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Projeto de extensão a geografia e a cultura dos lendários da capoeira: o trabalho de campo como estratégia metodológica / Extension project to the geography and culture of the legendary Capoeira: field work as a methodological strategy

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Academic year: 2020

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Braz. J. of Develop.,Curitiba, v. 6, n. 10, p. 78079-78091 ,oct. 2020. ISSN 2525-8761

Projeto de extensão a geografia e a cultura dos lendários da capoeira: o

trabalho de campo como estratégia metodológica

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Extension project to the geography and culture of the legendary Capoeira: field

work as a methodological strategy

DOI:10.34117/bjdv6n10-293

Recebimento dos originais: 08/09/2020 Aceitação para publicação: 14/10/2020

Catiane Muniz da Silva

Graduanda em Geografia - Universidade do Estado da Bahia/UNEB XI e-mail: Catianeww00@gmail.com

João Nogueira de Santana

Graduado em Geografia - Universidade do Estado da Bahia/UNEB XI Centro Cultural de Capoeira Lendário de Palmares

e-mail: joaonsantana@gmail.com Jean da Silva Santos

Professor da Universidade do Estado da Bahia, Departamento de Educação, Campus XI - Serrinha e da Rede Municipal de Ensino de Feira de Santana – BA e Integrante dos Grupos de Pesquisas

Laboratório de Estudos, Pesquisas e Extensão em Geografia e Educação (LEPEGE) e do Território, Cultura e Ações Coletivas (TECEMOS)

e-mail: jesantos@uneb.br Ana Margarete Gomes da Silva

Professora da Universidade do Estado da Bahia, Departamento de Educação e da Educação Básica do Estado da Bahia. Integrante do LEPEGE e do TECEMOS

e-mail: amgomes@uneb.br

RESUMO

Este trabalho tem como objetivo discutir uma das atividades do Projeto de Extensão Universitária “A Geografia e a Cultura dos Lendários da Capoeira” posta em prática em 2015/2016 na Universidade do Estado da Bahia, Departamento de Educação, Campus XI, Serrinha – BA. Versa sobre a importância do trabalho de campo no processo de ensino e aprendizagem, bem como do papel que este tem para agregar pessoas, considerando, sobretudo, o estudo a compreensão e a valorização dos aspectos socioculturais, apresentados pela capoeira como um fator de integração social sendo a cultura um aspecto que se constitui e se concretiza em diferentes espaços ao longo de um determinado período histórico, fruto de múltiplas relações sociais tendo como base a manifestação da cultura Afro-Brasileira.

Palavras-chave: Extensão, Capoeira, Trabalho de Campo.

1 Este artigo foi apresentado no VIII Seminário do NUPE: Universidade, Ciência e Culturas: aproximações necessárias, na Universidade do Estado da Bahia, Campus XI – Serrinha, em 07 a 09 de novembro de 2017.

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This work aims to discuss one of the activities of the University Extension Project "The Geography and Culture of the Legendary Capoeira" put into practice in 2015/2016 at the State University of Bahia, Department of Education, Campus XI, Serrinha - BA. Versa about the importance of field work in the process of teaching and learning, as well as the role it has to add people, considering, above all, the study the understanding and appreciation of socio-cultural aspects, presented by Capoeira as a factor of social integration, culture being an aspect that is constituted and concretized in different spaces throughout a certain historical period, fruit of multiple social relations based on the manifestation of Afro-Brazilian culture.

Keywords: Extension, Capoeira, Field Work.

1 INTRODUÇÃO

O Projeto A Geografia e a Cultura dos Lendários da Capoeira é um projeto de extensão desenvolvido na Universidade do Estado da Bahia (UNEB) Campus XI, também financiado por recursos deste. Este Projeto é desenvolvido em parceria com o Grupo de Capoeira Lendário de Palmares, ambos localizados no município de Serrinha-BA. O Projeto extensionista, visa uma maior integração entre a universidade e comunidade externa e tem como objetivo geral contribuir no processo de inclusão social de crianças e adolescentes que se encontram em situação de vulnerabilidade, utilizando para isso o ensino da capoeira nas suas diversas dimensões, sempre preservando e divulgando os fundamentos da cultura afro-brasileira. Para além deste objetivo busca-se ainda conhecer e compreender a diversidade e complexidade dos aspectos socioculturais da capoeira enquanto manifestação cultural, bem como, símbolos e significados que compõem o cenário sócio-espacial desta manifestação cultural e sua implicação no município de Serrinha.

