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Do cubo branco à caixa preta: uma análise da evolução dos espaços expositivos de arte

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Academic year: 2021

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TALITHA YRUAMA TEIXEIRA LACERDA TA

DO CUBO BRANCO À CAIXA PRETA

UMA ANÁLISE DA EVOLUÇÃO DOS ESPAÇOS EXPOSITIVOS DE ARTE

(2)

Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial Prof. Dr. Marcelo Bezerra de Melo Tinôco - DARQ - ­CT Lacerda, Talitha Yruama Teixeira.

Do cubo branco à caixa preta: uma análise da evolução dos espaços expositivos de arte / Talitha Yruama Teixeira Lacerda. - Natal, RN, 2019.

65f.: il.

Monografia (Graduação) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Tecnologia. Departamento de Arquitetura e Urbanismo.

Orientador: George Alexandre Ferreira Dantas.

1. Arte Contemporânea - Monografia. 2. Teoria e História da Arquitetura - Monografia. 3. Espaços expositivos - Monografia. I. Dantas, George Alexandre Ferreira. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título.

RN/UF/BSE15 CDU 7.01

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE TECNOLOGIA

DEPARTAMENTO DE ARQUITETURA CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMO

Trabalho Final de Graduação apresentado à banca Examinadora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Bacharel em Arquitetura e Urbanismo.

Orientador: George Alexandre Ferreira Dantas

NATAL, RN 2019

TALITHA YRUAMA TEIXEIRA LACERDA

DO CUBO BRANCO À CAIXA PRETA

UMA ANÁLISE DA EVOLUÇÃO DOS ESPAÇOS

EXPOSITIVOS DE ARTE

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RESUMO

Até meados do século passado, as artes plásticas enquadravam-se basicamente em duas categorias: a pintura e a escultura. No entanto, a partir das vanguardas artísticas, os suportes e temáticas da arte ficaram mais diversificados, alterando a maneira de produzir e expor. A arquitetura, por sua vez, como expressão de um tempo e sociedade, se molda às mudanças para manter sua utilidade. Desse modo, o presente trabalho tem por objetivo analisar as alterações da arquitetura dos espaços expositivos de arte contemporânea à luz da mudança do paradigma da neutralidade, proposto como Cubo Branco por Brian O'Doherty, para uma máxima flexibilização dos espaços, proposto por del Castillo como o conceito de Caixa Preta.

PALAVRAS-CHAVE: Arte Contemporânea; Teoria e História da Arquitetura; Espaços expositivos.

ABSTRACT

Until near the half of the last century, plastic arts participated in mainly two categories: paintings and sculptures. However, with the starting of the artistic vanguard, the platforms and the thematic of art turned out more diverse, changing the way to develop and exhibit. Architecture, on the other hand, as an expression of time and society, adjusts itself according to the perspective to maintain its applicability. Furthermore, the present manuscript has the objective of analyze the architecture mutation of the contemporary arts exhibition spaces by the renewal of the paradigm of neutrality proposed as White Cube by Brian O'Doherty, for maximum of flexibility of the spaces, designed by del Castillo as the Black Box concept.

KEY-WORDS: Contemporary arts; Teory and History of Architecture; Exhibition spaces.

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LISTA DE FIGURAS

Figura1 - Planta baixa da Galeria Uffizi...12

Figura2 - Galeria Uffizi... 12

Figura3 - Sala Tribuna dos Uffizi... 13

Figura4 - Museu Fridericianum...13

Figura5 - Planta baixa do Museu Fridericianum...14

Figura6 - Museu do Crescimento Ilimitado de Le Corbusier... 16

Figura7 - MoMa em 1939... 17

Figura8 - Plantas do MoMA de 1939... 18

Figura9 - Galerias do MoMA, espaços neutros e flexíveis... 19

Figura10 - Museu Guggenheim... 23

Figura11 - Interior do Guggenheim... 24

Figura12 - Salão Parisiense do século XVIII (Exposición en el Salon del Louvre en 1787 de Pietro Antonio Martini) ...26

Figura13 - 1.200 sacos de carvão - Marcel Duchamp, 1938...27

Figura14 - Montagem da instalação de Richard Hamilton na This is Tomorrow...29

Figura15 - Esquema tridimensional da exposição This is Tomorrow... 31

Figura16 - TELAS DE FRANK STELLA NA GALERIA LEO CASTELLI EM 1964...31

Figura17 - SPIRAL JETTY, ROBERT SMITHSON 1970...34

Figura18 - Instalação ATRAVÉS, CILDO MEIRELES...35

Figura19 - Exposição FRIDA KAHLO: suas fotos / olhares sobre o México... 41

Figura20 - Planta baixa do 1º pav. da Pinacoteca de São Paulo44 Figura21 - Octógono da Pinacoteca de São Paulo...45

Figura22 - Exposição de Ernesto Neto no Octógono da Pinacoteca de São Paulo...46

Figura23 - TAKE YOUR TIME DE OLAFUR ELIASSON na Pinacoteca... 46

Figura24 - Residência artística no Octógono, 2018...46

Figura25 - Vista aérea do Instituto Inhotim, Brumadinho/MG.48 Figura26 - Galeria Adriana Varejão no Instituto Inhotim...48

Figura27 -Echo, de Richard Serra, 2016...50

Figura28 - Instituto Moreira Salles Paulista...50

Figura29 - Instituto Tomie Ohtake... 52

Figura30 - Exposição Yayoi Kusama no Instituto Tomie Ohtake53 Figura31 - Plantas das salas de exposição do Instituto Tomie Ohtake... 54

Figura32 - Pinacoteca Potiguar... 60

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...7

01. O CUBO BRANCO COMO PARADIGMA...10

. O PARADIGMA DO MoMA...12

O CUBO BRANCO...20

O CUBO BRANCO SE DISSOLVE...22

02. AS MUDANÇAS NO PANORAMA ARTÍSTICO...25

OS NOVOS CAMINHOS DA ARTE...32

03. A POLIVALÊNCIA DA CAIXA PRETA...37

O OCTÓGONO...43

ARQUITETURA COMO ARTE PARA ARTE... 47

A EVOLUÇÃO DO PROGRAMA E A MONUMENTALIDADE... 49

INSTITUTO TOMIE OHTAKE...51

RECUPERAÇÃO DE ANTIGOS CENTROS ...55 CONSIDERAÇÕES FINAIS... 57 REFERÊNCIAS...63

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“Arte é sentir o ambiente para criar” Ernesto Neto

INTRODUÇÃO

Com as vanguardas artísticas do começo do século XX, o conceito de arte começou a se alargar, passando a ser muito mais fluido e abrangente no contexto contemporâneo. Apropriando-se de suportes, temáticas e métodos variados, surgiram os conceitos de Land Art, Instalação, Body Art, arte urbana, Light Art, Happenings, etc.

O interesse por essas manifestações artísticas e como elas podem representar a sociedade em que estão inseridas despertou a motivação deste ensaio, que, aliando-se à questão espacial, busca investigar a arquitetura dos espaços expositivos de arte, tão carentes na cidade de Natal.

Sobre essa sociedade, Guy Debord (2003) afirma que vivemos a sociedade do espetáculo:

uma fase específica da sociedade capitalista, quando há uma interdependência entre o processo de acúmulo de capital e o processo de acúmulo de imagens. O papel desempenhado pelo marketing, sua onipresença, ilustra perfeitamente bem o que Debord quis dizer: das relações interpessoais à política, passando pelas

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manifestações religiosas, tudo está mercantilizado e envolvido por imagens. (Coelho, 2011, n. p.)

Apesar de ser um conceito de 1967, ele vem se mostrando cada vez mais atual. Basta pensarmos que os espaços atualmente não são feitos apenas para serem experienciados, mas também “instagramados”, isto é, terem sua decoração e iluminação, por exemplo, pensadas especialmente para atrair o compartilhamento nas redes sociais, e assim, uma maior publicidade, que por consequência, gera mais lucros.

Sobre essa mercantilização, Hal Foster (2017, p. 59) alega que o âmbito cultural não mais está separado do econômico, e que uma característica do capitalismo contemporâneo é justamente “a combinação de ambos, que subjaz não só à proeminência dos museus como também à remodelação de tais instituições a serviço de uma “economia da experiência”.

Dessa forma, alguns museus parecem seguir a lógica da espetacularização, seja com a forte mercantilização de sua

própria marca, como é o caso da “Pina”, apelido construído para a Pinacoteca do Estado de São Paulo e estampado em dezenas de seus produtos, seja pela própria mercantilização dentro de seus espaços, com a presença de lojas e restaurantes, ou pela sua própria forma monumentalizada.

