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O uso do pronome relativo "onde": uma análise gramatical e funcionalista

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Academic year: 2023

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IFFLUMINENSE –CAMPUSCAMPOS CENTRO DIRETORIA DE ENSINO SUPERIOR DAS LICENCIATURAS

CURSO DE LICENCIATURA EM LETRAS – PORTUGUÊS E LITERATURAS

O USO DO PRONOME RELATIVO “ONDE” – UMA ANÁLISE GRAMATICAL E FUNCIONALISTA

IZABELLA MANHÃES SOARES

CAMPOS DOS GOYTACAZES – RJ 2021.2

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O USO DO PRONOME RELATIVO “ONDE” – UMA ANÁLISE GRAMATICAL E FUNCIONALISTA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Licenciatura em Letras – Português e Literaturas do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense, campus Campos Centro, como parte das exigências para a obtenção do título de Licenciada em Letras.

Orientadora: Profª Drª Ana Lúcia Monteiro Ramalho Poltronieri Martins

CAMPOS DOS GOYTACAZES – RJ 2021.2

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O início deste agradecimento não poderia ser diferente, entendendo que só cheguei até aqui porque Deus esteve comigo em todos os momentos, escrevendo a minha história e me capacitando em cada passo que dei. Agradeço a Ele por sempre fazer o que é melhor para mim e por me moldar nesses quatro anos de curso, que foram desafiadores, mas, também, recompensadores.

Além de Deus, agradeço a minha família, Arisvalter, Gilda, Nathália e Rafael, e ao meu noivo, Lucas, por estarem comigo nesta caminhada que é cheia de altos e baixos. Com eles tudo ficou mais leve e se tornou possível, porque estavam comigo e me deram confiança a cada etapa que eu vivi. Deixo aqui um agradecimento especial também a minha tia Marilane, que foi quem viu que eu havia passado na reclassificação e me avisou toda feliz da minha conquista, muito obrigada.

Agradeço, também, a minha orientadora, Ana Poltronieri, que de forma excelente me conduziu em toda a produção deste trabalho de conclusão de curso.

Antes de ser minha orientadora, já era uma inspiração para mim pela forma como ensinava em suas aulas. Deus me deu o grande privilégio de ser orientada por ela e sou muito grata por isso.

Para finalizar, também deixo o meu agradecimento aos amigos que sempre estiveram comigo desde o primeiro dia, fazendo cada trabalho, tirando cada dúvida e deixando os dias mais divertidos com as conversas e risadas.

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“Nunca me deixes esquecer Que tudo o que tenho Tudo o que sou O que vier a ser Vem de ti, Senhor”

(Ana Paula Valadão)

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Objetiva-se, nesta pesquisa, fazer um estudo gramatical, funcionalista e sociocognitivo do pronome relativo “onde” no português brasileiro, a fim de estudar o uso gramatical (gramaticalização), discursivo-textual (discursivização) e semântico (semanticização) do termo. Embora muitos trabalhos já tenham sido feitos sobre o pronome relativo “onde”, esta pesquisa pretende verificar se o “onde” como pronome relativo e com antecedente, mas em discordância com a norma-padrão já está mais espraiado na variedade culta da língua ou se ainda essa variedade segue, fortemente, uma tradição gramatical, em que o pronome relativo “onde” se refere a palavras que indicam um espaço físico, um lugar concreto. Alguns pesquisadores afirmam que o uso do “onde” em desacordo com a gramática normativo-prescritiva já existia já existe na língua há séculos. A nosso ver, ainda que existam outros valores sintático-semânticos do “onde” o uso normativo-prescritivo parece ser ainda mais usado, fazendo ainda frente ao processo de mudança linguística, que parece ser antigo em relação ao pronome relativo “onde”. Para verificar tal hipótese, escolhemos comocorpusduas mídias digitais importantes da cidade de Campos dos Goytacazes- RJ: o jornal on-lineCampos 24 horas, que circula somente no formato digital, e o jornal Folha da Manhã, fundado em 1977, que circula no formato impresso e digital. A metodologia deste trabalho é de base qualitativa, tendo em vista as abordagens teóricas usadas, e também quantitativa, porque há uma coleta de dados em um tempo determinado e tipo de modalidade linguística, a escrita, a fim de verificar a nossa hipótese. O resultado mostra que o termo “onde” sofre, hoje, além do processo de gramaticalização, já sedimentado, também os processos de discursivização e semanticização.

Palavras-chave: Onde. Funcionalismo. Gramaticalização. Discursivização.

Semanticização.

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1 INTRODUÇÃO 8 2 ONDE: DEFINIÇÕES, ASPECTOS GRAMATICAIS E LINGUÍSTICOS 11

2.1 Definições 11

2.2 As gramáticas normativo-prescritivas 13

2.2.1 O “onde” nas gramáticas normativo-prescritivas 14

2.3 As gramáticas de ordem descritiva 18

2.3.1 Aspectos da teoria funcionalista no ensino de gramática do português 20 2.3.1.1 Onde: pancronia, discursivização, gramaticalização e

semanticização 24

3 O CORPUS, A METODOLOGIA E A ANÁLISE 31

3.1 A metodologia 46

3.2 A análise 47

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS 51

REFERÊNCIAS 52

ANEXO 55

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1 INTRODUÇÃO

O termo gramatical “onde”, nas gramáticas normativo-prescritivas de língua portuguesa, pode ser classificado, no plano paradigmático, como advérbio interrogativo (Onde você mora?), advérbio de lugar (Moro onde eu quiser.), pronome relativo (A casa onde moro é pequena.) e pronome relativo sem antecedente (Moro onde mais me agrada.) (BECHARA, 2019, p. 189)), referindo-se a lugar no sentido concreto, físico. Neste trabalho, estudar-se-á o uso de “onde”

como pronome relativo com antecedente. De acordo com Abreu (2018, p. 250), entende-se como “pronomes relativos” os termos que “têm dupla função:

representam anaforicamente um termo antecedente e introduzem uma nova oração, chamada oração adjetiva”.

Sobre o “onde” como pronome relativo, muitas gramáticas normativo-prescritivas são enfáticas ao afirmarem que ele deve referenciar um termo locativo concreto, pois, caso contrário, estar-se-á diante de “construções defeituosas, em que o pronome onde tem como antecedente uma expressão não locativa” (ABREU, 2018, p. 255). Esse uso, considerado defeituoso por muitos gramáticos, “curiosamente tende a ocorrer quando um falante de desempenho linguístico pouco eficiente procura ‘falar difícil” (CIPRO NETO; INFANTE, 1997, p.436 apud BAGNO, 2011). Ainda que esse uso seja abominado pelas nossas gramáticas normativo-prescritivas, é possível encontrar, mesmo em textos jornalísticos da grande mídia ou em fala de pessoas com desempenho linguístico eficiente, esse “uso abominado” usado por falantes “de desempenho linguístico pouco eficiente”. Nas redações de escolares, esse uso é muito comum, porque é usado como uma forma de evitar o fenômeno do queísmo (uso abusivo do pronome relativo “que”).

Inicialmente, esta pesquisa, em seu projeto, pretendia fazer uma análise das redações do vestibular 2019 para o ingresso nos cursos de Ensino Superior do IFFluminense, com o intuito de observar a utilização do “onde”, podendo, então, chegar a uma conclusão do porquê e de que forma ele tem sido empregado e se havia um espraiamento maior em gêneros acadêmicos em que se pede a norma culta ou a norma-padrão, como a redação de vestibular. Como as redações ficam

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guardadas durante um certo período de tempo em uma sala do IFFluminense, o acesso a elas só poderia ser feito pessoalmente, sob a autorização e guarda da chefia do setor de vestibular, sem poder levar o material para casa. Entretanto, devido à pandemia de COVID- 19 e, consequentemente, o fechamento dos estabelecimentos escolares públicos e particulares, houve uma mudança no projeto.

Escolheu-se, então, um corpus on-line, no qual se podia ter acesso ao “onde” como pronome relativo por meio de um sistema de busca de pesquisa, que há, praticamente, em todos os jornais.