Para sua consecução, são desenvolvidas aulas teórico-práticas diretamente associadas à cultura afro-brasileira, as quais tendo a capoeira como atividade principal, e secundárias, o samba de roda e o maculêlê, a puxada de rede dentre outros elementos, em parceria com o Centro Cultural de Capoeira Lendário de Palmares. Desta maneira tem-se garantido um processo de apresentação e vivências junto a crianças e jovens para a produção do conhecimento acerca da diversificada cultura e sua gênese histórica.

Todo o aprendizado teórico é repartido a partir do histórico de cada indivíduo integrante do grupo, respeitando as características singular da capoeira e da cultura afro-brasileira de transmissão oral do conhecimento através de realizações de atividades semanais; apresentações públicas nas praças Luiz Nogueira e Astrogilda Guimarães e em outros espaços públicos do munícipio de Serrinha – BA; oficinas com professores e mestres da cultura popular do município em questão, e

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da região; desenvolvimento de debates e palestras sobre a capoeira, a cultura popular, manifestações populares; e apresentação de vídeos educacionais acerca da história e cultura afro-brasileira.

Atualmente o projeto atende aproximadamente duzentas pessoas, sendo crianças, jovens e adultos, com faixa etária a partir de 05 anos, e a maioria em situação de risco ou vulnerabilidade social principalmente nas comunidades de Bomba, Baixa D’água, Cruzeiro, Malhada do Alto, Muricy e Novo Horizonte de Serrinha, além das atividades desenvolvidas no campus da Universidade do Estado da Bahia – UNEB/ Departamento de Educação, Campus XI.

Ao acompanhar as atividades desenvolvidas pelo grupo, buscamos a superação do puro e simples assistencialismo, que por vezes a universidade deixa evidenciar em seus projetos de extensão, ao longo da história. Para isso adotamos a extensão universitária como o processo educativo, cultural e científico que articula o ensino e a pesquisa de forma indissociável e que viabiliza a relação transformadora entre Universidade e Sociedade de acordo com as ideias de Serrano (2014) e Jezine (2004).

Cabe destacar que o projeto de extensão universitária, A geografia e a Cultura dos Lendários da Capoeira que foi concebido em 2013 e que atualmente continua sendo realizado, nos faz perceber o quanto que a geografia se faz presente no contexto histórico em que se insere a capoeira, onde podemos correlacionar, questionar e compreender as múltiplas relações sociais, e sua concretude na sociedade.

Dado isso o espaço também é um fator essencial na produção dessas relações. E o trabalho de campo aqui será tratado como caminho que possibilita compreendermos melhor a diversidade e complexidade cultural uma vez que “[...] a paisagem carrega a marca da cultura e serve-lhe de matriz” (CLAVAL, 2007, p.21). Destaca-se que este trabalho de campo é apenas um dos momentos do projeto desenvolvido em 2015/2016.

2 A ABORDAGEM DO TRABALHO DE CAMPO COMO ESTRATÉGIA DE FORMAÇÃO EXTENSIONISTA

A abordagem de trabalho de campo se mostra como uma estratégia de ensino por meio da qual podemos explorar uma diversidade de conteúdo, estimulando assim a curiosidade e percepção espacial de crianças, jovens e adultos proporcionando-lhes uma aprendizagem mais significativa. Além disso, a saída de campo, enquanto instrumento metodológico, auxilia na construção dos conhecimentos científicos relacionando, fatos, elementos históricos, em seus espaços.

