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Dr. Matheus Papaléo Netto

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Academic year: 2021

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Entrevista

Com mais de 70: legados de ideias e ideais

Dr. Matheus Papaléo Netto

“A Geriatria não pode e não deve caminhar separadamente da Gerontologia”

Texto: Guilherme Salgado Rocha Fotos: Alessandra Anselmi ema principal da entrevista – a saúde da população idosa -, o médico Matheus Papaléo Netto chama a atenção “não somente dos médicos, mas de todos os profissionais de Saúde”, para a “impossibilidade de ser quebrado o vínculo existente entre as duas entidades: a Geriatria e Gerontologia”. A entrevista foi concedida na sala do Programa de Pós-Graduação em Gerontologia da PUC – São Paulo, da qual participaram a professora Beltrina Côrte, editora do Portal do Envelhecimento, e as professoras Elisabeth F. Mercadante e Nádia Dumara Ruiz Silveira, ambas do Programa de Gerontologia, e a psicóloga e mestranda Karen Harari.

Portal – O sr. defende exatamente a impossibilidade de haver a divisão entre as duas vertentes de atuação em favor da saúde da população idosa...

Papaléo - Gosto realmente de abordar o assunto, procurando chamar a atenção não somente dos médicos, mas de todos os profissionais da Saúde,

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que já faz alguns anos dedicam atenção à saúde da população idosa. Com efeito, não é mais possível quebrar o vínculo existente entre duas entidades essenciais no atendimento às necessidades mais prementes da pessoa idosa, que são a Geriatria e a Gerontologia. Atrevo-me a dizer que a Geriatria, embora fundamental na atenção à saúde do doente idoso, nada mais é do que um ramo da Gerontologia. Esta sim pode ser considerada um grande “guarda- chuva”, que tem sob si várias áreas de atuação de interesse desse segmento populacional. É importante abrir parênteses para deixar claro que o interesse pelo fenômeno do envelhecimento data de vários séculos, mas somente no século XX tomou vulto o interesse por essa ciência, que em 1903 recebeu denominação, que até hoje possui, Gerontologia, cunhada por Elie Metchnikoff. Portal - O sr. poderia nos dar algumas informações a propósito do que julga os momentos mais importantes de sua vida pessoal e de sua atividade profissional? E como lida com alguns aspectos emocionais, que parecem fazer parte de sua atividade médica e acadêmica?

Papaléo – Tenho 83 anos de idade, sou formado pela Faculdade de Medicina da USP em 1953, fui casado durante 47 anos, tenho duas filhas e três netos. Fiquei viúvo com 72 anos, e me casei novamente há aproximadamente três anos. É possível que a minha origem, pois sou neto de imigrantes italianos, todos do sul da Itália - que chegaram ao Brasil, com seus pais, logo após a libertação dos escravos, e que adotaram o nosso país durante toda a sua vida, tenha exercido influência decisiva sobre minha vida, minha personalidade e, em última análise, sobre minha maneira de ser. Orgulho-me de afirmar que foi deles e de meus pais que herdei tudo o que julgo mais importante em minha vida, inclusive um componente emocional, que não tenho constrangimento de revelar.

Portal – Como assim?

Papaléo - Esse componente emocional ocorreu e ainda ocorre em situações que se acham profundamente relacionadas à minha atividade profissional e à minha carreira científica. Dediquei-me no início à área de Cardiologia e à Cínica Médica, em meu consultório, no Hospital das Clínicas e no Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo. Paralelamente fiz um curso de matemática e estatística (áreas de cálculo integral e diferencial), fundamentais para minha formação científica e acadêmica. Esses estudos não somente abriram um campo de interpretação e realização de trabalhos científicos, como para orientação de dissertações de mestrado e teses de doutorado da área de medicina e em outros ramos do setor saúde. Tendo por base esses conhecimentos adquiridos defendi tese de doutorado com 40 anos de idade, e de livre-docência em Clínica Médica, com 45 anos.

Portal – Tudo isso se relaciona à atividade que desenvolve...

Papaléo – Sem dúvida. É realmente um fato, e está profundamente relacionado à minha atividade desenvolvida no trabalho em benefício da população idosa. Vale a pena esclarecer que há 25 anos aproximadamente, foi

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despertado em mim o interesse pela Geriatria, e logo em seguida pela Gerontologia. Hoje posso dizer que procuro ser muito mais um gerontólogo do que um geriatra, sem nunca esquecer que continuo sendo um médico.