Escolhemos para compor ocorpus os textos advindos de dois jornais on-line da região Norte Fluminense, mais precisamente de Campos dos Goytacazes- RJ: o Campos 24 horas, que tem somente versão on-line, e o jornal Folha da Manhã, com versões on-line e impresso, e é um dos mais tradicionais na região. Queremos, através do corpus escolhido, verificar se o uso do pronome relativo “onde” para termos não locativos já se espraiou com força por gêneros escritos cultos formais, como a fala na reportagem de jornal, visto que esse uso existe há muito tempo na língua, conforme afirma Bagno (2002).

Ao perceber uma nova utilização do “onde” fora dos conceitos estabelecidos pelas gramáticas normativo-prescritivas nas redes sociais e matérias jornalísticas, surgiu o interesse de pesquisar as motivações para tal utilização. A partir dessa percepção, chegou-se ao tema desta pesquisa, que buscará entender essa nova função em que o “onde” aparece a partir docorpusescolhido para este trabalho.

Entendendo que o “onde” tem assumido outras funções, além das gramaticais advindas do processo de gramaticalização, para além de advérbio ou pronome relativo, não retomando apenas um lugar concreto, esta pesquisa irá observar essas novas utilizações do “onde” com base na teoria funcionalista. Não será feito um juízo de valor quanto ao uso do “onde”, se está certo ou errado, mas sim uma busca por entender as motivações que levam a essa outra possibilidade de uso. Para isso, veremos como a forma e a função do “onde” na posição de pronome relativo no corpusdeste trabalho se gramaticaliza, discursiviza-se e semanticiza-se.

A partir de um olhar voltado para a função do “onde”, mas também para o ensino da utilização do mesmo em sala de aula, tem-se como objetivo aqui contribuir com o ensino reflexivo e analítico das formas e funções de termos gramaticais, trazendo uma reflexão quanto às possibilidades de uso que envolvem, no nosso caso, o pronome relativo “onde”. Dessa forma, os professores poderão sair do “certo

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ou errado” para o adequado e inadequado, mostrando as situações ideias para cada uso, entendendo que ao saber a motivação de determinada construção é possível até reduzir ou anular o uso indevido.

Em razão dessa visão de gramática, será utilizada a teoria funcionalista, para ter uma perspectiva do uso real desse “onde”, levando em consideração não só a forma, mas a função que ele exercerá nas construções em que for utilizado. O objetivo geral deste trabalho será apresentar uma nova reflexão em relação a este termo, quando ele não estiver sendo utilizado de acordo com a norma-padrão, a partir de um viés funcionalista que vê a língua como um multissistema sociocognitivo (CASTILHO & ELIAS, 2021) que apresenta processos de gramaticalização, discursivização e semanticização, interligados por um dispositivo sociocognitivo.

A escolha por uma visão funcionalista da linguagem se deve às duas características básicas dessa teoria, as quais são, segundo Cunha(2008, p.158): a)

“a língua desempenha funções que são externas ao sistema linguístico em si”; b) “as funções externas influenciam a organização interna do sistema linguístico”. A nosso ver, o uso de “onde” fora do padrão normativo-prescritivo vai ao encontro dessas duas características expostas por Cunha(2008), visto que o falante começa a perceber determinadas expressões com ideia de lugar, fazendo com que o “onde”, talvez o termo mais saliente linguisticamente com essa ideia, seja usado no lugar de expressões relativas como “no qual”, “na qual” e “em que”.

O primeiro capítulo, o da Introdução, apresentará as linhas gerais do trabalho.

No segundo capítulo, apresentar-se-á a definição do termo “onde” em dicionários da língua portuguesa, além de como a norma-padrão prescreve o uso do pronome relativo “onde”. Também, neste capítulo, mostrar-se-á a teoria funcionalista em suas linhas gerais, características e a sua importância para o ensino de gramática da língua portuguesa. No terceiro capítulo, faremos a apresentação docorpus e a sua análise, tendo em vista o arcabouço teórico apresentado. Por último, as considerações finais.

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2 ONDE: DEFINIÇÕES, ASPECTOS GRAMATICAIS E LINGUÍSTICOS

Neste capítulo, inicialmente, apresentaremos as definições do termo “onde”

tal como se encontra nos principais dicionários de língua portuguesa, de modo a verificar se as definições vão ao encontro ou fogem à norma da gramática normativo-prescritiva. Os dicionários Michaelis e Aulete tomam como referência ambas as gramáticas, a portuguesa e a brasileira; já o Houaiss tem como referência a gramática do português brasileiro, apresentando algumas vezes as variedades, mas ainda tem como paradigma a gramática do português culto escrito no Brasil, ou seja, a dos escritores e dos mais escolarizados.

Depois, passaremos a ver como determinadas variedades de gramáticas consideram o uso do “onde” no português, desde a sua classe de palavras até o uso do “onde” como pronome relativo. Tendo em vista sua importância no âmbito escolar, falaremos, primeiramente, do “onde” nas gramáticas normativo-prescritivas.

2.1 Definições

Segundo o dicionário on-line Michaelis (2021), define-se onde como um advérbio que “Denota circunstância de lugar ou indica o lugar em que se está; em que lugar, em qual lugar, no qual; donde: Onde você mora?”(ONDE, 2021). Para além dessa informação, o dicionário apresenta a etimologia doonde, sendolat unde, e oferece expressões nas quais o onde é utilizado da forma definida anteriormente, sendo estas “De onde a onde: V de onde em onde. De onde em onde: de tempos em tempos, de ocasião a ocasião, de vez em quando; ocasionalmente; de onde a onde.”(ONDE, 2021a).

Já no dicionário Aulete Digital (2021), o “onde” recebe definições mais específicas, possibilitando uma visão ampla acerca desse verbete. “Onde” pode ser, segundo suas definições e exemplos,

adv. || no qual lugar, no lugar em que:Ondeo dia é comprido eondebreve.

(Camões.) Onde o frade canta, lá janta. (Prov.) || (Interrogativamente) Em

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que parte, em que sítio ou lugar: Onde estou eu? Onde me puseram? ||

(Minho e Bras., Nordeste) Quando, aliás; enquanto. || Por onde 1. (loc. adv.), pelo qual lugar, pelo lugar em que: Era o pátio espaçoso por onde se entrava para os andares. (R. da Silva.) || Onde quer que 1. (loc. conj.), em qualquer lugar que; no lugar em que por acaso ou porventura...:Onde quer que apareça uma censura... há uma quebra na independência do homem.

(Herc.) || De onde 1. (loc. adv.), de que lugar, do qual lugar; do lugar em que: O Sr. Romão Pires, de onde eles estão aqui à nossa porta é muito longe? (R. da Silva.) Havia nelas uma varanda alta e mal reparada,de onde, andando com pouco resguardo, caiu abaixo. (Fr. L. de Sousa.) || De onde 1.

(loc. adv.), de que, do que, das quais coisas, dos quais princípios: ... de onde se conclui que isto é verdade. || De onde em onde 1. (loc. adv.), de espaço a espaço, aqui e ali; de tempos a tempos, de quando em quando:

Esparra, mas à mão ede onde em onde.(Castilho.)”(ONDE, 2021b)

A etimologia dada é a mesma do dicionário Michaelis e, além dessa informação, ainda há uma atualização desse verbete, incluindo a definição do “onde”

como “pronome relativo”, dando os seguintes exemplos: “1. Em que: Da fileira onde estou não vejo bem o palco.2. Que ponto ou lugar: Por esta marca você vê até onde o rio enche.”(ONDE, 2021b).

O Dicionário Houaiss (2009), em sua versão impressa, apresenta o “onde”

como:

Adv. (s. XIII) em que lugar, em qual lugar, (indagando ou especializando) (-O.vives?) (perguntava-se o. iria hospedá-los) (o lugar o. está a casa é lindo). De o. a o. m.q. DE ONDE EM ONDE. de o. em o.ocasionalmente;

de onde a onde (de o. em o., discutia-se política). GRAM. possui diversas funções no enunciado e sua significação básica locativa acompanha os empregos: a)como substituto de um circunstante locativo, em consequência de seu valor advérbio relativo (encontrou-o em Palmas, o. pensava que jamais dois cariocas se encontrariam); b) como elemento que estabelece relação de subordinação entre termos (o lugar o. nasceu) ou orações (não sabia o. seria a palestra). USOa)no discurso ou na situação, onde freq. tem função anafórica, p.ex., a rua o. vive; b) tb. Pode ter função catafórica, apontando para o que virá a seguir, p.ex.; na resposta a uma pergunta:até o. vai este trem?ETIM. lat.unde‘de onde’, que no lat. vulgar substituiu o lat.

ubi ‘onde, no lugar em que’, sentido esse que, estático, levou o adv. a ser empregado regido por prep. ( para onde, por onde, de onde = donde, a onde= aonde, desde onde, até onde). HOM. onde (fl. ondar). (HOUAISS, 2009, p. 1387)

Nota-se que o Dicionário Houaiss (2009) classifica o termo “onde” como advérbio que, em sua semântica, refere-se a um lugar locativo, mas também o relaciona como um pronome relativo, no sentido de um advérbio relativo, referindo-se a um local físico, concreto, estabelecendo relação de subordinação entre termos ou orações e, discursivamente, com função anafórica ou catafórica.

