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POR UMA PEDAGOGIA DA IGUALDADE: POR QUE SUPERAR O PRECONCEITO E A DISCRIMINAÇÃO RACIAL NO COTIDIANO ESCOLAR?

TENÓRIO, Aleir Ferraz GASPARIN, João Luiz

INTRODUÇÃO

Um desafio que se apresenta a todos os profissionais da educação, comprometidos com uma prática educativa que vise a promoção e o pleno desenvolvimento do ser humano, pressupõe necessariamente trabalhar por uma pedagogia que promova a igualdade, onde as pessoas possam partilhar das mesmas oportunidades e direitos, respeitando todas as culturas: européia, asiática, africana e indígena, dentre outras, utilizar um processo pedagógico capaz de não silenciar o racismo, o preconceito, e as atitudes de discriminação infligidos a alguns alunos, no cotidiano das atividades escolares; mas ao contrário, uma pedagogia capaz de superá-los.

Neste sentido, o presente artigo, com base no relatório do Parecer do Conselho Nacional de Educação – CNE/CP 3/2004, que instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, aprovado em 10/03/2004, objetiva refletir a respeito da necessidade de superar a discriminação e o preconceito no cotidiano da escola. Segundo Gomes (2008, p. 81):

É bom atentar para o título das diretrizes: Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Ou seja, a discussão sobre a África e a cultura afro-brasileira e africana encontra-se em um campo mais amplo: a educação das relações étnico-raciais. [...] A discussão sobre a questão africana e afro-brasileira só terá sentido e eficácia pedagógica, social e política se for realizada no contexto de uma educação para as relações étnico-raciais.

O intuito, portanto, é sensibilizar os profissionais do processo da educação escolar, da necessidade de se envolverem em um projeto de superação do preconceito racial e da discriminação no interior da escola. Evidencia que não podemos ignorar e nem negar a presença do racismo e das suas nefastas conseqüências à mentalidade de nossos alunos:

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crianças, jovens e adultos, que tentam buscar na educação uma vida melhor e um caminho mais seguro para o seu desenvolvimento enquanto pessoa humana. Como proposta de superação, concordamos com alguns autores quando afirmam que uma possibilidade estaria no investimento, por parte da escola, na educação das relações étnico-raciais, com vistas a educar homens e mulheres na promoção de condições de igualdade no exercício de direitos sociais, políticos, econômicos, dos direitos de ser, viver e pensar (GONÇALVES E SILVA, 2007).

Para responder, em parte, à pergunta formulada no título deste artigo, abordamos o tema sob alguns aspectos que julgamos fundamentais, como os apresentados a seguir.

O PRECONCEITO E A DISCRIMINAÇÃO RACIAL EXISTEM NA SOCIEDADE E, PORTANTO, MANIFESTAM-SE NO COTIDIANO ESCOLAR.

Em primeiro lugar, e enquanto resposta inicial à indagação do por que superar o preconceito e a discriminação no cotidiano escolar, apontamos a afirmação de que o preconceito e a discriminação existem na sociedade. Existindo na sociedade, não há como não manifestarem-se no cotidiano escolar. A escola não é uma organização estanque, apartada da sociedade maior. O racismo, presente com toda a sua força e prejuízo nas mentalidades daqueles que trabalham e estudam em nossas escolas, reflete nas ações e relações desenvolvidas e travadas no seu dia-a-dia. Caso queiramos superar as práticas racistas, e tudo aquilo que de negativo elas trazem consigo, precisamos desmascarar o mito de que nós, no Brasil, vivemos em uma democracia racial. Necessitamos, ainda, encarar a realidade da existência do preconceito e das discriminações, advindos do racismo, bem como encarar que, por sua conta, inúmeras pessoas, independente de seu nível sócio-econômico-cultural, estão a sofrer esse tipo de violência simbólica. Também, faz-se importante lembrar que a Constituição Federal de 1988 no seu artigo 5º, designa o racismo enquanto crime inafiançável. Aplica-se isto, não somente a todos os cidadãos, mas, inclusive, à escola.