Esta estratégia em questão nos permite fazer uma observação e correlação direta do fato ou fenômeno, com o seu lócus, nos levando a explorar os diversos sentidos e (de certa forma)

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contextualizarmos melhor. Assim “leva-nos a fazermos uma leitura do mundo de forma mais ampla partindo do local para o global” (BRASIL, 1997). Para tanto é possível afirmar que é esta visão de mundo que o aluno enquanto sujeito social precisa ter, porque os fatos que acontecem e as mudanças jamais ocorrem separadamente, existem interrelações de forma que um acontecimento pode influenciar em outro. Tomita (1999) destaca a importância de se estimular o educando a indagar o porquê das coisas para o mesmo não se conformar com a situação simples dos fatos, mas sim a partir de uma visão criteriosa e crítica, portanto, sob estas bases, acreditamos que a análise da realidade concreta, nas suas diversas dimensões, sejam elas culturais ou socioeconômicas, precisam ser observadas sob o enfoque de uma teoria, que permita a compreensão do papel dos sujeitos na construção de sua própria história. Assim, a abordagem histórico-cultural explica o aprendizado humano a partir de sua natureza social e a pedagogia histórico-crítica empenha-se em colocar a educação a serviço da transformação das relações sociais buscando traduzir para as relações educacionais o processo dialético de elaboração do conhecimento científico.

Desta forma, entende-se que a Teoria Histórico-Cultural e a Pedagogia Histórico-Crítica constituem um método eficiente de leitura de mundo e de análise da educação que se expressa numa Didática capaz de ser um instrumento significativo de elaboração do conhecimento científico na perspectiva da transformação social (ANTONIO, 2008, p. 8).

Nesse sentido, a viagem de campo feita para Salvador nos possibilitou ampliarmos a visão sobre diversos aspectos culturais e perceber que o conhecimento que temos a respeito da capoeira e outros aspectos culturais do nosso município, não se limitam nem se restringe apenas a aquilo que vivenciamos no nosso dia a dia, o nosso histórico cultural vai muito além do que imaginamos.

Para a abordagem do trabalho de campo junto a projeto extensionista A Geografia e a Cultura dos Lendários da Capoeira, optou pela viagem didática em que visitas técnicas e culturais aconteceram em duas edições, em dezembro de 2015 e em dezembro de 2016. Através destas atividades os alunos integrantes do grupo de Capoeira Lendário de Palmares, bem como monitores participantes do projeto de extensão, tiveram a oportunidade de visitar alguns roteiros históricos em Salvador, BA, onde reconheceram no conjunto arquitetônico soteropolitano, características de um patrimônio histórico e cultural muito rico.

Em todos estes lugares se primou pela reflexão sócio-espacial2 do patrimônio cultural, através da abordagem das dimensões cultural, política e econômica, e também se vislumbrou a real

2 Para Souza (2005, p. 101) “[...] um desenvolvimento urbano autêntico, sem aspas, não se confunde com uma simples

expansão do tecido urbano e a crescente complexidade deste, na esteira do crescimento econômico e da modernização tecnológica.” Para que esse desenvolvimento ocorra é necessário um desenvolvimento sócio-espacial da e na cidade, garantindo mais justiça social e qualidade de vida para um número crescente de pessoas (SOUZA, 2005).

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participação do povo negro africano e afro-brasileiro para a construção da atual sociedade brasileira e baiana, de forma a entender como a lógica da produção do espaço ao longo do tempo imprimiu marcas na paisagem atual, uma vez que todos estes espaços detêm características históricas e possuem valor simbólico para o patrimônio material e imaterial brasileiro e baiano.

Neste sentido, a paisagem soteropolitana apresenta diversas possibilidades de leitura sócio-espacial a partir das rugosidades3 presentes na capital baiana cuja infinidade de símbolos dentre pinturas, imagens, esculturas, artesanatos, instrumentos, escritas e arquiteturas se mostram como registros que carregam significados simbólicos e que nos permite fazer uma leitura e melhor compreensão de alguns processos sociais, culturais, políticos e econômicos, entendendo que cada registro faz parte de um contexto próprio, de acordo a cada momento histórico e, principalmente, de muitas vidas que por ali passaram e passam. Segundo Claval (2007, p. 63),

[...] a cultura tem suas raízes num passado longínquo, que mergulham no território onde seus mortos são enterrados e onde seus deuses se manifestaram. Não é portanto, um conjunto fechado e imutável de técnicas e de comportamentos. Os contatos entre povos de diferentes culturas constituem uma fonte de enriquecimento mútuo. A cultura transforma-se também, sob o efeito das iniciativas ou das inovações que florescem no transforma-seu transforma-seio (CLAVAL, 2007, p. 63).