Essa visão do Dicionário Houaiss (2009) é muito semelhante àquela que vemos nas

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gramáticas normativo-prescritivas, nas quais o “onde”, se pronome relativo, refere-se a um lugar ou local físico, concreto.

2.2 As gramáticas normativo-prescritivas

Deve-se, antes de explanar sobre o “onde” nas gramáticas normativo-prescritivas, compreender as características dessa gramática. Para iniciar, é necessário expandir o que se entende por "gramática" e reforçar que, segundo o dicionário Aulete Digital (2021), o verbete “gramática” se refere ao ”conjunto de regras que normatizam o falar e o escrever corretamente, segundo a língua-padrão”.

Portanto, escrever e falar de acordo com a norma-padrão é seguir as normas e regras prescritas por gramáticas normativo-prescritivas, compreendidas, muitas vezes, como gramáticas tradicionais. No Brasil, são exemplos de gramáticas tradicionais de linha normativo-prescritivas, as gramáticas escritas por Evanildo Bechara, Celso Cunha & Lindley Cintra, Domingos Paschoal Cegalla, Rocha Lima e Napoleão Mendes de Almeida. Além desses, há também os autores que desenvolveram gramáticas pedagógicas, difundidas como livros didáticos da educação básica, os quais são: Ernani Terra, William Cereja, Luiz Antônio Sacconi, Pasquale Cipro Neto, Ulisses Infante, entre outros.

A gramática normativa-prescritiva, também aceita por alguns gramáticos como “gramática tradicional”, traz em sua essência uma herança normativa deixada pelos gregos que, em sua gramática, tinham uma “preocupação normativa, ou seja, assumia a incumbência de ditar padrões que refletissem o uso ideal da língua grega”

(MARTELOTTA, 2011, p. 46). Esta influência chega até os nossos dias porque os

“princípios básicos da gramática grega foram adotados pelos romanos e adaptados à língua latina” (MARTELOTTA, 2011, p. 46), que depois deu origem ao nosso idioma. Partindo deste ponto, após saber de onde surgiu a gramática em questão, pode-se afirmar que, em parte, esse tipo de gramática é o que mais encontramos nas escolas, porque dita normas e regras que devem ser seguidas, a fim de escrever e falar corretamente. Segundo Martelotta (2011, p. 45), por meio deste modelo teórico “nossos professores de português nos ensinam a reconhecer os elementos constituintes formadores dos vocábulos (radicais, afixos, etc.), a fazer análise sintática, a utilizar a concordância adequada, sempre recomendando correção no uso que fazemos de nossa língua”. Não se pode esquecer de que, para essa

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variedade de gramática, há o certo e o errado, independente de aspectos sociolinguísticos, que trabalham mais com usos adequados e inadequados.

Corroborando com a ideia anterior, Perini (1985, p. 22), entende a gramática normativa como um esforço de ensinar a língua padrão a pessoas que utilizam a língua coloquial, no intuito de fazer com que elas dominem as regras para falar e escrever bem. Dessa forma, para muitos gramáticos, a gramática normativa assume também um caráter prescritivo, que, segundo Kaodoinski (2015), reforça a ideia de

“que os desvios em relação às normas impostas com base em clássicos da literatura, por exemplo, configuram erros, os quais ‘devem’ ser evitados” (2015, p.85). Entende-se o porquê da utilização do termo “normativo-prescritiva”, já que a prescrição é uma característica quase inerente à normatividade da língua. Sendo

“norma” uma “forma normal ou usual de se fazer alguma coisa” (NORMA, 2022), percebe-se que, uma vez que a gramática normativa trata de como a língua tem sido utilizada e tenta preservá-la com a regras estruturais, as gramáticas normativo-prescritivas acabam sendo um pouco mais rígidas, porque “impõem um uso retirado da literatura clássica, o qual é considerado de prestígio [...]” (LEITE, 1999, p.180), sem levar em consideração o uso real da língua, que nem sempre é o que a norma prescreve.

Por este motivo, a gramática normativa-prescritiva recebe muitas críticas por parte de gramáticos e linguistas que entendem que é necessário observar as variações existentes na língua. Segundo Kaodoinski (2015, p.86), “os gramáticos normativos reconhecem a existência de diversas modalidades de uso da língua e de dialetos, mas valorizam apenas uma manifestação da língua, a utilizada pela classe dominante”. Vale ressaltar que a gramática normativo-prescritiva pode ser encontrada também como “gramática tradicional”, pois muitos autores aceitam esse termo como sinônimo.

Após essa explanação sobre o que se compreende como gramática normativo-prescritiva, seguem algumas abordagens do “onde” de acordo com essas gramáticas.

2.2.1 O “onde” nas gramáticas normativo-prescritivas

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Para Cunha & Cintra (2017, p. 555), oondeé visto como um advérbio, que “é, fundamentalmente, um modificador do verbo”, podendo, também, reforçar o sentido de um adjetivo ou outro advérbio, recebendo classificações dependendo “da circunstância ou de outra ideia acessória que expressam” (CUNHA & CINTRA, 2017, p. 556). Dito isto, segundo Cunha & Cintra (2017), o “onde” não recebe apenas o título de advérbio, mas de advérbio de lugar, ou interrogativo, dependendo da oração em que for utilizado, e de advérbio relativo, termo muito usado nas gramáticas de língua portuguesa que seguem o português europeu. O advérbio relativo recebe esta adjetivação porque introduz uma oração subordinada relativa ao mesmo tempo que faz uma relação com o termo antecedente, tal como o pronome relativo “onde” em nossas gramáticas.

Entendendo que “os pronomes desempenham na oração as funções equivalentes às exercidas pelos elementos nominais” (CUNHA & CINTRA, 2017, p.

289), representando ou acompanhando um substantivo, os autores veem o “onde”

também como um pronome, mas da espécie dos relativos que, segundo Cunha &

Cintra (2017), é chamado dessa forma porque se refere a um termo anterior, denominado antecedente. O “onde” é um pronome relativo invariável e, como citado anteriormente, ao desempenhar normalmente a função de adjunto adverbial,

“costuma ser considerado por alguns gramáticos ADVÉRBIO RELATIVO, como neste exemplo retirado de texto literário por Cunha & Cintra (2017, p.365) : Sob o mar sem borrasca, onde enfim se descansa. (A. Nobre, S, 90.), no qual o pronome relativo “onde” tem como antecedente o sintagma preposicionado “Sob o mar sem borrasca”, indicativo de um lugar físico e concreto, tal como prescreve a tradição gramatical.

Seguindo nesta mesma linha, Bechara (2019) traz a categoria de advérbios pronominais, na qual o “onde” está incluso e é classificado como advérbio relativo e interrogativo, partindo de critérios funcionais. Para além disso, o autor reforça a ideia citada anteriormente aqui neste tópico, que “os advérbios relativos, como os pronomes relativos, servem para referir-se a unidades que estão postas na oração anterior. Nas ideias de lugar empregamos “onde”, em vez de em que, no qual (e flexões): A casa onde mora é excelente.” (BECHARA, 2019, p.317). É interessante essa afirmação de Bechara (2019), porque muitas gramáticas colocam sob o mesmo patamar semântico do “onde” em determinada estrutura sintagmática os termos “no qual”, “na qual” e “em que”, ainda que o uso do “onde” seja restrito a lugares

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concretos, podendo os outros termos citados se referirem a substantivos que não evidenciam lugares concretos, como, por exemplo, na frase “A sociedade na qual se vive sofre de ansiedade”.