Desse modo, este ensaio tem como objetivo analisar os espaços expositivos contemporâneos à luz da mudança do paradigma do Cubo Branco para a Caixa Preta. E para isso, compreender a evolução desses espaços que formaram o contexto para consolidação do paradigma do Cubo Branco, considerando as mudanças da produção artística do pós-guerra, que criaram novas necessidades espaciais, até as características dos espaços contemporâneos a partir do conceito da Caixa Preta.

A princípio, esta pesquisa nortearia diretrizes para criação de um projeto para um espaço expositivo de arte contemporânea como ilustração de seus resultados. No entanto, o processo foi dando origem a descobertas difusas e abertas, fazendo com que se fosse necessário dar mais

(9)

ênfase a essa pesquisa, de modo a não ter como resultado dois produtos (projeto e pesquisa) pouco embasados. Foi realizada, então, uma revisão bibliográfica acerca do assunto, bem como considerada visitas de campo e vivências da autora em espaços desse tipo.

Assim, o texto se divide em três partes: o primeiro capítulo traz um breve histórico dos espaços expositivos desde o seu surgimento até as galerias modernistas, sob o paradigma do cubo branco, conceito do artista e autor Brian O’Doherty, presente em seu livro No interior do cubo branco (2002).

O segundo capítulo trata das mudanças do panorama artístico, com enfoque a partir das vanguardas artísticas do começo do século XX, que levaram às transformações desses espaços, considerando a arquitetura como continente, influenciando e sendo influenciada por seu conteúdo.

O terceiro capítulo trata da dissolução do paradigma do cubo branco, sendo substituído pelo conceito da caixa preta, proposto por Sonia Salcedo del Castillo, em seu livro Cenário

da Arquitetura da Arte (2008), em que “o espaço expositivo

adquire flexibilidade semelhante à caixa preta do teatro” (Farias, 2008). Por fim, considerações finais são feitas acerca dos espaços expositivos, considerando um contexto geral e também focando na cidade de Natal, cujo cenário de espaços expositivos, bem como seus problemas e potencialidades, foi o grande motivador deste trabalho.

É importante destacar que, apesar de se tratar de espaços expositivos de arte de maneira geral, o presente ensaio recai sobre exemplos e conceitos relacionados a museus, por ser sua categoria mais representativa.

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i

01. O CUBO BRANCO COMO PARADIGMA

M oM A de 19 39

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Com o objetivo de compreender as bases que possibilitaram a consolidação do paradigma do cubo branco como espaço expositivo ideal, neste capítulo será apresentado um breve histórico desses espaços1, buscando pontos-chave de sua arquitetura até chegar nos preceitos defendidos pelo racionalismo modernista.

Os primeiros espaços expositivos foram criados a partir de coleções privadas, na época do Renascimento Europeu, quando o interesse e entusiasmo pela história da humanidade era crescente. Essas coleções dividiam-se em basicamente dois tipos: o primeiro eram os gabinetes de curiosidades, os quais reuniam objetos e animais exóticos, trazidos principalmente de viagens por exploradores, e que viriam a formar os museus de história natural; enquanto o segundo tipo eram coleções de arte abrigadas em salas intensamente ornamentadas de palácios, cujo primeiro grande exemplo foi o Palácio dos

1Baseado principalmente no artigo de Kiefer (2000) e na dissertação de

Lima (2015).

Médici, e que daria origem aos museus de belas artes (LIMA, 2012, p. 09). Este segundo tipo será o enfoque deste trabalho.

No entanto, de acordo com Kiefer (2000, p. 09), o primeiro espaço especificamente criado para exibição de obras de arte, sem preocupações decorativas como as salas dos palácios, foi a Galeria degli Uffizi (Figura 2) em Florença, criada por François I no final do século XVI, quando o burguês decidiu expor sua coleção de arte no último andar de seu edifício comercial.

A galeria, que funciona até hoje como um circuito de salas divididas em ordem cronológica (Figura 1), abriga a sala Tribuna dos Uffizi (Figura 3), que se tornou um paradigma da história da arquitetura de museus por causa de sua volumetria octogonal, coroada por uma cúpula e fortemente ornamentada (LIMA, 2012, p. 10).

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Figura 1 - Planta baixa da Galeria Uffizi.

<http://www.museumsinflorence.com/foto/uffizi/plan.html> Acesso em 22/10/2019.

Figura 2 - Galeria Uffizi.

<https://post-italy.com/ingresso-galleria-degli-uffizi-em-florenca/> Acesso em 10/2019.

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Figura 3 - Sala Tribuna dos Uffizi

<https://www.lonelyplanet.com/italy/florence/images/galleria-degli-u ffizi-47dbfd6ec77fe46ed97ba7a0e144a94>

Acesso em 10/2019.

Concomitante à consolidação da Galeria Uffizi, tornou-se cada vez mais comum a inserção de galerias nos projetos dos palácios da época. E com a vontade de expor as coleções dos nobres à população, as galerias passaram do interior dos palácios para edifícios independentes. Mas foi apenas no final do século XVIII que foi concebido o primeiro museu de acesso

público na Europa: o Fridericianum, na cidade de Kassel, Alemanha (Lima, 2012, p. 12). A edificação, que ainda hoje é sede da Documenta de Kassel, considerada a mais importante exposição de arte contemporânea e moderna, é composta por dois pavimentos e uma planta dividida em três naves (figura 5), com um exterior que mistura elementos barrocos e neoclássicos.

Figura 4 - Museu Fridericianum.

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Figura 5 - Planta baixa do Museu Fridericianum

<https://www.europeana.eu/portal/pt/record/08535/local__default__13 564.html> Acesso em 10/2019.

Os museus até o século XIX possuíam uma arquitetura com muitas características em comum que remetiam ao passado: frontões clássicos, pilastras romanas, abóbadas e cúpulas. Isso se deu principalmente com a Revolução Francesa, que derrubou a monarquia, fazendo com que os antigos palácios fossem ocupados com a finalidade dos museus, os

quais tinham o papel de delinear e afirmar as ideologias nacionais.

Outros edifícios foram construídos seguindo os padrões palacianos, pois se tratava de uma arquitetura imponente e que causa o sentimento de reverência às obras expostas. Suas plantas normalmente eram resolvidas através de um átrio que dava acesso a corredores ligando inúmeras galerias, com exposições quase sempre ordenadas em categorias de temáticas. De acordo com Kiefer:

A fórmula de museu-palácio conseguiu resultados significativos em termos urbanos e simbólicos durante mais de um século, tendo por base os protótipos criados por Klenze e Schinkel, que permitiam tanto um circuito seqüencial de visitação quanto o estabelecimento de subcircuitos independentes e especializados. Por outro lado, essa acomodação tipológica facilitou o aparecimento de problemas crônicos, como o amontoamento das salas e depósitos e uma dificuldade de comunicação com o público. As salas eram repletas de objetos apresentados, muitas vezes, sem nenhum comentário. (KIEFER, 2000, p. 17)

(15)

Com a Revolução Industrial, a partir do final do século XVIII, a burguesia ascendente passou a se apropriar da arte como símbolo de distinção social, vinculando a ideia de arte cada vez mais à de mercadoria. Nesse contexto, os movimentos de arte moderna buscavam fortalecer os ideais e convicções artísticas para além de sua mercantilização, sendo contrários ao padrão vigente na época. Dessa forma, decretavam em seus manifestos a morte dos museus por se tratar de uma instituição voltada ao passado, sem comprometimento ou ligação com as mudanças da sociedade em que estavam.

“No Manifesto Futurista de 1909, Filippo Marinetti chamava os museus e bibliotecas de ‘cemitérios’ e exigia que fossem destruídos; Jean Cocteau qualificou o Louvre como "depósito de cadáveres" (Montaner, 2003, p. 09). Dessa forma, para eles, o museu como era deveria desaparecer ou transformar-se para se adaptar à nova realidade.

Durante esse período de contestações dos artistas, aconteciam também as duas primeiras guerras mundiais, deslocando o foco, principalmente na Europa, das

preocupações das construções de museus para necessidades mais básicas como a reconstrução de cidades destruídas nos conflitos. No entanto, apesar do contexto político ter atrasado o surgimento de teorias acerca desse tipo de espaço, ele não evitou que isso acontecesse. E em 1931, Le Corbusier idealizou o Museu do Crescimento Ilimitado (Figura 6), com forma em espiral, possibilitando o seu crescimento acompanhar a evolução da sociedade. Esse modelo estabeleceu as bases fundamentais para discutir e reformular toda a museologia tradicional, e preconizava paredes imaculadamente brancas, com salas intensamente “iluminadas, de preferência de maneira zenital, mas necessariamente de maneira equânime e sem nenhum tipo de interferência arquitetônica” (del Castillo, 2008, p. 61).