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Destacamos a assertiva de Gonçalves e Silva (2004, p.14), de que “ainda persiste em nosso país um imaginário étnico-racial que privilegia a brancura e valoriza, principalmente, as raízes européias da sua cultura, ignorando ou pouco valorizando as outras: indígena, asiática e africana”. Compartilhamos então, da concepção de que este imaginário foi o responsável pela valorização do padrão estético e cultural branco europeu em detrimento, no nosso país, do padrão negro, muito embora este último grupo venha a representar mais de 45% da população brasileira. Esta supervalorização de um único padrão estético teve como resultado a construção das diferenças e hierarquização de grupos e culturas. Em nossa sociedade, no foco deste estudo, o reflexo desta postura, está na valorização do branco europeu, tomado enquanto “raça” superior e na desvalorização do negro, enquanto “raça” inferior.

Mclaren (2000) nos afirma que, ao criar categorias de diferença que localizam as pessoas e os grupos em superiores e inferiores, a discriminação universaliza e naturaliza as diferenças. Assim, os negros, enquanto grupo inferiorizados, vêem-se, “natural” e cotidianamente, sendo julgados por seus atos, comportamentos e idéias, de modo depreciativo, negativo e preconcebido, antes mesmo de pronunciarem uma só palavra. Estas atitudes depõem, como nos afirma Freire (1998), contra a ética universal do ser humano e tornam-se uma afronta dirigida a qualquer pessoa, independente de sua origem.

Reconhecer a existência do racismo na sociedade e, inexoravelmente, na escola, é condição fundamental para o início de um projeto pedagógico de desmistificação da ideológica igualdade racial brasileira. Igualdade esta que, na prática, nunca existiu, muito pelo contrário. Um projeto assim formulado,

Tem por alvo a formação de cidadãos, mulheres e homens empenhados em promover condições de igualdade no exercício de direitos sociais, políticos, econômicos, dos direitos de ser, viver, pensar, próprios aos diferentes pertencimentos étnico-raciais e sociais [...] Que se formem homens e mulheres comprometidos com e na discussão de questões de interesse geral, sendo capazes de reconhecer e valorizar visões de mundo, experiências históricas, contribuições dos diferentes povos que têm formado a nação (GONÇALVES E SILVA, 2007, p. 490).

A reivindicação, por parte do Movimento Social Negro Brasileiro, de que a escola seja um espaço assim constituído é antiga, todavia, continua bastante atual, uma vez que

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poucos passos foram dados, em nossa sociedade, para a superação do preconceito e da discriminação. Assim, faz-se necessário que se eduque para o reconhecimento e valorização das diferentes culturas e etnias que compõem a nossa nação. Com relação aos negros, uma das possibilidades de um trabalho voltado a este reconhecimento pode ser verificado em Cunha Jr. (2002) quando salienta a necessidade de se mostrar o continente africano em toda a sua beleza e inteireza. O conhecimento da História da África promove um melhor entendimento acerca da própria origem do homo sapiens, além de mostrar a riqueza das civilizações africanas enquanto perspectiva de melhor compreensão das raízes da história do povo brasileiro. Tal conhecimento, para este autor, tem como objetivo último superar a violência que o racismo e as discriminações têm infligido às populações afro-descendentes.

Gonçalves e Silva (2004), relatora do parecer que embasa esse artigo, defende que é necessário que se crie uma pedagogia de combate ao racismo e às discriminações. Neste intuito, segundo ela, há que se desfazer alguns equívocos: um primeiro equívoco seria aquele que diz respeito à preocupação de professores em designar seus alunos negros, como negros ou pretos, sem ofensas; outro seria aquele que afirma que os negros são racistas e se discriminam a si mesmos; um terceiro equívoco seria o que defende que a discussão da questão racial não é tarefa da escola, e sim do movimento negro e de pesquisadores interessados nesta temática; por fim, o equívoco de que o mito da democracia racial e da ideologia do branqueamento só atinge aos negros.