Ainda sobre o “onde” como advérbio interrogativo, o gramático afirma: “Os advérbios interrogativos de base pronominal se empregam nas perguntas diretas e indiretas em referência ao lugar, tempo, modo ou causa: Onde está estudando o primo? Ignoro onde estuda.” (BECHARA, 2019, p.317).

Para Bechara(2019, p. 178), os pronomes são “a classe de palavras categoremáticas que reúne unidades em número limitado e que se refere a um significado no léxico pela situação ou por palavras do contexto”. Sabendo que existem muitas classificações para os pronomes (pessoais, demonstrativos, possessivos, oblíquos, tônicos, indefinidos, interrogativos e relativos), é preciso mais uma vez enfatizar que, neste trabalho, focalizaremos o “onde” com a função de pronome relativo. Desse modo, o “onde”, para Bechara (2019), é classificado como um pronome relativo sem antecedente, ou seja, pode aparecer com emprego absoluto, sem referência a um termo anterior, como em Moro onde mais me agrada (BECHARA, 2019, p. 189). Contudo, vale lembrar uma observação feita pelo autor:

“Os relativos sem antecedentes também se dizem relativos indefinidos. Muitos autores preferem, neste caso, subentender um antecedente adaptável ao contexto.

Interpretando [...] onde como o lugar em que [...]” (BECHARA, 2019, p.189). Vale ressaltar que, para este trabalho, interessa o “onde” com antecedente explícito, como em “A casa onde morava era pequena”, no qual o pronome relativo “onde” se refere ao termo antecedente “casa”.

Já Rocha Lima(2011), entendendo que os advérbios são palavras que modificam o verbo ou expressam circunstâncias que cercam a significação verbal, podendo prender-se a adjetivos ou, até mesmo, a outros advérbios, classifica oonde como advérbio relativo e advérbio interrogativo. Oondecomo advérbio relativo se dá quando empregado “com “antecedente”, em orações adjetivas [...]: Fica ali a encruzilhada/ onde ergueram uma cruz de pedra.”(ROCHA LIMA, 2011, p. 228), e como advérbio interrogativo pode ser utilizado em perguntas diretas ou indiretas:

“Onde dormirão os hóspedes?/Indagam onde dormirão os hóspedes.”(ROCHA LIMA, 2011, p. 229).

Diferente das gramáticas anteriormente citadas neste tópico, em Rocha Lima(2011), o “onde” é classificado, também, como pronome indefinido, porque

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são palavras que se aplicam à terceira pessoa gramatical quando esta tem sentido vago, ou exprimem quantidade indeterminada. Alguns se empregam isoladamente, desacompanhados de substantivo; outros vêm ao lado de um substantivo, com o qual concordam em gênero e número. (ROCHA LIMA, 2011, p. 161)

Para Rocha Lima(2011, p. 161), o “onde” é da espécie dos pronomes indefinidos que se referem a lugares, assim como algures, alhures e nenhures.

Infelizmente, o autor não nos traz um exemplo desse uso.

Já Cegalla(2020, p. 259), em sua obra intitulada Novíssima Gramática da Língua Portuguesa, muito usada em concursos públicos, classifica, primeiramente, o

“onde” como um advérbio, que “é uma palavra que modifica o sentido do verbo, do adjetivo e do próprio advérbio”. Para além dessa classificação, o autor inclui o “onde”

no grupo dos advérbios de lugar e interrogativos, que, nesse caso, Cegalla (2020) ressalta que podem ser utilizados tanto em interrogações diretas quanto em indiretas.

Cegalla(2020, p. 184) vê o “onde” como um pronome relativo, entendido por

“palavras que representam substantivos já referidos, com os quais estão relacionados. Daí denominam-se relativos”, mostrando que o gramático vê o “onde”

como um termo anafórico, que faz referência a um termo antecedente. Cegalla (2020, p. 185) ainda reforça a ideia, aqui já mencionada, de que “onde, como pronome relativo, tem sempre um antecedente e equivale a em que: A casa onde moro foi de meu avô.[onde = em que]”, embora o “onde” tenha, nessa estrutura sintagmática, o seu uso semântico mais restrito, porque deve se referir a lugar concreto de acordo com a norma-padrão.

Nota-se que a tradição gramatical em relação ao “onde” e suas variadas classificações como classe de palavra tem muito mais ponto de contato do que de discordância, como se viu em Rocha Lima (2011) que classifica também o termo como um pronome indefinido. A abordagem de cunho tradicional- normativo é a mais presente em nossas gramáticas escolares, que adota perspectivas como “certo” e

“errado” em termos de usos linguísticos, ainda que reconheça a existência das variedades. Só é vista como adequada para todas as situações a norma culta, que é aquela que mais se aproxima da norma-padrão, ainda que existam pontos de discordância entre essas duas normas.

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2.3 As gramáticas de ordem descritiva

A gramática descritiva está ligada à descrição da língua em um dado momento, levando em consideração as expressões que a estruturam. De acordo com Kaodoinski(2015, p.86), as “estruturas são divididas em unidades, as quais são associadas a uma categoria, como substantivo, verbo, artigo, preposição etc”. Neste modelo teórico, vemos uma descrição e aproximação com as variedades existentes;

contudo, apesar de a gramática descritiva não indicar se há uma forma errada ou correta na língua, ela mostra que, no ensino de gramática tal como é dado na escola, existe um distanciamento entre a língua padrão ensinada e a língua real falada pelos alunos e até pelos professores.

Autor da obra intitulada Gramática Descritiva do Português, Perini(2005) faz uma afirmação em relação ao que foi falado anteriormente:

Sustento a ideia de que é responsabilidade dos linguistas brasileiros elaborar uma descrição ampla e detalhada da realidade linguística do Brasil.

Entendo essa descrição como abrangendo não só a estrutura da língua padrão (objeto da minha Gramática), mas ainda a descrição da língua coloquial, sua variação social e geográfica, sua história etc.(PERINI, 2005, p.14)

Portanto, a gramática descritiva, ao observar e descrever os diferentes modos de utilização da língua, tem como foco o entendimento do funcionamento da língua, suas funções, estruturas e adequações. Assim, leva o falante a um nível mais elevado de noção e estruturação da língua e não vai apenas “elencando regras para

‘bem falar e escrever’” (KAODOINSKI, 2015, p.87). É importante deixar o alerta, para que a gramática descritiva não seja usada como um caminho para a normatização.

Vale ressaltar que, enquanto a gramática normativa-prescritiva é um “conjunto de regras a serem seguidas para que se possa falar e escrever corretamente”(POSSENTI E ILARI, 1987, p. 12), a gramática descritiva, da qual falamos aqui, é um “conjunto de regras que são seguidas”(POSSENTI E ILARI, 1987, p. 12). Ou seja, é exatamente a descrição da forma de falar de uma língua, não apontando se essa forma está certa ou errada.

Entretanto, não se vai aqui, neste trabalho, colocar a gramática normativo-prescritiva contra a descritiva e vice-versa. Partimos do mesmo princípio

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adotado por Bagno(2011) em suaGramática Pedagógica do Português Brasileiro, ou seja:

[...]. Os linguistas filiados a uma perspectiva investigativa e científica frequentemente adotam um discurso pejorativo com relação à gramática tradicional, discurso que muitas vezes beira o preconceito. E não consideram pertinente abordar essa tradição em seus cursos na universidade supondo, erroneamente, que os estudantes já tiveram suficiente contato com ela durante a escolarização básica. No entanto, como patrimônio cultural do Ocidente, a gramática tradicional tem de ser muito bem conhecida por aqueles que, profissionalmente, serão confrontados a ela – cobrados para que a ensinem, desafiados a dizer por que não a ensinam, acusados de não reconhecer a suposta (e nunca comprovada) necessidade de ensiná-la etc. Além disso, é impossível negar que a gramática tradicional é o repositório de importantes reflexões de filósofos e filólogos – por baixo da pesada ideologia prescritiva existem interessantes sugestões de análise, além de descobertas importantíssimas sobre o funcionamento da linguagem humana em geral e das línguas em particular.(BAGNO, 2011, p. 23)

Como bem disse Bagno(2011), acima, o conhecimento gramatical adotado pela tradição também faz parte da formação do professor de língua portuguesa, mesmo que a tradição não apresente as variedades linguísticas, tendo em vista a perspectiva teórica que ela adota em relação ao objeto, que é a linguagem humana.

