A descolonização em África
Diana Santos
ILOS, IBER1501 d.s.m.santos@ilos.uio.no
Outono de 2016
A importância da África para o império português
A mais próxima – e a mais insinuante
A última a ser alienada – e daí a mais longa convivência O peso que teve no 25 de Abril
O 25 de Abril começou na Guiné
Foi na Guiné que houve o primeiro protesto dos militares portugueses contra a guerra e a forma como estava a ser concebida
Foi na Guiné que os oficiais estavam mais prontos a fazer a independência do ponto de vista português
Na Guiné não houve mais guerra a partir do 25 de Abril de 1974
Diana Santos (UiO) África lusófona Outono 2016 3 / 35
Amílcar Cabral
Foi da Guiné (e de Cabo Verde) que o teórico mais importante da libertação dos países africanos veio: Amílcar Cabral, o Che Guevara africano.
Mapa
Diana Santos (UiO) África lusófona Outono 2016 5 / 35
Mapa da África Lusófona (PALOP)
cod. int. sup. (km2) habitantes
.st 1000 0,19 CPV .cv 4000 0,5 GNB .gw 36.000 1,5 MOZ .mz 800.000 28,5 .ao 1.250.000 26 Fonte: Wikipedia
Títulos dos reis portugueses (Revisão)
D. Dinis rei de Portugal e dos Algarves (1279) (...)
D. João I rei de Portugal e dos Algarves e senhor de Ceuta (1415)
D. Afonso V rei de Portugal e dos Algarves, d’aquém e d’além mar em África (1471)
D. João II rei de Portugal e dos Algarves, d’aquém e d’além mar em África, senhor da Guiné (1495)
D. Manuel I rei de Portugal e dos Algarves, d’aquém e d’além mar em África, senhor da Guiné, senhor da Conquista, Comércio e Navegação da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia (1499)
A Guiné era praticamente toda a África Ocidental depois do golfo da Guiné...
Diana Santos (UiO) África lusófona Outono 2016 7 / 35
Um pouco de história
http:
//www.rtp.pt/arquivo/index.php?article=4003&tm=34&visual=4
Feitoria de Cacheu
feitorias comerciais na África Ocidental conquista de praças na África Oriental reino do Congo
A igreja em África: Pretos e brancos
os brancos não aguentavam o clima – alianças com o reino do Congo D. Manuel I teve de lutar para obter o primeiro bispo negro em 1518 cerca de mil alunos, todos da família real, foram estudar para Portugal
Diana Santos (UiO) África lusófona Outono 2016 9 / 35
Feitorias
S. Jorge da Mina: Elmina
Arguim, https://pt.
wikipedia.org/wiki/Arguim S. Jorge da Mina (1482),
holandês a partir de 1637, inglês só a partir de 1873
Axim (1502) Sofala (1505)
São Paulo de Luanda (1576) São Filipe de Benguela (1617) As feitorias correspondiam a um duplo sistema comercial: interligação com o local, e com o marítimo. Também havia feitorias no Norte da Europa (Flandres), etc.
Exemplo de comércio
África ocidental: Cavalos da África do Norte e tapetes e tecidos berberes,
e conchas, são trocados contra escravos em Arguim, e escravos são
trocados por ouro na Mina, que depois era usado para comprar coisas na Flandres.
Depois os escravos passaram a ser a mercadoria mais importante, por causa do açúcar no Brasil e noutras colónias europeias na América.
África oriental: feitorias não funcionaram, foi preciso obter acesso às
minas e o apoio dos reinos nativos. O rei(no) do Monomotapa converteu-se ao catolicismo.
Sistema de prazos em Moçambique: concessão de terras por 3 gerações, mas prazeiros pela linhagem feminina, descendência de mulheres
portuguesas.
Diana Santos (UiO) África lusófona Outono 2016 11 / 35
Política africana: comum?
Bula pontifex: o Papa autoriza o rei de Portugal a cativar todos os
mouros, pagãos e outros inimigos de Cristo...
Diferentes construções geoestratégicas nas diferentes “províncias ultramarinas”
A África Oriental estava associada ao Reino da Índia
Em Angola havia dois reis africanos (sobas) vassalos de Portugal (Luanda e Benguela) durante o século XIX
A partir de 1840 houve intermináveis campanhas de pacificação da Guiné.