É imprescindível que, na efetivação de uma educação das relações étnico-raciais, os equívocos elencados sejam elucidados e desfeitos, uma vez que têm impedido o combate ao racismo e às discriminações. O parecer às Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais evidencia a necessidade de professores qualificados para uma abordagem assim mencionada. Professores preparados para direcionarem, positivamente, as relações entre os alunos de diferentes pertencimentos étnico-raciais e que sejam sensibilizados à necessidade do trato destas questões e em condições de educar “cidadãos orgulhosos de seu pertencimento étnico-racial, para interagirem na construção de uma nação democrática, em que todos, igualmente, tenham seus direitos garantidos e sua identidade valorizada”. (GONÇALVES E SILVA, 2004, p. 10).

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A SOCIEDADE TEM UMA DÍVIDA SOCIAL, MORAL E ECONÔMICA PARA COM OS NEGROS.

Precisamos, também, superar o preconceito e a discriminação no cotidiano escolar, porque temos, enquanto sociedade, uma dívida social, moral e econômica para com os negros. No parecer que estamos buscando embasar a nossa análise, a relatora menciona a dívida por parte do Estado e da sociedade para com os afro-descendentes. Trata-se de uma dívida proveniente dos danos psicológicos, materiais, sociais, políticos e educacionais impostos aos negros, não apenas durante o regime escravista, mas, estendendo-se desde o período pós-abolição até aos dias atuais.

Embora não haja dúvida quanto à participação dos negros na formação da nação brasileira, os afro-descendentes foram submetidos a um sistemático processo de invisibilidade, que lhes custou uma vida sempre à margem da nossa história oficial, trazendo-lhes, não apenas prejuízos materiais, mas influenciando decisivamente em sua subjetividade, na não-construção de uma identidade negra positiva. A limitada visão que possuíam de si próprios, levou os negros a negarem-se e, na visão de Munanga (2004, p. 102), “no momento em que internalizando uma imagem negativa de si próprio e uma imagem positiva do outro, o indivíduo estigmatizado tende a se rejeitar, a não se estimar e a procurar aproximar-se em tudo do indivíduo estereotipado positivamente”.

A despeito da ausência de qualquer política de reconhecimento por parte do Estado Brasileiro, só essa construção identitária negativizada já bastaria para acarretar, aos negros, prejuízos materiais, educacionais, políticos e sociais. O parecer 03/2004 do CNE deixa claro que o dever do Estado está em promover e incentivar políticas de reparações, no sentido de cumprir a Constituição Federal no seu artigo 205, que assinala:

[É] Dever do Estado de garantir indistintamente, por meio da educação, iguais direitos para o pleno desenvolvimento de todos e de cada um, enquanto pessoa, cidadão ou profissional. Sem a intervenção do Estado, os postos à margem, entre eles os afro-brasileiros, dificilmente, e as estatísticas o mostram sem deixar dúvidas, romperão o sistema meritocrático que agrava desigualdades e gera injustiça, ao reger-se por critérios de exclusão, fundados em preconceitos e

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manutenção de privilégios para os sempre privilegiados (GONÇALVES E SILVA, 2004, p. 11).

Esta dívida se perpetua. De acordo com o senso de 2000, a população composta por negros (incluem-se aqui, as pessoas que se auto-classificam, segundo o senso do IBGE/2000, em pretas e pardas) chega a 75 milhões de brasileiros. Dado este, que faz com que o Brasil tenha a segunda maior população de negros do mundo. Perde apenas para a Nigéria. Ainda assim, trata-se de uma população excluída dos bens de consumo, de uma justa política social e da garantia de acesso e permanência, com qualidade, em todos os níveis de ensino do país, e, deste modo, sobreviva em um processo de extrema desigualdade social.

