• Nenhum resultado encontrado

LITÍGIO ESTRATÉGICO E SISTEMA INTERAMERICANO DE DIREITOS HUMANOS:

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "LITÍGIO ESTRATÉGICO E SISTEMA INTERAMERICANO DE DIREITOS HUMANOS:"

Copied!
6
0
0

Texto

(1)

LITÍGIO

ESTRATÉGICO

E

SISTEMA

INTERAMERICANO

DE

DIREITOS

HUMANOS:

A

FUNÇÃO DA

D

EFENSORIA

P

ÚBLICA DA

U

NIÃO NA MUDANÇA DA

CULTURA INSTITUCIONAL BRASILEIRA

1

Por João Marcos Mattos Mariano. Graduado na Universidade Federal do Espírito Santo. Defensor Regional de Direitos Humanos da Defensoria Pública da União no Espírito Santo.

Palavras-chave: Atuação no Sistema Interamericano: Direitos Humanos. Direito fundamental ao acesso à justiça. Justiça multiportas. Estratégias na atuação em defesa de Direitos Humanos. Efetividade e Limitações da atuação perante a Corte e a Comissão Interamericana de Direitos Humanos.

1 Este material foi desenvolvido a partir das discussões durante o evento: I Curso de Capacitação em Direitos

(2)

1. ACESSO À JUSTIÇA, LITÍGIOS DE MASSA E DEFENSORIA PÚBLICADAUNIÃO

O acesso à justiça – direito fundamental consagrado no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, e no art. 8º, § 1º, da Convenção Americana de Direitos Humanos – não pode ser reduzido ao direito de acesso ao Poder Judiciário.

A Justiça, portanto, é uma instância multiportas e envolve qualquer meio legalmente válido e moralmente aceito de resolução dos diversos conflitos existentes na sociedade. Ademais, numa sociedade de massas, o Poder Judiciário, enquanto ponto nodal da prestação jurisdicional do Estado-juiz demonstra cada vez mais vocação para a emissão de ordens estandardizadas de resolução, capazes de serem aplicadas para uma infinidade de situações semelhantes – basta ver as técnicas de resolução massiva de questões trazidas pelo Novo Código de Processo Civil (Lei 13.105 de 2015) e a imposição de uma teoria dos precedentes vinculantes – e de possibilitar a celeridade processual e o desafogamento de cartórios judiciais.

Justifica-se esse tipo de modelo pelo ideal de isonomia que deve pautar todas as expressões dos poderes públicos, incluído o Judiciário; é dizer: não há independência de juízes capaz de justificar a entrega destoante da jurisdição diante de casos similares.

No entanto, o influxo desses “novos” ventos apresenta risco considerável de que interesses individuais, e mesmo coletivos, sofram graves ofensas. A ideia de que essas soluções estandardizadas são capazes de realizar a justiça na infinidade de casos concretos correlatos passa pela noção de fortalecimento de uma democracia procedimental, nos moldes propostos por John Hart Ely.

O conceito é perigoso em um país em uma democracia frágil e em construção como a brasileira, notadamente marcada pela falta de acesso a direitos fundamentais básicos, como o acesso à educação, à livre disseminação do pensamento, à alimentação de qualidade e à moradia.

Há que se considerar ainda que o Poder Judiciário integra a estrutura do Estado Brasileiro; nessa linha, pode ser ele o responsável pela violação de direitos e pela omissão frente a uma ofensa dessa espécie, o que enseja a responsabilização do país perante o Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos – vide as conclusões tomadas pela Corte Interamericana no Caso Escher e Outros vs. Brasil.

(3)

Nesse contexto, relevam o comando do inciso II do art. 4º da Lei Complementas 80/1994 (Lei Orgânica da Defensoria Pública da União) ao estatuir que é função institucional das Defensorias “promover, prioritariamente, a solução extrajudicial dos

litígios, visando à composição entre as pessoas em conflito de interesses, por meio de mediação, conciliação, arbitragem e demais técnicas de composição e administração de conflitos”.

