rren tes contribuíssem para a sustentação do d e s e n v o l v i m e n t o e p ara a competitividade internacional. A tese da evolução linear da estrutura tributária cedia espaço à busca de

um melhor equilíbrio, do ponto de vista da contribuição das principais ca te g o r ia s d e t r ib u t o s para a formação das receitas públicas. As re c o m e n d a ç õ e s de p o lític a tributária passaram a c o n c e n - trar-se: a) na redução dos en ca r­ g o s i n c i d e n t e s s o b r e a p o u p a n ç a e o i n v e s t i ­ mento; b) na a te n u a çã o da p r o ­ gressividade do im p o sto que onera a renda pessoal;

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c) na maior utilização dc impostos sobre o consumo com o fonte de receita do g o v e r n o e c o m o in s t r u ­ mento de im plementação dos p rincípios d c ju stiça fiscal.

A p r o p o s t a d e a m p li a ç ã o do im posto sobre o consum o não é nova; nova é a sua inclusão na agenda das preocupações atuais da p o lític a trib u tá ria . Em um estudo clássico sobre a matéria, p u b l i c a d o na d é c a d a d o s c i n q ü e n t a , N ic h o la s K a ld o r e l a b o r o u , d e fo r m a a m p la e detalhada, sua proposta para a c o n s t r u ç ã o d e um m o d e l o tributário ideal, baseado na idéia de um imposto abrangente sobre o c o n s u m o (K aldor, 1 9 9 5 ) . O im po sto idealizado por Kaldor pretendia reunir, em um só tributo, a tripla vantagem da neutralidade econ ôm ica, da justiça fiscal e da relação direta entre o contribuinte e o fisco. Ao invés dc declarar a sua ren d a, o cid a d ã o -c o n trib u in te d e v e r ia d e c l a r a r o seu g a s to (consumo), incidindo o tributo em função do montante e da composição do gasto de cada um. Ao incidir s o b r e a d e s p e s a fin a l d o s con su m id ores, o im posto seria neutro, tanto do pon to dc vista da f o r m a ç ã o d c p r e ç o s n o m ercado de produtos, quanto da e s c o l h a e n t r e p o u p a n ç a e in v e stim e n to e trabalho/lazer,

n o s m e r c a d o s de f a t o r e s . Ao exigir uma declaração pessoal do c o n t r ib u in t e , o im p o s t o id e a ­ lizado p or Kaldor preservaria os m esm os a trib u to s do im p o sto direto sobre a renda, do p on to d e vista d as r e l a ç õ e s d e co- responsabilidade entre o Estado e o cidadão. Por último, a aplicação de alíquotas progressivas, em relação ao consumo, atenderia ao princípio do tnuamen to seletivo em função da c a p a c i d a d e c o n t r i b u t i v a d o s indivíduos, além de estim ular a poupança e o investimento. O imposto ideal de Kaldor jamais v in g o u , p e l a a u s ê n c i a d e c o n d i ç õ e s p r o p í c i a s à su a o p eracion alização. Os m otivos que conduziram à elaboração dessa proposta, no entanto, retom am , agora, com redo brado vigor. A d e s c o n s i d e r a ç ã o d a s c o n t r a - i n d i c a ç õ e s a o u s o a b u s i v o e prolongado de doses cada vez mais elevadas do imposto sobre a renda, que constavam das advertências feitas à ép o ca, abalou a saúde e c o n ô m i c a d o s p a í s e s m ais d ese n v o lv id o s, f o r ç a n d o u m a mudança de estratégia. A terapia do im p o sto s o b r e o c o n s u m o foi retomada, sob novo enfoque. A experiência dos países europeus, com a adoção generalizada do imposto sobre o valor agregado - IVA -, impulsionada pelos esforços de in tegração da C o m u n id a d e Européia, abriu novas perspectivas

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para que a tese da predominância do imposto sobre o consumo ganhasse maior espaço para aplicação prática. Não é necessário centrara aplicação d o im p o s t o na d e c la r a çã o do contribuinte. Ele pode ser aplicado, d e fo r m a in d i r e t a , m e d ia n t e utilização das técnicas adotadas para a im p lan tação do IVA, já testadas com sucesso em um grande número de países do ociden te. O i m p a c t o da in v e r s ã o das reco m e nd açõ e s com respeito a m o d i f i c a ç õ e s na e s t r u t u r a t r ib u t á r i a ao lo n g o d o s a n o s oitenta já se faz sentir. Arrefeceu o crescimento da participação dos impostos sobre a renda na receita tributária dos países da OCDE ao longo da última década, ao mesmo tempo em que se alterou a natureza dos tributos que oneram o consumo, nesses mesmos países. O acréscimo na participação dos impostos sobre o consum o deveu-se a uma maior ênfase n o Imposto sobre o Valor Agregado - IVA - em relação a outras modalidades de tributa­ ção. A absoluta maioria dos paí­ ses que integram a OCDE adota, hoje, o IVA com o um dos mais im p o rta n te s im p o sto s de seus sistemas tributários. (Tabela 2). Não é só nos países da OCDE que a idéia do Imposto sobre o Valor Agregado flo resceu . Ela e s te n ­ d eu -se a toda a parte. Estudo r e c e n t e m e n t e d iv u lgad o p e lo