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Figura 6 - Museu do Crescimento Ilimitado de Le Corbusier

<https://www.pinterest.ch/pin/287104544974010136/?autologin=true> Acesso em 10/2019.

O PARADIGMA DO MOMA

Com o período entre-guerras, o centro artístico mundial foi transferido da Europa para os Estados Unidos. Nesse contexto surgiu o Museum of Modern Art de Nova York

(MoMA), que acabou tornando-se um exemplo paradigmático da arquitetura de museus dessa época. Apesar de ter sido inaugurado em 1929, no 12º andar de um edifício, foi apenas em 1939 que seria construída sua sede própria, com projeto dos arquitetos Phillip Goodwin e Edward Durell Stone. O edifício, cujos preceitos expositivos são copiados até os dias de hoje, possuía uma “arquitetura neutra, disponibilizando para montagens expositivas um espaço purista, livre de interferências decorativistas ou arquiteturais” (CASTILLO, 2003, p. 117).

O MoMA foi projetado sob os mais rígidos preceitos modernos, transpirava em sua fachada plana o Estilo Internacional, a qual possuía grande área de vidro translúcido com janelas em fita nos últimos pavimentos (Figura 7). Todos os elementos buscavam comunicar "uma nova arquitetura como volume e não como massa, o primeiro princípio do Estilo Internacional" (RICCIOTTI, 1985, p. 52). A ornamentação foi reduzida ao máximo, e para dar maior leveza, foi colocada uma cobertura de efeito flutuante e com círculos vazados no

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último pavimento. A sensação de harmonia era dada não mais pela simetria, mas pela regularidade das formas. Dessa maneira, o conhecido e até hoje utilizado letreiro vertical foi posto lateralmente em sua fachada.

O museu surgia com um papel inovador porque tinha como preceito ser uma instituição educacional, que informava e difundia os temas e a produção da arte moderna. Dessa forma, um auditório foi colocado no subsolo para receber cursos e palestras, bem como uma biblioteca no quarto pavimento. Os setores administrativos e de curadoria ocupavam parte do quarto pavimento além do quinto. Toda a parte de serviço era subterrânea e se conectava com o restante do museu através de escadas e elevadores, que formavam um núcleo de serviço vertical, e possuía também fácil acesso à rua. A figura 8 apresenta, de cima para baixo e da esquerda para a direita, as plantas do edifício a partir do porão com mezanino.

Figura 7 - MoMa em 1939

<https://www.jstor.org/stable/1594435?read-now=1&seq=2#page_scan _tab_contents> Acesso em 04/11/2019.

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Figura 8 - Plantas do MoMA de 1939

<https://www.jstor.org/stable/1594435?read-now=1&seq=7#page_scan_tab_contents> Acesso em 05/11/2019.

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As galerias, que tornariam-se paradigmáticas como espaços expositivos no século XX, encontravam-se no primeiro e segundo pavimento. Além das salas com paredes brancas e flexíveis (figura 9), uma vez que não eram autoportantes, contavam com um sistema de divisórias em madeira compensada mantidas sob tensão para as exposições temporárias dos primeiros anos. Havia também uma galeria estreita e iluminada por uma clarabóia para as esculturas. É interessante notar que, apesar da flexibilidade das salas, havia uma clara separação entre espaços para quadros e para esculturas.

Figura 9 - Galerias do MoMA, espaços neutros e flexíveis.

<https://www.jstor.org/stable/1594435?read-now=1&seq=8#page_scan _tab_contents> Acesso em 05/11/2019.

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O CUBO BRANCO

Acerca desse novo tipo de museu que começava a se destacar com a corrente modernista e a consolidação do MoMA, Lima (2012, p. 17) escreve: “O Museu Modernista traz importante alteração em seus espaços internos: a sua simplificação. As salas de exposição e as circulações passam a ser integradas num contínuo espacial”.

Dentre esses novos preceitos, Pfeiffer destaca a acessibilidade, a intensa iluminação (em contraponto às salas mal iluminadas dos museus palacianos):

um museu deve ser extenso, contínuo e bem proporcionado, desde o nível inferior até o superior; que uma cadeira de rodas possa percorrê-lo, subir, baixar e atravessá-lo em todas as direções. Sem interrupção alguma e com suas seções gloriosamente iluminadas internamente desde cima, de maneira apropriada a cada grupo de pinturas ou a cada quadro individual, segundo se queira classificá-los (Pfeiffer apud Kiefer, 2000, p. 19).

É sobre esse novo paradigma do museu moderno que Brian O’Doherty, artista, crítico, escritor e diretor de filmes, escreve entre as décadas de 1970 e 1980, o primeiro dos quatro ensaios que compõe o livro No Interior do Cubo Branco, publicado em 2002. A publicação faz uma crítica a esse modelo de espaço, o qual assemelham-se às igrejas medievais no que diz respeito aos seus preceitos rigorosos de construção, vedando completamente o mundo exterior e criando uma atmosfera própria e sacralizada.

As paredes são pintadas de branco. O teto torna-se a fonte de luz. O chão de madeira é polido, para que você provoque estalidos austeros ao andar, ou acarpetado, para que você ande sem ruído. A arte é livre, como se dizia,"Para assumir vida própria". Uma mesa discreta talvez seja a única mobília. Nesse ambiente, um cinzeiro de pé torna-se quase um objeto sagrado” (mcevilley, 2002, p. Iv)

O’Doherty, como artista, já trabalhava diálogos irônicos com as linguagens tradicionais da arte. Como escritor, criticava a galeria modernista em um contexto de forte crítica a todo o movimento moderno. Wisnik (2018) aponta a simultaneidade

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do surgimento e consolidação dos experimentalismos artísticos dos anos 1960 e 19702com a publicação de livros3que faziam a revisão crítica dessa arquitetura. Que, por sua vez, veio a ser consolidada, em 1972, “com a implosão do conjunto habitacional de Pruitt-Igoe, em Saint-Louis, tomada pelo historiador da arquitetura Charles Jencks como o grande funeral do Movimento Moderno” (Wisnik, 2018, p. 17). A partir disso surgiriam variadas correntes linguísticas na arquitetura, tornando ainda mais favorável o contexto de crítica da publicação.

Dentre as críticas de O’Doherty, é destacada a separação que a galeria provoca entre o artista e sua sociedade, uma vez criada com o intuito de gerar um espaço sacralizado, separado do mundo real, que dá ares de eternidade aos valores artísticos e, como reflexo, aos valores da parcela da sociedade que a legitima. Dessa forma, o cubo branco, além de afirmar o status de superioridade e intangibilidade das obras que contém,

2Ver capítulo 02.

3Por exemplo, Complexidade e contradição em arquitetura, de Robert

Venturi, e A arquitetura da cidade, de Aldo Rossi.

ainda reduz as possibilidades de diversidade, promovendo seu próprio ponto de vista, de uma realidade única, e consequentemente de sua continuidade ou legitimidade eterna (McEvilley, 2002, p. XVIII).

O’Doherty (2002) desejou mostrar como o modelo “cubo branco” privilegiava a apreensão das obras de arte como entidades autônomas, separadas da vida – do mundo externo e da passagem do tempo –, favorecendo sua aparência de eternidade, de beleza imortal própria aos objetos sagrados. Seu argumento é uma forte crítica a uma ideia de “neutralidade” do espaço expositivo

Uma vez erguido como exemplar dos preceitos modernistas para arquitetura de espaços de arte, o MoMA é enquadrado no paradigma do cubo branco. Para del Castilo (2008, p. 118), ele provoca no espectador uma relação de passividade perante as obras, beirando o ritualismo e privilegiando a percepção museográfica sob a lógica da linearidade histórica.

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Enquanto na galeria tradicional, a obra era para o espectador mais um ornamento em uma sala já intensamente detalhada, uma janela para uma realidade representada, encerrada e separada das demais obras por uma espessa e detalhada moldura, na galeria modernista o espaço se dissolvia para dar voz apenas à obra. Ela mesma se tornava seu próprio contexto, em um espaço instrospectivo e autorreferente . Ao espectador, por sua vez, cabia o papel de apenas observar e absorver, contido em um espaço neutro, sem expressão nenhuma diante das obras expostas. No entanto, “por mais sedutores que sejam esses constructos, a arte necessita sempre aferir e calibrar seus valores com o mundo que a abriga e a inspira” (Grossmann, 2002, p. 14).

