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Historiografia e História do Direito no século

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Anais do Seminário Nacional de História da Historiografia: historiografia brasileira e modernidade

Historiografia e História do Direito no século

Rhadson Rezende Monteiro

As mudanças metodológicas no âmbito das ciências humanas ocorridas nas ultimas décadas, bem como as novas tendências de uma sociedade mais questionadora sobre as origens de seu sistema jurídico, reavivem a necessidade de reexaminar e problematizar a historia do direito, marcada por “uma historicidade jurídica estruturada na tradição teórico-empírica construída pela força da autoridade, da continuidade, da acumulação, da previsibilidade e do formalismo1”.

A historia assim como o direito cumpre muitas vezes “um papel legitimador do status quo, um papel restaurador e reacionário, ou ainda um papel legitimador no novo regime2”, dentro desse aspecto a tradicional histográfica jurídica tornou-se um mecanismo de legitimação da ordem jurídica moderna ocidental, pautada em um modelo liberal – individualista, no Estado como provedor do direito e no modo de produção capitalista, na medida em que estes espaços institucionalizados passam a ser cobertos por um “universo ideológico apresentado como uma situação natural, independente do devir histórico3”.

O presente artigo propõe examinar as vicissitudes da historiografia durante o século XX no âmbito especifico da historia do direito, campo de estudo até as ultimas décadas fortemente influenciado pelos aspectos positivistas da ciência jurídica.

Desta forma, se faz necessário compreender do que trata a “historia do direito”, e para tal passarmos a considerar o Direito e a Historia propriamente ditos, como áreas de investigação com características e autonomia próprias.

Assim, a historia “pode ser visualizada como a sucessão temporal dos atos humanos dinamicamente relacionados com a natureza e a sociedade4”, por sua vez utilizando-se da “tripartição simplificada” o direito “pode ser visto como ordenamento,

1 WOLKMER, Antonio Carlos. Historia do Direito no Brasil. Rio de Janeiro : Editora Forense, 2000 p. 1 2 LOPES, José Reinaldo de Lima. O Direito na Historia: Lições Introdutórias. São Paulo : Editora Max

Limonad, 2002 p. 18

3 HESPANHA, Antonio M. A Historia do Direito na Historia Social. Lisboa: Livros Horizontes, s/d p 11 4 WOLKMER, Antonio Carlos. Historia do Direito no Brasil. Rio de Janeiro : Editora Forense, 2000 p.

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isto é como o conjunto de regras e leis; pode ser visto como uma cultura, um espaço onde se produz um pensamento, um discurso um saber; e pode ser visto como um conjunto de instituições, aquelas praticas sociais reiteradas as organizações que produzem e aplicam o próprio direito5”.

A “historia do direito” sendo o estudo histórico do direito, abrange então dentro de seu recorte temático, a historia das instituições jurídicas, a historia das idéias ou do pensamento jurídico e a historia das leis propriamente ditas. Desta maneira “pode se conceituar a historia do direito como a parte da historia geral que examina o direito como fenômeno sócio cultural, inserido num contexto fático, produzido dialeticamente pela interação humana através dos tempos6”.

Tendo conceituado e demarcado o campo analítico da dita “historia do direito”, passamos a analisar duas grandes mudanças metodológicas ocorridas na historiografia durante o século XX, e as suas influencias no campo especifico da historia do direito, para tal se faz necessário a titulo comparativo, observamos o contexto historiográfico majoritário, formulado a partir do século XVIII e vigente ate o inicio de século XX.

A historiografia tradicional moderna fundada em grande parte “por princípios e valores liberal – burgueses7”, vincula-se a uma historia estritamente política, funcionado como instrumento na produção e consolidação da historia dos Estados Nacionais. Áreas de investigação como a “historia do direito, historia das instituições jurídicas e historia das idéias ou do pensamento jurídico, estão todas identificadas, ora com um saber formalista, abstrato e erudito, ora com uma verdade extraída de grandes textos legislativos, interpretações exegéticas de magistrados, formulações herméticas de jusfilosofos e institutos arcaicos e burocratizados8”, esta historiografia teria como objetivo, “relativizar e conseqüentemente, desvalorizar a ordem social e jurídica pire burguesa, apresentando - a como fundada na irracionalidade, no preconceito e na injustiça9” na busca de uma valorização da nova ordem jurídica liberal e do Estado – Nação.