B a n c o M u n d ia l r e l a t a v á rio s c a s o s d e p a í s e s em d e s e n ­ volvimento nos quais a ad oção do IVA desem penhou um papel i m p o r t a n t e na d i r e ç ã o d e m o d ern ização dos resp ectiv o s sistem as trib u tá rio s n o tr a n s ­ correr das últimas décadas, entre eles o Brasil (Gillis, Shoup and Sicat, 1990). Em todos os casos analisados, a contribuição do IVA para a r e c e ita p ú b lica d e s e m ­ p en h a um papel sign ificativ o, co m u m a cla ra t e n d ê n c i a de crescimento. (Tabela 3).

A fragmentação do antigo bloco soviético estende ao leste europeu as preocupações com a m od er­ nização tributária sustentadas na ad oção do IVA c o m o piéce de resistánce d o s m o d e l o s de Reforma a serem adotados naquela p a rte da E u r o p a . Em u m a interessante análise dos problemas tributários desses países, Sijbren Cnossen (C nossen, 1 9 9 1 ) e n u ­ m era as q u e s t õ e s a s e r e m enfrentadas para a adoção desse imposto nas antigas econ om ias planificadas d o leste eu ro p e u , concluindo pela dificuldade em fazer uma transição im ediata e pela necessidade de estabelecer-se um calendário compatível com o ritmo de andamento das demais reformas econômicas, que têm por objetivo a liberação dos mercados e a modernização das estruturas econômicas vigentes.

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O s rum os da reform a fiscal

Tab ela 2

IMPOSTO SOBRE VALOR AGREGADO

PAÍSES DA OCDE EM % DA RECEITA TRIBUTÁRIA E % DO PIB

% RECEITA % PIB % RECEITA % PIB ÁUSTRIA 18.08 5.84 18.76 5.97 BÉLGICA 17.70 7.34 17.89 7.56 DINAMARCA 32.14 10.09 30.74 9.79 FRANÇA 23.51 8.93 22.92 9.06 ALEMANHA OC. 13.99 3.85 1 3 2 5 3.66 IRLANDA 15.61 5.03 21.93 8.16 ITÁLIA 16.18 5.39 14.64 5.82 LUXEMBURGO 11.63 4.45 13.15 — HOLANDA 15.27 6.90 13.90 6.47 NORUEGA 22.84 8.53 22.44 8.48 SUÉCIA 19.86 6.42 19.89 6.81 REINO UNIDO 16.38 5.09 15.81 5.24 Font*: Gillis et allii, 1990. Dados Básicos: Government Flnance Statistics, FMI, 1985 n.a. = não aplicável — = não disponível

Tabala 3

IMPOSTO SOBRE VALOR AGREGADO

PAÍSES EM DESENVOLVIMENTO EM % DA RECEITA TRIBUTÁRIA E % DO PIB

% RECEITA % PIB % RECEITA % PIB ISRAEL 25.04 8.71 28.01 7.57 KOREA 24.95 3.89 25.07 4.29 COTE dTVOlRE 10.64 2.16 — — MADAGASCAR 23.38 3.82 — — MARROCOS 24.30 5.22 29.20 6.35 SENEGAL 15.72 3.44 21.26 3 9 1 COSTA RICA 10.03 1.68 17.42 3 .69 GUATEMALA 14.63 1.48 — 1.56 HONDURAS 7.08 0.99 — — MÉXICO 17.26 2.58 19.71 3.18 NICARÁGUA 10.70 2.06 10.42 2.84 PANAMÁ 8.92 1.87 — — ARGENTINA 12.48 1.87 14.89 1.88 BOLÍVIA 5.61 0.40 6.83 0.28 BRASIL n.a. — 28.74 6.49 CHILE 39.80 10.19 37.43 8.12 COLÔMBIA 18.76 1.93 — — EQUADOR 11.87 1.45 12.35 1.33 PERU 30.02 5.66 — — URUGUAJ 27.01 5.68 23.49 4.55 Font*: Gillis et allii, 1990. Dados B ásico s: Government Finance Statistics, FMI, 1985.

n.a. = não aplicável — = não disponível

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O s r u m o s d a r e f o r m a

l ^ a s poucas questões sobre as quais há um razoável consenso n o s d e b a te s em cu rso so b re a Reforma Fiscal, duas m erecem ser destacadas, de inicio:

a) O sistema tributário bra­ s i l e i r o é d e m a s i a d a ­ mente com plexo e pre­ c is a s e r d r a s t i c a m e n ­ te simplificado;

b ) O s e n t r a v e s f is c a is , rep resen ta d o s p or p e­ sados ônus à produção, aos in v e stim e n to s e à exportação, ameaçam a sustentação de padrões d c c o m p e t i t i v i d a d e c o m p a t í v e i s c o m as exigências de integração in t e r n a c io n a l da e c o ­ n o m ia e d c m o d e r n i­ zação do país, e preci­ sam s e r r a p i d a m e n t e eliminados.