O CUBO BRANCO SE DISSOLVE

Vinte anos mais tarde da criação do MoMA, em 1959, o Guggenheim de Nova York (figura 10) é construído com projeto de Frank Lloyd Wright. Uma torre helicoidal de concreto branco que destaca-se do seu entorno por sua forma

irreverente, linhas elegantes e gabarito mais baixo. Apesar de sua forma já representar um rompimento com os ideais modernistas para construção de museus, sua arquitetura significa um rompimento ainda maior no que diz respeito aos espaços expositivos.

Se Wright, nos primeiros anos do século XX, já tinha sido o primeiro a conseguir romper com a caixa tradicional da casa residencial, em meados do século XX foi também ele quem concebeu a solução que convertia o museu em um percurso gerador de movimento contínuo. Era o primeiro grande passo para evoluir da caixa estética e fechada, acadêmica e simétrica, para uma forma inédita e cinemática; um novo museu ativo e dinâmico, configurado, neste caso, em espiral (Montaner, 2001, p. 12)

A principal diferença é seu percurso espiralado. A galeria convencional dá lugar a uma grande rampa contínua de seis pavimentos que contorna um fosso iluminado pela luz natural proveniente de uma cúpula (Figura 11). Essa arquitetura traz a atenção do expectador para o edifício, além do que está

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exposto, dando-lhe protagonismo. De acordo com del Castillo (2008, p. 116), o Guggenheim inaugurou a ideia do museu como obra de arte, podendo gerar conflito com as obras expostas, ou seja, indo de encontro a um dos principais ideais modernistas, e contrariando sua função.

Figura 10 - Museu Guggenheim

<https://www.floornature.com/frank-lloyd-wrightas-guggenheim-mu seum-turns-60-14338/> Acesso em 05/11/2019.

Elaine Caramella (2013, n. p.) chega a comparar a arquitetura do Guggenheim à da torre observatório da

Mesquita de Samarra, no Iraque, e à Torre de Babel, os quais são templos sagrados com santuários localizados no topo, lugar mais perto do céu, em noção de ascendência, e portanto que faz ligação com o divino. No caso do museu nova-iorquino, a torre está invertida, e o percurso começa do topo, através dos elevadores, sendo conduzido de forma descendente. Dessa forma, “o arquiteto inverte o significado da forma helicoidal, apontando não para o desprendimento material, mas para a própria materialidade da obra” (Caramella, 2013, s. p.).

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Figura 11 - Interior do Guggenheim

<https://www.floornature.com/frank-lloyd-wrightas-guggenheim-mus eum-turns-60-14338/> Acesso em 05/11/2019.

Não foi apenas por sua arquitetura escultural que o Guggeinheim foi criticado. Embora tenha se tornado um símbolo da arquitetura americana, a falta de ortogonalidade de suas galerias atraiu muitas críticas principalmente dos artistas da época, os quais reclamavam da falta de uma grade

ortogonal de referência, alegando que a edificação era “inadequada para uma exposição favorável à pintura e escultura” (COHEN, 2013, p. 435). Além disso, a falta de linearidade do percurso também foi criticada, assim como a incapacidade de suportar obras de grande porte, o que viria a ser solucionado com ampliações posteriores.

Wright recria e re-significa a concepção tradicional de museu, ao saturar a Arquitetura na Escultura, apresentando o edifício não como invólucro, mas como signo híbrido, entre Arquitetura e Escultura e, portanto algo para ser visto/visitado como acervo, provando assim que o meio é a mensagem. (...)

Quem vai visitar o Guggenheim não vai apenas para ver as exposições temporárias, mas principalmente para vê-lo. Ele é acervo do seu próprio acervo e não abrigo da arte, ou espaço das musa. Ele é a musa.” (CARAMELLA, 2013, s. p.)

O Guggenheim simbolizou o desenrolar da ruptura com os ideais arquitetônicos modernistas para os museus, surgindo também como museu obra de arte. No entanto, todas as alterações vistas no presente capítulo foram acompanhadas por mudanças também no contexto artístico, que iriam desencadear o surgimento do museu pós-moderno.

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ii

02. AS MUDANÇAS NO PANORAMA

ARTÍSTICO

W alk in g th e w all

(26)

Uma vez que a arquitetura é continente, é preciso entender as mudanças pelas quais o seu conteúdo, no caso deste trabalho, a arte, passou para que se justifique as mudanças espaciais dos espaços expositivos. Dessa forma, este capítulo traz um panorama das principais mudanças do contexto artístico com foco no pós-guerra.

Desde o impressionismo, no fim do século XIX, possamos observar rompimentos da arte com a pintura tradicional, como o fim da composição formal, sobre o qual Brian O”Doherty escreve:

Essas e outras pinturas centradas em um trecho indeterminado da paisagem que geralmente parece ser o tema “errado” apresentam a ideia de perceber algo, de um olho rastreando. Essa aceleração temporal faz da moldura uma área equivocada, e não absoluta” (O’DOHERTY, 2002, p. 10)

Embora tenha havido esse rompimento com expressões artísticas mais tradicionais, ainda não foi suficiente para que houvesse um rebatimento nos espaços expositivos. Os impressionistas ainda penduravam as pinturas lado a lado,

como era feito nos salões parisienses (Figura 12) do século XVIII. Esses salões estavam intimamente ligados à elite, sendo fonte de investimentos e lucros financeiros, valorizando “muito mais a disputa artística sob critérios de um juri duvidoso, do que o verdadeiro sentido das exposições: dar concretude às ideias e às convicções artísticas” (Del Castillo, 2008, p. 26).

Figura 12 - Salão Parisiense do século XVIII (Exposición en el Salon del Louvre en 1787 de Pietro Antonio Martini)

<https://www.metmuseum.org/art/collection/search/393346> Acesso em 04/10/2019.

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Mudanças mais significativas no modo de expor vieram apenas com as vanguardas artísticas do começo do século XX, como forma de oposição ao gosto público dominante promovido pelos salões. Os artistas passaram a criar suas próprias exposições, por vezes individuais, por vezes em grupo, buscando atrair a atenção do público através de estratégias de montagens originais (del Castillo, 2008, p. 28). Como exemplo, em 1938, na Exposição Internacional do Surrealismo, Marcel Duchamp subverteu o espaço da galeria. Enquanto várias obras eram expostas tradicionalmente penduradas nas paredes com molduras ortodoxas, o artista, pela primeira vez na história, transformou o espaço inteiro da galeria em sua obra de arte (O’Doherty, 2002, p. 75).

1.200 sacos de carvão (Figura 13) virou a galeria ao

contrário, transformando o teto em chão e vice-versa ao colocar sacos de carvão pendurados no teto e um tonel com uma lâmpada no chão metaforizando o fogareiro. O’Doherty (2002, p. 75) aponta para a interpretação de que a, ainda não denominada assim, instalação de Duchamp fazia referência à

própria história da arte, com obras prestes a entrar em combustão e transformar-se em cinzas.

Figura 13 - 1.200 sacos de carvão - Marcel Duchamp, 1938

<https://doattime-arthistory.blogspot.com/1981/04/1938-marcel-ducha mp-1200-coal-bags-sala.html> Acesso em 04/11/2019.

(28)

Enquanto movimentos como o surrealismo e dadaísmo propunham o espaço expositivo como parte de uma obra de arte total, o De Stijil, com suas experiências neoplásticas, dá destaque à parede branca como suporte ideal para a exposição das obras sem causar interferências com o espaço ao redor. Como resultado desse embate ideológico, somando-se ao contexto da arquitetura modernista no começo do século XX, ganham força as propostas expositivas racionalistas, como mencionadas no capítulo anterior.

Na década de 1950, o mercado vinha se aquecendo no pós-guerra, fato que levou ao diálogo entre lógica capitalista e produção artística, fazendo surgir um consumo cultural de massa (del Castillo, 2008, p. 114) que incentivou novas experimentações artísticas. Nesse contexto, uma exposição marcaria um ponto de ruptura com os modos de expor da época, uma vez que já surgia como um discurso, antecipando as práticas expositivas atuais: a I Documenta de Kassel, em 1955.

Mais do que apenas expor visualmente as obras, a I Documenta se destacada por ter como objetivo criar um discurso para reavivar a cultura na Alemanha após os conflitos bélicos mundiais. Apesar disso, ainda buscava trazer uma nova leitura da arte moderna a seu público. E com essas intenções, a exposição afirmava a museografia

como veículo de adequação da tipologia moderna no cubo branco a antigos espaços degradados e reabilitados pelo uso de materiais efêmeros ou sintéticos, como, por exemplo, painéis plásticos, suportes metálicos, cortinas de tecido fino em fios de náilon como difusores de luz, assim como carpetes, aplicados harmoniosamente às superfícies rústicas de tijolos. (del Castillo, 2008, p. 140)

O contexto começava, portanto, a aparecer cada vez mais como parte integrante da obra. Por sua vez, as exposições começava a reaparecer como uma obra total, assim como propuseram as vanguardas mais radicais do começo do século, maculando o espaço sacralizado do cubo branco, até então já consolidado como paradigma. Além disso, a partir dessa exposição, o curador passava da figura ligada apenas à

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pesquisa e articulação da produção artística para criador de um discurso cultural.