Segundo Wagner e Mikesell “[...] a cultura é resultado da capacidade dos seres humanos se comunicarem entre si por meio de símbolos”. (2007, p. 28). Partindo dessa afirmação percebe-se que existem muitas formas de registrar e também de revisitar valores culturais de práticas sociais pouco usuais pela atual geração, ressignificando-os de modo que cada indivíduo se encontre em determinado espaço, reconhecendo suas características culturais por meio dos cantos, das danças, dos toques, dos gestos e da diversidade das figuras de linguagens que estejam ao seu entorno possibilitando uma maior comunicação e interação entre os seres humanos.

Segundo Claval (2007) a cultura é a soma dos comportamentos, dos saberes, das técnicas, conhecimentos e valores acumulados pelas pessoas durante suas vidas e também pelo conjunto de práticas sociais coletivizadas. Sendo assim as características culturais que os nossos ancestrais tiveram, apresentadas na atividade de campo, deve-se justamente a esse conjunto de conhecimentos e saberes adquiridos ao longo de suas trajetórias de vida, e vai além, é uma herança dos antepassados.

A característica marcante de nossa cultura é essa riqueza de sua diversidade como resultado de nosso processo histórico social (FERNANDES, 2005). Considerando a pluralidade étnica a qual 3 Conceito de Milton Santos, (1977) que inaugura originalmente a ideia e se conjuga, basicamente, como formas espaciais oriundas de múltiplos períodos de tempo, vinculados na síntese do espaço como acumulação desigual de tempos históricos.

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sabemos que existe em nosso país e que contribui para a formação de nossa cultura, deveríamos e temos o direito de assegurar, de falarmos em culturas brasileiras ao invés de cultura brasileira.

Segundo Gadotti (1992),

[...] a diversidade cultural é a riqueza da humanidade. Para cumprir sua tarefa humanista, a escola precisa mostrar aos alunos que existem outras culturas além da sua. Por isso, a escola tem que ser local, como ponto de partida, mas tem que ser internacional e intercultural, como ponto de chegada [...] (2005, p. 386).

Para tanto, o projeto de extensão através das atividades desenvolvidas, para além do trabalho de campo analisado, destacam que o indivíduo, assim como a escola e a universidade precisam ser autônomos, ousando e buscando dialogar com todas as concepções de culturas. Neste contexto o projeto de extensão é apresentado como possibilidade e esse pluralismo designa especialmente o diálogo com todas as culturas, partindo de uma determinada cultura que se abre as demais. Assim sendo, neste mesmo contexto é possível afirmar que a capoeira é um instrumento de inclusão social uma vez que através dela pode-se conhecer e experienciar muitas outras culturas.

3 A EXPERIÊNCIA DO TRABALHO DE CAMPO EM SALVADOR

A intenção da abordagem do trabalho de campo, através do citado projeto extensionista, deu-se no deu-sentido de proporcionar aos integrantes do Centro Cultural de Capoeira Lendário de Palmares e aos monitores voluntários e bolsistas do projeto pertencentes a Uneb, a produção de conhecimento histórico e geográfico in loco nos locais visitados, a saber: no Pelourinho, Mercado Modelo, a Fundação Casa de Jorge Amado, o Memorial das Baianas, o Elevador Lacerda; foi visitada também o Forte Santo Antônio Além do Carmo, Parque das Dunas, a Lagoa do Abaeté e o Parque São Bartolomeu. Buscou-se compreender e correlacionar tais lugares com a gênese da própria história dos participantes, articulando o pensamento sob a perspectiva de que os sujeitos históricos são constituídos como parte de um processo, e que eles pudessem se reconhecer como parte integrante da própria diversidade cultural revisitada.

Também foi possível a análise de aspectos não somente culturais, mas nos aspectos políticos e econômicos da constituição do povo negro na Bahia, cujas possibilidades de leituras perpassaram também pela observação de distintos aspectos das paisagens vistas ao longo de todo o percurso. Segundo Santos (2001) a paisagem é o conjunto de formas que, num dado momento exprimem as heranças que representam as sucessivas relações localizadas entre homem e natureza. Esta é o conjunto de elementos naturais e artificiais que caracterizam uma área fisicamente.

