• Nenhum resultado encontrado

Estimulação Cerebral Profunda na Epilepsia

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Estimulação Cerebral Profunda na Epilepsia"

Copied!
75
0
0

Texto

(1)

2011/2012

Tânia Filipa Fernandes Pires Afonso

Estimulação Cerebral Profunda na Epilepsia

(2)

Mestrado Integrado em Medicina

Área: Neurocirurgia

Trabalho efetuado sob a Orientação de:

Dr. Paulo José de Campos Linhares Vieira

Trabalho organizado de acordo com as normas da revista:

Sinapse

Tânia Filipa Fernandes Pires Afonso

(3)
(4)
(5)

AGRADECIMENTOS

(6)

FACULDADE DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE DO PORTO HOSPITAL DE S.JOÃO,PORTO

Estimulação Cerebral

Profunda na Epilepsia

Afonso Tânia *, Linhares Paulo**

* Aluna do 6º ano do Mestrado Integrado em Medicina da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto.

** Assistente Hospitalar do Serviço de Neurocirurgia do Hospital de S. João; Assistente Convidado da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto.

Correspondência para:

Departamento de Neurociências Clínicas e Saúde Mental Alameda Prof. Hernâni Monteiro

(7)

RESUMO

INTRODUÇÃO: A Epilepsia é uma perturbação neurológica crónica comum, que afeta 50 milhões de pessoas em todo o mundo. Cerca de um terço destes doentes não respondem aos fármacos antiepiléticos. A Epilepsia refratária ao tratamento médico é uma doença complexa que muitas vezes escapa ao potencial curativo das abordagens cirúrgicas ablativas convencionais. A estimulação elétrica do sistema nervoso é um tratamento em rápido desenvolvimento para a epilepsia refratária, representando uma opção terapêutica reversível adicional para doentes que de outra forma não seriam candidatos a cirurgia. OBJETIVOS: Este trabalho pretende clarificar o papel da estimulação cerebral profunda no tratamento da epilepsia, que alvos e parâmetros de estimulação garantem o melhor controlo das crises e de que forma a estimulação cerebral profunda exerce o seu efeito antiepilético. DESENVOLVIMENTO: A estimulação terapêutica pode fazer-se de forma direta como acontece na estimulação cerebral profunda, ou indireta como é o caso da estimulação de nervos periféricos. Várias estruturas cerebrais e núcleos específicos tais como os núcleos talâmicos, os gânglios da base, o cerebelo e estruturas do lobo temporal foram investigadas como alvos para a estimulação cerebral profunda. Os dados da literatura apontam para um claro benefício desta técnica em casos selecionados de epilepsias refratárias. É feita uma descrição destas situações, tendo em conta a sua clínica, fisiopatologia e tratamento.

CONCLUSÕES: As indicações e resultados da estimulação cerebral profunda, no tratamento da epilepsia, não se encontram totalmente validados e os objetivos terapêuticos devem permanecer paliativos. A estimulação cerebral profunda deve ser considerada uma terapia inovadora que com estudos mais extensos integrará definitivamente o leque de opções de tratamento disponíveis.

Palavras-chave: estimulação cerebral profunda, epilepsia refratária, cirurgia da epilepsia, neuromodulação, tálamo, hipocampo.

(8)

ABSTRACT

INTRODUCTION: Epilepsy is a common chronic neurological disorder affecting 50 million people around the world. Up to one-third of these patients do not respond to antiepileptic medication. Medically refractory epilepsy is a complex disease that often evades cure by longstanding resective surgical approaches. Electrical stimulation of the nervous system is a rapidly evolving treatment for refractory epilepsy, offering a reversible, adjunctive therapeutic option for patients who otherwise are not surgical candidates.

OBJECTIVES: This paper aims to clarify the role of deep brain stimulation in epilepsy treatment, which targets and stimulation parameters grant the best seizure control and how deep brain stimulation exerts its antiepileptic effect.

THEORY: Therapeutic stimulation can occur directly via deep brain stimulation or indirectly via stimulation of peripheral nerves. Various brain structures and specific nuclei such as the thalamic nuclei, the basal ganglia, the cerebellum and temporal lobe structures have been investigated as target areas for deep brain stimulation. Literature data shows a clear benefit of this technique in selected cases of refractory epilepsy. A description of these conditions is made regarding its presentation, pathophysiology and treatment.

CONCLUSIONS: Indications and results of deep brain stimulation in epilepsy treatment are not fully validated and its therapeutic goals shall remain palliative. Deep brain stimulation shall be considered as an innovative therapy which, with further trials, will definitely be among the range of available treatment options.

Keywords: deep brain stimulation, refractory epilepsy, epilepsy surgery, neuromodulation, thalamus, hipoccampus.

(9)

ÍNDICE Agradecimentos ... 4 Título ... 5 Resumo ... 6 Abstract ... 7 Lista de abreviaturas... 10 Índice de tabelas ... 11 Introdução ... 12 Métodos ... 14 Epilepsia ... 15 Convulsões epiléticas ... 17

Classificação das convulsões ... 17

Convulsões Focais ... 19

Convulsões Generalizadas ... 19

Síndrome epilética ... 20

Epilepsia Refratária ... 25

Principais alternativas terapêuticas ... 29

Cirurgia ... 29

Neuromodulação ... 31

Estimulação do Nervo Vago ... 31

Estimulação Cerebral Profunda ... 34

Procedimento cirúrgico ... 34

Mecanismos de Ação ... 35

Potenciais alvos de estimulação ... 37

(10)

Núcleos da base ... 40 Cerebelo ... 42 Controlo direto... 43 Hipocampo ... 43 Parâmetros de estimulação ... 45 Efeitos adversos ... 49 Discussão/Conclusão ... 51 Referências Bibliográficas ... 54 Anexos ... 67

(11)

LISTA DE ABREVIATURAS

AVC – Acidente vascular cerebral ECP – Estimulação cerebral profunda ENV – Estimulação do nervo vago FDA – US Food and Drug Administration ILAE – International League Against Epilepsy NAT – Núcleo anterior do tálamo

NC – Núcleo caudado

NCM – Núcleo centromediano NST – Núcleo subtalâmico

PET – Posítron emission tomography SNC – Sistema nervoso central TSM – Transecção subpial múltipla

(12)

ÍNDICE DE TABELAS

Tabela I – Classificação das convulsões……… 17

Tabela II - Síndromes epiléticas organizadas em função da idade/condições

relacionadas………. 21

Tabela III - Categorização do outcome para qualquer intervenção terapêutica na

epilepsia……… 27

Tabela IV - Informação mínima necessária para determinar se a intervenção terapêutica

é adequada………... 28

(13)

INTRODUÇÃO

A Epilepsia é uma perturbação cerebral crónica que se caracteriza por convulsões recorrentes, que mais não são do que a tradução física de descargas elétricas excessivas, repentinas e geralmente breves, de um grupo de neurónios cerebrais (1-5).

As crises epiléticas podem apresentar-se de múltiplas formas, desde breves perdas de atenção a contrações musculares violentas involuntárias.

Reconhecida desde tempos imemoriais, a epilepsia afeta cerca de 50 milhões de pessoas em todo o mundo (1, 6). Indiferentes aos avanços da ciência e da medicina, o medo, a incompreensão, a discriminação e o estigma social que desde sempre envolveram a condição, persistem até aos nossos dias (7).

A sua incidência é de cerca de 50/100,000/ano, sendo ligeiramente superior nos países menos desenvolvidos. Estima-se uma prevalência da doença entre os 5-10/1000 (8, 9).

Apesar de terapêutica médica ótima, mais de um terço dos doentes com epilepsia, mantém atividade convulsiva ou debate-se com importantes efeitos laterais dos fármacos antiepiléticos (10-14). A epilepsia refratária associa-se a disfunção psicossocial, significativo comprometimento cognitivo, traumatismos e mesmo morte, afetando todas as esferas da vida do indivíduo, com repercussões importantes em termos da qualidade de vida do próprio e dos que lhe são próximos, o que reforça a necessidade de outras opções de tratamento nomeadamente a cirurgia (7, 10, 15, 16).