Se por um lado, ainda haviam esforços para afirmar a arte moderna, por outro se consolidava movimentos de ruptura e que estreitavam laços com a lógica capitalista, como a fotografia que “encontra na estética dos anos 1960 o espelho da questão da reprodutibilidade técnica anunciada por (Walter) Benjamin” (ibid., p. 147), e a Pop Art, que banalizava a arte, dessacralizando-a, ao passo que criticava sua mercantilização.

Outra exposição que seria emblemática e se tornaria mais um marco de ruptura com a lógica modernista de exposição foi a This is Tomorrow, que apresentou, na Whitechapel Art Gallery em Londres, uma instalação de Richard Hamilton (Figura 14), inaugurando uma das primeiras manifestações da Pop Art na Inglaterra. De acordo com del Castillo (2008, p. 149), a exposição reunia artistas londrinos que já em 1956 utilizavam quadrinhos, anúncios, filmes e outros produtos e objetos em suas produções.

Figura 14 - Montagem da instalação de Richard Hamilton na This is Tomorrow

<https://www.ft.com/content/a5228eaa-2418-11e9-8ce6-5db4543da632 > Acesso em 08/11/2019.

Além disso, a própria montagem já era inovadora ao ser pensada desde do início, não só como um discurso, como fez a I Documenta de Kassel, mas como um projeto artístico completo e interdisciplinar, unindo de forma inédita, arquitetos,

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designers e artistas, como pode ser observado na figura 15, representando a planta de um dos três espaços.

Como naquelas exposições do passado, que buscaram ser uma obra de arte total, tudo que era exposto na This is Tomorrow vinculava-se ao espaço expositivo, porém, de forma efêmera e segundo critérios que manipulassem a percepção do espectador.

Influenciados pelo rápido progresso tecnológico do pós-guerra, seus organizadores desenvolveram princípios e concepções de espaços e montagem conforme os modelos que a indústria de comunicação, a ciência e a tecnologia faziam surgir. (ibid., p. 149)

Como pode ser observado na figura 15, a exposição que tinha como objetivo representar as visões dos artistas sobre a arte contemporânea, resultou em uma mostra fragmentada com 12 ambientes, que buscavam provocar os sentidos dos espectadores de maneiras únicas, explorando efeitos ópticos e interativos. A participação do espectador, portanto, era essencial na construção do sentido da exposição, levando ao conceito do “espectador emancipado” de Rancière:

A emancipação, por sua vez, começa quando se questiona a oposição entre olhar e agir, quando se compreende que as evidências que assim estruturam as relações do dizer, do ver e do fazer pertencem à estrutura da dominação e da sujeição. Começa quando se compreende que olhar também é uma ação ” (Rancière, 2014, p. 17) Del Castillo aponta que essa importância dada ao observador foi bastante forte também em um movimento divergente da Pop Art, mas que compartilhava de algumas caracteísticas: o Minimalismo. Ambos os movimentos “adotam igualmente, formas seriais; insistem na externalidade, na superficialidade das representações e experiências contemporâneas; e se valem da lógica do ready-made não apenas de maneira temática e formal, como estruturalmente” (Foster apud del Castillo, 2008, p. 154).

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Figura 15 - Esquema tridimensional da exposição This is Tomorrow

Fonte: Juan Cabello Arribas4

4Apresentado durante o curso O que é uma exposição? Práticas

Colaborativas para a Construção De Uma Experiência Coletiva no Museu Câmara Cascudo em parceria com a Universidade Federal do Rio Grande do Norte, ministrado em setembro de 2017

O'Doherty destaca a exposição das telas de Frank Stella, de 1960, apresentadas na Galeria Leo Castelli de Nova York, como um marco Minimalista. Isso porque as telas negras tinham como formato o rebatimento de seus núcleos vazios (figura 16), travando um "diálogo sem precendentes" entre as obras e o espaço, graças ao formato inédito das telas. (O’Doherty, 2002, p. 22)

Figura 16 - telas de Frank Stella na galeria Leo Castelli em 1964.

<https://www.aaa.si.edu/assets/images/leocast/fullsize/AAA_leocast_ 54990.jpg> Acesso em 07/11/2019.

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Ao serem apresentadas, as obras pairavam entre o efeito conjunto e a independência. O modo de pendurar era tão revolucionário quanto os quadros; já que a disposição fazia parte da estética, ela cresceu simultaneamente com os quadros. O abandono do retângulo confirmou formalmente a autonomia da parede, modificando para sempre o conceito de espaço na galeria. Parte da mística da superfície pictórica rasa fora transferida para o contexto da arte. (Ibid., p. 28)

Como maior contribuição das propostas minimalistas, del Castillo aponta, além da ampliação do campo escultórico, a ampliação do espaço expositivo. Isso porque o espaço minimalista não se restringia apenas aos espaços institucionalizados, mas a todo o ambiente urbano, de ruas e praças a terrenos e edifícios. E “ao se relacionar com o contexto em que se inseriam, romperam tanto com os limites cúbicos (arquitetônicos) das galerias quanto com os limites físicos (plásticos) do objeto artístico” (del Castillo, 2008, p. 164), criando novas linguagens e novos termos.

As mudanças no panorama artístico, portanto, eram claras. O próprio Donald Judd, ícone do movimento minimalista,

escreveu em seu ensaio “Objetos específicos”, de 1965, que “muito da arte que estava sendo feita não podia mais ser descrita como pintura ou escultura” (Archer, 2012, p. 43). A importância do observador deslocava parte da atenção da obra para o espaço em que ela estava inserida, levando em consideração o tempo de fruição. A arte começava a invadir a vida, como observou o crítico Clement Greenberg, ao afirmar: “o que parece definido é que [os artistas] empenham-se na terceira dimensão porque ela é, entre outras coisas, uma coordenada que a arte deve compartilhar com a não-arte” (Greenberg apud Archer, 2013, p. 43).

OS NOVOS CAMINHOS DA ARTE

O Minimalismo e experimentalismos dos anos 1960 abriram caminhos para novos tipos de arte que se consolidariam a partir, principalmente, da década de 1970. Ao se relacionar com o espaço, levou ao site-specific, que levou à Land Art e Instalações. Ao se relacionar ao sujeito e à teatralidade, levou às perfomances e à arte conceitual. Esses

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novos caminhos, por sua vez, seriam responsáveis por colocar a baixo definitivamente os limites da arte.

Lucy Lippard, crítica americana, tentou documentar todos esses acontecimentos, chegando a um resultado bastante fragmentado. “Não havia nenhuma maneira simples de desenredar todas essas tendências uma da outra e examiná-las separadamente” (Archer, 2013, p. 62). Pairava o questionamento sobre se a arte tinha um formato substancial ou estava se tornando apenas um conjunto de ideias como forma de perceber o mundo. E no entanto, apesar da dificuldade em se definir o resultado desses experimentalismos, alguns deles serão descritos aqui como forma de ilustrar a expansão do campo artístico e expositivo.

LAND ART

A Land Art surgiu a partir da aproximação do Minimalismo ao espaço em que se inseria, mas levando essa condição ao máximo e fazendo desse lugar, a própria obra, de maneira que seria impossível separá-los. Ao extrapolar as paredes da galeria,

essas obras ficam sujeitas também à passagem do tempo, além dos fatores metereológicos.

Ao realizar a obra Spiral Jetty, em 1970, o artista Robert Smithson depositou pedras negras no lago, emergindo na superfície em formato de espiral (Figura 17). Além de estar condicionado pela configuração formal do lago salgado do deserto de Utah, Estados Unidos, era de seu interesse os efeitos que seriam provocados pela deposição de cristais de sal e algas vermelhas, bem como as questões relacionadas à temporalidade sobre a obra.

Embora tenha saído da galeria e pareça se desvincular da arquitetura desses espaços, esse tipo de arte volta para dentro de suas paredes através de fotos, vídeos e outros tipos de documentações e registros.

Quando tais registros eram transportados para dentro do espaço das galerias, não se tornavam apenas um veículo capaz de levar ao olhar do espectador a imagem do que estava do lado de fora, sem que o mesmo tivesse que se deslocar de sua instalação, mas, sim, parte constituinte do trabalho. (...) não eram simplesmente memória, documento ou rastros escultóricos da obra, mas

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fragmentos do que sua totalidade estabelecia - a relação necessária entre obra e contexto. (del Castillo, 2008, p. 167)

Figura 17 - Spiral Jetty, Robert Smithson 1970

Fonte: Dave Sunderland. Disponível em Google Maps. Acesso em 09/11/2019.