Simplificação e competitividade con stitu em , pois, os dois eixos principais em que se assentam as p ro p o sta s de reform ulação do sistema tributário, tanto aquela q ue vem sendo preparada pelo G o v e r n o , q u a n t o as q u e vêm s e n d o a n u n c i a d a s , d c form a independente, por congressistas,

entidades civis e especialistas na matéria. Claro q u e to d o s c o n ­ cordam, ainda, com a proposição de que a Reforma Fiscal não se resume a modificações no campo trib u tário , d ev en d o se r a c o m ­ panhada (se possível precedida), de uma p ro fu n d a r e d u ç ã o do gasto público. No en tanto, com o a q u e s t ã o d o g a s t o p ú b l i c o envolve um problema muito mais amplo, que se inicia pela revisão d o papel do E sta d o e a r e o r ­ ganização do regime federativo, e vai descendo a detalhes tais como a estabilidade do funcionalismo, a isonomia salarial, e os regimes especiais de ap o s e n ta d o ria d o servidor, o avanço dc proposições consensuais a respeito é muito mais d ificil dc scr consegu ido.

Se, à ép o ca da C o n stitu in te , a principal bandeira da batalha da Reforma era a d escentralização fiscal, vista com o indispensável ao reforço da autonomia política de e s ta d o s e m u n i c í p i o s , e à redução do poder de intervenção do governo federal, a palavra de ordem, agora, é a simplificação. Sucessivas trapalhadas jurídicas, a c o m p a n h a d a s d e m u d a n ç a s freqü en tes nas regras do jo g o , le v a ra m o c o n t r i b u i n t e à exaustão. To dos concordam em q u e é n e c e ss á rio sim p lificar o sistema tributário, reduzindo o n ú m ero de trib utos, m e d ia n te a m p l i a ç ã o d e s u a s b a s e s ,

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O s rumos da reforma fiscal

to m a n d o as regras aplicáveis à sua administração mais estáveis e mais fáceis de serem seguidas e criando incentivos à queda da e v a s ã o e d a s o n e g a ç ã o , p ela redução de alíquotas e extinção d e p r i v i l é g i o s , s i m p li fi c a r , p ortan to, é preciso. Mas com o c o n c i l i a r o s i n t e r e s s e s da s im p lificação com a com plexa re a lid a d e o riu n d a das c o n h e ­ cidas desigualdades que marcam a federação brasileira?

S i m p l i f i c a r n ã o s i g n if ic a , necessariamente, reduzirão mínimo o número de impostos existentes (quiçá a um só). Um só imposto geral pode ser muito mais complexo do que um núm ero variado de impostos específicos (por exemplo: se in s t i t u ís s e m o s a p e n a s três im p o stos so b re o co n su m o de energia elétrica, combustíveis e t e l e c o m u n i c a ç õ e s , sua a d m i­ n is t r a ç ã o seria e x t r e m a m e n t e sim ples, mas, n ão o b sta n te , o sistema seria inadequado). O que é, então, ser simples cm matéria de tributação? T er um c o n j u n t o d e i m p o s t o s q u e redu za ao m ín im o o cu s to do cum prim ento da obrigação fiscal pelo contribuinte? Ou o que deve s e r m in im iz a d o é o c u s to da a r r e c a d a ç ã o ? V is to d e o u t r o ângulo, qual é o custo que deve m erecer mais atenção: o que se m e d e p e l o la d o d o s a c rifíc io

imposto à população (a renda do assalariado, o lucro da empresa, o preço dos alimentos) ou o que re fle t e o c u s to c o n t á b i l r e l a ­ c i o n a d o a o seu p a g a m e n t o ? S i m p l i c i d a d e é um a t r i b u t o importante, mas não o traço que deve definir o caráter e a p er­ sonalidade de qualquer sistema tributário. Não é de h o je que a literatura especializada na área recomenda a utilização de algumas bases tributárias, de facil exploração p elo Estado, c o m o ân co ras de sustentaçãodos orçamentos públicos em países menos desenvolvidos, d o t a d o s de u m a i n e f i c i e n t e administração fiscal (os chamados

tax-bandles, na língua inglesa). E simples, por exemplo, tributar as im portações, as ex p o rtaçõ es, a exp loração de g ran d es jazidas minerais, o refino de petróleo, a g e r a ç ã o e d i s t r i b u i ç ã o d e e n e r g i a , o r e n d i m e n t o d o trabalho assalariado.

Um sistema tributário com po sto por vários im postos específicos, do tipo daqueles m encion ad os n o p a r á g r a fo a n t e r i o r é c e r t a m e n t e m ais s im p le s (d o p o n t o de v ista d e c u s t o s a d m i n i s t r a t i v o s , o b r i g a ç õ e s acessórias, facilidade de cobrança e de pagamento) do que outro q u e a l c a n c e a p e n a s as tr ê s principais bases con h ecid as de trib u ta çã o : ren d a, c o n s u m o e propriedade. Mais simples, mas

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n e m p o r is s o , m ais r e c o ­ mendável.