4,5% dos doentes são candidatos a cirurgia, variando as opções entre a cirurgia ressetiva, a cirurgia de desconexão e a cirurgia de estimulação (17).

O desejo de descobrir abordagens cirúrgicas menos invasivas, ou mesmo novas formas de tratamento para os doentes cuja condição não responde às modalidades existentes, renovou o interesse na neuromodulação (18). A estimulação do nervo vago e a estimulação cerebral profunda são as duas formas de neuromodulação mais utilizadas na

(14)

Desenvolvida em 1980, e aprovada em 1997 pela FDA (US Food and Drug Administration), a estimulação do nervo vago (ENV) é comprovadamente eficaz na epilepsia focal, mesmo nos doentes que não responderam à cirurgia ablativa (19, 20).

A estimulação cerebral profunda (ECP) com o sucesso alcançado no tratamento das doenças do movimento (21), aliado à reversibilidade, adaptabilidade e ao baixo risco de complicações (22), tornou-se uma opção terapêutica muito atrativa na epilepsia refratária (18, 23, 24).

Os principais objetivos desta revisão são:

 clarificar o papel da ECP no tratamento da epilepsia;

 perceber quais os melhores alvos cerebrais e parâmetros de estimulação para o controlo das convulsões;

 descrever os principais mecanismos de ação da ECP;

 avaliar a eficácia global da técnica nomeadamente no controlo das crises, na redução da necessidade de fármacos e na qualidade de vida dos doentes.

(15)

MÉTODOS

Para esta revisão bibliográfica fizeram-se pesquisas periódicas no Pubmed com os termos “deep brain stimulation”, “electrical stimulation”, “vagal nerve stimulation”, “thalamic stimulation”, “anterior thalamic nucleus”, “caudate”, “cerebellum”, “hippocampus” e “treatment” combinados com o termo “epilepsy”. Foram também pesquisadas as expressões “refractory epilepsy”, refractory epilepsy treatment”, “epilepsy surgery” e “epilepsy epidemiology”. A combinação dos termos “deep brain stimulation” e “mechanisms of action” foi também objeto de pesquisa.

A última pesquisa foi concluída em março de 2012. Os artigos a incluir foram selecionados a partir dos abstracts, com base na sua relevância. Só foram admitidas publicações em inglês e português. Foram também incluídos outros artigos identificados a partir de revisões prévias sobre o tema.

(16)

EPILEPSIA

Definição, epidemiologia, tipos de convulsões, síndrome epilética.

A epilepsia é um distúrbio cerebral caracterizado por uma predisposição persistente para gerar convulsões, e pelas consequências neurobiológicas, cognitivas, psicológicas e sociais desta condição. A definição de epilepsia requer a ocorrência de pelo menos uma convulsão epilética (2, 4, 5). Daqui se depreende, que um indivíduo com história de um único ou vários episódios convulsivos devidos a circunstâncias corrigíveis e/ou evitáveis não tenha, necessariamente, epilepsia.

A epilepsia afeta todas a faixas etárias, tem múltiplas causas e formas de apresentação muito diversas, com vários tipos distintos de convulsões e síndromes identificáveis (2).

O espetro de etiologias e fatores de risco varia em função da idade e da localização geográfica (2, 9, 25). As doenças genéticas, congénitas e do desenvolvimento associam-se sobretudo ao aparecimento de epilepsia na infância, adolescência e início da idade adulta. No adulto jovem, o desenvolvimento de neoplasias é um fator importante de epilepsia. Já acima dos 60 anos, o fator de risco mais comum para epilepsia é a doença cerebrovascular (2, 8, 25). Os traumatismos cranianos e as infeções do SNC (Sistema Nervoso Central) podem ocorrer em qualquer idade.

As infeções endémicas como a malária ou a neurocisticercose ocorrem particularmente nos países subdesenvolvidos (2, 8, 25).

As recomendações mais recentes (4, 26) sugerem a substituição dos termos idiopática, sintomática e criptogénica pelas seguintes designações e respetivos conceitos associados:

1. Genética: a epilepsia é entendida como o resultado direto de um defeito genético conhecido ou presumido, em que as convulsões representam o sintoma nuclear

(17)

2. Estrutural/metabólica: quando existe uma condição ou doença estrutural ou metabólica distinta, que se demonstrou estar associada a um aumento substancial do risco de desenvolver epilepsia. As lesões estruturais podem ser alterações adquiridas como o AVC (acidente vascular cerebral), o trauma e a infeção, ou de origem genética, como por exemplo nos casos de esclerose tuberosa em que há uma condição interposta entre o defeito genético e a epilepsia.

3. Causa desconhecida: a natureza da causa subjacente à epilepsia permanece desconhecida podendo ser genética, como estrutural ou metabólica.

(18)

CONVULSÕES EPILÉTICAS

Uma convulsão epilética define-se pela ocorrência transitória de sinais e/ou sintomas decorrentes da descarga hipersíncrona anormal de um grupo de neurónios cerebrais. É um evento transitório, demarcado no tempo, com início e fim óbvios (2-5).

A apresentação clínica depende do local de início no cérebro, dos padrões de propagação, da maturidade cerebral, de processos de doença intercorrentes/confundidores, do ciclo sono-vigília, da ingestão de fármacos e de uma variedade de outros fatores. As convulsões podem afetar as funções sensitiva, motora e autonómica; a consciência, o estado emocional, a memória, a cognição e o comportamento. (3, 4)

Determinar o tipo de convulsão é essencial para direcionar o diagnóstico para etiologias particulares, assim como para selecionar a terapêutica apropriada.

Classificação das convulsões

A ILAE (International League Against Epilepsy) Comission on Classification and Terminology 2005-2009, atualizou a classificação das convulsões [Tabela I] baseando-se nas suas características clínicas, e nos achados eletroencefalográficos associados (26, 27).

(19)

TABELA I – CLASSIFICAÇÃO DAS CONVULSÕES

Convulsões Focais:

Descritas com base nas suas características (por ex.: motoras, sensitivas, autonómicas ou outras). Convulsões Generalizadas: > Ausência; > Tónico-clónica; > Clónica; > Tónica; > Atónica; > Mioclónica. Convulsões Inclassificáveis: > Espasmos epiléticos.

Nem todos os tipos de convulsões se enquadram nas designações focal e/ou generalizada. Até que se obtenha informação adicional que permita uma

classificação válida, devem permanecer “inclassificáveis” sendo que esta designação não representa uma categoria.

TABELA CONSTRUÍDA COM BASE EM

(20)

CONVULSÕES FOCAIS

As convulsões focais têm origem em redes neurais confinadas a um único hemisfério cerebral. Surgem a partir de uma rede neural discretamente localizada, ou mais amplamente distribuída mas também confinada a um único hemisfério. Dependendo da existência de comprometimento cognitivo, podem descrever-se como convulsões focais com ou sem características discognitivas. Esta terminologia veio substituir as subcategorias “focal simples” e “focal complexa” (2, 3, 5, 26, 27).

As convulsões epiléticas focais podem evoluir para convulsões generalizadas (antes denominadas secundariamente generalizadas). O novo sistema de classificação preconiza que sejam descritas em função do tipo de convulsão generalizada para que evoluem (tónica, clónica, tónico-clónica) (26, 27).

CONVULSÕES GENERALIZADAS

As convulsões generalizadas surgem em, e envolvem rapidamente, redes neurais bilateralmente distribuídas (2, 3, 26, 27). Alguns dos vários tipos de convulsões generalizadas podem, pelas suas características particulares, agrupar-se em categorias distintas (Ausência, Tónico-clónica, Clónica, Tónica, Atónica e Mioclónica) (27).

(21)

SÍNDROME EPILÉTICA

Uma Síndrome Epilética define-se como um conjunto de sinais e sintomas que definem uma condição clínica particular (27-29). São entidades clínicas distintas, identificáveis com base numa idade de início típica, características eletroencefalográficas particulares, tipos de convulsões ou outros aspetos que, quando conjuntamente avaliados, permitem um diagnóstico específico. Diagnóstico este com implicações quer em termos de abordagem terapêutica, quer em termos de prognóstico (27).

