• Nenhum resultado encontrado

PROPRIEDADES PROSÓDICAS DA FALA DIRIGIDA À CRIANÇA COMO PISTAS DISTINTIVAS DA POSIÇÃO DO ADJETIVO DENTRO DO DP

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "PROPRIEDADES PROSÓDICAS DA FALA DIRIGIDA À CRIANÇA COMO PISTAS DISTINTIVAS DA POSIÇÃO DO ADJETIVO DENTRO DO DP"

Copied!
10
0
0

Texto

(1)

PROPRIEDADES PROSÓDICAS DA FALA DIRIGIDA À CRIANÇA COMO PISTAS DISTINTIVAS DA POSIÇÃO DO ADJETIVO DENTRO DO DP

Azussa Matsuoka - UFJF Maria Cristina Lobo Name - UFJF

0 Introdução

Os primeiros meses de vida são cruciais para a aquisição da linguagem. Durante esse período, os bebês aprendem a utilizar informações lingüísticas e não lingüísticas para identificar e extrair palavras do fluxo de fala.A partir do final do primeiro ano de vida até a fase dos 3 a 4 anos de idade, a criança evolui rápida e naturalmente, de uma produção/compreensão de palavras isoladas até um domínio lingüístico quase pleno, que se assemelha ao de um adulto.

O mecanismo pelo qual se dá esse processo é o foco de inúmeros trabalhos científicos que se dividem em várias linhas teóricas. O presente trabalho assume a Teoria Gerativa, nos moldes do Programa Minimalista (Chomsky, 1995 e obras seguintes). Assumimos, portanto, que a partir do momento que o bebê é exposto a uma língua L, os seus sistemas cognitivos captam as informações necessárias ao desencadeamento do sistema computacional que constitui a Faculdade da Linguagem no sentido estrito (FLN). São o sistemas cognitivos com os quais FLN faz interface: o sistema sensório-motor, ou articulatório perceptual, e o sistema conceitual-intencional, ou sistemas de pensamento.

Nesses termos, o presente trabalho aventa uma possibilidade de associar o modelo de língua proposto pela teoria gerativa a um modelo de processamento lingüístico nos termos de Correa (2006). Essa associação promove uma ponte entre dois pontos cruciais para a aquisição da primeira língua que são: uma predisposição para a aquisição da linguagem e habilidades perceptuais que permitam a identificação das propriedades dessa língua para o desencadeamento desse processo.

Christophe & Dupoux (1996) argumentam que pistas prosódicas podem ser usadas por bebês a fim de segmentar o contínuo da fala em unidades prosódicas menores que sentenças, mas maiores que palavras. Assumimos a hipótese do Bootstrapping Fonológico/Prosódico proposta por Cristophe et al. (1997) que defende que a percepção de propriedades sonoras da língua seria um dos desencadeadores do processo de segmentação de palavras, e mais do que isso, sustenta que informações fonológicas da fala são suficientes para desencadear o processo de aquisição de uma língua natural.

A hipótese da segmentação prosódica é baseada na idéia de que a fala é espontaneamente percebida como uma linha de constituintes prosódicos e que esse processo perceptual é um dos primeiros estágios do processamento, e que posteriormente alimenta o nível lexical. Sob essa visão, as unidades prosódicas seriam usadas pelos bebês para construir o léxico e por adultos para acessar elementos desse léxico (Christophe & Dupoux, 1996).

Dessa forma, propriedades fonológicas poderiam desencadear o processo de aquisição lexical de duas formas:

1. A prosódia forneceria uma segmentação inicial, cujos resultados seriam unidades menores, mais fáceis de serem segmentadas a fim de se atingirem as unidades lexicais;

2. Propriedades prosódicas, agindo em conjunto com as propriedades fonológicas e distribucionais, facilitariam a distinção dos elementos lexicais e seu mapeamento em categorias gramaticais.

Na presença de crianças, adultos de várias culturas do mundo tendem a modificar a sua fala. A fala dirigida à criança ou IDS (termo mais freqüente na literatura - abreviação de Infant Directed Speech) possui alterações significativas no nível prosódico que já foram observadas em vários trabalhos. Para citar apenas alguns, Garnica (1977 apud Fernald, 1994) documentou uma freqüência fundamental (F0) média mais alta e maiores variações de F0 na fala dirigida a crianças de dois anos que na fala dirigida ao adulto, assim como um maior uso de elevações no contorno de F0. Em análise acústica da fala de mães alemãs, Fernald & Simon (1984 apud Fernald, 1994) encontraram que, mesmo com recém-nascidos, as mães faziam uso de F0 média mais alta, diferenças maiores de F0, pausas mais longas, enunciados mais curtos, e contornos de F0 mais estereotipados que na fala do

(2)

adulto. Em diferentes contextos interacionais, comparada à fala dirigida ao adulto, a IDS é mais lenta: além das palavras serem faladas em tempo mais lento, as pausas encontradas em fronteiras de frases são mais longas na IDS (Andruski & Kuhl, 1997; Fernald & Simon, 1984; Papousek, Paousek & Haekel, 1987 apud Trainor & Desjardins, 2002). Características da IDS poderiam facilitar o processo de aquisição lexical, ampliando algumas propriedades da língua, e conseqüentemente, facilitando a identificação de elementos pelo bebê. Koponen & Lacerda (2003) observaram um alongamento final no nível da palavra na comparação da IDS com a fala dirigida ao adulto e os autores consideram que o alongamento final poderia funcionar como um importante marcador dos constituintes da sentença.