Posto que um sistema tributário simples não é, necessariamente, aquele que é com posto por um m e n o r n ú m e r o p o s s ív e l de t r i b u t o s , c o m o o b t e r a tão ansiada simplificação tributária n o b o jo de uma Reforma que leve em c o n t a a c o m p l e x id a d e de nosso sistema federativo? Como fa z e r co m q u e a b a n d e ir a da simplificação não seja utilizada com o uma manobra divisionista, para abrir espaço ao avanço dc propostas que conduzam a um r e t o r n o à c e n tra liz a çã o fiscal, o b j e t o d e se v era s c r í t i c a s ao longo das duas últimas décadas, e tão duramente combatida por o c a s i ã o d o s t r a b a l h o s da Constituinte?

Q ualquer estudante de finanças públicas é capaz de enunciar que são três as bases de tributação co n h e cid a s: renda, con su m o e p r o p r i e d a d e ; e q u e a e s s e s impostos, que têm a finalidade d e s u s t e n t a r o o r ç a m e n t o p ú b lico , p od em ser agregados outros, de finalidade extrafiscal, e que alcançam, usualmente, as operações de com ércio exterior c d o m e r c a d o f in a n c e ir o . No c ô m p u t o geral, três im p o sto s g e r a i s , m a is d o i s ou três i m p o s t o s de fin a lid a d e e s p e ­ cífica, form am o c o n ju n t o de

cinco ou seis impostos, que tem sido freqüentem ente anunciado com o grande inovação.

A transposição dessa tese para regim es federativos tam b ém é conhecida dos leitores dos textos b á sico s de F in a n ç a s P ú b licas. Impostos com função extrafiscal devem, por sua natureza, ser de c o m p etên cia federal; e os três im p o s t o s g e r a i s d e v e m s e r repartidos segundo a vinculação do seu fato gerador à base territorial encarregada d c sua cobrança e administração. Assim, o im posto sobre a propriedade imobiliária deve ser do município, o imposto sobre o consumo, do estado, e o imposto de renda, da União. Do ponto de vista co n ceitu ai, há c o n s is tê n cia na argumentação. Q u e chances há, e n t r e t a n t o , d c um s i s t e m a construído apenas com base em preceitos teóricos ser compatível c o m a c o m p l e x a r e a l i d a d e brasileira?

Os rumos da Reforma dependem dc uma abordagem realista do delicado problema do equilíbrio n a s r e l a ç õ e s f is c a is i n t r a g o - vemamentais. Convém notar, em p r i m e i r o lu g a r , q u e o a t u a l desenho do mapa geopolítico do Brasil não deverá ser alterado, no s e n t i d o d e u m a r e v is ã o d e f r o n t e ir a s q u e p r o m o v a u m a a g l u t i n a ç ã o d e e s t a d o s e municípios. Ao contrário, o que

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se verifica é a consolidação de uma tendência divisionista. Três n o v o s e s ta d o s e c e rc a de mil novos municípios foram criados a p ó s 1 9 8 8 e n ã o há, p o r enquanto, nenhum a garantia de interru p ção desse p ro ce sso de fragm entação. Q u an to m aior o núm ero de estados e municípios criados, maior a dificuldade em c o n c i l i a r as n e c e s s i d a d e s orçam en tárias mínimas (manu­ tenção do executivo, do legislativo, da in fr a -e s tr u tu r a u rb a n a , da segurança pública, da escola, do p o s to de saúde, da assistência so cial...) com a capacidade de geração de receita própria, mediante c o b r a n ç a d o im p o s to s o b r e a propriedade, caso dos municípios, ou do imposto sobre o consumo, c a s o d o s e s t a d o s . C o m o a demarcação de novas fronteiras políticas é fruto da ampliação das transferências, o número de novas unidades federadas criadas a partir d e 1 9 8 8 , q u e n ã o a p r e s e n t a c o n d i ç õ e s m ín im a s de a u to - s u f i c i ê n c i a f i n a n c e i r a , é a esm ag ado ra maioria. Som ados aos antigos estados e municípios, em q u e os níveis de renda da p o p u l a ç ã o e as c o n d iç õ e s de pobreza urbana não asseguram q u a l q u e r v ia b i l i d a d e o r ç a ­ mentária, pela via da tributação do consum o ou da propriedade de seus habitantes, o número de casos em que a dependência d e o u tr a s fo n t e s de re c e ita é

g r a n d e a s s u m e p r o p o r ç õ e s elevadas.