Esse débito social, moral e econômico será pago, segundo Gonçalves e Silva (2004, p. 12), com a implementação de uma séria política de reconhecimento, que “implica justiça e iguais direitos civis, culturais e econômicos, bem como a valorização da diversidade”. Implica também, segundo a autora, um trabalho sistemático de desconstrução do mito da democracia racial brasileira, no que diz respeito à difusão da crença de que se os negros “não atingem os mesmos patamares que os não-negros, é por falta de competência ou de interesse, desconsiderando as desigualdades seculares que a estrutura social hierárquica cria com prejuízo para os negros”.

O Brasil é tido como um país mestiço, seus ícones culturais são mestiços, a maior personalidade brasileira de projeção mundial é negra – o jogador de futebol Edson Arantes do Nascimento – Pelé; entretanto, somos um país onde a cor aparece pouco. As novelas, as propagandas que aparecem em grande número nos jornais, revistas e televisões são estreladas por modelos brancos, em sua maioria; em que as bonecas vendidas às nossas crianças, brancas e não-brancas, obedecem a um padrão de beleza europeu (COELHO, 2007). Enquanto nação a abrigar a segunda população de negros do mundo, a cor precisa ser evidenciada em nosso país.

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TODAS AS PESSOAS NASCEM LIVRES E IGUAIS EM DIGNIDADE E DIREITOS.

Um dos princípios da Declaração Universal dos Direitos Humanos está relacionado à liberdade e dignidade a que todos nós, indistintamente, temos direito. Nascendo livres e iguais, todos têm a capacidade para gozar os direitos e as liberdades sem distinção de qualquer espécie. Cada um tem o direito de ser, em todos os lugares, reconhecido como pessoa.

Este, para nós, seria um quarto aspecto da resposta à pergunta: por que superar o preconceito e a discriminação racial no cotidiano escolar? Em consonância com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, formulada em 1948, este princípio: “todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos”, guarda em si, a necessidade de uma séria e criteriosa reflexão por parte de todos nós, educadores, comprometidos em trabalhar a educação das relações étnico-raciais. Esta Declaração está a completar 60 anos, no entanto, muito ainda precisa ser feito para que, de fato, as pessoas negras sejam tratadas em igualdade de direitos e dignidade.

Para Munanga & Gomes (2006), ao subjugar seres humanos, o regime escravocrata transformou pessoas livres em sua terra natal, em mercadorias. Milhares de mulheres e homens foram despojados de sua humanidade, considerados e tratados tão somente como força animal, nada mais do que meros objetos, com os quais se negociava com o fim de auferir lucros.

É preciso que tenhamos claro que esse processo de desumanização do negro trouxe-lhe, como vimos, sérios danos psicológicos, sociais, políticos e econômicos. O resultado destes prejuízos ainda, hoje, são presentes e quebram os princípios da liberdade e igualdade humana, defendidos na Declaração Universal dos Direitos Humanos. Vale ressaltar, novamente, o parecer do CNE, quando afirma que:

Se não é fácil ser descendente de seres humanos escravizados e forçados à condição de objetos utilitários ou a semoventes, também é difícil descobrir-se descendente dos escravizadores, temer, embora veladamente, revanche dos que, por cinco séculos, têm sido desprezados e massacrados. Para reeducar as relações étnico-raciais no

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Brasil, é necessário fazer emergir as dores e medos que têm sido gerados. É preciso entender que o sucesso de uns tem o preço da marginalização e da desigualdade impostas a outros. E então decidir que sociedade queremos construir daqui para frente (GONÇALVES E SILVA, 2004, P. 14).