Da Tabela II constam as principais síndromes eletroclínicas atualmente reconhecidas, avaliadas em função de uma série de critérios previamente definidos, entre os quais a idade de início, os tipos de convulsões ou as características eletroencefalográficas interictais (5, 27, 29).

(22)

TABELA II – SÍNDROMES EPILÉTICAS* ORGANIZADAS EM FUNÇÃO DA IDADE/CONDIÇÕES RELACIONADAS

Período Neonatal

> Convulsões neonatais benignas familiares; > Encefalopatia mioclónica precoce;

> Síndrome de Ohtahara.

Lactentes

> Convulsões migratórias parciais do lactente; > Síndrome de West;

> Epilepsia mioclónica do lactente; > Convulsões infantis benignas; > Síndrome de Dravet;

(23)

Cont. - TABELA II – SÍNDROMES EPILÉTICAS* ORGANIZADAS EM FUNÇÃO DA IDADE/CONDIÇÕES RELACIONADAS

Infância

> Epilepsia occipital benigna da infância de início precoce (tipo Panayiotopoulos);

> Epilepsia com crises mioclono-astáticas;

> Epilepsia benigna da infância com descargas centrotemporais; > Epilepsia occipital da infância de início tardio (tipo Gastaut); > Epilepsia com ausências mioclónicas;

> Síndrome de Lennox-Gastaut;

> Encefalopatia epilética com descargas de espícula-onda contínuas durante o sono incluindo a síndrome de Landau-Kleffner;

> Epilepsia de ausência da infância.

Adolescência

> Epilepsia de ausência juvenil; > Epilepsia mioclónica juvenil;

(24)

Cont. - TABELA II – SÍNDROMES EPILÉTICAS* ORGANIZADAS EM FUNÇÃO DA IDADE/CONDIÇÕES RELACIONADAS

Relação com a idade menos específica

> Epilepsia do lobo frontal noturna autossómica dominante;

> Epilepsias familiares do lobo temporal;

> Epilepsia do lobo temporal mesial com esclerose hipocampal;

> Síndrome de Rasmussen;

> Crises gelásticas com hamartoma hipotalâmico.

Condições epiléticas especiais

> Epilepsias focais sintomáticas não especificadas de outra forma;

> Epilepsia apenas com crises tónico-clónicas generalizadas;

> Epilepsias reflexas; > Crises febris plus;

(25)

Cont. - TABELA II – SÍNDROMES EPILÉTICAS* ORGANIZADAS EM FUNÇÃO DA IDADE/CONDIÇÕES RELACIONADAS

Condições associadas a convulsões epiléticas que não requerem o diagnóstico de epilepsia

> Crises neonatais benignas;

> Crises febris.

*Critérios usados na avaliação de síndromes epiléticas: tipos de convulsões, idade de início das convulsões, progressão dos sintomas, achados no EEG

(eletroencefalograma) interictal, sintomas e sinais interictais associados, mecanismos fisiopatológicos/substratos anatómicos/categorias etiológicas, base genética.

(26)

EPILEPSIA REFRATÁRIA

Apesar da importância da sua identificação, não tem sido fácil chegar a um consenso quanto à definição precisa de epilepsia refratária. Têm sido vários os critérios utilizados para a definir, e nenhuma definição serve todos os propósitos (30). Num sentido estrito, incluem-se na definição de epilepsia refratária todos os casos em que não é possível controlar completamente a atividade convulsiva.

O quadro global da definição da ILAE compreende dois níveis hierárquicos (31, 32): Nível 1: fornece um esquema geral para categorizar o outcome de qualquer intervenção terapêutica na epilepsia, e serve de base ao nível 2. As diferentes categorias incluem [Tabela III]:

1. Ausência de convulsões: ausência de qualquer tipo de convulsão durante 12 meses, ou durante um período de tempo três vezes superior ao maior intervalo entre convulsões verificado antes da intervenção.

2. Falha terapêutica: o doente não fica livre de convulsões após intervenção terapêutica adequada [Tabela IV].

3. Outcome indeterminado: quando não existe informação suficiente para determinar o resultado de uma intervenção em termos do controlo das convulsões, da ocorrência de efeitos adversos ou de ambos.

Nível 2: define epilepsia fármacorresistente – o esquema terapêutico adequado de dois fármacos antiepiléticos tolerados e corretamente escolhidos (usados quer em monoterapia, quer combinados), falha em alcançar ausência sustentada de convulsões – definida no Nível 1.

A epilepsia refratária tem repercussões várias na vida dos indivíduos afetados, influenciando as suas interações familiares e sociais, a progressão em termos educativos, a

(27)

qualidade de vida. O impacto dos efeitos laterais dos fármacos antiepiléticos na qualidade de vida do doente pode mesmo superar o impacto do número absoluto de convulsões (16).

As perturbações de humor, nomeadamente a depressão major, parecem ser mais prevalentes nos indivíduos com convulsões recorrentes e mesmo nos doentes com epilepsia controlada, do que na população geral (16, 33).

A mortalidade é duas a três vezes superior à da população geral (34), com um risco aumentado de morte prematura (35). A mortalidade secundária a acidentes relacionados com as convulsões (36) e a morte súbita associada à epilepsia (37) são particularmente preocupantes, e o risco de suicídio destes doentes é superior ao da população geral (38).

Os fatores acima mencionados sugerem de forma clara que para certas formas de epilepsia, e após a falha de esquemas terapêuticos adequados em alcançar o controlo das convulsões, a terapêutica médica continuada não é a melhor opção.

Assim, o reconhecimento da epilepsia refratária torna-se particularmente importante nas situações em que o substrato patológico prediz, por um lado, a resistência ao tratamento médico e por outro o reconhecido benefício da cirurgia como, por exemplo, na esclerose do hipocampo (16, 39).

(28)

TABELA III – CATEGORIZAÇÃO DO OUTCOME† PARA QUALQUER INTERVENÇÃO

TERAPÊUTICA NA EPILEPSIA_NÍVEL 1 do quadro global da ILAE para a definição de

epilepsia fármacorresistente.

1. AUSÊNCIA DE CONVULSÕES

A. Efeitos laterais: não B. Efeitos laterais: sim

C. Efeitos laterais: indeterminado

1A 1B 1C 2. FALHA TERAPÊUTICA

A. Efeitos laterais: não B. Efeitos laterais: sim

C. Efeitos laterais: indeterminado

2A 2B 2C 3. OUTCOME INDETERMINADO

A. Efeitos laterais: não B. Efeitos laterais: sim

C. Efeitos laterais: indeterminado

3A 3B 3C

† a nomenclatura numérica e alfabética das categorias não implica qualquer gradação ou hierarquia.

Adaptada de Kwan et al (31)

(29)

TABELA IV – INFORMAÇÃO MÍNIMA NECESSÁRIA PARA DETERMINAR SE A INTERVENÇÃO TERAPÊUTICA É ADEQUADA.

 Natureza da intervenção (por exemplo: tipo de fármaco antiepilético usado).  Modo de aplicação:

o Formulação; o Dose;

o Intervalo entre as doses; o Compliance.

 Duração da exposição.

 Ocorrência de convulsões e/ou efeitos laterais durante a intervenção.  Existência ou não de esforços para otimização da dose.

 Razões para a descontinuação (se aplicável): o Controlo não satisfatório das convulsões; o Efeitos adversos;

o Ausência sustentada de convulsões;

o Razões psicossociais (por exemplo: planeamento de gravidez); o Razões administrativas (perda de follow-up ou outras);

o Razões financeiras (impossibilidade de custear o tratamento); o Opção do doente e/ou cuidador;

o Outras. Adaptada de Kwan et al (31)

(30)

PRINCIPAIS ALTERNATIVAS TERAPÊUTICAS

CIRURGIA

Ainda que a terapêutica médica permaneça a opção de primeira linha no tratamento da epilepsia, em doentes criteriosamente escolhidos, a cirurgia pode controlar as convulsões, melhorar a qualidade de vida e reduzir os custos da terapêutica médica (40-42) permitindo o controlo eficaz da doença a longo prazo (43).

Embora tradicionalmente se considerassem as convulsões focais com origem no lobo temporal como o grupo que mais beneficiaria com a cirurgia, todas as síndromes e todos os tipos de convulsões que se mostrem resistentes ao tratamento médico devem, até prova em contrário, ser vistos como potenciais candidatos cirúrgicos (39).