Também Castilho & Elias(2021) veem duas direções para se compreender os estudos gramaticais: a gramática prescritiva ou normativa e a gramática descritiva.

Segundo os autores, a primeira se identifica como “[...] a disciplina que nos ensina a falar e a escrever corretamente, valendo-nos sempre do padrão culto”(CASTILHO &

ELIAS, 2021, p. 42); já, a segunda, a descritiva, vê a gramática como “um conjunto de sons que podemos gravar, de palavras e de sentenças cuja estrutura podemos descrever, recolhendo tudo num livro chamado gramática; em seguida, podemos produzir algumas generalizações”(CASTILHO & ELIAS, 2021, p. 42). A segunda direção comporta várias linhas de gramática com base teóricas distintas, como o gerativismo, a sociolinguística, o sociocognitivismo, o funcionalismo, entre outras.

Para esta pesquisa, escolheu-se a linha funcionalista, por desenvolver uma visão que

[...] caracteriza-se por conceber a língua como um instrumento de comunicação que não pode ser analisado como um objeto autônomo, mas com uma estrutura maleável, sujeita a pressões oriundas das diferentes situações comunicativas, que ajudam a determinar sua estrutura gramatical.

(MARTELOTTA & KENEDY, 2015, p. 14 apud MARTELOTTA, 2005)

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A seguir, veremos como a abordagem funcionalista se caracteriza em linhas gerais, a fim de que, adiante, possamos compreender o uso do pronome relativo

“onde” por meio dessa perspectiva linguística.

2.3.1 Aspectos da teoria funcionalista no ensino de gramática do português

Bagno(2017) apresenta em seu dicionário o verbete “Funcionalismo”, em inglês Functionalism, como uma teoria oposta aos preceitos do Formalismo, dominado pelo gerativismo e desenvolvido, principalmente, pelo estadunidense Noam Chomsky desde a década de 60 do século XX. Apesar de existirem várias correntes funcionalistas, elas compartilham concepções, segundo Bagno(2021), as quais são:

(1) A língua é um instrumento de interação social.

(2) A função primária da língua é a comunicação.

(3) O correlato psicológico da língua é a competência comunicativa: a habilidade de conduzir a interação social por meio da língua.

(4) O estudo do sistema linguístico deve ter lugar no interior dos sistemas de usos linguísticos.

(5) A descrição dos elementos linguísticos de uso de uma língua deve propiciar pontos de contato com o contexto em que ocorreram.

(6) A criança descobre o sistema que subjaz à língua e ao uso ajudada por inputs de dados linguísticos extensos e altamente estruturados, presentes em contextos naturais.

(7) Os universais linguísticos são especificações inerentes às finalidades da comunicação, à constituição dos usuários da língua e aos contextos em que a língua é usada.

(8) A pragmática é a moldura dentro da qual a semântica e a sintaxe devem ser estudadas. A semântica é dependente da pragmática, e as prioridades vão da pragmática para a sintaxe via semântica.(BAGNO, 2017, p 138-139)

Nesse sentido, para as diferentes abordagens funcionalistas, a gramática de uma língua tem funções sociais e cognitivas, “que exercem um papel central na determinação das estruturas e dos sistemas [...]”(BAGNO, 2017, p. 139). Tendo uma função social, as abordagens funcionalistas veem a língua sempre como fluida e emergente, diferente da concepção formalista que restringe e limita, como faz o gerativismo em sua concepção inatista da linguagem. Logo, para os funcionalistas, a língua é vista

[...], como um sistema aberto, com uma gramática sempre emergente, com categorias marcadas pela fluidez das fronteiras e nunca vistas como classes estanques. A estrutura da gramática, desse modo, está longe de ser

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formalmente ótima, uma vez que sua organização é uma resposta complexa, variável e mutante às funções comunicativas e interacionais que é chamada a exercer, bem como às propriedades cognitivas, socioculturais e fisiológicas dos usuários humanos.(BAGNO, 2021, p. 139)

Na concepção de linguagem adotada pelo funcionalismo, que é “a de língua enquanto atividade social enraizada no uso comunicativo diário e por ele configurada"(CUNHA e TAVARES, 2016, p.14), percebe-se que a gramática funcionalista está voltada para o uso real da língua, observando as construções feitas em situações comunicativas cotidianas.

Para Martelotta(2005), a gramática funcionalista está muito ligada à questão sociocognitiva do falante, pois

a linguagem reflete um conjunto complexo de atividades comunicativas, sociais e cognitivas, integradas com o resto da psicologia humana, isto é, sua estrutura é consequente de processos gerais de pensamento que os indivíduos elaboram ao criarem significados em situações de interação com outros indivíduos.(MARTELOTTA, 2005, p.62)

A gramática funcionalista olha para além da estrutura gramatical analisando também toda a situação comunicativa, o propósito da fala, o contexto e o falante.

Com essa concepção, segundo Martelotta(2005, p.63), tem-se uma gramática que entende que a situação comunicativa é a motivadora da estrutura gramatical e não o contrário.

Um fato importante a ser destacado na gramática funcionalista é que ela acompanha a evolução que ocorre com o passar do tempo, entendendo que a língua é viva e está em constante mudança. A gramática em sua estrutura não é ignorada só para analisar o novo, mas entende-se que,

nos termos funcionalistas, a gramática não pode ser vista como independente do uso concreto da língua, ou seja, do discurso. Quando falamos, valemo-nos de uma gramática, ou seja, de um conjunto de procedimentos necessários para, através da utilização de elementos linguísticos, produzirmos significados em situações reais de comunicação.

(MARTELOTTA, 2005, p.63)

Entretanto, é necessário dizer que o funcionalismo também evidencia a estabilidade e continuidade semântico-sintática, que mostra o estável em todos os níveis da estrutura linguística. A compreensão dessa estabilidade é importante para a relação sincronia-diacronia, visto que a sincronia é essencialmente estática, e a diacronia, mutável(FERREIRA, 2015). Logo, muitas vezes, opta-se por um olhar pancrônico em relação aos fenômenos linguísticos, porque permitem “uma observação mais transparente da natureza sistemática e estável das relações

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polissêmicas, dos usos e das construções nas quais se encontram os itens focalizados”(FERREIRA, 2015, p.63). É possível notar que a vertente funcionalista valoriza a variedade existente na língua, não fazendo juízo de valor ou indicando o que é certo ou errado, mas mostrando e analisando qual é a função da língua em determinadas situações reais de uso.

Partindo do pressuposto que a língua é viva, está a todo instante em uso e possui diversas possibilidades dependendo do contexto em que é utilizada, o funcionalismo tem como objetivo analisar as relações entre funções e formas nos âmbitos da gramática(CUNHA e TAVARES, 2016). Logo, o funcionalismo traz em si a possibilidade de refletir acerca da língua falada no dia a dia, não levando em consideração somente a gramática tradicional, mas o contexto em que a língua falada ou escrita está inserida. Dessa forma, pode-se dizer que a concepção de linguagem adotada pela teoria funcionalista é “a de língua enquanto atividade social enraizada no uso comunicativo diário e por ele configurada"(CUNHA e TAVARES, 2016, p.14). Isto é, para o funcionalismo a língua é o resultado de situações comunicativas entre pessoas reais que, ao se comunicarem, não estão preocupadas em monitorar ou analisar a forma do que está sendo falado.

A teoria funcionalista, segundo Cunha e Tavares(2016), em suas análises, acaba por aproximar as regras da norma-padrão ao uso, entendendo que é essa relação no ensino-aprendizagem que trará profundidade e segurança ao falante para usar a própria língua materna. Contudo, ainda hoje a gramática tradicional, de forma isolada, é muito enfatizada em salas de aula, não permitindo aos alunos um outro olhar sobre o que estão aprendendo, gerando, muitas vezes, um domínio superficial sobre a língua ou uma grande dificuldade em aprendê-la.