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Vale destacar que por tratarmos majoritariamente de crianças e adolescentes, a atividade ocorreu no sentido de demonstrar de forma lúdica e implicada, através de uma linguagem apropriada, os eventos históricos em seus processos de permanências e transformações sociais no espaço soteropolitano. Foi possível garantir o entendimento junto aos participantes, que tais eventos históricos se deram em diferentes contextos históricos e que não foram fatos que aconteceram de forma repentina, naturalizada, mas seguiram a lógica de produção de espaço perverso, excludente a partir dos interesses de grupo de poder e que se demonstravam nas formas-conteúdos, sobretudo nos lugares. Outra conclusão apresentada pela percepção dos participantes, foi possível notar que as formas presentes nas paisagens observadas e nos fixos visitados, mudaram suas funções, de acordo a cada momento histórico, porém suas formas continuaram as mesmas.

Sendo assim, na visita ao Pelourinho foi possível discutir no coletivo, algumas considerações a respeito do processo histórico daquele espaço e debater questões apresentadas pelos participantes, sobretudo a partir da forma-conteúdo e o processo de (re)funcionalização do espaço, a substituição da função de espaço de opressão durante o período escravocrata, área core da cidade-fortaleza do Salvador, no passado, á espaço turístico no tempo do presente, como valor simbólico para a comunidade afro-brasileira. Foi possível vislumbrar as atuais atividades culturais e comerciais ali existentes, com destaque para a territorialização dos grupos de capoeira em suas manifestações culturais. Portanto, o que antes era símbolo de sofrimento e repressão hoje é um lugar ressignificado, e, é considerado um dos pontos turísticos mais visitados da cidade de Salvador.

Figura 1 – Visita ao Pelourinho – Salvador/BA.

Fonte: Jailton Oliveira, monitor voluntário.

A figura 1 trata-se do registro da passagem do grupo pelo Largo do Terreiro de Jesus, onde podemos encontrar com o senhor Manoel Silva, conhecido como Mestre Boca Rica. O Mestre Boca

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Rica tem um reconhecido trabalho com capoeira no Brasil e em alguns outros países. O encontro com o mestre propiciou alguns momentos de descontração além de importante diálogo sobre a representatividade do mestre enquanto figura que transmite conhecimento e a importância da tradição da capoeiragem.

Na Fundação Casa de Jorge Amado (Figura 2), cujo objetivo é preservar, pesquisar e divulgar o acervo bibliográfico e artístico do escritor baiano Jorge Amado além de incentivar e apoiar estudos e pesquisas sobre a vida do escritor e sobre a arte e a literatura baianas, tivemos a possibilidade de debater sobre o imaginário da cultura baiana a partir da exposição permanente de documentos, fotografias, exemplares de livros de sua vasta obra produzida, objetos pessoais do referido autor. A Fundação Casa de Jorge tem como uma de suas missões: a criação de um fórum permanente de debates sobre cultura baiana especialmente sobre as lutas que envolveram as discriminações raciais e socioeconômicas nesse Estado.

Cabe destacar um trecho de uma das narrativas feitas por um dos alunos que participaram do trabalho de campo,

A viagem de campo a Salvador foi bastante interessante e importante a partir do momento em que saímos um pouco do nosso lugar para aprendermos em espaços diferentes, onde não estamos acostumados a visitar (Nilcley Rocha – Aluno da capoeira).

Figura 2 – Fundação Casa de Jorge Amado

Fonte: João Santana, monitor voluntário.

Nesse momento, o ponto central da discussão junto a Fundação Casa de Jorge Amado foi sobre a presença e o papel do negro nos ambientes romanescos, sobretudo nas obras do escritor baiano, dentre eles, Jubiabá (1935), Capitães da Areia (1937), e, dentre outros livros, Gabriela Cravo e Canela (1958) os quais contemplam a temática de forma direta ou tangenciada.

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Na visita ao Memorial das Baianas, é possível destacar a percepção dos participantes do projeto sobre o importante papel desempenhado pela figura tradicional e histórica da baiana na luta pela libertação e pelo sustento de seus familiares, ressaltando a relação direta com os elementos basilares da cultura afro-brasileira, destacando a religiosidade, e, acima de tudo, a Mãe de Santo como detentora dos saberes e tradições.