Nessas condições, o au m ento da base tributária estadual (tran s­ formando o atual ICMS em um imposto de base ampla sobre o consumo, incorporando a ele a m aio r p a rte d o atual IPI e os serviços) n ão é su ficien te para dar autonomia financeira a um g r a n d e n ú m e r o d e e s t a d o s brasileiros. Sim ulações feitas à época da Constituinte mostram q u e a a m p li a ç ã o da b a s e d o antigo ICM, c sua transformação em um imposto sobre o consumo, s e g u n d o o f i g u r i n o d o IVA, produziriam ganhos de receitas suficientes, para com pensar uma eventual extinção das transferências federais, cm um número reduzido de casos em que o grau de dependência de recursos transferidos é pouco significativo. Mesmo levando em conta que os ganhos de receita em estados mais pobres poderiam ser expressivos, pois eles passariam a usufruir, integralmente, da receita obtida com o imposto cobrado sobre os bens de maior valor consumidos em seu te rritó r io , tais g a n h o s fic a r ia m m u i t o a q u é m d as perdas, ca so as tra n sfe rê n c ia s constitucionais fossem zeradas. Para uma situação não incomum, cm q u e as r e c e i t a s p r ó p r i a s respondem por cerca de 2/3 do orçamento, a compensação integral de uma extinção das transferências

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só o c o r r e r ia na h ip ó te se de a am pliação da base do imposto estadual provocar um aumento de arrecadação superior a 50%, o que dificilmente acontecerá cm um g r a n d e n ú m e r o d e casos. C om o nesse meio tempo o país em pobreceu e as transferências aumentaram, é provável que n o ­ vas sim u laçõ es a respeito p ro­ duzam resultados ainda menos satisfatórios.

C a b e a c r e s c e n t a r q u e as exigências da nova Reforma não se r e s u m e m à r e d u ç ã o do n ú m e r o de trib u to s. É fu n d a­ m e n t a l q u e a re v is ã o das co m p e tê n cia s tributárias e das bases de tributação seja feita de forma a viabilizar a exoneração plena das exportações (o Brasil é um d o s p o u c o s p a íse s q u e alm ejam integrar-se ao circuito i n t e r n a c i o n a l q u e t e im a em q u e r e r e x p o r t a r t r i b u t o s ) , a substancial redução da carga de im postos que oneram os inves­ t i m e n t o s , e o alív io d o p e s o tributário que sufoca a produção de alim entos e encarece o custo da alim en tação do trabalhador brasileiro. Convém salientar que a so lu ção desses três problem as vincula-se, diretamente, a modi­ ficações na tributação estadual. Em ou tras palavras: n ão basta assinalar que a implantação de um imposto sobre o consumo, de bases

a b r a n g e n te s , de c o m p e t ê n c i a estadual, é incapaz por si só, de a te n d e r às n e c e s s id a d e s o r ç a ­ mentárias da maioria dos estados brasileiros. É preciso cham ar a atenção, ainda, para o fato de q u e as trê s e x i g ê n c i a s m e n ­ cionadas no parágrafo a n te rior afetam, de modo distinto, orçamento de todos os estados brasileiros. E n q u an to a n ã o -in c id ê n c ia do im p o s t o e s t a d u a l s o b r e a a q u is iç ã o d e b e n s de c a p it a l afetaria os estados mais in d u s­ trializados, a d e s o n e ra ç ã o das e x p o rta çõ es de p ro d u to s agrí­ c o la s - e p r i n c i p a l m e n t e d o s semi-elaborados - atinge àqueles q u e tê m a g r i c u l t u r a e a g r o ­ p e c u á r i a m o d e r n a s ; o s m a is pobres, por seu turno, sofreriam o im p a c t o da r e d u ç ã o d as a l í q u o t a s ou da i s e n ç ã o d o im p o s t o i n c i d e n t e s o b r e o s alimentos que com põem a cesta básica do trabalhador.

No q u e d iz r e s p e i t o a o s municípios, já foi m encionado, a n te rio rm e n te , q u e a trad ição latina é a de um baixo índice de cob ran ça de im p o sto s so b re a propriedade. Esse fenôm eno tem r a íz e s c u l t u r a i s , e s ó s e r á revertido na medida em que for e x tin to o in centiv o q u e a a m ­ p l ia ç ã o d e p a r t il h a s e t r a n s ­ fe r ê n c i a s c o n c e d e a sua p r e ­ servação. Convém admitir, que n ã o só o a t o d e t r i b u t a r a

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O s rumos da reforma fiscal

pro p ried ad e é o politicam ente m a is o n e r o s o , m as q u e a administração desse tributo em regimes inflacionários instáveis torna-se complexa. Se, ao ônus p o l í t i c o c às d i f i c u l d a d e s a d m i n i s t r a t i v a s , s o m a m - s e o baixo estím ulo que as generosas p a r c e l a s d e t r a n s f e r ê n c i a s , p r o v e n i e n t e s da p a r t il h a de im p o s to s fed era is e estad u ais c o n c e d e à m elh o r ex p lo ração das bases tributárias próprias, é fácil e n t e n d e r p o rq u e se to m a d i f í c i l , n o c o n t e x t o a t u a l , i n v e r t e r o q u a d r o d e p r o ­ g r e s s i v a d e p e n d ê n c i a d o s o r ç a m e n t o s m u n i c i p a i s d c receitas transferidas. O d ile m a é o s e g u i n t e : se as c o m p e t ê n c ia s trib u tárias p r ó ­ prias d c estad o s e m un icípios forem claram ente insuficientes para a t e n d e r às n e c e s s id a d e s m í n i m a s d e s o b r e v i v ê n c ia financeira e d c preservação da sua autonomia política, aumen­ tam as pressões para que cresça, p a ra n ív e is in d e s e já v e is , sua participação na rcccita federal. Por seu turno, se aumentam os c o e f i c i e n t e s de tra n sfe rê n c ia , in v i a b i l i z a - s e o o r ç a m e n t o f e d e r a l , g e r a n d o um c í r c u l o vicioso d c difícil interrupção. Ao lo n g o do tem po, as demandas p o r transferências superam a preocupação com a administra­ ção eficiente das bases tributárias

próprias, acarretando inúmeras distorções.

