HISTÓRICO DA PONTE HERCÍLIO LUZ Florianópolis - SC
Introdução
Neste artigo é apresentado um panorama histórico sobre a concepção, projeto e realização da estrutura da ponte Hercílio Luz de Florianópolis, em Santa Catarina. Esta ponte que é a maior do mundo do tipo pênsil usando correntes, ou também chamada de cadeia de barras de olhais, foi na década de 1920 um marco da engenharia mundial.
Mesmo entre as pontes penseis usando cabos só havia até o ano de 1926 cinco pontes maiores que a de Florianópolis. Atualmente, em todo o planeta, são encontradas cerca de oitenta pontes vencendo vão maior que os 340 metros.
De maio de 1926, quando foi inaugurada, até hoje, cumprida sua missão como obra, até sua primeira interdição em 1982, depois de mais de 60 anos de serviço ao transporte em Santa Catarina, problemas técnicos; como corrosão e trinca em uma das barras de olhais que sustentam a ponte, geraram sua interdição, inicialmente desde 1982 até 1988 e depois em 1991. Atualmente, está em andamento um projeto de recuperação que define uma maneira de recuperar a obra que tem em vista a sua conservação como monumento histórico.
Objetivos
O objetivo deste trabalho foi de coletar e sistematizar algumas informações para que se possa conhecer e avaliar as possibilidades de recuperação de uma obra tão peculiar. Onde a concepção e o processo construtivo, apesar de atualmente ultrapassados do ponto de vista tecnológico, ainda apresentam um conhecimento que certamente interessa aos estudiosos da história da técnica e constitui uma contribuição à evolução da engenharia.
Histórico
O desejo de vencer vãos cada vez maiores e a evolução da arte de construir, é inerente a história da humanidade. As construções pela sua complexidade e imponência, desde a Antigüidade, tem uma importância fundamental na compreensão da cultura dos povos.
Uma sucessão de invenções e descobertas registra o esforço em promover abrigos cada vez mais seguros, espaços de reunião de pessoas com as mais diversas finalidades, artísticas, culturais, religiosas ou mesmo de transpor obstáculos como é o caso das pontes e viadutos.
A descoberta de novos materiais como o aço, o cimento e o concreto estrutural, praticamente nos últimos duzentos anos, modificaram enormemente estas possibilidades.
Um vão livre da ordem de 40 metros que foi liberado pelos romanos no Panteon de Roma
e só depois de mais de 1400 anos igualado nas basílicas de Alexandria e de Florença, são
hoje vãos de obras comuns que podem ser encontradas em ginásios e clubes das nossas cidades mais modestas.
As pontes até então em alvenaria de pedras ou madeira, tiveram uma fantástica evolução nestes dois últimos séculos. Desde a primeira ponte em ferro fundido, a Iron Bridge sobre o rio Severn River, em Coalbrookdale, Inglaterra, com seus 30 metros (100 pés), completada em 1779, uma sucessão de obras notáveis tem fascinado as pessoas em todo o mundo.
A idéia de transpor obstáculos usando cabos é muito antiga e não há registro das primeiras pontes penseis que inicialmente usaram cordas. São encontradas ilustrações de pontes de cordas na Europa, China, Índia e até a famosa ponte Inca na América (http://www.youtube.com/watch?v=xb5_Kuvkhxc). Segundo o site de David Denenberg (http://www.bridgemeister.com/) a primeira ponte pênsil usando correntes metálicas tenha sido construída em 1734 Glorywitz, Prussia (Oder River). Em 1810 John Templeman construiu uma ponte pênsil com vão de 74 m chamada Newburyport em Massachusetts, EUA, sobre o rio Merrimack.