A Visita ao Mercado Modelo, local de importante visitação turística da capital baiana, que funcionava como o principal entreposto comercial de produtos alimentício e de escravos da Bahia colonial, hoje é o lugar onde são comercializados produtos artesanais dos mais variados tipos. Em conjunto com os integrantes da atividade, houve a oportunidade de se discutir sobre a (re)funcionalização do lugar sob a perspectiva da diversidade cultural, tanto de manifestações artísticas, quanto de produtos ali existentes, a exemplo de fotografias, artesanatos, vestuários típicos. Foi possível verificar uma série de artefatos que têm uma relação muito próxima das vivências das crianças e jovens pertencentes ao projeto, a exemplo dos instrumentos musicais utilizados em uma roda de capoeira, como o berimbau, o pandeiro e, dentre outros, o atabaque.

Na área externa ao Mercado Modelo os alunos tiveram a oportunidade de participar de uma roda de capoeira que estava acontecendo, onde foi possível a troca de experiências entre os grupos.

Figura 3 – Roda de Capoeira no Mercado Modelo – Salvador/ BA.

Fonte: João Santana, monitor voluntário.

Outro lugar visitando na Cidade do Salvador foi, o Forte Santo Antônio Além do Carmo, o qual após uma recente restauração ficou conhecido como Forte da Capoeira, localizado na praça Barão do Triunfo (Largo de Santo Antônio). Os participantes tiveram a oportunidade de conhecer um pouco de sua historia, bem como da (re)funcionalização para um local de importante representatividade para a cultura da capoeira. Assim, de antiga prisão de negros, as atuais salas de aula de capoeira nomeadas com referencias a importantes pessoas negras da história brasileira, a

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exemplo da antiga cela que hoje é utilizada pela Escola Filhos de Zumbi. O local dispõe de um pátio para atividades coletivas e um memorial alusivo aos grandes mestres da capoeira baiana com objetos pessoais, livros, fotos e vídeos e seis salas de aula para a prática da capoeira, além de uma videoteca.

Visando desenvolver a atitude científica junto aos participantes do projeto de extensão, foi desenvolvido uma atividade prática no Parque Metropolitano do Abaeté em conjunto com o Grupo de Capoeira Raça (Itapoan, Salvador), sob orientação partilhada com o professor Almiro, conhecido como Zebu. Foram realizadas entrevistas aleatórias com a intencionalidade de compreender qual a atual função do Parque Metropolitano do Abaeté, a partir das práticas sociais dos moradores, sob a perspectiva de como estes se relacionam com o lugar.

Do universo de 15 pessoas entrevistadas, 12 disseram que visitavam a Lagoa do Abaeté a trabalho e como forma de lazer esporádico. Apenas 2 pessoas afirmaram frequentar o parque para lazer rotineiro. E 1 pessoa afirmou que o frequentava para ritos religiosos.

Realizamos visita ao Parque das Dunas, também conhecido como Unidunas, que é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), em área de restinga dunária, com aproximadamente seis milhões de metros quadrados inseridas nos domínios do município de Lauro de Freitas, BA, além de situar-se também em Área de Proteção Ambiental (APA) das Lagoas e Dunas do Abaeté. O Parque desenvolvem ações de educação ambiental as quais tem como objetivo central o preservacionismo do meio ambiente, por conta da grande diversidade de flora e fauna. Um dos fundadores do parque, apresentou uma variedade de plantas ali existentes fazendo correlação com as utilizações em ritos ancestrais da cultura indígena e negra. Destacaram-se alguns exemplos da fitoterapia: o cambuí que serve para curar a gripe e garganta inflamada, e o guajurú fruto que serve para amenizar dores de estômago, dentre outros.

Figura 4 – Visita ao Parque das Dunas

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Durante a participação dos jovens na longa caminhada por uma trilha interpretativa, foi possível conhecer uma parte da fauna e flora local, e temas relacionados a especulação imobiliária e de grupos de poder que apresentam interesse de ocupação daquele espaço e citou também o interesse do estado no espaço para a ampliação do Aeroporto Internacional Luiz Eduardo Magalhães, antigo 2 de Julho, suscitando o debate sobre os possíveis impactos socioambientais decorrente dessa ampliação.