Para q u e o s p r i n c í p i o s da R eform a se ja m o b e d e c i d o s , é necessário associar a abrangência das bases tributárias a uma ampla - e seletiva - redução de alíquotas. No entanto, mesmo que a redução de alíquotas e a ampliação das bases concorram para uma espetacular queda nos índices de sonegação fiscal, não é factível supor que tal efeito será suGciente para sustentar a receita pública indispensável à preservação do equilíbrio orça­ mentário.

Aponta-se, com freqüência, que os ín d ice s de p a rtic ip a ç ã o do im p o s to de ren d a p e s s o a l na receita tributária, no Brasil, são pequenos quando subm etidos a q u a lq u e r c o m p a ra çã o in t e r n a ­ cio n al. T o d o s c o n c o rd a m q u e essa participação deveria crescer, q u i ç á d u p l i c a r . Mas c o m o conseguí-lo em um co n texto de em pobrecim en to geral do país, de modestas perspectivas quanto à retomada do crescim ento nesta década, e da urgente necessidade dc adaptarmo-nos à realidade da é p o c a , co m r e s p e i t o a u m a m en or ênfase na aplicação dos t r a d i c i o n a i s p r i n c í p i o s d e progressividade tributária? Do p o n t o de v ista c o n c e i t u a i , a ju s t iç a trib u t á r ia p o d e r ia se r aten d id a pela s u b s tit u iç ã o da

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progressividade do im posto de r e n d a p o r u m a t r i b u t a ç ã o s e l e t i v a d o c o n s u m o , q u e b e n e f i c i a s s e o s p r o d u t o s de m a io r e s s e n c ia lid a d e . Não há c o m o es co n d e r, n o e n tan to, o f a t o d e q u e o e s p a ç o para aum entar o imposto que incide sobre a renda familiar é estreito, p e l o s b a ix o s n ív eis d e ren d a m é d ia e p e l o a lt o í n d i c e de c o n c e n t r a ç ã o . Em su m a , a redução da alíquota do imposto q ue on era o lucro das empresas, a e x t in ç ã o dos ad icio n ais que penalizam o capital estrangeiro, o e n c u rta m e n to da t a b e la progressiva do imposto de renda pessoal, não sinalizam na direção de expressivos ganhos, do ponto d e v ista da p a r t i c i p a ç ã o da receita do im posto de renda no PIB, n o m é d io prazo (q u içá a preservação dos índices atuais já seria uma hipótese otimista). E c e r t o q u e , a lo n g o p razo , os efeitos decorrentes da expansão da e c o n o m i a , da a b s o rç ã o de parcela expressiva d o mercado informal de trabalho, e da queda n a s o n e g a ç ã o d e v e r ã o s e r expressivos. Mas até que esses resultados se materializem será n e c e s s á r io trabalh ar em bases mais realistas para a construção de um pro jeto viável de Reforma. A pedra de toque do equilíbrio fiscal, sob a ótica regional, está n a b u s c a d e u m a s o l u ç ã o

a c e it á v e l p a ra o c o m p l e x o p r o b l e m a d e r e d e f i n i ç ã o d e a t r i b u i ç õ e s e r e p a r t i ç ã o d e e n c a r g o s p ú b l i c o s e n t r e o governo federal, os estados e os m u n i c í p i o s . A s i n c r o n i a d o processo de descentralização de receitas e de encargos depende de uma forte von tade p o lítica para im p u lsio n á-la. A tr a n s fe ­ r ê n c ia das r e s p o n s a b i l i d a d e s pela saú de, p e lo e n s in o , pela a s s i s t ê n c i a s o c i a l , e o u t r o s p r o g r a m a s q u e a l ó g i c a r e c o m e n d a s e ja m d e s c e n t r a ­ lizados atende aos princípios da Reforma - aproximar governantes e c i d a d ã o s , n o c a m p o da p r e s t a ç ã o de s e r v iç o s s o c i a is básicos e de seu financiam ento - , contribui para o equilíbrio das relações intergovem am entais, e dá efetivas c o n d iç õ e s para um real en xu g am en to da m áquina administrativa federal.

O q u e se p r e t e n d e c o m a descentralização de atribuições é a detonação de uma seqü ên cia de efeito s positivos. P rim eiro, evitar q u e a a d e rê n cia a teses e q u iv o c a d a s j u s t i f i q u e m o r e t o r n o a um r e g im e c e n t r a ­ lizado, com os vícios conhecidos. S e g u n d o , a r e o r i e n t a ç ã o d as ações do governo central, m enos voltado para a administração de c o n v ê n i o s e a p r e s t a ç ã o d e serviços, e mais orien tado para a tiv id a d e s d e f o r m u l a ç ã o de

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O s rumos da reforma fiscal

p o l í t i c a s , p l a n e j a m e n t o e c o n t r o l e . T e r c e i r o , a m a io r eficiên cia n o uso dos recursos p ú b l i c o s , p e l a c r i a ç ã o de co n d iç õ e s propícias ao efetivo c o n t r o l e da a d m i n i s t r a ç ã o pública por parte dos próprios usuários dos serviços.