Ponte Newburyport em Massachusetts, EUA
Em 1826 o famoso construtor de pontes inglês Thomas Telford concluiu a ponte Menai Straits Bridge em Wales, País de Gales, com torres de alvenaria de pedra, vencendo um vão de 176 metros (570 pés) com uma corrente composta de 12 barras de olhais, dispostas em dois feixes de seis barras de cada lado da ponte. A barra de olhal é uma barra que tem a possibilidade de emenda como mostra a foto das barras da ponte Hercílio Luz.
barras de olhais da ponte Hercílio Luz
Na Alemanha, em 1829 foi construída uma ponte pênsil de correntes sobre o Rio Regnitz, em Bamberg. Entretanto a ausência de vigas de rigidez causava grandes deslocamentos e deterioravam os pinos dos olhais. A grande exigência de manutenção, obrigou sua substituição em 1891 por outra ponte em arco metálico.
Em 1864 foi concluída a Clifton Bridge sobre o rio Avan, em Bristol, Inglaterra, projeto de Isambard Kingdom Brunel, em ferro forjado sendo a corrente, de cada lado, composta de 36 barras, dispostas em três camadas de doze (2x6) barras.
Em 1903, aparece a ponte Elizabeth, também sobre o Rio Danúbio em Budapeste, com vão de 290 metros, projetada por Aurel Czekelius e M. Nagy. Esta era considerada por alguns autores europeus que desconheciam a Ponte Hercílio Luz, a maior ponte em correntes do mundo, foi destruída na segunda guerra mundial.
Em 1926, é concluída a ponte Hercílio Luz, em Florianópolis, Santa Catarina, projeto de D. B. Steinman e Willian G. Grove, com vão central de 340 metros (1113 pés) em estrutura pênsil usando correntes de 4 barras de cada lado, ancoradas a 120 m no lado do continente e 110 m no lado da ilha, em blocos presos a rocha. O seu comprimento total é de 821 m, 222 m do lado do continente e 259 m no lado da ilha. No vão central a altura média do tabuleiro é de 30 metros do nível do mar.
Mais similares a ponte Hercílio Luz, na concepção estrutural, usando as barras de olhais e o mesmo tipo de aço empregado foram a Silver Bridge sobre o rio Ohio, entre Point Pleasant em Gallipolis, nos EUA, e a Saint Mary’s Bridge em West Virginia, EUA.
Ambas projetadas e construídas pela firma J. E. Greiner & Co. A primeira ruiu em 15/11/1967, por ruptura em um olhal da corrente, causando a morte de 46 pessoas. A segunda, em mau estado de conservação, foi desativada e desmontada em 1971. As diferenças entre as pontes brasileiras e americanas são muito bem abordadas no artigo de Lichtenstein. As americanas totalmente penseis, ou seja, no vão e nos acessos, e tinham apenas duas correntes de cada lado, quando a brasileira tem quatro. (Lichtenstein, 1993).
Desmonte da ponte Saint Mary´s
A necessidade da ponte para Florianópolis
A cidade de Florianópolis, chamada de Desterro, antes de revolução federalista de 1894, nasceu da colonização portuguesa na Ilha de Santa Catarina, a ilha é uma faixa de cerca de 55 km de extensão com 8 km de largura, e sempre foi a capital administrativa do estado de Santa Catarina.
A ligação com o continente era feita através de barcos e balsas, o que era comum nos séculos passados! Pois só a partir da evolução dos meios de transportes, no século XX, é que o transporte terrestre predominou e apareceu a necessidade das pontes e viadutos rodoviários.
Por volta de 1900, no caso de Florianópolis, apesar do anseio por uma ponte, a necessidade não seria justificável tratando-se de uma cidade comum. Aconteceu que por ser capital do estado, abrigava políticos e pessoas influentes que ali desejavam permanecer. Assim traçaram-se planos de implantar uma ferrovia para ligar a capital às outras cidades e construir um porto na parte norte da ilha, de modo a evitar as águas rasas das baías norte e sul. Isso não ocorreu devido a evolução e predomínio do transporte rodoviário o que tornou mais viável o porto de Itajaí, distante 80 km de Florianópolis.
“No governo do Estado, mandarei construir uma grande ponte e vocês que são moços terão oportunidade de passar muitas vezes
por ela” Hercílio Luz, 1917