A partir dessa relação com a imagem, foram necessários novos meios de transmissão, como televisões, telões e vitrinas,

ou seja, eram evocadas novas concepções de montagem, o que, mais uma vez, distanciava-se da neutralidade do espaço proposta pelo cubo branco.

INSTALAÇÃO

As instalações são o resultado da completa relação entre o objeto instalado (ou objetos) em determinado lugar, o espaço em que está instalado e o espectador, que condiciona a existência da obra, sendo a principal intenção, provocar os seus sentidos. Apesar da difícil definição, reúnem três principais qualidades que foram instauradas pelos experimentalismos das décadas em questão, e classificadas por Fernanda Juncqueira como: in situ, por funcionar apenas em um lugar; site specific, por se tratar de conteúdo para determinado lugar; e

ambientação, por ser formada por um conjunto de objetos

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Figura 18 - Instalação Através, Cildo Meireles

Fonte: Daniela Paoliello.

<http://inhotim.org.br/blog/cinco-obras-para-curtir-com-criancas/> Acesso em 09/11/2019.

Del Castillo aponta para um rebatimento espacial de grande importância provocado pelas instalações: o de que por meio delas, o espaço expositivo adquiriu flexibilidade e caráter lúdico através de recursos arquitetônicos e cenográficos, “uma vez que, no âmbito de suas experimentações, além de trabalhos realizados in situ e em site specific, inserem-se

trabalhos que lidam com ambientações e significados metafóricos” (ibid., p. 184)

ARTE CONCEITUAL

Na arte conceitual, a ideia é o ponto mais importante da obra, sobressaindo-se aos seus aspectos meramente estéticos. Esse tipo de arte fez rever o papel do público, do objeto, do artista, e principalmente das instituições de arte. Isso porque as obras não se apresentavam mais como objeto, mas como processo.

O desaparecimento das obras como objetos concretos e estáveis dará lugar, neste evento, a idéias, conceitos, processos, informações e situações, cujo caráter provisório, imaterial e inacabado funcionou como uma espécie de afirmação para as novas experiências artísticas do momento. (Artmotiv, 2015, n. p.)

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Começando com a criação de uma exposição como discurso na I Documenta de Kassel, passando pela interdisciplinaridade da This is Tomorrow e chegando à impossibilidade de definição precisa dos limites artísticos, percebemos que a arte ganhou a vida e transpassou seus contornos. Mas além disso, Wisnik (2018, p. 16) chega a mencionar uma fusão entre os processos produtivos de artistas e arquitetos, chegando até mesmo a se inverterem, como é o caso de artistas como Richard Serra e Robert Smithson trabalhando com

grossas barras de ferro em estaleiros navais, vestindo botas e capacetes, comandando helicópteros, tratores e escavadeiras, movimentando terra e orientando o trabalho de equipes de operários.

Enquanto que, por outro lado, vemos arquitetos como o mesmo Frank Gehry projetando edifícios singulares através de papéis amassados, que ele e seu assistente dispõe sobre a mesa, olhando-os sob diversos ângulos de modo a avaliar a harmonia visual de suas proporções, conseguida quase que espontaneamente. (Wisnik, 2018, p. 16)

Mostrando que a crise do paradigma moderno nessas décadas provocou um alargamento das antigas fronteiras disciplinares na esfera cultural, aumentando imensamente as possibilidades do fazer artístico, e, consequentemente, dos seus modos de expor. Ao passo que alguns artistas se apropriavam de materiais e técnicas arquitetônicas, arquitetos criavam verdadeiras obras de arte, desvinculando-se cada vez mais da racionalização modernista.

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iii

03. A POLIVALÊNCIA DA CAIXA PRETA

R os en th al Ce nte r of Co nte m po ra ry A rts

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Com as mudanças estruturais no fazer e expor da arte, descritas no capítulo 02, muito foi alterado no que diz respeito à criação de espaços expositivos para atender as novas necessidades de tamanho, forma e características das obras artísticas. Essas mudanças espaciais, bem como a análise de alguns espaços como forma de exemplificação, serão o enfoque deste capítulo.

Na medida em que as vanguardas mais recentes, como o Minimalismo, Pop Art, Videoart, Happenings, Perfomances e Instalações, se desvinculam da pura visualidade e tornam o espectador imprescindível à existência da obra, requerem também uma crescente vinculação ao contexto social e político, e assim começam a ditar suas próprias leis para criação dos espaços expositivos. E uma vez utilizado como parte do discurso artístico, o espaço perde a necessidade de neutralidade tão imposta pelos ideais modernistas. “O recinto da galeria não é mais ‘neutro’. A parede torna-se uma membrana através da qual os valores estéticos e os comerciais permutam-se por osmose” (O’Doherty, 2002, p. 89).

Além disso, as manifestações artísticas das décadas de 1960 e 1970 questionavam exatamente a institucionalização do sistema de arte, apropriando-se de novas propostas e lugares, e colaborando para as reflexões acerca do que seria um espaço ideal de exposição. E como substituição ao paradigma do cubo branco criado durante o modernismo, del Castillo defende em sua tese de doutorado, publicada em 2008 como

Cenário da Arquitetura da Arte, o conceito da caixa preta, no

qual “o espaço não mais se cala para a obra falar; agora, obra e espaço falam, em uníssono, assim como na caixa preta ou ‘lugar teatral’” (del Castillo, 2008, p.329).

Concordando com O’Doherty em seus ensaios do final da década de 1970, del Castillo assume que, uma vez que se torna um ponto chave na comunicação do conteúdo através das obras e exposições, o espaço expositivo perde a necessidade de ser neutro e asséptico em relação ao seu conteúdo. A este argumento, a autora adiciona a necessidade do espaço transmutar-se de acordo com os ideais do curador e designer de exposições, adquirindo uma característica semelhante à

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polivalência dos espaços teatrais através, principalmente, dos recursos cenográficos.

Essa mudança de paradigma está intimamente ligada ao contexto social e político. De acordo com a autora, a arte vincula-se “às transformações sociais em seus aspectos políticos e econômicos” (del Castillo, 2008, p. 319), de forma que existe uma relação de mão dupla entre a produção artística e o contexto em que essa produção está inserida, na qual cada uma das partes influencia a outra. O contexto do capitalismo industrial está estritamente relacionado às mudanças nesse panorama:

Desde o século XIX, esse sistema econômico arrastará consigo a evolução de uma estética ligada ao consumo, ampliando fortemente o mercado artístico. Uma prova disso é o fato de que, desde então, as grandes coleções de arte foram constituídas sobretudo por grandes nomes do empresariado industrial, especialmente norte-americano, tornando-se - em pouco tempo e por iniciativa própria desses colecionadores -fundações e galerias públicas. Dessa maneira, repetindo o pensamento dos grandes industriais, ‘que se fizeram sozinhos’, buscando contribuir para

uma sociedade moderna e livre de tradicionalismos, a arte, assim como a cultura, sob a égide do progresso, passou a ser administrada como empresa financeira - coleções particulares, acervos de museus, tudo se transformava em investimento. (del Castillo, 2008, p. 103)

Enquanto os expressionistas abstratos buscavam se distanciar da impessoalidade trazida pela era industrial, com sua produção em massa, os artistas pop buscavam justamente se apropriar dessa cultura para se destacar. No que diz respeito ao espaço dos museus na pós-modernidade,

atundo sob a lógica do consumo cultural, esse mercado tendia a transformar os museus em empresas, as obras em ações, e os acervos em aval para financiamentos, ampliando a malha institucional por todo o mundo. Assim, vimos a proliferação de galerias, o surgimento de novos espaços, como os centros culturais, mas especialmente a reformulação de antigas concepções museológicas (ibid., p. 323).

O espaço expositivo polivalente como a caixa preta teatral surgia, portanto, não apenas das transformações nas

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dinâmicas de produção da arte, mas também da necessidade de alimentar um consumo cultural de massa, que crescia conforme o aquecimento do mercado a partir dos anos de 1950. Del Castillo destaca a definição de Juan Carlo Rico de Museu-Negócio, que concilia justamente o mercado de massa ao mercado de arte e utiliza-se de “exposições temporárias e itinerantes, tornando-as, em pouco tempo, propensas a transformar-se em espaço de lazer, diversão e espetáculo” (del Castillo, 2008, p. 114), através de montagens elaboradas com ambientações e recursos cenográficos, além de um forte apelo à mídia, em busca de maiores retornos financeiros para as empresas que começaram a investir nessa “cultura de exposições”.