Dependendo da síndrome epilética e da capacidade de definir claramente e remover na totalidade o foco epileptogénico, 30 a 85% dos doentes submetidos a cirurgia permanecem livres de convulsões (17).

O tratamento cirúrgico da epilepsia baseia-se na ideia de que a remoção, lesão ou interrupção das conexões do local do cérebro capaz de gerar convulsões resulta na redução ou cessação completa das mesmas (17, 39).

Em geral, doentes com lesões estruturais tais como tumores ou malformações vasculares devem ser primariamente tratados com recurso à cirurgia. Também nos doentes com um foco epilético localizado, que não respondem ao tratamento médico, a abordagem cirúrgica deve ser ponderada.

Os procedimentos cirúrgicos podem encarar-se como curativos ou paliativos (44). Os procedimentos curativos adequam-se a doentes com focos localizados numa região cortical específica em que é possível a sua remoção de forma segura, e sem que daí resulte um défice neurológico permanente como é o caso da amigdalohipocampectomia (45).

A cirurgia paliativa tem interesse quando não é possível identificar o foco ou quando este não pode ser removido, sendo o seu objetivo a redução da frequência e gravidade das

(31)

As potenciais contraindicações para o tratamento cirúrgico ressetivo incluem (46): múltiplos focos envolvidos na génese das convulsões, impossibilidade de localizar satisfatoriamente o foco epileptogénico, sobreposição da zona epileptogénica e córtex funcional, o doente não reunir condições anestésicas ou cirúrgicas. Em suma, a resseção cirúrgica não é a opção ideal para todos os doentes com epilepsia refratária. É um procedimento invasivo e irreversível, com resultados modestos na ausência de alterações imagiológicas e perante focos difusos, e que acarreta um risco não negligenciável de declínio neurológico ou neuropsicológico no pós-operatório (18).

(32)

NEUROMODULAÇÃO

A neuromodulação representa uma alternativa terapêutica para os doentes que não respondem aos fármacos antiepiléticos ou que não beneficiariam da resseção cirúrgica.

Na epilepsia, a neuroestimulação tem como principal objetivo reduzir a probabilidade de ocorrência e/ou a propagação das convulsões, quer através da manipulação de sistemas de controlo remoto (estimulação do nervo vago, estimulação cerebral profunda), quer interferindo com a própria zona epileptogénica – controlo direto (47, 48).

Estudos recentes sobre a estimulação direta do foco epilético demonstraram um decréscimo na atividade epilética interictal, bem como a redução da frequência das convulsões (47, 49).

Estas técnicas têm a vantagem de abordar diretamente os substratos neuroanatómicos que se julga estarem envolvidos na génese e propagação das convulsões, e de minimizarem os potenciais efeitos adversos dos procedimentos cirúrgicos convencionais (45).

Em teoria, a neuromodulação permite também que o controlo das convulsões seja adaptado ao doente, e ao seu tipo específico de epilepsia (48).

Estimulação do Nervo Vago (ENV)

A ENV é um tratamento sintomático adicional para doentes com epilepsia focal refratária (46).

O dispositivo eletrónico foi aprovado pela FDA em 1997 para utilização na epilepsia focal, em doentes com idade igual ou superior a 12 anos (20). Consiste na estimulação elétrica intermitente do nervo vago esquerdo, por meio de um elétrodo helicoidal e de um gerador de impulsos implantável e programável (46).

A implantação do gerador sob a clavícula esquerda pode ser feita em ambulatório com anestesia local e a colocação dos elétrodos no nervo vago esquerdo no pescoço,

(33)

O dispositivo é programável a partir do exterior. É geralmente programado para períodos de estimulação de 30 segundos com intervalos de 5 minutos, com pulsos de 250 a 500 Hz de duração e 0,25 a 3,5 mA de amplitude (50, 51). Se a programação convencional não for eficaz pode tentar-se a estimulação com ciclos rápidos - intervalos de estimulação inferiores a 180 segundos (52). O normal período de vida da bateria varia entre 5 a 10 anos (50).

O próprio doente, durante a aura ou no início da convulsão pode, utilizando um íman que ativa o estimulador, aplicar um impulso elétrico, diminuindo a gravidade ou abortando mesmo a atividade convulsiva (50).

O nervo vago tem projeções para o tálamo, amígdala, e prosencéfalo através do núcleo do trato solitário, e para outras áreas corticais através da formação reticular medular (53).

Os estudos através de PET (positron emission tomography) e ressonância magnética funcional dos efeitos da ENV no homem confirmaram a influência do nervo vago sobre estruturas cerebrais superiores. De um modo geral, mostraram que durante a estimulação do nervo vago há alterações importantes do fluxo sanguíneo para regiões cerebrais que correspondem às projeções sinápticas anatómicas do nervo, e que o tálamo está consistentemente envolvido (54-56).

A ENV reduz a sonolência diurna independentemente do controlo das convulsões o que sugere a ativação de regiões cerebrais colinérgicas e outras, envolvidas na vigília (57).

A ENV tem resultados favoráveis em 30 a 50% dos doentes, com uma redução de cerca de 50% da atividade convulsiva (58).

Para além do seu efeito anticonvulsivante a curto prazo, se continuada no tempo a eficácia da estimulação elétrica aumenta, sugerindo um efeito adicional de neuromodulação (14).

A ENV é geralmente bem tolerada. Os efeitos adversos mais comuns como tosse, rouquidão e dor de garganta, relacionam-se com a estimulação e tendem a melhorar com o

(34)

esternocleidomastoideu e a bradicardia transitória ou assistolia são complicações raras mas que podem surgir aquando da implantação (19).

(35)

ESTIMULAÇÃO CEREBRAL PROFUNDA (ECP)

Definição, mecanismo de ação, alvos e parâmetros de estimulação.

Clinicamente, o termo ECP refere-se à estimulação elétrica de estruturas subcorticais, com corrente pulsada de elevada frequência, de forma a modificar o seu output funcional (60).

Datado de 1973, o primeiro ensaio da estimulação cerebral para o tratamento da epilepsia demonstrou uma redução da frequência das convulsões na sequência de estimulação cerebelar subdural (47).

Embora o córtex desempenhe um papel crucial na génese das convulsões, a evidência acumulada salientou a importância de estruturas subcorticais na expressão clínica, propagação e controlo das crises epiléticas no ser humano (61). Com base em achados experimentais, a ECP foi aplicada a vários alvos cerebrais entre os quais o cerebelo, diferentes núcleos do tálamo e várias estruturas dos núcleos da base (48).

A estimulação de núcleos profundos com amplas conexões com estruturas corticais torna a ECP uma modalidade particularmente atrativa na epilepsia multifocal (62).

PROCEDIMENTO CIRÚRGICO

A cirurgia da ECP consiste na implantação de um elétrodo de estimulação cerebral num dos núcleos profundos do cérebro, utilizando uma técnica cirúrgica estereotáxica. A localização intraoperatória das estruturas cerebrais é feita por microrregisto e muitas vezes também pela avaliação dos efeitos laterais induzidos pela estimulação intraoperatória. Os componentes incluem dois elétrodos, os cabos de ligação e um gerador de impulso implantável (60).

(36)

MECANISMO DE AÇÃO

Apesar da crescente utilização da técnica na prática clínica, o mecanismo pelo qual a estimulação elétrica poderá controlar a atividade epilética permanece por esclarecer (47).

Tem-se vindo a reconhecer que, ao nível das redes córtico-subcorticais, vários circuitos envolvendo estruturas corticais e dos núcleos da base desempenham um papel de relevo na epileptogénese. Com base neste princípio, pode encarar-se a estimulação elétrica dos “retransmissores” anatómicos destas redes como um controlo remoto da génese e/ou propagação da atividade epilética. Em alternativa, pode-se estimular diretamente a área que se presume ser o foco epileptogénico – controlo direto.

As teorias acerca do efeito da estimulação elétrica centram-se em duas hipóteses: a hipótese neuroquímica, segundo a qual a estimulação levaria a uma libertação preferencial de neurotransmissores inibitórios (47); e a hipótese elétrica que presume que a estimulação inativa os neurónios na vizinhança do elétrodo por bloqueio da despolarização e falha subsequente dos canais de sódio (47, 63).