O primeiro grande marco teórico historiográfico do século XX e o conjunto de critérios de analise e investigação proposto pela escola dos Annales. Esta “nova historia” desloca seu centro de atenções da historia política, “especialmente do Estado e

5 LOPES, José Reinaldo de Lima. O Direito na Historia: Lições Introdutórias. São Paulo : Editora Max Limonad, 2002 p. 22

6 WOLKMER, Antonio Carlos. Historia do Direito no Brasil. Rio de Janeiro : Editora Forense, 2000 p. 4 7 WOLKMER, Antonio Carlos. Historia do Direito no Brasil. Rio de Janeiro : Editora Forense, 2000 p.

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8 WOLKMER, Antonio Carlos. Historia do Direito no Brasil. Rio de Janeiro : Editora Forense, 2000 p. 15

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do Estado Nacional10” privilegiando toda a atividade humana, agora “tudo tem uma Historia11”. O relato histórico perde espaço uma vez que a “a historia das mentalidades a historia problema vieram a ocupar o espaço da historia relato. O próprio facto histórico – durante muito tempo um valor seguro da ciência positivista – passou a ser um material como qualquer outro12”.

A nova historia liberta-se do paradigma da historiografia tradicional que tem privilegiado uma perspectiva de cima para baixo, destacando a obra dos “grandes homens, estadistas, generais ou ocasionalmente eclesiásticos. Ao resto da humanidade foi destinado um papel secundário no drama da historia13”, agora se recupera a “experiência das pessoas comuns e das mentalidades coletivas14”, outro aspecto importante, esta na redefinição do conceito de fonte, que se expandem para alem dos registros oficiais, e na interdisciplinaridade, que propiciou a expansão do campo de analise da historia.

Com essas medidas a historia ultrapassa o positivismo histórico, inclinado para a “pura descrição de fatos isolados (...) através de um esforço no sentido de surpreender as estruturas mais profundas e mais estáveis (estruturas demográficas, econômicas, culturais, lingüísticas, etc.) que explicam a verificação e o encadeamento desses fatos”, também se elimina as barreiras “que se levantam entre os diversos setores especializados da historia (...) de modo a estabelecer uma historia global restaurando a unidade real da vida, em que os diversos aspectos da atividade humana se inter-relacionam15”.

“Transpondo esses pressupostos da 'nova historia' para o campo das fontes, das idéias e das instituições jurídicas, chega-se a proposta de alinhamento de um modelo metodológico que venha redefinir as funções dos estudos históricos no âmbito do direito. Tal postura implica a adesão a uma estratégia interdisciplinar, não uma interdisciplinaridade meramente formal, mas que tenha presente a critica e a transformação do conteúdo problematizado16”.

Estas mudanças permitem a historiografia jurídica analisar as idéias e pensamentos jurídicos não apenas no âmbito dos grandes textos legislativos, mas

10 LOPES, José Reinaldo de Lima. O Direito na Historia: Lições Introdutórias. São Paulo : Editora Max Limonad, 2002 p. 18

11 BURKE, Peter. A Escrita da Historia: Novas perspectivas. São Paulo:Unesp, 1993 p 11

12 LE GOFF, Jacques. LE ROY LADURIE, Emmanuel . Historia e Nova Historia. Lisboa: Teorema, 1986. p 5

13 BURKE, Peter. A Escrita da Historia: Novas perspectivas. São Paulo:Unesp, 1993 p 13

14 WOLKMER, Antonio Carlos. Historia do Direito no Brasil. Rio de Janeiro : Editora Forense, 2000 p. 13

15 HESPANHA, Antonio M. A Historia do Direito na Historia Social. Lisboa: Livros Horizontes, s/d., p 17

16 WOLKMER, Antonio Carlos. Historia do Direito no Brasil. Rio de Janeiro : Editora Forense, 2000 p. 21

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realizar uma critica com uma analise que partem também de “baixo para cima”, e de questão no âmbito sociológico e filosófico do conceito de direito, e de sua relação com os homens no tempo.