Em suma, cabe à Defensoria Pública resolver conflitos extrajudicialmente. Não pode o órgão servir apenas de ponte para que cidadãos desafortunados financeiramente possam levar causas ao Judiciário; é muito mais: é uma forma eficaz para que problemas possam ser resolvidos a despeito do Judiciário. Não faltam armas para isso, visto que o ferramental legal posto à disposição de defensores públicos é adequado; falta incentivo, capacitação e, principalmente, braços e pernas capazes de levar essa atuação para todos os que precisam, já que o número de defensores está aquém do necessário.

2. SISTEMA INTERAMERICANO E CONTROLE DO JUDICIÁRIO INTERNO

A missão de resolver extrajudicialmente conflitos implica ainda a função da Defensoria Pública de atuar como órgão de fiscalização das decisões do Poder Judiciário perante as camadas mais vulneráveis e de disseminação da cultura dos direitos humanos no Brasil (art. 4º, III, da Lei Complementar 80/1994).

Isso pode ocorrer de duas maneiras: (a) pela garantia do devido processo legal interno; e (b) pela denúncia de eventuais abusos ou omissões relevantes aos mecanismos internacionais de proteção dos direitos humanos.

Em primeiro lugar, cabe à Defensoria atuar como o mecanismo de vocalização de demandas de grupos vulneráveis perante os poderes públicos estatais, de modo a ultrapassar a barreira dos ritos e formalismos dessas instâncias e assegurar que a solução final, mesmo nos casos em que desfavorável, contemple integralmente a profundidade dos elementos postos em disputa.

Contudo, caso a crença na capacidade das instituições internas brasileiras de resolverem com Justiça os problemas trazidos se frustre, a vocação institucional da

(4)

Defensoria impõe o acionamento dos mecanismos externos de proteção dos direitos humanos, nos termos do art. 4º, VI, da Lei Complementar 80/1994.

A lógica acima permite atribuir à Corte de São José e aos mecanismos que a precedem a noção de complementaridade aos sistemas internos imposta pela Convenção Americana de Direitos Humanos (art. 2º e 46). A provocação desses sistemas não é uma finalidade em si mesma, mas uma forma de aprimorar os mecanismos de prestação jurisdicional dos países membros.

3. LIMITES E POSSIBILIDADES DO ACESSO AO SISTEMA INTERAMERICANO

Acessar o sistema interamericano não pode ser visto como um mecanismo ínsito ao sistema interno.

Esse tipo de litígio não pode, por conseguinte, ser uma estrada de validação dentro do cotidiano ordinário da atuação jurisdicional brasileira. Há entraves e limitações – óbvios até – decorrentes da extensão e da pluralidade dos territórios sujeitos à Corte de São José que fazem com que essa instância não seja capaz de propiciar sempre uma resposta adequada às necessidades dos indivíduos atingidos em seus direitos no caso concreto. Essa possibilidade dinâmica só pode ser contemplada pelo funcionamento adequado de um sistema de justiça capilarizado em todos os rincões dos Estados-membros do Pacto de São José.

Some-se isso ao quadro de crise econômica existente no cenário internacional pós-2008, capaz de multiplicar litígios e ofensas a direitos e de fazer minguar as fontes de financiamento do Sistema Interamericano de Proteção (visto que oriundas desses mesmos Estados-nações em déficit), há o risco de paralisia dos órgãos.

Nada obstante essa tomada de consciência de que o Sistema Interamericano não é a panaceia para os males internos, um parêntese deve ser feito quanto à situação brasileira: falta uma cultura de incorporação do Pacto de São José, de seus órgãos e das decisões tomadas ao ordenamento jurídico pátrio.

São relativamente diminutos, diante do conjunto da obra sistêmica, os casos que envolvem diretamente o Brasil – outros países, que não possuem as dimensões continentais

(5)

destas terras possuem, até em valores absolutos, mais casos. Isso, quando o país é pródigo em ações ofensivas aos direitos humanos. Ademais, as normas internacionais de proteção aos direitos humanos são vistas, inclusive pelas instâncias mais altas de Justiça Constitucional, como subordinadas às normas internas. Não há, em regra, recurso aos tratados e às decisões da Corte e da Comissão no direito interno; seja por desconhecimento, seja por uma incompleta noção de soberania.