As autoras ainda reforçam que, ao ensinarem uma gramática artificial distanciada da realidade do uso, os professores acabam deixando passar um ponto central, que “as relações entre formas e funções dependem da gama de fatores que interferem a cada interação comunicativa”(CUNHA e TAVARES, 2016, p.15). Dessa forma, não levar para sala de aula o contexto do uso de cada item gramatical e sintático ensinados, relacionando um ao outro, faz com que os alunos não percebam o propósito e a importância do que estão aprendendo e com o tempo, frases como

“português é chato” ou “português é difícil” são cada vez mais ouvidas, gerando uma aversão às aulas de português.

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Segundo Cunha e Tavares(2016), a solução para o problema da aversão às aulas de português mencionado anteriormente seria simples. O primeiro passo seria relacionado aos professores, que precisam estar dispostos a conhecer cada vez mais seu objeto de estudo, a língua portuguesa e seu funcionamento; e o segundo passo seria em relação ao “entendimento de que, embora independentes, os aspectos formais, semânticos e discursivos de uma língua devem ser articulados, uma vez que representam diferentes faces de um mesmo objeto”(CUNHA e TAVARES, 2016, p.16). A necessidade de colocar em prática o passo a passo sugerido pelas autoras fica ainda mais evidente quando elas dizem que há um preconceito com a língua falada dentro de sala, aumentando a distância entre função e forma. Desse modo, para eliminar esse obstáculo entre a oralidade, que recebe muitos julgamentos, e a escrita, que é vista como o ambiente das correções, elas afirmam que

[...].Cabe à escola desenvolver atividades que, contemplando a variação linguística observada em textos reais, falados e escritos, levem o aluno a perceber a adequação de determinados empregos em determinadas situações, ou seja, a língua em uso. (CUNHA e TAVARES, 2016, p.17)

A fim de corroborar a afirmação acima, as autoras apresentam uma pesquisa feita com informantes do ensino fundamental e ensino médio de uma escola de Natal- RN, utilizando textos escritos por eles. Cunha e Tavares (2016) tiveram como objetivo analisar o uso do “e”, “aí” e “então” nos quatro formatos de escrita que elas pediram aos informantes, sendo eles narrativa de experiência pessoal, relato de procedimento, descrição de local e relato de opinião. Elas constataram que os termos em questão se tornaram conectores através da gramaticalização, “processo de mudança responsável pela migração de itens do léxico à gramática ou de itens já gramaticais a novas funções no mesmo âmbito” (CUNHA e TAVARES, 2016, p.102).

Com essa pesquisa, Cunha e Tavares (2016) puderam observar e mostrar que “e”, aí” e “então” são utilizados da mesma forma, como conectores coordenativos, porém com frequências e situações diferentes, entendendo que um é mais marcado que o outro para certas construções. Ao analisarem os escritos, as autoras constataram um problema que pode ser solucionado com a ajuda da escola.

O problema se dá quando o conector “e”, que aparece frequentemente em maior número nos dados obtidos, assume o lugar dos conectores “aí” e “então”, também,

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na escrita formal. Ressaltando a ideia de que o “aí” é tido como um vício de linguagem nas escolas, as autoras perceberam que

as altas taxas de ocorrência deena escrita, um contexto mais marcado, em detrimento da miríade de conectores de maior marcação disponíveis da língua, podem ser tomadas como indício de que a escola, embora pareça ter êxito em sua campanha pela diminuição do uso de na escrita, não consegue levar os alunos ao emprego de outros conectores, comoentão, assim, logo, portanto, por conseguinte etc. (CUNHA e TAVARES, 2016, p.125)

Para as autoras, o problema em si não é usar o “e” nas construções escritas, mas é a utilização excessiva do “e” quando há outros conectores que podem exercer a mesma função. Para tanto, a escola pode entrar em ação para sanar essa repetição e “criar condições de contato entre os alunos e uma maior diversidade de conectores,[...].”(CUNHA e TAVARES, 2016, p.125). Atividades de revisão, pesquisa e análise de textos orais e impressos de diversos gêneros podem levar os alunos a se aproximarem, não só das outras formas de conectores, mas também da função que cada um pode assumir nas situações comunicativas.

Sendo assim, diante do que foi abordado sobre o funcionalismo e dos resultados obtidos da pesquisa feita pelas autoras, entende-se a importância de levar a teoria funcionalista à sala de aula, porque “a escola contribuirá com o desenvolvimento de habilidades para o uso da língua de forma autônoma, crítica e criativa, aprimorará a reflexão e a prática da língua oral e escrita e possibilitará a ampliação do universo linguístico [...]”(CUNHA e TAVARES, 2016, p.131).

2.3.1.1 Onde: pancronia, discursivização, gramaticalização e semanticização Já vimos que a gramática normativo-prescritiva indica que o “onde” como pronome relativo deve fazer referência a lugares físicos, concretos. Essa prescrição possibilita pensar se essa categoria do “onde” sempre foi usada nesse tipo de relação ou se, em um determinado momento da sincronia, houve outro(s) uso(s) concorrente(s). A fim de responder a essa indagação, promoveremos um olhar pancrônico sobre esse termo, ou seja, um olhar que “postula (e comprova empiricamente) a possibilidade de acompanhar in vivo a mudança linguística enquanto ela se processa(BAGNO, 2017, p. 338).

Em um pequeno tópico denominado “Onde não é só lugar”, Bagno(2002) afirma que o uso do “onde” fazendo referência a seres que vão além do espaço

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físico já aparece na língua portuguesa desde a época de Camões. Para corroborar essa afirmativa, Bagno(2002, p. 150) traz duas estrofes camonianas retiradas deOs Lusíadas, famoso poema épico do século XVI: Aqueles sós direi, que aventuraram/

Por seu Deus, por seu Rei, a amada vida,/ Onde, perdendo-a, em fama a dilataram/

Tão bem de suas obras merecida. (Os Lusíadas, VII, 87); Este que vês é Luso, donde a fama/ O nosso reino Lusitânia chama. (Os Lusíadas, VIII, 2). Para Bagno (2002), o primeiro “onde” tem um forte valor conclusivo, podendo ser substituído pela expressão “por isso”, e, no segundo, o “donde” tem um valor de posse, podendo ser substituído pelo pronome relativo “cuja”, em concordância com “fama”, ou seja, “ por cuja fama”. De acordo com Bagno (2002), o “onde” tem origem no latim unde, que, segundo o autor, indica origem, lugar de procedência. Segundo Bagno(2011), a forma u, também escrito como hu, proveniente do galego e do português arcaico, desapareceu em favor da forma unde, que é a forma mais próxima do “onde”, que passou a ter as funções de advérbio e de pronome relativo(BAGNO, 2011).

Bagno(2002) também mostra que escritores modernos já fazem uso do pronome relativo “onde” sem fazer referência a lugares concretos, em desacordo com a prescrição da gramática tradicional. Para o autor, “[...] esta palavra, desde que começou a ser usada na língua portuguesa, sempre teve uma abrangência sintático- semântica- pragmática muito mais ampla do que a visão normativista estrita (e estreita) vem tentando mostrar”(BAGNO, 2002, p.152), além de uma função discursiva, exercendo o papel de elemento coesivo, por pressão do queísmo, a nosso ver. Nota-se, por meio do estudo de Bagno(2002), que o uso do pronome relativo “onde” para referenciar outras coisas, além de lugares concretos, locais físicos, já é bem antigo no português.

Já Moura Neves(2018) afirma que o pronome relativo “onde” nunca se refere a pessoas, visto que o seu antecedente é um sintagma nominal que indica uma localização. Caso venha sem antecedente, o qual ela chama de “pronome relativo do tipo absoluto ou livre”(MOURA NEVES, 2018, p. 650), ele já inclui em si a natureza locativa. Adiante, na obra, a pesquisadora evidencia que o pronome relativo pode ser usado sem valor locativo, mas “a construção não é abonada nas lições normativas, embora se trate de um uso antigo e frequente na língua”(MOURA NEVES, 2018, p. 667), o qual se percebe por meio de uma visão pancrônica da língua.