Ao desvincular a historia de seu aspecto político, estritamente ligado ao Estado, também abre-se as bases para a desvinculação da historia do direito da historia do Estado-Nação, e conseqüentemente do direito estritamente visto como direito do Estado.

Passa-se a ter em conta a “historia como ciência do passado (...); mas como ciência do presente, na medida em que, em ligação com as ciências humanas, investiga as leis de organização e transformação das sociedades17”, problematizado questões do presente sobre o passado, e não mais sendo uma historia formulada para justificar a ordem vigente no presente.

O segundo marco teórico é a emergência no final da década de 60 de uma historiografia neomarxista, “contribuição importante foi a reação á filosofia analítica por parte do marxismo britânico, representado por teóricos como E. Hobsbawn e E. P. Thompson, no sentido de discutir e fundar uma historiografia social 18”. Tal movimento coincide com a renovação critica da historiografia jurídica “no âmbito de suas fontes históricas, suas idéias e de suas instituições – que começam a aparecer em fins dos anos 60 e ao longo da década de 7019” sob a influencia desta “historia social”, e de uma “historia dos movimentos sociais” reaparece, com uma preocupação com as questões, referentes a temas como a relação - direito (direito posto) versus justiça social (direito pressuposto) - conceitos estes, desvinculados desde o advento da jusposistivismo do século XIX.

Um terceiro marco opera no campo das ciências jurídicas, trata-se da decadência do paradigma positivista no campo do direito, pautado na compreensão da impossibilidade de codificar todas as leis espontâneas da sociedade capitalista, e das mudanças ocorridas no papel do Estado de principio liberal, e do direito do Estado desde o século XIX.

A concepção positivista do direito “rejeita toda e qualquer dimensão a priori. Descarta assim, princípios e valorativos em função de uma suposta neutralidade axiomática.” (WOLKEMER, Antonio Carlos. Ideologia, Estado e Direito. 2.ed. São

17 WOLKMER, Antonio Carlos. Historia do Direito no Brasil. Rio de Janeiro : Editora Forense, 2000 p. 20

18 WOLKMER, Antonio Carlos. Historia do Direito no Brasil. Rio de Janeiro : Editora

Forense, 2000 p. 18

19 WOLKMER, Antonio Carlos. Historia do Direito no Brasil. Rio de Janeiro : Editora

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Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p.59) desta forma cai em descrença sobre a

perspectiva social, uma vez que um dos maiores dilemas atuais e o retorno da vinculação do adjetivo “justiça” ao “conceito de direito”, conceitos que necessitam de juízo de valor para serem concebidos. Desta forma a historiografia jurídica, e a cultura jurídica minoritárias, vêm nas ultimas décadas buscado novas abordagens metodológicos, de forma a desvincular Estado e direito, e a vincular direito a justiça, aproximando o direito das dimensões e peculiaridades humanas, na busca de novos caminhos fora das analises de cunho jusposistivista.

Assim conclua-se que a historia do direito tornou-se por intermédio da historia o primeiro campo de estudo relacionado ao direito a se desvincular do paradigma jus positivista da ciência jurídica, problematizar essas relações entre direito e historia possuem hoje grande importância, pois suas comparações permitem conscientiza e liberta o presente, alertando-a para as mudanças ocorridas no âmbito do Estado e da sociedade em relação a uma ordem vigente incompatível com os novos anseios sociais. Por fim percebesse a importante influencia exercida pela metodologia da historiografia, para a revisão dos estudos relacionados a historia do direito, como campo independente da ciência jurídica do Estado, e de uma perspectiva de justificação da ordem jurídica atual.

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