Como produto de uma sociedade espetacularizada,

os espaços dos museus passaram a requerer uma capacidade de jogo espacial semelhante à polivalência dos teatros e óperas, e o modus operandi das montagens a implicar estratégias museográficas dicotômicas: meios transitórios e/ou efêmeros e flexibilização buscam atender à arte como experimento; e, para responder à museofilia,

acrescentam-se, além de documentos, recursos cenográficos à expografia. (ibid., p. 327)

Um exemplo dessa nova característica dos museus pode ser observada na exposição FRIDA KAHLO: suas fotos / olhares

sobre o México, que apresentou ao público a coleção de

fotografias que a artista possuía, tanto anônimas quanto assinadas por grandes fotógrafos, e esteve em cartaz conjuntamente no Museu da Imagem e do Som de São Paulo e no Espaço Cultural Porto Seguro em 2016. Apesar de ter as fotografias como foco, o discurso da exposição apresentava uma visão do México e utilizava fortes recursos cenográficos, dividindo a exposição em dois principais espaços: um bastante lúdico com elementos que remetiam à pintura de Frida Kaklo bem como à vegetação e cultura mexicana, e outro mais introspectivo, remetendo à uma casa, onde as fotografias eram de fato expostas, como pode ser observado na Figura 19.

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Figura 19 - Exposição FRIDA KAHLO: suas fotos / olhares sobre o México

Fonte: Juan Cabello Arribas5

É interessante notar neste exemplo, que existe uma distinção muito clara de espaços, em que um parece alimentar

5Apresentado durante o curso O que é uma exposição? Práticas

Colaborativas para a Construção De Uma Experiência Coletiva no Museu Câmara Cascudo em parceria com a Universidade Federal do Rio Grande do Norte, ministrado em setembro de 2017.

as demandas da sociedade espetacularizada, com cenários detalhados, além da apresentação de vídeos e documentos como forma de contextualização, e outro que apresenta as obras em si. No entanto, mesmo com tal distinção, ambos os espaços são igualmente cenográficos, utilizando uma infinidade de meios efêmeros para criação de atmosferas completamente diferentes da arquitetura do edifício em que estão inseridas.

De acordo com del Castillo, essa gama de possibilidades espacias trazidas pelas exposições como espetáculo nos leva a um limite perigoso, em que “subjetividades temáticas ou conceituais, aglutinadoras de um conjunto de obras, podem comprometer a fruição dos objetos” (del Castillo, 2008, p. 322), mas são também um ponto extremamente positivo ao atrair a atenção de uma sociedade espetacularizada como a nossa. E acerca disso, Hal Foster é bastante crítico ao afirmar que algumas experiências chegam ao ponto de nos subjugar “pois quanto mais optam por efeitos especiais, menos nos envolvem como espectadores ativos” (Foster, 2017, p. 115). Enquanto del

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Castillo trata a espetacularização como um fato inquestionável e tendo as exposições cenográficas como possíveis aliadas na difusão do conhecimento, embora não desconsidere seu ponto fraco, Foster é irremediavelmente contra a relação de exposição como espetáculo, pois recai na fetichização, subjugando o intelecto do espectador ao criar a dependência de fatores externos à obra para sua compreensão.

Ainda acerca da relação entre o espaço expositivo e o teatral, a autora faz outras conexões como a possibilidade que o curador tem de passar como mensagem sua ótica própria acerca de determinadas obras em uma exposição. Assim como o diretor teatral dá uma essência particular às peças com as quais trabalha, o curador cria discursos de acordo com as intenções que deseja comunicar acerca de um determinado período, temática ou artista. Além disso,

Na cultura das exposições, de forma geral, observamos um crescente interesse em se manter a memória coletiva, expresso por mis-sen-scènes espetaculares, simulações e representações. Por serem formas efetivamente ambíguas, relacionadas ao binômio real/imaginário - ora como maneiras

de afastar o contexto expositivo do real, ora como formas de aproximá-los das contingências da vida -, entendemos que são semelhantes às teatrais. (del Castillo, 2008, p. 327)

Dialogando com o conceito de Caixa Preta de Castillo, o estúdio espanhol Sol89, ao explicar sua intervenção no antigo convento de Madre de Dios para criar um espaço de arte contemporânea, em Sevilla, parece dar a definição mais adequada para a necessidade mais desejável ao espaço expositivo de arte no contexto contemporâneo:

Podemos reconhecer que grande parte da expressão da arte contemporânea entende o espaço arquitetônico como matéria de trabalho. Assim, um espaço de exposição poderia permanecer em pontos de reticências, como se fosse um relato inacabado, aguardando que cada exposição venha completá-lo. O espaço do museu contemporâneo poderia então se assemelhar ao espaço teatral, mudando ao longo do tempo. (Sol89, 20146, grifo da autora)

6Disponível em: http://sol89.sol89.com/2003/07/blog-post.html. Acesso

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A arquitetura das instituições não precisa mais ser engessada em paredes brancas e ortogonais. Agora, pode-se brincar com suas formas porque a arte atuará em resposta, desde que haja potencialidades para isso. Desse modo, os espaços expositivos devem possibilitar a criação de diferentes cenários, a apropriação pela arte, além da utilização dos mais variados tipos de tecnologias, desde da iluminação à projeções mapeadas e realidade aumentada. Deve ser, portanto, polivalente.

Às vezes uma exibição específica exige um espaço especialmente constituído. Outras vezes, o tamanho e o peso do trabalho obrigam o prédio a atender certas condições especiais de

infra-estrutura. Quase invariavelmente é exigido um espaço com provisões tecnológicas sofisticadas. Resumindo, espaços destinados a abrigar trabalhos de arte contemporânea devem possuir certas qualidades cuidadosamente definidas, provavelmente incluindo flexibilidade, versatilidade e um alto nível de tecnologia.” (Montaner apud Kiefer, 2000, p. 20)

O OCTÓGONO

Nem sempre, no entanto, as exposições constroem ambientes dentro de outros espaços. Por vezes, a arte se aproveita de suas características para se mostrar da melhor forma. Para exemplificação, foi tomado como exemplo o Octógono, átrio central da Pinacoteca do Estado de São Paulo. O edifício original da Pinacoteca foi construído no final do século XIX para abrigar o Liceu de Artes e Ofícios e teve sua mudança de função com a intervenção de Paulo Mendes da Rocha e equipe, concluída em 1998. Sua característica mais marcante é a clarabóia que toma lugar da nunca construída (pois o edifício não foi finalizado) cúpula e ilumina o octógono e os pátios internos, bem como as passarelas metálicas criadas entre esses pátios para dar um novo eixo de circulação à edificação.

Também foi criada, no espaço do octógono central, uma laje intermediária que delimita um auditório com cerca de 150 lugares destinado a cursos, conferências, cinema, desfiles e outros eventos, o que torna o museu, juntamente com os espaços do

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café/restaurante e das diversas oficinas, um lugar versátil e multifuncional. (Müller, 2000, n. p.)

Figura 20 - Planta baixa do 1º pav. da Pinacoteca de São Paulo

<https://www.archdaily.com.br/br/787997/pinacoteca-do-estado-de-s ao-paulo-paulo-mendes-da-rocha> Acesso em 10/11/2019.

É interessante notar que, apesar de conter salas mais tradicionais, com paredes brancas e ortogonais, os espaços centrais, principalmente o octógono (Figura 21), da Pinacoteca

são intensamente utilizados para exposições de arte contemporânea.

O octógono possui paredes estruturais de tijolos aparentes, uma geometria, como sugere seu próprio nome, não ortogonal e um pé direito duplo em dois dos seus três níveis. Seu interior pode ser visto pelo público através das várias aberturas que tiveram suas esquadrias retiradas na intervenção. Essas características criam um ambiente com personalidade própria, que pode ser facilmente identificado e exprime um contexto único às obras que recebe, indo de encontro, portanto, a todos os preceitos do cubo branco.

Enquanto a exposição de Ernesto Neto (Figura 22) criou uma atmosfera própria utilizando o espaço, Olafur Eliasson tomou partido das características únicas para potencializar sua obra Take your time (Figura 23), que convida o espactador ao deleite do espaço por uma perspectiva invertida. A Figura 24, por sua vez, ilustra a polivalência do espaço, ocupado em julho de 2018 por uma residência artística, fazendo as vezes de um ateliê, e incluindo a obra de arte como processo.

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Figura 21 - Octógono da Pinacoteca de São Paulo

<https://www.archdaily.com.br/br/787997/pinacoteca-do-estado-de-s ao-paulo-paulo-mendes-da-rocha> Acesso em 10/11/2019.

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Figura 22 - Exposição de Ernesto Neto no Octógono da Pinacoteca de São

Paulo.