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Há, também, a investigação pancrônica de Oliveira(1997 apud FERREIRA,

2015). que mostra em seu trabalho que, nas várias sincronias analisadas, o “onde” já apresentava não só o sentido concreto, referenciando local concreto e físico, em sintonia com a prescrição da norma-padrão, mas também já havia o uso do “onde”

ligando-se a termos abstratos, funcionando, muitas vezes, como uma espécie de anáfora encapsuladora, sem sentido locativo, porém, discursivo. Essa conclusão deve-se à visão pancrônica, que compara as diferentes sincronias da língua. Ferreira (2015), ao mostrar a conclusão de Oliveira (1997), afirma que:

[...] em seu percurso histórico, onde mantém seu sentido original e outros sentidos vão surgindo sem que o primeiro desapareça. Como nem sempre os mesmos valores e usos são encontrados em todas as sincronias, a autora postula que alguns sentidos seguem uma ‘espécie de onda cíclica, realizando um movimento de emergir e submergir’. A essa possível interpretação dos dados acrescentamos outra: é possível que os valores e usos mais abstratos tenham estado sempre disponíveis na língua, mas que a análise das evidências históricas realizadas pela autora simplesmente não os tenha flagrado. (FERREIRA, 2015, p. 68)

Na obra Gramática Pedagógica do Português Brasileiro, Bagno (2011) afirma que o termo “onde” vem passando por um processo de discursivização no PB, entendido como:

Um processo em que os elementos perdem a função lexical e gramatical para ficar a serviço da organização da linha de raciocínio na fala, funcionando como marcadores discursivos que ora marcam uma retomada da linha de raciocínio perdida (ou, de um modo geral, mudanças de estratégia comunicativa), reorganizando o discurso e ao mesmo tempo chamando a atenção do ouvinte para essa retomada; ora funcionam como artifício para o falante, sem perder a palavra, refletir sobre o que vai dizer, funcionando como preenchedores de pausa [...]. (MARTELOTTA, NASCIMENTO E COSTA, 1996, p. 261-262 apud BAGNO, 2011, p. 960)

No nosso corpus, encontramos exemplos desse “onde” que, estruturalmente, tem a posição de um pronome relativo, mas, na discursivização, age como um organizador de discurso, estando, muitas vezes, no lugar do “que” coesivo, ou funciona também como um mero marcador de pausa discursivo, o que é muito comum na oralidade em falas menos monitoradas. Para Bagno(2011), esse processo de discursivização pelo qual passa o “onde” é irrefreável, muito difícil de ser interrompido, visto que ele é muito comum na oralidade.

Porém, encontramos também o “onde” reconhecidamente advindo do processo de gramaticalização, fruto da seguinte trajetória, demonstrada por Silva (2008, p.19), em dissertação de mestrado apresentada na UFMG:OndeAdverbial >

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Onde Relativo [ + concreto] > Onde Relativo [ + abstrato] > Onde Conectivo, entendendo o termo “conectivo” como conjunções de valor explicativo, conclusivo, causal, consecutivo etc.(SILVA, 2008). Entretanto, em relação ao Onde Conectivo, postulamos que ele esteja muito mais ligado ao processo de discursivização, agindo como um organizador do discurso, tal como afirmou Bagno(2011).

Ainda que a norma-padrão tenha um papel importante na relação sincronia-diacronia, porque ela faz parte da estabilidade, não se pode esquecer que é, por meio da pancronia, que notamos aspectos mais ou menos estáveis na língua, assim como outros que já existiam, mas que não foram relacionados à norma e a prescrição. O fato de não terem sido relacionados à norma não quer dizer que não sejam usados pelo falante, que, nesse uso, muitas vezes, promove o processo de gramaticalização de algumas formas, assim como a mudança linguística, aspecto caro à teoria sociolinguística. Assim, entende-se a gramaticalização como

o trajeto empreendido por um item lexical, ao longo do qual ele muda de categoria sintática (= recategorização), recebe propriedades funcionais na sentença, sofre alterações morfológicas, fonológicas e semânticas, deixa de ser uma forma livre, estágio em que pode até mesmo desaparecer, como consequência de uma cristalização extrema. (CASTILHO, 1997, p. 31 apud BAGNO, 2017, p. 170)

Maria Helena de Moura Neves, linguista brasileira da área do funcionalismo, explica o termo “gramaticalização” como um processo importante no funcionamento das línguas, ou seja:

[...]. Trata-se do encaminhamento de elementos (mais) lexicais na direção de uma gramaticalização, ou seja, de uma atuação em funções (mais) gramaticais. Por exemplo: elementos a princípio “substantivos”

(referenciais), em determinadas condições construcionais, passam (gradualmente) a adjetivos (mantêm a expressão de propriedades mas perdem a referencialidade); elementos a princípio adjetivos, em determinadas condições construcionais, passam (gradualmente) a advérbios de modo (mantêm a expressão de modo de ser, mas aplicam-se a núcleos de diferente natureza); [...].(MOURA NEVES, 2018, p. 77)

Mas como separar a gramaticalização da discursivização, sendo tão limítrofe a linha de separação entre esses dois processos? Segundo Martelotta, Votre &

Cezário(1996), em obra seminal sobre o assunto, os dois processos podem ser compreendido da seguinte maneira:

Gramaticalização e discursivização constituem processos especiais de mudanças linguísticas. Gramaticalização leva itens lexicais e construções sintáticas a assumir funções referentes à organização interna do discurso ou estratégias comunicativas. Discursivização leva o item a assumir função de marcador discursivo, modalizando ou reorganizando a produção da fala,

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quando sua linearidade é momentaneamente perdida, ou servindo para preencher o vazio causado pela perda da linearidade.(MARTELOTTA, VOTRE & CEZÁRIO, 1996, p .12)

Nota-se que a definição de discursivização de Martelotta, Votre &

Cezário(1996) insere o processo de discursivização na língua falada. Entretanto, Bagno(2011) nos dá vários exemplos de discursivização do “onde” na língua escrita, retirados do corpus IVEM (Impacto do Vernáculo sobre a Escrita Monitorada), com textos escritos por professores na ativa ou ainda em formação. Vejamos dois exemplos dessecorpus:

(27) Em uma sociedade que não houvesse normas, o caos já teria tomado conta da situação. A regulação quer seja social ou linguística é feita através de inúmeros fatores, quer sejam “ascendentes ou descendentes” que objetivam centrar a realidade linguística ou social em um padrão aceitável, ondea cidadania e a comunicação possam chegar ao objetivo. (EL 312) (28) A unificação a que se referem diz respeito a geração de uma dupla tendência linguística: a língua que é falada e a língua que é escrita, tendo a primeira dentro dos grupos sociais variações linguísticas diversas; e a segunda, como uma norma- prescritiva padrão para a língua, onde ambas tem convivência pacífica que como diz Corbell “se faz por uma prática

“consciente” e “inconsciente”. (EL 301)

Já Castilho(2019) propõe que se tenha uma visão multissistêmica da língua, propondo um modelo denominado funcionalista- cognitivista. Nessa abordagem, não se pode ver em separado os processos de gramaticalização e discursivização, além do processo de semanticização que se junta aos dois primeiros. Todos esses processos são interligados por um dispositivo sociocognitivo, que é social, porque parte da atividade linguística básica: a conversação.

Em relação ao processo de mudança linguística que atravessa esse dispositivo, Castilho(2019) afirma que as comunidades mais homogêneas sociolinguisticamente tendem a diminuir o processo de mudança, enquanto as heterogêneas aceleram o processo. O aspecto cognitivo do dispositivo se deve ao fato de ele ter em sua base categorias e subcategorias cognitivas, como as

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categorias de pessoa, coisa, espaço e tempo, visão, movimento e evento. Para Castilho(2019), esses processos são multissistêmicos porque “é possível notar que o falante ativa, reativa e desativa propriedades lexicais, semânticas, discursivas e gramaticais no momento da criação de seus enunciados, constituindo dessa forma as expressões que pretende “pôr no ar”(CASTILHO, 2019, p. 17)

Castilho(2019) conceitua o processo de discursivização como:

[...], o processo de criação do texto. Nele se abriga um conjunto de atividades de negociação conversacional em que se envolvem o locutor e o interlocutor (ou o autor e o leitor), através das quais (i) se instanciam as pessoas do discurso e se constroem suas imagens, (ii) se organiza a interação através da elaboração do tópico conversacional, objetivando agir sobre o outro, informar ou exteriorizar sentimentos, (iii) se reorganiza essa interação através dos procedimentos de correção sociopragmática, (iv) se abandona o ritmo em curso através de digressões e parênteses, que passam a gerar outros tópicos discursivos, e (v) se estabelece a coesão textual por meio de expedientes vários.(CASTILHO, 2019, p. 23)

Castilho(2019, p. 23) chama a atenção para a compreensão desses dois processos, a gramaticalização e a discursivização, tendo em vista que “os estudos sobre discursivização revelam o desconforto dos pesquisadores quando tratam os temas citados como casos de gramaticalização”, porque são processos distintos, embora façam parte da abordagem sistêmico – funcional e sociocognitiva.