É n o marco das necessidades de fin an ciam en to das atividades a se re m d esc e n tra liz a d a s q u e o p r o b l e m a d o e q u i l í b r i o na distribuição intergovernamental de recursos p od e ser apreciado c o m m a i o r p r o p r i e d a d e . Alterações na distribuição inter c in tr a g o v e m a m e n ta l da receita pública poderão ser negociadas, com maior segurança, se o ponto de referência for a magnitude das r e s p o n s a b i l i d a d e s a s e r e m a s s u m i d a s , e n ã o o s v a lo r e s atualm ente observados.

A a p o s ta n a d e s c e n t r a l iz a ç ã o significa admitir que o custo da p re stação de serviços públicos nos estados e municípios é muito i n f e r i o r a o c u s t o d o m e s m o serviço, q uan d o prestado pelo g o v e rn o federal. Isso significa que, no médio e longo prazos, os mesmos programas poderão ser s u s t e n t a d o s co m m e n o r e s r e ­ quisitos financeiros, de forma tal a viabilizar a progressiva c o n ­ v e r g ê n c i a p a ra um s i s t e m a tributário construído segundo o ideário do momento.

C o n c l u s õ e s

C o m o se sabe, o d ebate sobre Reforma T ribu tária tem ressal­ tado os vícios do sistema atual e defendido mudanças orientadas por uma forte p re o c u p a ç ã o co m a s i m p l i f i c a ç ã o d as n o r m a s vigentes. Em linhas gerais, o novo p a d r ã o d e f i n a n c i a m e n t o d o gasto público deve ser definido p o r um c o n j u n t o d e p o u c o s tributos, de bases abrangentes, cujas alíquotas, fixadas em níveis m o d e ra d o s , se ja m s u f i c i e n t e ­ m e n t e b a ix a s para a m p li a r o universo de contribuintes, mas capazes de assegurar níveis de a r r e c a d a ç ã o s u f i c i e n t e s p a r a s u s t e n t a r as a t r i b u i ç õ e s d o governo e preservar o desejável equilíbrio regional.

A s i m p lific a ç ã o d o s is t e m a tributário inicia-se pela redução do n ú m e r o d e t r ib u t o s , p e la r e d e f i n iç ã o d e su as b a s e s de incidência, pelo respeito ao direito do contribuinte, pela estabilidade normativa, e pela recuperação de padrõ es m ínim os de é tic a tri­ butária. As freqü en tes disputas legais que colocam o Estado e os contribuintes em campos opostos devem ser eliminadas, mediante o mútuo respeito a novas normas in stitu íd as em o b e d iê n c ia aos princípios de legalidade e justiça.

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A

trib u ta ç ã o a b ra n g e n te das três principais bases tributárias conhecidas - renda, consumo e propriedade - é a q u e la q u e mais se ajusta, no campo tributário, ao espírito das reformas a serem realizadas. Como se sabe, essa tese, defendida pela maior parte dos especialistas na matéria, é a que se aproxima do modelo adotado na maior parte do m u n d o m o d e r n o , ao qual deveremos nos integrar ao longo da presente década. Não se trata, obviamente, de agir por imitação, mas sim de re c o n h e c e r o fato óbvio de que a harmonização do t r a t a m e n t o fiscal é um dos r e q u is i t o s in d is p e n s á v e is ao a t e n d im e n t o dos o b jetiv o s da integração internacional.

Em linhas gerais, o m odelo de Reforma T rib u tária d e fe n d id o n e s s e t r a b a l h o a p r e s e n t a as seguintes características:

a) a trib utação da renda deve ser feita de forma abrangente, reduzindo- se ao mínimo as dedu­ ç õ e s e a b a t i m e n t o s , elim inando-sc os regi­ m es e s p e c ia is , e r e s ­ t r i n g i n d o a p r o g r e s ­ s iv id a d e das a l í q u o ­ tas ao imposto cobrado sobre a renda familiar. A pesada carga trib u ­ tá ria q u e o n e r a os l u c r o s d e v e s e r r e ­ duzida, e x t in g u in d o - se o t r a t a m e n t o d i s ­ criminatório concedido ao capital estrangeiro;

b) nenhum im posto deve­ rá on erar a exportação e a a q u is iç ã o d c m á ­ quinas e equipam entos in d is p e n s á v e is à m o ­ dernização tecnológica, ao a u m e n t o da c a p a ­ cidade produtiva, e à g e r a ç ã o de m a i o r e s oportunidades de em ­ prego. O im posto deve incidir sobre o co n su ­ m o , c n ã o s o b r e a p r o d u ç ã o e o s i n ­ v e s t i m e n t o s . O i m ­ p o s t o d e c o n s u m o deverá ser seletivo, cm f u n ç ã o do g ra u d c c s s c n c i a l i d a d e d as mercadorias e serviços, co n fo rm e p r e ce itu a m os modernos princípios de justiça fiscal;

c) o im posto sobre a p ro­ p r i e d a d e d e v e s e r utilizado co m o reforço d o v í n c u l o d c c o - rcsponsabilidade entre o Estado e o cidadão- contribuinte, n o plano das relações do poder p ú b lic o lo ca l co m as