A interferência com a libertação sináptica de neurotransmissores é outro dos possíveis mecanismos pelos quais a estimulação elétrica é capaz de abortar convulsões. Os efeitos sobre as convulsões são comprovadamente dependentes da frequência, intensidade e duração da estimulação. A estimulação de elevada frequência (25-200 Hz), durante poucos segundos, resulta na depressão da transmissão sináptica traduzida pela redução da amplitude dos potenciais pós-sinápticos excitatórios (64). Este fenómeno deveu-se provavelmente à depleção do pool de vesículas sinápticas prontas a libertar, embora possam também estar envolvidos outros mecanismos pré e pós-sinápticos, tais como a dessensibilização dos recetores de glutamato e a modulação através de recetores pré-sinápticos. Foi demonstrado que a estimulação afeta somente os neurónios adjacentes à área onde a corrente elétrica é aplicada e não os mais distantes, interrompendo deste modo o circuito e as redes epiléticas que provocam as convulsões (64).

(37)

central). Este efeito é mais provável por exemplo em situações em que estão envolvidas estruturas cruciais nas redes epileptogénicas, como é o caso do núcleo anterior do tálamo (65).

É possível que a estimulação direta do foco epilético também afete a rede epileptogénica, o que pode acontecer devido à ativação de projeções inibitórias ou através da inibição de projeções excitatórias (18).

Alguns autores defendem que a estimulação elétrica não é realmente necessária, e que a eficácia da técnica se baseia na lesão provocada pela inserção do elétrodo (efeito de microtalamotomia) (66, 67). O estudo multicêntrico randomizado SANTE® (Stimulation of the Anterior Nucleus of the Thalamus) excluiu um mero efeito de microtalamotomia, sugerindo que o efeito da estimulação elétrica é independente do da cirurgia de implantação (68).

(38)

POTENCIAIS ALVOS DE ESTIMULAÇÃO

A maioria dos alvos de estimulação elétrica são núcleos cerebrais profundos com amplas conexões. Estas ligações permitem que a estimulação dos núcleos profundos module as áreas do córtex que produzem a atividade convulsiva (62, 69).

Controlo Remoto TÁLAMO

Com o objetivo de suprimir as convulsões estimularam-se vários núcleos do tálamo, principalmente o núcleo anterior e o núcleo centromediano. Ainda que limitada, existe alguma evidência de estudos em animais de que a estimulação destas estruturas pode influenciar o limiar para as convulsões. Por outro lado, há evidência clínica de que a estimulação contínua destes núcleos em doentes epiléticos reduz a frequência e a gravidade das convulsões (48).

NÚCLEO CENTRO-MEDIANO (NCM)

O núcleo centro-mediano participa, através de conexões difusas para várias regiões corticais incluindo o lobo temporal mesial, na regulação de estruturas envolvidas na génese das convulsões generalizadas (70).

O primeiro estudo do NCM (71) enquanto alvo de estimulação envolveu uma série de 5 doentes com convulsões generalizadas ou multifocais refratárias e constatou uma redução substancial, tanto clinicamente como no eletroencefalograma, da frequência das convulsões.

Mais recentemente, um estudo de follow-up de 13 doentes com Síndrome de Lennox-Gastaut mostrou uma redução global de 80% da frequência de convulsões 18 meses após a implantação, associada a melhoria funcional significativa e sem efeitos laterais associados. Os casos mais graves foram os que aparentemente melhor responderam à estimulação (72).

(39)

generalizadas durante o período de estimulação do NCM. Na ausência de estimulação verificou-se um decréscimo de 8%. As diferenças encontradas não foram contudo estatisticamente significativas (73).

NÚCLEO ANTERIOR DO TÁLAMO (NAT)

Comparativamente a outras estruturas subcorticais, o NAT é uma estrutura relativamente grande e bem definida para a estereotaxia, o que faz dele um alvo particularmente atrativo (23). Tem múltiplas projeções para inúmeras estruturas nomeadamente o córtex do cíngulo, a amígdala, o hipocampo, o córtex orbitofrontal e o núcleo caudado, e recebe aferências dos corpos mamilares integrando o circuito de Papez.

Têm sido usados vários modelos animais para o esclarecimento dos mecanismos de ação da ECP, nomeadamente da participação do NAT na propagação de alguns tipos de convulsões e para avaliar a sua potencial utilização no tratamento da epilepsia. Os modelos animais de epilepsia utilizaram, entre outros, pentilenotetrazol, picrotoxina, bicuculina e cainato para a indução de convulsões.

A ECP de alta frequência (100 Hz) do núcleo anterior do tálamo aumenta o limiar convulsivo num modelo de convulsões induzidas por pentilenotetrazol (74). Já a ECP de baixa frequência (8 Hz), mostrou ser epileptogénica (74, 75).

Após a supressão com etossuximida das convulsões induzidas por pentilenotetrazol, o metabolismo da glicose no NAT aumenta, o que suporta o papel deste núcleo na propagação da atividade convulsiva (76). A interrupção bilateral, através de lesões eletrolíticas, dos tratos mamilotalâmicos protege da ação epileptogénica do pentilenotetrazol (77).

A estimulação bilateral do NAT pode também prolongar o tempo de latência para o estabelecimento do estado de mal epilético após a administração de pilocarpina (78).

Não obstante, e em face de resultados contraditórios, com alguns autores a referir benefício (78, 79), enquanto outros relataram aumento da frequência da atividade convulsiva

(40)

A estimulação do NAT em humanos para controlo da epilepsia foi primeiramente tentada por Cooper (81).

Em 1987, Upton et al., descreveram melhorias em quatro de seis doentes com epilepsia parcial intratável, após estimulação do NAT (82).

Subsequentemente, um estudo de 3 doentes tratados com estimulação bilateral do NAT mostrou uma redução de 75,4% na frequência das convulsões (83). Um outro estudo que envolveu 5 doentes com vários tipos de epilepsia (tónico-clónica generalizada, atónica, focal motora e focal com características discognitivas) demonstrou uma redução média de 53,8% na frequência das convulsões após estimulação intermitente bilateral do NAT (67). Curiosamente, a redução na frequência das convulsões verificou-se após a implantação dos elétrodos e antes da estimulação, sugerindo a possibilidade de um efeito lesional.

Outros pequenos estudos obtiveram resultados semelhantes com taxas de complicações minor ou aceitáveis (84-86).

Estes resultados culminaram num estudo multicêntrico randomizado (SANTE) que envolveu 110 doentes para tentar demonstrar a eficácia da estimulação bilateral do NAT (68). O ensaio foi feito com dupla ocultação, os elétrodos foram implantados em todos os doentes. Nos doentes do grupo de controlo o elétrodo permaneceu inativo durante 3 meses, nos doentes do grupo experimental foi ativado no primeiro mês.

Foi aplicada estimulação a 5V, com pulsos de 90 μseg durante um minuto, alternando com períodos de 5 minutos sem estimulação. Nos doentes do grupo experimental verificou-se uma redução das convulsões 29% superior à do grupo de controlo (68).

A mediana do decréscimo da frequência das convulsões foi de 14,5% no grupo de controlo e 40,5% no grupo experimental. Os benefícios da estimulação mantiveram-se durante todo o período de estudo, com uma mediana de 56% de redução da frequência das convulsões aos 2 anos. Oito dos doentes permaneceram livres de convulsões durante pelo

(41)

não beneficiaram com cirurgia ou estimulação do nervo vago prévias responderam favoravelmente à ECP (87).

Os autores do estudo notaram também que nos doentes com focos epiléticos localizados nos lobos frontal, parietal e occipital a estimulação do NAT não se associou a melhorias significativas. Os doentes com convulsões com origem no lobo temporal foram os que obtiveram melhores resultados com a estimulação bilateral do NAT: redução de 44,2% na frequência das convulsões por oposição à redução de 21,8% que se verificou no grupo de controlo (68).