No Parque São Bartolomeu, o principal ponto de discussão foram as religiões de matriz africana, seus rituais e relação com a natureza. Alguns elementos naturais como cachoeiras, a Mata Atlântica e o clima chamaram a atenção dos participantes da atividade. Outro destaque foi a apresentação, por parte de uma moradora da comunidade, da questão socioambiental do lugar. Uma moradora do bairro São Bartolomeu, também aluna de dança afro no parque, afirmou,

O local é muito histórico, traz a força dos ancestrais pela cultura africana, é muito simbólico e, além disto, ajuda na economia local, pois muitas pessoas utilizam deste local para retirar o sustento através das frutas e peixes existentes no local, e vendem no comércio local da comunidade (Moradora local do Bairro São Bartolomeu).

A narrativa acima demonstra a importância do Parque São Bartolomeu tanto do valor simbólico cultural, religioso, quanto econômico para a comunidade, bem como da consciência ambiental que ela, a moradora possui. A partir da observação direta dos participantes do projeto foi possível destacar alguns aspectos: a pesar de o lugar ser de características ambientais privilegiadas, há uma condição aparente de abandono do espaço físico por parte dos poderes políticos locais, mediante a ausência de serviços de manutenção, bem como da práticas individuais de alguns moradores que contribuem diretamente para a poluição do lugar a partir do acumulo de resíduos sólidos.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considerando as múltiplas observações e reflexões feitas à luz do processo histórico de cada espaço visitado, percebeu-se que embora seja marginalizada a participação da população negra na construção da história e da cultura brasileira, são a figura central de todo este processo, uma vez que, foram os negros, a mão de obra na produção da riqueza nacional, embora expropriados de todas as suas riquezas culturais, sobretudo dos seus lugares de origem.

Cada lugar visitado teve uma função específica para as discussões do projeto de extensão. Os aspectos políticos, sociais, econômicos e ambientais trabalhados, fortaleceram a discussão da diversidade das características culturais da Bahia junto ao grupo. Cabe destacar também que para a

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maioria das crianças e adolescentes, esta foi a primeira atividade de formação fora de seu município, pois a abordagem do trabalho de campo, segundo os participantes do projeto, não é uma prática metodológica comum nas suas escolas de ensino fundamental.

Nesse sentido, durante todo o percurso foi possível perceber em cada rosto o contentamento em estar participando das atividades. Sendo assim o trabalho de campo tornou-se parte do calendário do projeto de extensão, pois a mesma contribui diretamente para o desenvolvimento social e intelectual dessas crianças e jovens tornando-os mais reflexivos e críticos sobre a presente realidade e ainda possibilitando-os a fazer correlações conceituais entre os eventos históricos do presente e do passado a fim de construir seus conceitos, de desenvolver atitude científica a partir da prática da pesquisa.

Outro fator a ser destacado é a relação tempo-espaço, das transformações e permanências, das formas-conteúdos e suas (re)funcionalizações e as rugosidades espaciais cristalizadas na paisagem contemporânea. Foi possível perceber, principalmente no Mercado Modelo, que cada espaço assume uma característica de acordo a uma demanda social, e que os espaços que hoje utilizamos resultam da luta e do sofrimento de um povo, tendo a capoeira enquanto uma das representações desta resistência. Estes fatores nos levam a considerar que a capoeira não significa apenas uma dança, um canto, um batuque, um simples salto como de forma simplória a consideramos, ela nos diz muito sobre a gênese da nossa história.

A partir das situações experienciadas no processo formativo empreendido pelo Projeto de Extensão A geografia e a cultura dos Lendários da capoeira, sobretudo na atividade abordada pelo trabalho de campo, é possível afirmar que a atividade proporcionou uma leitura de tempo-espaço no campo do tangível, além de destacar a importância das manifestações e tradições populares afro-brasileiras na construção do Estado Brasileiro enquanto Nação, possibilitando com isso que cada individuo, independentemente de onde se encaixa na estrutura socioeconômica da pirâmide social, é sujeito participante do projeto de construção de sociedade mais justiça sócio-espacial.

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Imagem

Figura 1 –  Visita ao Pelourinho – Salvador/BA.
Figura 2 –  Fundação Casa de Jorge Amado
Figura 3 –  Roda de Capoeira no Mercado Modelo – Salvador/ BA.
Figura 4 –  Visita ao Parque das Dunas

Referências

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