Pepetela: romance histórico
Diana Santos (UiO) África lusófona Outono 2016 13 / 35
A situação em S. Tomé e Príncipe
Tchiloli
S. Tomé: Praça giratória de tráfego de escravos, onde se fazem as
organizações das mercadorias, “peças”.
Em 1530, revolta de escravos e forros, liderada por um cego, João Gato.
Em 1585, já com Angolares também, Amador sagrou-se rei de S. Tomé (morto 7 anos mais tarde pelos portugueses).
Comunidade com autonomia até meados do século XIX.
Os lançados
Para África iam degredados, judeus, presos políticos... e havia os
lançados, portugueses que se africanizavam e contrabandeavam.
1884 Durante toda a história da presença portuguesa houve “portugueses” que eram mais africanos do que “reinóis”, houve sempre miscigenação cultural e física.
Diana Santos (UiO) África lusófona Outono 2016 15 / 35
A prisão do Tarrafal
No século XX, com parecenças com Guantanamo, também era em África (Cabo Verde, ilha de Santiago) que estava a pior prisão do regime fascista português: 1936-1974, em que morreram 32 portugueses.
A situação em Moçambique
Sistema de prazos em
Moçambique: concessão de terras por 3 gerações, mas prazeiros pela linhagem feminina, descendência de mulheres portuguesas.
Era em Goa que se formava o clero, primeiro seminário em Moçambique em 1761.
Sempre houve um pequeno hospital, mas Moçambique era considerado “matadouro dos portugueses”.
Até na 1.a guerra mundial, a maior parte das baixas foi por doença!
Diana Santos (UiO) África lusófona Outono 2016 17 / 35
O 25 de Abril
Grândola: http:
//www.rtp.pt/arquivo/index.php?article=286&tm=34&visual=4 O chefe operacional, e os generais que lhe deram apoio.
(Major) Otelo Saraiva de Carvalho
Gen. Costa Gomes e Gen. Vasco Gonçalves
Consequências do 25 de Abril para a descolonização
Um dos pontos em que houve divisão entre o MFA e Spínola, e que acabou por redundar em muitos mortos portugueses completamente desnecessários. Outro ponto foi a manutenção da PIDE no Ultramar. Situações diferentes nos diferentes países:
A Guiné já tinha declarado a sua independência em 1973
Em Angola havia três forças que reclamavam o poder: o MPLA, a Unita e a FNLA, e Portugal teve os acordos do Alvor com elas – mas infelizmente a independência resultou numa longa guerra civil (de 1975 a 2002)
Timor foi invadido pela Indonésia
S. Tomé e Príncipe, independente em 1975
Cabo Verde – pelo qual lutava o PAIGC desde 1956 – independente desde 1975
Diana Santos (UiO) África lusófona Outono 2016 19 / 35
Moçambique
A princípio era só a Frelimo, mas houve problemas causados pela África do Sul e quase que houve um massacre dos brancos em 1974, impedido in extremis, depois apareceu a Renamo e tb houve guerra civil (1977-1992)
A questão da língua (o exemplo de Moçambique)
Porque é que falam português em Moçambique? Porque é que é a única língua oficial?
Porque é a língua neutra. Das 23 outras línguas bantu nenhuma cobre todo Moçambique.
Porque é a língua das elites (e dos assimilados) – daí o estatuto Porque não existem materiais de ensino noutras línguas
Porque dá acesso a toda a comunidade lusófona: os outros PALOP e o Brasil e até Timor, e Portugal
Língua da moçambicanidade, ver
https://ciberduvidas.iscte-iul.pt/outros/antologia/ a-lingua-portuguesa-em-mocambique/709
Desde a independência que se passou de, em 1980, 25% e 1% língua materna para 40% em 1997. Em 2010, 90% da população urbana usa o português e 6,5% tem-no como língua materna. Na população rural está a diminuir.
Diana Santos (UiO) África lusófona Outono 2016 21 / 35
História (do lado de Portugal)
Depois da independência do Brasil e da perda do comércio com a Índia, Portugal vira-se para África.
Sá da Bandeira
Em 1820 foi decretado o abandono do “nome injurioso de colónias”, éramos todos cidadãos da mesma pátria, e havia deputados de África no
Parlamento português.
Tentou-se criar “um novo Brasil em África”, assentando na imigração e no trabalho livre.