Embora o número insuficiente de casos não tenha permitido a formulação de conclusões, nos casos de epilepsia difusa ou multifocal a ECP foi tendencialmente benéfica.(68)

Estes resultados fazem do NAT o alvo de estimulação melhor estabelecido para o tratamento da epilepsia até ao momento.

NÚCLEOS DA BASE NÚCLEO CAUDADO (NC)

O papel do núcleo caudado na modulação da atividade convulsiva foi sugerido por estudos em animais, que demonstraram que a estimulação deste núcleo resulta na diminuição da frequência e amplitude dos picos epileptiformes do hipocampo (88).

Em 1997, um estudo que envolveu 38 doentes constatou que a estimulação de baixa frequência (4-6 Hz) deste núcleo se associava a um decréscimo da atividade interparoxística, das descargas focais no neocórtex e nos focos epiléticos do lobo temporal medial, e à interrupção abrupta de descargas generalizadas ou em propagação (89).

Posteriormente, um estudo sobre os efeitos eletrofisiológicos da estimulação cerebral direta na epilepsia intratável demonstrou que a estimulação de baixa frequência do núcleo caudado suprime as descargas epiléticas subclínicas e reduz a frequência das convulsões generalizadas, das convulsões parciais complexas e das convulsões parciais

(42)

determinar se o núcleo caudado representa um alvo de estimulação viável no tratamento da epilepsia.

NÚCLEO SUBTALÂMICO (NST)

A experiência acumulada e o sucesso alcançado com a estimulação do núcleo subtalâmico para o tratamento da Doença de Parkinson avivaram o interesse na sua estimulação para o tratamento da epilepsia.

Acredita-se que a inibição da parte reticular da substância negra tem um forte efeito antiepilético. Uma vez que a substância negra recebe projeções do núcleo subtalâmico, e a estimulação deste núcleo aumenta o efeito inibitório da sua parte reticular (91).

O primeiro estudo da ECP do núcleo subtalâmico em doentes com epilepsia refratária ao tratamento médico data de 2001 (92). Dos três casos submetidos a estimulação, um dos doentes tinha uma displasia cortical focal, o segundo tinha epilepsia mioclónica e o terceiro tinha epilepsia frontal bilateral. Verificou-se uma redução significativa da frequência das convulsões em todos os doentes. Nos primeiros 2 casos, a percentagem de redução ascendeu aos 83% e 50% respetivamente (92).

Desde então, os resultados dos vários estudos da ECP do NST para o tratamento da epilepsia não têm sido consensuais (93, 94).

Dos 5 doentes submetidos a estimulação em Grenoble (94), os 3 casos de epilepsia focal responderam favoravelmente com uma redução de 67% a 80% da frequência das convulsões. Nos restantes dois casos, um com epilepsia mioclónica e outro com síndrome de Dravet, o benefício da estimulação foi escasso ou mesmo nulo.

Recentemente, a estimulação do NST mostrou ser eficaz na epilepsia mioclónica progressiva (95).

Os estudos publicados indicam que o NST é um alvo terapêutico promissor em certas formas de epilepsia.

(43)

CEREBELO

O cerebelo foi a primeira estrutura não-cortical a merecer atenção como alvo potencial de modulação eletrofisiológica no tratamento da epilepsia (23).

Cooper (96), pioneiro na aplicação da estimulação do cerebelo ao tratamento da epilepsia, verificou que, após cerca de três anos de follow-up, 10 dos 15 participantes do seu estudo experimentaram uma diminuição da frequência das convulsões superior a 50%.

O maior estudo não controlado (97) objetivou uma redução da frequência das convulsões em 85% dos doentes. Dos 27 doentes submetidos a estimulação do cerebelo de longa duração (follow-up médio de 14,3 anos), 23 beneficiaram de um decréscimo global da frequência das convulsões. Curiosamente, à época do estudo, 12 destes doentes tinham um estimulador não-funcionante. Cinco dos casos estavam assim mesmo livres de convulsões, nos restantes constatou-se uma diminuição da frequência das crises.

Um ensaio clinico com dupla ocultação controlado por placebo (98) da estimulação crónica do cerebelo em 12 doentes com epilepsia refratária grave falhou em demonstrar o benefício terapêutico da intervenção. Ainda que onze dos doentes tenham considerado que a estimulação os ajudou, nenhuma redução da frequência das crises ocorreu que pudesse ser atribuída à estimulação.

Em 2005, um ensaio randomizado com dupla ocultação (99) que durante dois anos seguiu 5 doentes submetidos a estimulação do cerebelo, mostrou melhorias no controlo das convulsões. Foi aplicada estimulação de 10-Hz na superfície medial superior de ambos os hemisférios cerebelosos. No período inicial de três meses com dupla-ocultação verificou-se um decréscimo significativo das crises com a estimulação. Nos 6 meses subsequentes, em que todos os doentes foram estimulados, verificou-se uma redução de 41% das convulsões.

A estimulação do lobo anterior do cerebelo pareceu ser mais eficaz que a do lobo posterior. Pensa-se que a estimulação do cerebelo ativa as células de Purkinje, levando à inibição dos núcleos profundos do cerebelo e à redução das suas eferências excitatórias para o tálamo, condicionando a diminuição do output das projeções talamocorticais

(44)

Globalmente, os resultados da estimulação cerebelosa são contraditórios. Neste sentido não é ainda conhecida qual a frequência ótima de estimulação (alta ou baixa) e quais as melhores estruturas a estimular dentro do cerebelo (córtex superior medial ou núcleo denteado).

Controlo Direto HIPOCAMPO

A inibição da atividade epileptiforme por estimulação diretamente sobre o local de início das convulsões, ao invés de alterar ou influenciar as redes epiléticas subcorticais, pode ser uma alternativa (100).

A epilepsia do lobo temporal é a síndrome epilética focal mais comum e associa-se frequentemente a fármacorresistência (101). Mais de 70% dos doentes submetidos a resseção das estruturas do lobo temporal mesial, quer seletiva quer associada a lobectomia temporal anterior, ficam livres de convulsões (102). Porém, devido ao risco de lesão das áreas da memória e da linguagem, os casos em que as convulsões têm origem bilateral, ou aqueles em que existe um foco unilateral que se propaga ao hemisfério dominante não são, tradicionalmente, candidatos a cirurgia (103). Nestas situações, a estimulação do hipocampo impõe-se como uma potencial alternativa terapêutica.

Velasco e colaboradores (104) demonstraram que a estimulação do hipocampo na epilepsia refratária do lobo temporal permitia abolir as crises, e diminuía de forma significativa o número de picos interictais. Não observaram quaisquer alterações histopatológicas nos doentes posteriormente submetidos a resseção e constataram também que a estimulação resultava na hipoperfusão do hipocampo, apontando para a hipótese de que a estimulação condicionava inibição neuronal (104).

Em 2007, depois dos resultados favoráveis num estudo piloto que envolveu 3 doentes(105), Boon e colaboradores (106) apresentaram os resultados de 10 doentes com epilepsia do lobo temporal mesial tratada com ECP. Os elétrodos foram colocados

(45)

menos 50% das crises e um dos doentes ficou mesmo livre de convulsões (106). Em dois dos doentes verificou-se uma diminuição de 30-49% da frequência das convulsões e um dos casos não respondeu à estimulação. O único efeito adverso relatado foi uma hemorragia intracerebral assintomática detetada no estudo imagiológico de um dos doentes.

Os resultados do único estudo randomizado com dupla-ocultação da estimulação do hipocampo na epilepsia do lobo temporal (107) foram todavia mais modestos, com uma redução média de 15% das convulsões sem significado estatístico. O hipocampo continua, no entanto, a ser considerado como potencial alvo terapêutico na epilepsia do lobo temporal.

(46)

PARÂMETROS DE ESTIMULAÇÃO

Um dos principais problemas dos ensaios clínicos é que até ao momento não estão definidos os parâmetros ótimos de estimulação. A escolha dos parâmetros adequados depende do efeito pretendido. Por outro lado, a natureza paroxística da doença coloca desafios próprios. Se no tratamento das doenças do movimento é muitas vezes possível testar o efeito da ECP ainda durante a cirurgia de implantação, e assim determinar os melhores parâmetros para aquele doente; na epilepsia, os efeitos do tratamento só são visíveis a longo prazo (14).