Por último, apresentamos o processo de semanticização, inerente ao signo verbal na relação significante- significado. De acordo com Castilho(2019, p. 21), a semanticização “é o processo de criação, alteração e categorização dos sentidos.

Esse processo compreende a semanticização léxica, a semanticização sintática e a semanticização discursiva”. Castilho(2019) vê este processo em quatro áreas da semântica: a lexical, que categoriza os significados e sentidos, além da mudança que eles sofrem; a gramatical, ou sintática, que ocupa “dos processos de troca de propriedades de itens dispostos em contiguidade sintagmática”(CASTILHO, 2019, p.

22); a discursiva, na qual surgem significações no âmbito da conversação entre os locutores, ou seja, “surgem significados não contidos nas palavras nem nas construções gramaticais”(CASTILHO, 2019, p. 22), e, por fim, a histórica, que estuda as ressemantizações e dessemantizações do signo verbal.

Na próxima seção, a de análise do corpus deste trabalho, veremos como os processos de gramaticalização, discursivização e semanticização se inserem na estrutura sintagmática na qual há um pronome relativo “onde” de acordo com os

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preceitos da norma-padrão ou que estejam numa posição sintagmática do pronome relativo “onde”, mas com discordância com a norma-padrão.

(31)

3 OCORPUS, A METODOLOGIA E A ANÁLISE

O corpus desta pesquisa compõe-se de duas mídias digitais da cidade fluminense de Campos dos Goytacazes: o site de notícias Campos 24 horas e a versão on-line do jornalFolha da Manhã, um dos mais importantes da região.

Para isso, pesquisou-se, com ajuda da ferramenta de busca já contida nessas mídias, textos que continham o “onde” na função ou na posição de pronome relativo.

Nos dias 30 de março e 1 de abril de 2022, fez-se a busca no site Campos 24 Horas, e entre 04 e 11 de abril, fez-se a busca na versão on-line da Folha da Manhã. Dessa forma, houve muitos resultados contendo a partícula “onde”, contudo, apenas o que é objeto dessa pesquisa foi separado para ser apresentado aqui.

Assim, não faz parte docorpuso “onde” na função de advérbio.

O corpus está assim dividido: as notícias de 1 a 25, que correspondem aos exemplos de 1 a 34, são trechos de textos do site de notícias on-line Campos 24 horas, já os exemplos de 35 até 184 foram retirados das notícias de 26 a 70 do jornal on-line Folha da Manhã, como mostra o anexo deste trabalho.

A seguir, apresentamos os 184 excertos docorpusnos quais se apresentam o

“onde” na função ou na posição de pronome relativo:

1- “As obras já estão acontecendo e em abril será inaugurada a Clínica da Criança, no espaço onde funciona hoje a UPH de Guarus, antigo PU de Guarus.” (Notícia 1)

2- “Aos 44 minutos Antony partiu pela direita e chutou rasteiro para o meio da área, onde Richarlison, com liberdade, apenas escorou para o gol.”

(Notícia 2)

3- “Segundo o estudo, o recuo generalizado do desemprego foi mais intenso na Região Sudeste, onde a taxa de desocupação caiu 3,9 pontos percentuais de 2020 para 2021, ...” (Notícia 3)

4- “O diretor técnico do hospital onde será realizada a cirurgia robótica é o responsável por conferir a documentação que garante a capacitação e competência do cirurgião principal,...” (Notícia 4)

5- “..., sendo obrigatório autorização por escrito do diretor técnico do hospital ondea cirurgia será realizada.” (Notícia 4)

(32)

6- “Três homens invadiram uma casa onde acontecia uma festa de aniversário, para tentar matar um rapaz.” (Notícia 5)

7- “D. disse ainda que viu o momento em que os três entraram pelo portão, correndo até a área dos fundos, onde acontecia a comemoração,...”

(Notícia 5)

8- “Todos os envolvidos foram levados para a 146ª DP/Guarus, onde a ocorrência foi registrada.” (Notícia 5);

9- “Na ocasião, Wladimir anunciou mais um benefício para a instituição, o encaminhamento de um projeto de lei à Câmara Municipal onde prevê que uma parte do recurso do fundo do Instituto Municipal de Trânsito e Transporte (IMTT)...” (Notícia 6)

10- “Os agentes foram até o local onde fizeram contato com o mesmo e após buscas no bar,...” (Notícia 7)

11- “O caso foi apresentado na 146ª DP/Guarus ondeo acusado foi autuado e permaneceu preso.” (Notícia 7)

12- “Em buscas no local onde a dupla foi vista, os agente encontraram 11 pinos de cocaína.” (Notícia 7)

13- “Com o material, a equipe procedeu à 146ª DP/Guarus onde o caso foi registrado.” (Notícia 7)

14-“ ‘Temos que repudiar a guerra, um lugar de morte onde pais e mães enterram seus filhos, onde homens matam seus irmãos sem sequer vê-los, onde os poderosos decidem e os pobres morrem’, acrescentou.”

(Notícia 8)

15-“O sucesso das forças ucranianas em torno de Kharkiv foi espelhado mais ao norte, perto da cidade de Sumy, ondeas tropas ucranianas libertaram vários vilarejos, ...” (Notícia 9)

16- “A cidade fica a 400 km do país onde está o presidente dos EUA.”

(Notícia 9)

17- “O prefeito de Lviv, Andriy Sadovyi, disse que com resultado do bombardeamento, um dos objetos industriais onde o combustível é armazenado está queimando.” (Notícia 9)

18-“Após informações de que no local estaria um carro com características de que havia sido roubado, os policiais se dirigiram ao endereço, onde localizou o veículo Corsa de cor vermelha, estacionado.” (Notícia10)

(33)

19- “Segundo a PM, eram dois pontosondeele buscava o material.” (Notícia 11)

20- “As equipes da PM se deslocaram para o local onde J. buscava o material e apreenderam 30 buchas de maconha e 19 papelotes de cocaína.” (Notícia 11)

21- “A dupla e todo o material foram levados para a 145ª DP da cidade e posteriormente conduzidos para a 146ª DP/Guarus,ondeforam autuados e permaneceram presos.” (Notícia 12)

22- “O caso foi registrado na 146ª DP/Guarus, onde os acusados foram autuados por tentativa de homicídio.” (Notícia 13)

23- “Einstein também cumpriu o protocolo de visitas científicas no Rio:

Fundação Oswaldo Cruz, Observatório Nacional e Museu Nacional – ondeplantou um broto de pau-brasil.” (Notícia 14)

24- “Como seu semelhante norte-americano, o avião foi projetado para servir como posto de comando móvel, deondeseria possível iniciar uma guerra nuclear, segundo o site Aerotime Hub, especializado em aviação.”

(Notícia 15)

25- “Nas entrevistas com moradores, as assistentes sociais buscaram conhecer a realidade e problemas locais para a proposição de soluções efetivas, conforme as necessidades das crianças e adolescentes, levando-se em conta a realidade da comunidade onde estão inseridas.”

(Notícia 16)

26-“O espetáculo é uma aventura onde oito bichos se deparam com um desejo em comum e recebem um desafio de Elisa,...” (Notícia 17)

27- “Na Cidade da Criança,ondea vacinação é exclusiva para crianças de 2 meses a 6 anos, ....” (Notícia 18)

28- “Mas agora é realidade. Hoje temos prazer de estar em um lugarondea gente se sente valorizada como profissional e como aluno", disse Maria Paula.” (Notícia 19)

29- “Agentes atuaram, nesta terça-feira (29), na Avenida XV de Novembro, com presenças nos pontos de ônibus à margem do Rio Paraíba do Sul e em pontos de táxi ao lado do Campos Shopping, onde foram solicitadas aos motoristas, permissionários e taxistas e verificadas todas as

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