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O s rumos da reforma fiscal

comunidades. A rnuni- cipalização do contri­ b uinte, no sentido de uma apropriação maior d e su a c a p a c i d a d e contributiva pelo m u­ n ic íp io , é uma forma m ais e fe tiv a d e c o n ­ t r o l e da s o c i e d a d e sobre o gasto público, e uma alternativa eficaz p ara o c o m b a t e a o s vícios e as descaminhos f a v o r e c id o s p o r uma indevida centralização dos re cu rso s fiscais - p r i n c i p a l m e n t e os destinados à cobertura de programas sociais; d) o com bate à evasão e à

s o n e g a ç ã o d e v e s e r conduzido, prioritaria­ m e n t e , p e l a r e c u p e ­ ração da ética tributária c não por medidas de c u n h o r e p r e s s i v o e policial. Isso significa q u e as a líq u o ta s dos impostos sejam fixadas em níveis compatíveis c o m a c a p a c i d a d e c o n t r ib u t iv a das e m ­ presas e das famílias, q u e e la s se ja m r e c o ­ n h ecid as co m o legíti­ mas (não apenas legais) do p on to de vista dos fins a que destinam, e q u e haja p len a tran s­

p a r ê n c i a d as r e g r a s aplicadas à instituição d o s t r i b u t o s e à adm in istração dos r e ­ c u r s o s a r r e c a d a d o s pelo governo;

e) a sim p lificação trib u ­ tária requer não apenas a redução do n ú m ero d e i m p o s t o s , m as também a simplificação e e s t a b i l i d a d e d as normas ju rídicas ap li­ cadas à administração e cobrança dos tributos. Uma vez a p r o v a d a a Reforma, deverá haver um compromisso explí­ cito com a preservação das novas normas por um prazo co m p a tív e l c o m o h o r i z o n t e d e estabilidade necessário à retomada d o d e s e n ­ volvimento; f) o número de im postos que deverá sobreviver ao processo da Reforma Tributária não pode ser definido de antemão, o n ú m ero efetivo re s u l­ ta rá d e um a m p l o processo de negociação q u e e n v o lv e o e q u a - cio n a m e n to dos c o m ­ p le x o s p r o b le m a s r e ­ gionais e d o d elicad o equilíbrio federativo. R.Scrv.Públ. Brasília 11 9 (I):1 5 3 -1 7 4 , jan./abr. 1995 1 7 3

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R e f e r ê n c i a s B i b l i o g r á f i c a s

CNOSSEN, Sijbren. (1 9 9 1 ) Key Q u c stio n s in C onsidering a Valuc Added Tax for Centrai a n d E a s t c r n E u r o p e a n C o u n t r i e s . IM F W o rk in g Paper, IMF. H IN R IC H S , H arley . ( 1 9 6 6 ) A G e n e r a l T h e o r y o f T a x S t r u t u r e C h a n g e D u rin g E c o n o m i c D e v e l o p m c n t . Cambridge, Mass, Law Scholl o flla rv a rd University.

KALDOR, N icholas. ( 1 9 5 5 ) An E x p e n d i t u r e T a x . Unw in University Books, London.

R e s u m e n

LOS RUMBOS DE LA REFORMA

FISCAL

La r e d e fin ic ió n d ei papel dei E s t a d o y la d e m a r c a c i ó n de r e s p o n s a b i l i d a d e s d ei s e c t o r público constituyen la base sobre la c u a l d e b e n s o s t e n e r s e la propuesta de reformulación de su padrón de financiación. En este sentido, el trabajo defiende un m odelo de reforma tributaria determ inado por la relación dei n ú m e r o de t r i b u t o s , p o r la

r e d e f i n ic ió n d e su s b a s e s de in c id ê n c i a , p o r el r e s p e t o al derecho dei contribuyente, por la estabilidad normativa y por la r e c u p e r a c i ó n d e la é t i c a tributaria.

A b s t r a c t

THE DIRECTIONS OF THE TAX

REFORM

The directions o f the tax reform The redefinition o f the role o f the state and the dem arcation of the limits o f the responsabilities o f the public sector con stitu te a basis on which the proposal o f its financing pattem should rest. T o this end, the paper advocates a Tax Reform model determined by the reduetion in the n u m b er o f taxes, by the redefinition o f its bases, by the respect to the taxpayers’ rights, by regulation stability and by the recovery o f the ethics in taxing.

Fernando Rezende é professor

da E sco la B r a s ile ir a de

A d m in istra çã o P ú b lica da

Fundação Getúlio Vargas - EBAP/

FGV, Rio de Janeiro e diretor

e x e c u tiv o do I n s titu to de

Pesquisa Econômica Aplicada

-IPEA.

Referências

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