Fazer emergir dores e medos. Ter ousadia para abrir uma discussão em torno de que uns podem usufruir da maioria dos bens de consumo e de uma educação de qualidade hoje, dada a exploração a que outros, a maioria negros, foram e ainda são submetidos. Ensinar que, enquanto seres históricos, podemos contribuir para com uma possível mudança de rumos e até mesmo escolher que sociedade queremos construir daqui para frente. Pensamos que precisa ser uma sociedade que possua a marca do cumprimento dos princípios que regem a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Uma sociedade que não assuma a culpa pela desumanidade defendida e praticada no passado, porém, que se responsabilize, moral e politicamente, pelo combate ao racismo e tudo aquilo que ele gera. Faz-se necessário sonhar e lutar para um mundo em que todos trabalhem pela promoção do bem comum e pela realização e crescimento de todos, enquanto seres humanos.

EXISTEM DADOS QUE REVELAM A EXISTÊNCIA DE UM APARTHEID SOCIAL NO BRASIL

Em último lugar, queremos afirmar que precisamos superar o preconceito e a discriminação racial, porque, no Brasil, dados revelam claramente, que os negros estão em séria defasagem social em relação aos brancos e a escola pode contribuir, também, para o questionamento dessa situação.

O Relatório de Desenvolvimento Humano – racismo, pobreza e violência – PNUD (2005), traz alguns dados que revelam esse apartheid social em que vivem os negros em nosso país. Eis alguns deles:

Em relação ao Índice de Desenvolvimento Humano – IDH: O da população branca no Brasil, no ano de 2000, era de 0,814 enquanto o da população negra era de 0,703.

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Com relação a dados referentes a ricos e pobres, temos que, embora os negros representem 45,7% da população do país, sua participação chega a 70% entre os 10% mais pobres. Isso quer dizer que dos pobres existentes, a maioria, são negros. O que mais, além do racismo e da discriminação racial, justificaria essa diferença?

Em 2003, os homens brancos ganhavam em média 113% mais que os homens negros e as mulheres brancas, 84% mais que as mulheres negras. Juntando ao preconceito racial, o preconceito de gênero, as mulheres negras se encontram numa posição ainda mais desigual.

A diferença de escolaridade entre brancos e negros com mais de 25 anos passou de 1.7 anos, em 1960, para 2.1 anos em 2000. Também grave é o baixíssimo acesso do negro ao ensino superior: em 2001, representava 2,5% da população brasileira. O relatório do PNUD 2005 aponta que esse percentual foi atingido, nos Estados Unidos, em 1947. Período em que vigorava naquele país a segregação, intolerância e violência racial explícita.

Em 2000, a proporção de negros que viviam em aglomerados subnormais – favelas, palafitas e assemelhados – era quase o dobro da de brancos. Este dado torna-se facilmente comprovado ao visitarmos as favelas do Rio de Janeiro, São Paulo ou mesmo as periferias de qualquer uma de nossas cidades. Nas batidas policiais, por exemplo, a maioria das pessoas abordadas é sempre negra. Ao visitarmos os presídios brasileiros, também podemos comprovar a grande maioria de negros – pessoas detentoras de baixíssimo, ou nenhum poder aquisitivo.

Em relação a expectativa de vida, embora haja um crescimento apontado para o Brasil, ainda temos que, uma pessoa negra nascida em 2000 viverá, em média, 5,3 anos a menos do que uma pessoa branca. Os homens negros são os mais prejudicados: em 2000, tinham uma esperança de vida de 63,27 anos, menor que a dos homens brancos em 1991, 64,36 anos. Isto em virtude da falta de condições econômicas e financeiras capazes de proporcionar acesso à saúde, a uma boa alimentação, a condições de higiene e à necessidade de terem que se submeter a trabalhos que desgastam a pessoa ou que oferecem riscos à sua integridade física.

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Assim como defendemos que não podemos fazer vistas grossas à existência do preconceito e da discriminação na sociedade e, por extensão na escola, precisamos também entender que os números apontados, comprovando a existência de um apartheid social no Brasil, têm origem num modo de organização social que privilegia o padrão de beleza branco, que acredita, enfim, na existência de uma raça superior.