Portal – Uma visão interdisciplinar, portanto?

Papaléo - Lembro sempre a quem me quiser ouvir: desde que se iniciou em mim o interesse pela Ciência do Envelhecimento, a visão para dar atenção à saúde da pessoa idosa tem que ser prioritariamente interdisciplinar. Essas duas ciências caminham juntas ou, em última análise, elas são indissociáveis. Portal – O sr., que é médico, admite certa resistência de profissionais de sua categoria em relação à Gerontologia?

Papaléo – É preciso que fique claro que essa resistência, embora existente, não é de todos os médicos. A maioria dos geriatras já admite a importância da Gerontologia. Ela é uma realidade com a qual temos que trabalhar em benefício daqueles que merecem o máximo de nossa atenção – as pessoas idosas. Vou mais adiante: em minhas aulas defendo que no futuro será uma realidade a denominação Ciência do Envelhecimento, que irá congregar a Geriatria e todos os demais ramos da Gerontologia.

Portal – O senhor é considerado referência na Geriatria brasileira por vários motivos, que gostaríamos que fossem esclarecidos mais adiante. Credita a feminização da velhice ao fato de que a mulher se cuida mais?

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Papaléo - É verdade, as estatísticas mostram em todo o mundo que a mulher tem uma sobrevida de cinco a sete anos maior que o homem. Um dos motivos é justamente este. As mulheres, desde a juventude, cuidam melhor de sua saúde. Os homens, pelo contrário, em sua maioria, desde a adolescência, com muita frequência se submetem a vários fatores de risco, como tabagismo, etilismo, acidentes os mais diversos etc. Infelizmente, as mulheres hoje se submetem a alguns fatores de risco como, por exemplo, o tabagismo.

Portal – O sr. comentava que a emoção é parte integrante da vida. Como isso

se dá?

Papaléo – Sinto que enquanto tiver comigo esse sentimento, mais vivo me sentirei. Normalmente, quando vou falar em público tenho certa dificuldade de me controlar. Por vezes ocorre em determinadas situações. É preciso que fique claro que não tenho dificuldade em dar aulas, pois elas fazem parte de meu dia a dia. Em algumas

ocasiões, no entanto, as emoções me dominam. Recentemente fui homenageado na Câmara dos Vereadores de São Paulo. Recebi um diploma, destacando o trabalho que executo em benefício da população idosa, e a Medalha Anchieta, pelo mesmo motivo. Estavam presentes representantes de entidades médicas. Já fui homenageado outras vezes, inclusive na PUC, no Ministério da Saúde, no Ministério da Justiça, na Terceira Conferência dos Direitos da Pessoa Idosa e no último Congresso da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia. É lógico que essas e outras homenagens são motivos suficientes para me emocionar. Ratifico que revelar emoções não me deixa constrangido.

Portal - Onde o sr. estudou?

Papaléo - Fiz o primário no Grupo Escolar Rodrigues Alves, na avenida Paulista, e o secundário no Colégio Ipiranga. Passei no vestibular e estudei Medicina na USP.

Portal - Em que época?

Papaléo - De 1948 a 1953. Comecei na Clínica Médica, depois me especializei em Cardiologia. Trabalhei no Hospital das Clínicas, no Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo, e tive consultório até os 70 anos de idade. Portal - E sobre os livros?

Papaléo - Em 1994, com Urbano Pasini e Eurico Tomás de Carvalho Filho, editei e escrevi, o que talvez tenha sido o primeiro livro de Geriatria no país, “Geriatria, fundamentos, clínica e terapêutica”, que tem 36 capítulos; em 1996, voltado à área da Gerontologia, escrevi e editei o livro “Gerontologia”, com 46

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capítulos; em 2001, o livro “Urgências em Geriatria”, com Francisco Carlos de Brito; em 2005, a segunda edição do livro de Geriatria, com 72 capítulos, e em 2007 o “Tratado de Gerontologia”, com 72 capítulos; em 2010, com Francisco Carlos de Brito e Luciano Ricardo Giacaglia, o livro “Tratado de Medicina de Urgência em Idosos”, com 69 capítulos.

Portal - Gostaríamos de voltar a perguntar sobre a importância da interdisciplinaridade no atendimento à pessoa idosa.