Basta ver que discussões há muito sepultadas no horizonte da Corte Interamericana de Direitos Humanos, a exemplo daquela a respeito dos crimes de desacato (Caso Palamara

Iribane v. Chile), são extremamente atuais no dia a dia forense brasileiro – a suposta

ocorrência do crime de desacato é talvez o principal motor para prisões e demais atos de repressão policial a manifestações.

A Defensoria Pública da União pode ajudar a reverter esse quadro: é uma instituição com potencialidade nacional, capaz de agregar as demais vozes estatais e da sociedade civil que atuam na defesa dos direitos humanos, assim como de incorporar ao seu cotidiano de atuação o Sistema Interamericano de Proteção como norte institucional primeiro.

Para tanto, faz-se necessário disseminar e facilitar o acesso de defensores, servidores e estagiários às decisões e às discussões desenvolvidas nesse sistema; importa criar sistemas informáticos facilitadores, elaborar um periódico diário acerca do tema que chegasse ao correio eletrônico institucional; fomentar discussões internas e externas (capitaneadas pela DPU) sobre os assuntos. Enfim, criar nesta instituição uma cultura de trabalho no/pelo normativo regional de proteção para que este órgão sirva de provocador de discussões.

4. CONCLUSÕES

Englobar a atuação no sistema interamericano ao cotidiano da Defensoria, principalmente diante das recentes conquistas e parcerias do órgão na atuação regional, mostra-se essencial ao aprimoramento de uma atuação estratégica na seara dos Direitos Humanos.

A posição constitucional privilegiada do órgão, com um viés institucional único voltado à proteção dos mais vulneráveis, pode servir como índice capaz de criar ao seu

(6)

redor um perfil de referência regional no atual processo brasileiro de tomada de consciência da importância dos direitos humanos.

Galgada a esse justo posto perante a sociedade civil e os órgãos nacionais internacionais, a Defensoria Pública da União poderá contribuir decisivamente para reverter a atual ignorância sistêmica acerca da profundidade e dos aspectos da proteção desses direitos primordiais a uma vida digna.

5. REFERÊNCIAS

ARENHART, Sérgio Cruz. A Tutela Coletiva de Interesses Individuais: Para além da proteção dos interesses individuais homogêneos. 2ª ed. Ed. Revista dos Tribunais: São Paulo, 2014.

BRASIL. Constituição Federal da República Federativa do Brasil, 1988. BRASIL. Código de Processo Civil, 2015.

BRASIL. Lei Complementar nº 80, de 12 de janeiro de 1994. OEA. Convenção Americana Sobre Direitos Humanos

PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e Justiça Internacional - 2ª ed. Ed. Saraiva: São Paulo, 2011.

PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional - 14ª ed. Ed. Saraiva: São Paulo, 2013.

RAMOS, André de Carvalho. Processo Internacional de Direitos Humanos - 4ª ed. Ed. Saraiva: São Paulo, 2015.

Referências

Documentos relacionados

Sugere-se a clarificação de qual a informação que constará neste campo, tendo em conta a não aplicabilidade do conceito “número de contratos” a instrumentos financeiros

No 3T15, a marca apresentou um crescimento de receita de quase 66% em relação ao mesmo período do ano anterior, consequente de sua expansão no canal varejo, a fidelização e

- Toxicidade para órgãos-alvo específicos (STOT), a exposição repetida: Com base nos dados disponíveis, os critérios de classificação não são preenchidos, não

A espectrofotometria é uma técnica quantitativa e qualitativa, a qual se A espectrofotometria é uma técnica quantitativa e qualitativa, a qual se baseia no fato de que uma

 Para os agentes físicos: ruído, calor, radiações ionizantes, condições hiperbáricas, não ionizantes, vibração, frio, e umidade, sendo os mesmos avaliados

Equipamentos de emergência imediatamente acessíveis, com instruções de utilização. Assegurar-se que os lava- olhos e os chuveiros de segurança estejam próximos ao local de

Com o objetivo de compreender como se efetivou a participação das educadoras - Maria Zuíla e Silva Moraes; Minerva Diaz de Sá Barreto - na criação dos diversos

Avaliação da atividade antimicrobiana do extrato etanólico bruto da casca da sucupira branca (Pterodon emarginatus Vogel) - Fabaceae.. Pterodon emarginatus