CONCLUSÃO

Procuramos neste artigo refletir em torno da resposta à indagação do por que superar o preconceito e a discriminação racial no interior da escola, por acreditar que, enquanto negarmos a sua existência, pouco poderemos fazer para a superação. Também por acreditar que a escola pode fazer alguma coisa pelos alunos que por ela passam, no sentido de questionar o conhecimento que não leva em consideração a presença de outras culturas na nossa formação identitária, e, ao mesmo tempo, mostrar a riqueza de cada uma delas.

Como vimos, a primeira condição que colocamos para a superação do racismo é desmistificar a ideológica igualdade racial brasileira. É necessário crer na existência do preconceito e da discriminação racial, enquanto conseqüência da hierarquização das raças. Outro aspecto da resposta que apontamos foi em relação à dívida que, enquanto sociedade hoje, possuímos em relação aos negros. Uma indenização pelos danos sofridos, proveniente de séculos de exclusão e abandono a que os negros foram submetidos, precisa ser liquidada. Pontuamos também que precisamos superar o preconceito e a discriminação por que, enquanto humanos que somos, possuímos o direito de sermos tratados como tal. Como último aspecto do questionamento inicial abordamos a existência de números oficiais que comprovam a segregação racial no Brasil.

Por fim, acreditamos na possibilidade da escola contribuir na reversão deste cenário de exclusão, resultante do processo de preconceito e discriminação, por partilhamos da concepção de que o homem não se apresenta enquanto ser pronto, acabado. Ao contrário nós, mulheres e homens, construímos a materialidade e, nessa mesma medida,

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construímos o imaterial – o subjetivo. Constituímo-nos, portanto, enquanto sujeitos que, ao mesmo tempo em que sofremos a ação do contexto, no qual estamos inseridos, também somos capazes, com nossa atuação, de agir neste contexto, contribuindo para com a sua modificação. É neste processo de desenvolvimento cíclico que conhecemos e adquirimos experiências, dentre estas, as que acreditam na existência de preconceitos raciais e suas perspectivas de superação.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Parecer do CNE/CP 003/2004, aprovado em 10 de março de 2004. Diretrizes Curriculares nacionais para a educação das relações étnico-raciais e para o ensino de história e cultura afro-brasileira e africana, 2004.

______. Constituição: República Federativa do Brasil, Brasília: Horizonte Editora, 1988.

COELHO, Wilma Nazaré Baía. O silêncio tácito sobre a cor. Revista Brasileira de Educação. Rio de janeiro: V. 12, n. 34, 2007.

CUNHA JR., Henrique. África-Brasil no pensamento escolar. Revista Kawé Pesquisa, Ano I, nº. 1, 2002.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1998.

GOMES, Nilma Lino. A questão racial na escola: desafios colocados pela

implementação da Lei 10.639/03. In MOREIRA, Antonio Flavio; CANDAU, Vera Maria (orgs). Multiculturalismo Diferenças Culturais e Práticas Pedagógicas. Petrópolis, Vozes, 2008.

GONÇALVES E SILVA, Petronilha Beatriz. Aprender, ensinar e relações étnico-raciais no Brasil. Porto Alegre: Revista Educação, nº. 3, 2007.

______. (Relatora) Parecer das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Ministério da Educação/SEPPIR. Brasília, 2004.

MCLAREN, Peter. Multiculturalismo Revolucionário: pedagogia do dissenso para o novo milênio. Porto Alegre: ARTMED Editora, 2000.

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MUNANGA, Kabengele; GOMES, Nilma Lino. O negro no Brasil de hoje. São Paulo: Editora Global, 2006.

______. Rediscutindo a Mestiçagem no Brasil. São Paulo: Autêntica, 2004. PNUD. Relatório de Desenvolvimento Humano Brasil 2005: Racismo, pobreza e violência. Brasília, 2005.

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