Papaléo - O idoso frequentemente tem que ser atendido por diversas áreas. Não é possível ao médico impor um tratamento, pois as questões relativas ao idoso são muito mais amplas. Por isso, defendo a interdisciplinaridade, que é o grande caminho que temos a seguir, a grande contribuição que todos nós podemos dar a essa causa. E ressalto que a interdisciplinaridade é diferente da multidisciplinaridade. Na multi, o idoso é encaminhado para profissionais distintos, e na inter o trabalho é frequentemente realizado em conjunto. O caminho não é fácil, mas sou otimista e percebo que um esforço conjunto tem tudo para dar certo.

Portal - E há certa urgência, pois o Brasil está envelhecendo. O senhor concorda?

Papaléo - A adoção dessa forma de atuação conjunta de todos os profissionais da área da Ciência do Envelhecimento tem que ser implementada o mais rapidamente possível, justamente porque o número de idosos em todo o mundo aumenta acentuadamente, particularmente nos países em desenvolvimento. Os exemplos são muitos. Nosso grande arquiteto, Oscar

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Niemeyer, já passou dos 100 anos, e parece que se encontra perfeitamente lúcido. O cardeal dom Eugênio Sales morreu recentemente com 91 anos. É comum vermos pessoas, com 80 anos ou mais, em intensa vida produtiva, profissional e intelectualmente. Eu mesmo, que tenho 83 anos, vim ao Programa de Gerontologia da PUC pedir a colaboração de profissionais tão competentes para escrevermos juntos um livro sobre a quarta idade. Ressalto ainda que na Grécia a sabedoria estava ligada à idade, pois uma parcela de filósofos tinha mais de 80 anos. E isso pode ser observado em várias áreas do conhecimento humano. Ressalto outro exemplo: Giuseppe Verdi, que aos 82 anos compôs sua última ópera.

Portal - No dia a dia encontramos exemplos semelhantes...

Papaléo - Sem dúvida. Há um grande número grande de pessoas ativas e perfeitamente lúcidas. Os dados indicam o crescimento da proporção de pessoas com 80 anos ou mais. Esse é o motivo pelo qual justifica-se a denominação de quarta idade e estudos mais aprofundados sobre essa faixa etária.

Portal - O livro está previsto para quando?

Papaléo - Creio que estará pronto para ser lançado daqui a dois anos, se possível no próximo Congresso Brasileiro de Geriatria e Gerontologia.

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Papaléo - A mulher consegue ter muito mais cuidado com a própria saúde. Não há dúvida de que a velhice masculina e a velhice feminina são diferentes. A velhice masculina sempre foi deixada um pouco de lado, e é importante que seja valorizada e receba a mesma atenção. Apesar de a mulher ter às vezes duas jornadas de trabalho, ou talvez por causa disso, ela se cuida mais. O homem perde a autonomia mais cedo, e a mulher será a sua grande cuidadora, e acaba sofrendo muito com isso. Como o homem morre mais cedo, ela vive mais tempo solitariamente.

Portal - E o contrário, ocorre?

Papaléo - Nem sempre, pois o homem, se fica viúvo, casa-se com outra pessoa, e não é incomum vermos que se casa com uma pessoa muito mais jovem. Em resumo, nossa luta é para que as distintas velhices sejam igualmente assistidas. Do mesmo modo que a Geriatria e a Gerontologia não podem se distanciar, a velhice feminina e a masculina merecem toda a nossa compreensão, colaboração e esforços. Os motivos do esforço para lançar um livro com esse conteúdo – já posso dizer extenso – são mais que evidentes. É por isso que procuro contar com a colaboração de profissionais da PUC, sempre presente nas publicações anteriormente citadas. Estou seguro que, além da PUC, várias áreas de conhecimento serão convidadas e estarão prontas a colaborar.

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Guilherme Salgado Rocha - Jornalista e revisor. Formado pela Universidade Federal de Juiz de Fora (MG) em 1979, tem 53 anos. Desde dezembro 2011 passou a integrar a equipe do Portal do Envelhecimento. E-mail:

rochaguilherme@hotmail.com

Alessandra Anselmi - Profissional de Comunicação e Marketing formada em Relações Públicas pela Metodista em 1996 e em Marketing e Vendas pela Anhembi Morumbi em 2012. Mais de dez anos de experiência em Comunicação, Marketing e Eventos, atuando também com Locução e Fotografia. Atualmente trabalha como repórter fotográfico para o Portal do Envelhecimento e é responsável também pela Comunicação e Marketing da Ong OLHE - Observatório da Longevidade Humana e Envelhecimento. E-mail: a.alesp11@gmail.com

Referências

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