A maioria dos protocolos que avaliaram a estimulação cerebral profunda no tratamento da epilepsia utilizaram parâmetros de estimulação derivados da literatura sobre ECP para as doenças do movimento. A ideia chave era reduzir a excitabilidade cerebral e, como consequência, suprimir as condições que favorecem a emergência de convulsões. Assim sendo, a ECP foi maioritariamente aplicada de forma contínua (estimulação open-loop), mostrando-se potencialmente benéfica em termos da frequência das convulsões em doentes com epilepsia refratária à terapêutica médica (108).

Contudo, a estimulação contínua pode não conseguir controlar a ocorrência de crises, e há até evidência que sugere a existência de um período refratário de cerca de 60 segundos durante o qual a estimulação não surte qualquer efeito (109) e pode mesmo agravar a ocorrência de convulsões, como foi demonstrado para a estimulação do NAT (80).

Embora em alguns estudos aparente ser menos eficaz que a estimulação contínua (110), a ECP intermitente programada, alternando períodos com e sem estimulação, pode mitigar este problema. Por outro lado, existe já alguma evidência de que a estimulação adaptativa (também conhecida por closed-loop) poderá ser eficaz no controlo das crises no ser humano (12, 48).

A estimulação adaptativa, contrariamente à contínua, não pretende diminuir cronicamente a excitabilidade cortical, mas antes abolir as convulsões aquando da sua ocorrência. Requer que o estimulador implantado esteja acoplado a técnicas de análise de

(47)

alterações eletroencefalográficas caraterísticas do início da atividade ictal (12, 24). Esta modalidade de estimulação parece particularmente apropriada na ECP de controlo direto.

A natureza paroxística das crises, a existência de períodos refratários durante a estimulação contínua, e a redução do consumo de energia a que se associa o prolongamento do tempo de vida útil da bateria são os principais incentivos à utilização da ECP adaptativa (14, 108, 111). Esta modalidade tem a desvantagem de ser mais um tratamento “anticonvulsões” do que antiepilético, de implicar o desenvolvimento de mecanismos que permitam detetar com precisão a atividade elétrica anormal, e de depender da determinação dos parâmetros ótimos de estimulação (108).

Para a ECP utilizam-se geralmente impulsos bipolares ortogonais sendo a frequência de 130 Hz a mais vezes empregue (14).

Cada alvo de estimulação tem as suas propriedades específicas e uma diversidade morfológica e biofísica de neurónios particular, pelo que é lógico pensar-se que tem de igual modo parâmetros ótimos de estimulação próprios. Para o cerebelo, a frequência mais vezes usada é de 10 Hz (96, 98, 99). Na estimulação do núcleo caudado obtiveram-se resultados favoráveis com frequências da ordem dos 4-8 Hz (89).

Nos restantes alvos explorados são geralmente empregues frequências altas, entre os 60-190 Hz (Tabela V). O recém-publicado estudo SANTE (68) obteve resultados encorajadores com uma frequência de 145 Hz.

(48)

TABELA V- ALVOS, PARÂMETROS E RESULTADOS DA ECP EM 20 ESTUDOS Autores, ano N.º de doentes Alvo Parâmetros de estimulação Redução da frequência de convulsões [nº de doentes / (%)] Fisher et al., 1992 7 NCM 65 Hz 4 / (57%) Velasco et al., 2006 13 NCM 130 Hz, 0.4-0.6 mA 10 / (77%)

Upton et al., 1987 6 NAT ND 4 / (66%)

Hodaie et al., 2002 5 NAT 100 Hz, 10 V 5 / (100%)

Kerrigan et al., 2004 5 NAT 100 Hz, 1-10 V 1 / (20%)

Lee et al., 2006 3 NAT ND 3 / (100%)

Osorio et al., 2007 4 NAT 175 Hz, 4.1 V 4 / (100%)

Lim et al., 2007 4 NAT 90-110 Hz, 4-5 V 4 / (100%)

Chkhenkeli et al., 2004 17 NC 4-8 Hz 14 / (82%) Loddenkemper et al., 2001 5 NST 100 Hz 2 / (40%) Chabardes et al., 2002 5 NST 130 Hz 3 / (60%)

(49)

Cont. - TABELA V- ALVOS, PARÂMETROS E RESULTADOS DA ECP EM 20 ESTUDOS Autores, ano N.º de doentes Alvo Parâmetros de estimulação Redução da frequência de convulsões [nº de doentes / (%)]

Cooper et al., 1976 15 Cerebelo 10 Hz 10 / (66%)

Wright et al., 1984 12 Cerebelo 10 Hz, 5 mA 0 / (0%)

Davis & Emmonds, 1992

27 Cerebelo ND 23 / (85%)

Velasco et al., 2005 5 Cerebelo 10 Hz, 3.8 mA 5 / (100%) Velasco et al., 2000 10 Hipocampo 130 Hz, 0.2 mA 7 / (70%) Vonck et al., 2002 3 Hipocampo 130 Hz, ˂ 3 V 3 / (100%)

Boon et al., 2007 10 Hipocampo 130 Hz 9 / (90%)

Tellez-Zenteno et al., 2006

4 Hipocampo 190 Hz 3 / (75%)

NCM – núcleo centro-mediano, NAT – núcleo anterior do tálamo, NC – núcleo caudado, NST – núcleo subtalâmico, ND – não disponível.

(50)

EFEITOS ADVERSOS

Os efeitos adversos da ECP podem surgir associados à implantação do elétrodo, ou como consequência da estimulação.

Na generalidade dos estudos da ECP para o tratamento da epilepsia, tanto a cirurgia de implantação como a estimulação foram bem toleradas pelos doentes, não tendo sido reportados efeitos adversos importantes (67, 72, 73, 84, 85, 106, 107).

Em 2006, uma infeção por Staphylococcus aureus num dos 6 participantes de um estudo de estimulação cerebral profunda crónica para controlo da epilepsia refratária obrigou à remoção do hardware (83). Os agentes com mais frequência implicados nas infeções de hardware são os estafilococos, enterobacter, estreptococos, pseudomonas e, raramente, micobactérias ou cândida, e integram geralmente a flora bacteriana da pele do doente (86, 112, 113).

Num estudo de follow-up a longo prazo da estimulação do NAT na epilepsia intratável (86) verificou-se uma situação de extensa erosão que obrigou também à remoção do hardware. Um dos participantes do mesmo estudo notou uma diminuição moderada da força da mão esquerda dois dias após a remoção do elétrodo colocado no NST. A ressonância magnética revelou uma pequena hemorragia da região frontal direita. Esta diminuição de força resolveu gradualmente, não se verificando qualquer comprometimento funcional permanente.

Nos primeiros 13 meses do estudo SANTE (68), os principais efeitos adversos relacionados com o dispositivo de estimulação foram parestesias em 18,2% dos participantes, dor no local do implante em 10,9% e infeção do local do implante em 9,1%. Todos os efeitos diminuíram em frequência entre o primeiro e segundo ano de seguimento.

Durante todo o período do estudo, 14 dos participantes (12,7%) desenvolveram infeções no local do implante: 7,3% na loca do estimulador, 5,5% no trajeto do cabo do elétrodo e 1,8% no orifício de trepanação. Um outro doente teve uma reação meníngea.

(51)

em nove doentes. Em três dos casos o hardware foi posteriormente reimplantado sem complicações. Nenhuma das infeções atingiu parênquima cerebral.

Não se verificaram hemorragias sintomáticas ou clinicamente significativas. Contudo, foram incidentalmente descobertas cinco hemorragias (4,5% dos participantes) em estudos de neuroimagem.

Globalmente, foram descritos 23 novos tipos de convulsões num total de 20 indivíduos. O aparecimento de novos tipos de convulsões foi referido por sete doentes durante a fase do estudo sem ocultação, e por dez doentes no período de seguimento a longo prazo. Nos períodos referidos a estimulação estava ativa em todos os doentes.

Cinco dos participantes (4,5%) experienciaram estado de mal epilético no decurso do estudo. Dois deles após a implantação, antes do início da estimulação e na sequência do esquecimento de uma ou mais doses dos fármacos antiepiléticos.