Em 1834 dá-se a supressão das ordens religiosas.
Em 1836 Sá da Bandeira proíbe o comércio negreiro a partir dos territórios portugueses.
Diana Santos (UiO) África lusófona Outono 2016 23 / 35
História (do lado de Portugal)
Capelo e Ivens
1875 fundada a Sociedade de
Geografia de Lisboa, por Luciano Cordeiro.
1877-1879 Serpa Pinto liga Angola a
Moçambique/África do Sul por terra.
1877-1880 Hermenegildo Capelo (oficial da Marinha) e Roberto Ivens (oficial da Marinha e geógrafo) fazem uma expedição científica para estudar as relações entre as bacias hidrográficas do Zaire e do Zambeze...
1884-1885 Porto Pinda (Angola) até Quelimane (Moçambique)
O mapa cor-de-rosa: 1890
Diana Santos (UiO) África lusófona Outono 2016 25 / 35
O mapa agora
Diana Santos (UiO) África lusófona Outono 2016 27 / 35
História (do lado do Brasil)
A questão do tráfico de escravos para o Brasil:
S. João Baptista de Ajudá, dominado pela Baía.
Africanos livres são enviados para o Benim, os chamados “Brasileiros”
Em 1850 o governo brasileiro começa a perseguir os traficantes
Os traficantes mais conhecidos e ricos eram em geral mulatos.
A questão da escravatura, vista de Portugal
Em 1761 o Marquês de Pombal aboliu a escravatura tanto no reino como na Índia.
Em 1836 foi abolido em todo o império o tráfego.
Proibido o tráfego, em 1854 havia 100 mil escravos em Angola e Moçambique.
1858 fim progressivo da escravatura decretado por Sá da Bandeira
1875-1878 trabalho forçado próximo da escravatura; seguido por contratos a prazo
Diana Santos (UiO) África lusófona Outono 2016 29 / 35
Porque é que os ingleses eram contra a escravatura?
Embora houvesse um movimento idealista muito forte na Inglaterra contra a escravatura, é preciso chamar a atenção de que havia condições
económicas que também favoreciam a abolição:
Revolução industrial em Inglaterra: Depois de terem inventado as máquinas, já não precisavam de escravos.
Aparentemente, a mão do obra assalariada, rotativa, era mais eficiente, e constituía mercado consumidor.
Para venderem máquinas para o exterior, os clientes não podiam usar trabalho (quase) grátis humano...
Comparação das diferentes potências coloniais
Um dos grandes teóricos dessa questão, e muito positivo em relação à colonização portuguesa, foi o brasileiro Gilberto Freyre.
Gilberto Freyre
Em traços rápidos:
a miscigeneização em vez de apartheid uma terceira via, muita improvisação, pouca obediência, muita criatividade tolerância (Comentário meu: à
diferença, mas também ao crime) a língua e a linhagem e a riqueza são mais importantes do que a cor
Outro teórico importante, da atualidade, desta vez português: Boaventura de Sousa Santos. Epistemologies of the South. Justice against
Epistemicide. Boulder - London: Paradigm Publishers, 2014.
Diana Santos (UiO) África lusófona Outono 2016 31 / 35
Alguns sinais positivos
Não houve problemas de raça depois da descolonização nas antigas colónias portuguesas – compare-se com os Estados Unidos ainda agora! Pessoas mestiças com muito mais possibilidades em países lusófonos: primeiro ministro português,
Alguns sinais positivos
Mulheres de esquerda em países lusófonos: presidente brasileira (2011-2016), primeira-ministra portuguesa (1979-1980)...
Dilma Rousseff, Maria de Lourdes Pintasilgo
Diana Santos (UiO) África lusófona Outono 2016 33 / 35
África agora
Ary (Ariovalda Gabriel) (Angola) Carmen Souza (Cabo Verde)
Luísa Dias Diogo (Moçambique) (primeira-ministra, 2004-2010, candidata à presidência em 2014)
Dina Adão (Guiné)
África agora: e o futuro?
Mia Couto
De acordo com Mia Couto (escritor
moçambicano), a imprensa não-africana tem a tendência para apresentar a África
insistindo em tudo o que é trágico e dramático.
Mas África é muito mais do que isso! música
literatura arte
cinema teatro
Sem falar em culinária, natureza, fauna e flora...