<https://casacor.abril.com.br/arte/retrospecti va-de-ernesto-neto-e-a-grande-atracao-da

-pinacoteca/> Acesso em 10/11/2019.

Figura 23 - TAKE YOUR TIME DE OLAFUR ELIASSON na Pinacoteca

Fonte: Pontes, 2017, p. 165.

Figura 24 - Residência artística no Octógono, 2018.

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ARQUITETURA COMO ARTE PARA ARTE

Se por um lado obras de arte tomam partido do espaço, por outro, a arquitetura pode ser feita sob medida para certas obras. Um exemplo brasileiro de destaque no mundo todo é o Instituto Inhotim (Figura 25), localizado na cidade de Brumadinho, Minas Gerais.

Graças a uma série de contextos específicos, Inhotim oferece um novo modelo distante daquele dos museus urbanos. A experiência do Inhotim está em grande parte associada ao desenvolvimento de uma relação espacial entre arte e natureza, que possibilita aos artistas criarem e exibirem suas obras em condições únicas. O espectador é convidado a percorrer jardins, paisagens de florestas e ambientes rurais, perdendo-se entre lagos, trilhas, montanhas e vales, estabelecendo uma vivência ativa do espaço.7

As obras são dispostas tanto ao ar livre quanto em pavilhões e galerias, muitas das quais construídas especificamente para uma exposição ou artista. É o caso da

7Informações disponíveis em

<http://inhotim.org.br/inhotim/arte-contemporanea/> Acesso em 10/11/2019.

Galeria Adriana Varejão (Figura 26), projetada pelo arquiteto Rodrigo Cerviño Lopez, em estreita ligação com a artista que lhe dá nome. Com 558m², foi inaugurada em 2008.

Um seleto conjunto de obras da artista contemporânea brasileira faz parte do acervo do Inhotim. Parte encontra-se exposta no interior deste cubo de concreto e outros trabalhos estão instalados na área externa da edificação. O volume prismático nos instiga a desvendar o seu conteúdo. (Ribeiro, 2016, p. 182)

Em espaços como esse, a arquitetura se distancia de vez da neutralidade, chegando a tornar-se parte da obra e colaborando para o retorno da sua aura, tão condenada pelos artistas modernos.

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Figura 25 - Vista aérea do Instituto Inhotim, Brumadinho/MG.

<https://arteview.com.br/projetocultura-promove-visita-guiada-a-inh otim/> Acesso em 09/11/2019.

Figura 26 - Galeria Adriana Varejão no Instituto Inhotim

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A EVOLUÇÃO DO PROGRAMA E A MONUMENTALIDADE

A espetacularização dos museus, tornando-os parte de investimentos altamente lucrativos, foi imprescindível para uma outra grande mudança na arquitetura dos museus contemporâneos: a evolução do seu programa de necessidades. É indispensável que os edifícios abarquem um programa híbrido, que pode incluir cafeteria, lojas de produtos ligados à temática do museu, livraria, ateliês, salas de aula, auditório, espaço para residências artísticas, entre outros.

O edifício construído em 2017 para ser a nova sede do Instituto Moreira Salles (IMS) em São Paulo, por exemplo, teve como partido arquitetônico a continuação do térreo na Avenida Paulista em seu terceiro pavimento (Figura 28), com um mirante para esta avenida, além de um café e livraria. Dessa forma, a instituição atrai uma intensa visitação que pode, dessa forma, tornar-se público para suas exposições. Acerca disso, Montaner escreve:

A afluência maciça de visitantes implicou na necessidade de multiplicar os serviços do museu, com exposições temporárias e locais para consumo, e redundou no crescimento das áreas dedicadas à direção, à educação e à conservação. Os museus contemporâneos seguiram na esteira dos protótipos do movimento moderno e de algumas realizações dos anos cinqüenta, recuperando valores tipológicos dos museus históricos; ao mesmo tempo, porém, eles realizaram uma completa transformação de sua concepção convencional. (Montaner, 2003, p. 08)

É interessante notar que o IMS é a primeira instituição a receber uma exposição permanente do artista Richard Serra na América Latina. A obra Echo (Figura 27) é composta por duas placas de aço com mais de 18 metros de altura, e muito embora o instituto possua uma estrutura reforçada nos pavimentos de exposição, já diminuindo alguns entraves expositivos relacionados a grandes obras, Echo consegue transpor seus limites, e justamente por suas características monumentais, não está em uma das salas de exposições, mas apropriou-se de um dos recúos laterais do prédio.

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Figura 27 -Echo, de Richard Serra, 2016.

<https://cultura.estadao.com.br/noticias/artes,ims-ganha-escultura-gi gantesca-de-richard-serra,70002729846>. Acesso em 10/11/2019.

Figura 28 - Instituto Moreira Salles Paulista

<https://www.archdaily.com.br/br/883093/instituto-moreira-salles-an drade-morettin-arquitetos/5a0184f1b22e38b1dc0002cc-instituto-morei ra-salles-andrade-morettin-arquitetos-foto?next_project=no> Acesso

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A transformação radical mencionada por Montaner se refere tanto às novas possibilidades de espaços expositivos e ao programa de necessidades expandido, quanto à monumentalidade da própria arquitetura, que, no caso dos edifícios existentes, com seus acréscimos e reformulações, e “conforme a intensidade do comprometimento com a espetaculização social (...) pode resultar em colagem e fragmentação de vocabulários arquitetônicos precendentes” (del Castillo, 2008, p. 119).

Acerca desse ponto, Hal Foster (2017) afirma que a arquitetura contemporânea passa por um “cosmopolitismo banal”, no qual os edifícios são pensados, ainda que se considerados as especificidades locais, para produzir uma imagem que circule globalmente. Aplicando essa questão aos museus de arte, o autor defende que “alguns desses edifícios são tão performáticos ou escultóricos que os próprios artistas devem se sentir os últimos a chegar à festa, colaboradores a posteriori” (Foster, 2017, p. 93), apontando para um conflito entre forma e função da arquitetura de museus, os quais não

deveriam possuir uma arquitetura a ponto de atrair visitantes por ela mesma, sobrepondo as obras a serem expostas.

Ainda sobre essa questão, Montaner (2003) defende um ponto de vista mais conciliador entre o papel da arquitetura e sua imagem. Para ele, a “missão primordial (da arquitetura) é expressar o conteúdo do museu como coleção e também como edifício cultural e público” (Montaner, 2003, p. 11). Desse modo, além de mero continente da arte, os edifícios museológicos também guardam a função de mostrar a personalidade de uma determinada localidade.

INSTITUTO TOMIE OHTAKE

Vemos então a proliferação de edifícios-ícones principalmente nas maiores cidades. As instituições buscam se destacar através da arquitetura, muitas vezes traduzindo seus ideais e temáticas em suas próprias paredes.

Seguindo essa linha, o Instituto Tomie Ohtake (Figura 29) é um dos raros edifícios da cidade de São Paulo especialmente projetado, arquitetônica e conceitualmente, para receber

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mostras de artes plásticas, arquitetura e design. Construído em 2001 como parte de um complexo de edifícios de escritórios, possui um programa de exposições marcante na cena cultural brasileira, focado nos últimos 60 anos, período que diz respeito à época de atuação da artista que dá nome ao instituto, incluindo também outras atividades, como debate, pesquisa, produção de conteúdo, documentação e edição de publicações, tendo um papel importante na pesquisa e ensino da arte contemporânea no país8.

Projetado pelo arquiteto Ruy Ohtake para se destacar na paisagem, com cores marcantes, diferenças de gabarito e ondas sinuosas que marcam muito bem a estética de sua fachada, possui salas de exposições com formatos não ortogonais (Figura 31), que ainda assim se mantém flexíveis. Sendo três galerias maiores e quatro salas menores, mas com grande potencial de transformação, como ilustrado pela Figura 30, com a exposição da artista Yoyoi Kusama, fazendo o

8Informações disponíveis em

<https://www.institutotomieohtake.org.br/o_instituto/sobre> Acesso em 10/11/2019.

expectador adentrar em um ambiente lúdico, proporcionado por recursos cenográficos e também tecnológicos.

Figura 29 - Instituto Tomie Ohtake

<https://live.staticflickr.com/2881/9067383150_4f26257ba0_b.jpg> Acesso em 10/11/2019.

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Figura 30 - Exposição Yayoi Kusama no Instituto Tomie Ohtake

<https://www.institutotomieohtake.org.br/exposicoes/interna/obsessao-infinita-de-yayoi-kusama>. Acesso em 10/11/2019.

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Figura 31 - Plantas das salas de exposição do Instituto Tomie Ohtake.

Referências

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