Um terceiro doente foi hospitalizado por estado de mal durante o mês dois da fase de dupla-ocultação. Constatou-se que pertencia ao grupo sujeito a estimulação.

Após a ativação do estimulador no fim do período de ocultação, verificaram -se, num quarto doente, alterações eletroencefalográficas epileptiformes e confusão. A estimulação foi interrompida e as convulsões cessaram em 5 dias.

Um ano após a descontinuação da ECP foi reportado estado de mal epilético num quinto participante.

No final da fase de ocultação, os resultados dos testes neuropsicológicos para a cognição e o humor do grupo estimulado e do grupo de controlo não revelaram diferenças. Ainda assim, em alguns casos, é possível que a estimulação tenha agravado ou induzido um quadro de depressão.

Acredita-se que os epiléticos incorrem num risco maior de lesões acidentais tais como contusões, lacerações, abrasões, fraturas e concussões. Considerando os eventos relacionados com as convulsões que ocorreram durante a fase de ocultação, nos indivíduos do grupo estimulado verificaram-se menos lesões associadas a crises (7,4%) do que no

(52)

DISCUSSÃO/CONCLUSÃO

A ECP, como novo método de tratamento da epilepsia, está no centro do interesse da pesquisa clínica mundial. Subsistem ainda muitas questões: qual o melhor alvo de estimulação?, quais os parâmetros ótimos de estimulação?, como selecionar para cada doente em particular o tipo de estimulação mais adequado?

As diferenças nos parâmetros de estimulação aplicados [Tabela V], até dentro do mesmo alvo anatómico, tornam a comparação dos estudos animais e clínicos disponíveis muito difícil, levantando talvez mais questões do que as que podem ser respondidas: é a ECP unilateral suficiente ou é a ECP bilateral necessária para prevenir as crises? Quais as voltagens e frequências de estimulação menos lesivas e capazes de suprimir as convulsões? O paradigma mais efetivo de estimulação é contínuo ou intermitente? Se intermitente, deve o estímulo ser a intervalos regulares ou dependente da deteção de atividade ictal? Se estiver indicada estimulação bilateral intermitente a intervalos regulares, deve a estimulação alternar entre os lados? E se sim, com que frequência?

São necessários mais estudos para determinar qual dos esquemas de estimulação é mais efetivo: open-loop ou closed loop? Os dois métodos podem em última análise ser considerados complementares, e usados em populações diferentes de doentes. É possível que possam inclusivamente ser combinados no mesmo doente, utilizando a estimulação open-loop para profilaxia e a closed-loop para interrupção aguda de crises.

É expectável que o tratamento de uma entidade patológica tão heterogénea e complexa como a epilepsia implique mais do que um alvo e/ou tecnologia de estimulação.

Apesar dos múltiplos tipos de epilepsia, o alvo de estimulação é geralmente escolhido de forma aleatória o que, embora não existam estudos que favoreçam claramente um alvo em detrimento de outro, é uma abordagem excessivamente simplificada. Tome-se como exemplo do exposto o maior estudo controlado da ECP para a epilepsia (68): se nos

(53)

significativa da frequência das convulsões, já naqueles com focos epiléticos de localização difusa, frontal, occipital ou parietal, não se constataram os mesmos benefícios.

O facto de se tratar de uma técnica minimamente invasiva aliado ao menor risco de efeitos adversos, confere à ECP uma vantagem decisiva sobre procedimentos cirúrgicos convencionais como a resseção do lobo temporal ou a remoção seletiva da amígdala e do hipocampo e mesmo dentro das técnicas de neuromodulação, a maior facilidade de remoção do hardware e o perfil de complicações e efeitos adversos tornam-na muito mais atrativa que a estimulação do nervo vago.

Ainda que não seja previsível que a ECP supere, em termos de eficácia, a resseção cirúrgica do hipocampo, pode, pelas razões já mencionadas, tornar-se uma forma estabelecida de tratamento. Os estudos de estimulação do hipocampo disponíveis demonstram que a estimulação não afeta a função mnésica (104, 107). Por outro lado, na eventualidade de surgirem efeitos secundários, a estimulação pode ser interrompida ou otimizada a qualquer momento pelo clínico ou pelo próprio doente.

A ECP é uma opção de tratamento promissora num subgrupo criteriosamente escolhido de pacientes com epilepsia intratável que não são candidatos a resseção cirúrgica.

A complexa patofisiologia do início/propagação das crises epiléticas obriga a mais investigação clínica e eletrofisiológica. Para que seja possível refinar os critérios de seleção dos doentes, escolher os alvos anatómicos apropriados e determinar os parâmetros ideais de estimulação é fundamental esclarecer as correlações existentes entre as manifestações clínicas, as patologias cerebrais epileptogénicas, e as redes envolvidas no controlo da epileptogénese. Importa também compreender os mecanismos de ação da ECP em níveis córtico-subcorticais.

A estimulação cerebral profunda no tratamento da epilepsia deve ser considerada uma terapia inovadora. As indicações e resultados não se encontram totalmente validados e

(54)

extensos, a ECP na epilepsia integrará definitivamente o leque de opções de tratamento disponíveis.

(55)

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1.

WHO. Epilepsy Fact Sheet No 999. 2009 [cited 2012 Janeiro]; Available from:

http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs999/en/index.html

.

2.

Duncan JS, Sander JW, Sisodiya SM, Walker MC. Adult epilepsy. Lancet.

2006 Apr 1;367(9516):1087-100.

3.

Blume WT, Luders HO, Mizrahi E, Tassinari C, van Emde Boas W, Engel J, Jr.

Glossary of descriptive terminology for ictal semiology: report of the ILAE task force

on classification and terminology. Epilepsia. 2001 Sep;42(9):1212-8.

4.

Fisher RS, van Emde Boas W, Blume W, Elger C, Genton P, Lee P, et al.

Epileptic seizures and epilepsy: definitions proposed by the International League

Against Epilepsy (ILAE) and the International Bureau for Epilepsy (IBE). Epilepsia.

2005 Apr;46(4):470-2.

5.

Engel J, Jr. Report of the ILAE classification core group. Epilepsia. 2006

Sep;47(9):1558-68.

6.

Wiebe S, Bellhouse DR, Fallahay C, Eliasziw M. Burden of epilepsy: the

Ontario Health Survey. Can J Neurol Sci. 1999 Nov;26(4):263-70.

7.

de Boer HM, Mula M, Sander JW. The global burden and stigma of epilepsy.

Epilepsy Behav. 2008 May;12(4):540-6.

8.

Sander JW. The epidemiology of epilepsy revisited. Curr Opin Neurol. 2003

Apr;16(2):165-70.

9.

Bell GS, Sander JW. The epidemiology of epilepsy: the size of the problem.

Seizure. 2001 Jun;10(4):306-14; quiz 15-6.

Referências

Documentos relacionados

Desse modo, a escola pode sim contribuir para o desenvolvimento da psicomotricidade nas crianças, estimulando-as com o uso de diferentes materiais e recursos, sempre

O uso do poliuretano (PU) como suporte de baixo custo para de imobilização , prova ser um material muito promissor, pois em nosso estudo o uso da lipase de Candida antarctica

Esta etapa não seria       atingida em menos de vinte ou trinta anos, mas não existe “caminho das pedras”, não há       solução política, não há fórmula

Este padrão de movimento é realizado de forma intercalada entre os membros inferiores, devendo sempre começar pelo lado dominante, sendo realizado 03 (três)

PARÁGRAFO SEGUNDO – O e-mail de solicitação será respondido pela entidade laboral à mesma caixa postal que a remeteu, no prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas, designando a

O USIC em escala de cinza, derivado da análise da amplitude do sinal de ultrassom intravascular, é comumente usado para análise quantitativa do ateroma, como comprimento da

Esta abordagem dos fundamentos do comportamento organizacional, bem como do relacionamento interpessoal e intrapessoal, visa mostrar como o comportamento das pessoas é importante

Total de votos Percentual de votos válidos T: ANTONIO DE PÁDUA PITHON CYRINO – FM/BO | S: LUIZ ANTONIO ANDRADE DE OLIVEIRA – IQ/AR 13 votos 100% dos votos válidos. 20 100% dos votos