O presente trabalho focaliza a aquisição de adjetivos e investiga propriedades prosódicas poderiam auxiliar o bebê/criança no seu reconhecimento do fluxo de fala. Os adjetivos são membros de uma classe aberta – o que permite que novos elementos sejam adicionados indefinidamente – e no Português do Brasil (PB) essa classe gramatical não apresenta uma ordem tão rígida como em outras línguas – como no inglês, por exemplo. Em PB, apesar da ordem canônica ser a forma anteposta, existe uma flutuação na posição de alguns adjetivos (ex: menina bonita/bonita menina) e esse fato pode, de algum modo, influenciar no processo de aquisição lexical. A ordem estrutural do DP complexo no PB não parece ser uma fonte totalmente segura para isso. Em um trabalho que investigou a relação entre a posição do adjetivo e o envelope prosódico do DP, Serra (2005) quantificou os contornos prosódicos da fala adulta e verificou que a prosódica não é indiferente ao posicionamento do adjetivo – em anteposição ou posposição.

A fim de investigarmos se os parâmetros prosódicos seriam pistas potenciais para a distinção da posição do adjetivo na IDS, propomos duas atividades experimentais a serem aplicadas a mães e pais de crianças em fase de aquisição lexical.

1 ATIVIDADE EXPERIMENTAL I – propriedades entoacionais da IDS na ausência da criança

1.1. Objetivos e Previsões

Esta atividade tem como objetivo investigar se a posição do adjetivo é marcada prosodicamente como verificado na fala adulta (Serra, 2005). Nossas previsões são que as propriedades entoacionais do DP, além de serem distintas para as categorias ADJ e N, são amplificadas na fala dirigida à criança em comparação à fala dirigida ao adulto.

1.2. Procedimento

Foram realizadas gravações de histórias infantis contendo DPs complexos do tipo DET–N– ADJ cujos adjetivos pudessem ser posicionados tanto na ordem não-marcada como na ordem marcada. Posteriormente, foi efetuada análise acústica dos DPs complexos através do software de análise acústica Praat.

O material utilizado para o experimento foi: 1 laptop; pranchas de 4 pequenas histórias digitadas no programa power-point ;1 microfone acoplado a fone de ouvido; software de gravação digital Sound Forge versão 8,0 e software de análise acústica praat.

Foram criadas 4 pequenas histórias. A primeira e a terceira eram distratoras e não foram usadas para a obtenção dos dados. A segunda e a quarta histórias continham os DPs a serem analisadas, que totalizaram um conjunto de 15. Os DPs eram formados por nomes e adjetivos. Os adjetivos escolhidos permitiam anteposição ou posposição ao nome, sem alteração significativa do valor semântico (ex: um gorila charmoso, uma pesada barriga)1.

Como mencionamos anteriormente, os 15 DPs do tipo DET-N-ADJ foram constituídos por grupos de nome-adjetivo contendo adjetivos que permitem variação na ordem dentro do sintagma – forma não-marcada ((DET-N-ADJ) ou ordem marcada (DET-ADJ-N). Tomou-se o cuidado de se controlar o número mínimo de sílabas – 3 - de cada elemento (nome ou adjetivo), sendo que grande parte dos nomes e adjetivos eram trissílabos. Além disso, controlou-se também a sílaba tônica de

(3)

modo que todos os nomes e adjetivos eram paroxítonos começados por consoantes. Procuramos equilibrar a quantidade de adjetivos de sentido positivo e negativo, a fim de minimizar o possível efeito desse valor pragmático nos parâmetros prosódicos.

As histórias distratoras tinham o objetivo de “camuflar” os DPs para que o leitor não identificasse o objetivo da atividade. As gravações foram programadas para serem feitas em dois dias diferentes. Para isso, foram criadas as duas versões que diferiam apenas na ordem dos adjetivos e nomes. Na versão do segundo dia de gravação (versão 2) procedeu-se apenas à inversão dos DPs da versão 1 (versão do primeiro dia de gravação). Cada história era projetada na tela do computador em uma só imagem. Foi mantido um intervalo superior a um mês entre a gravação da primeira e segunda versões, lidas pelo mesmo sujeito. Esse intervalo tinha o propósito de disfarçar a inversão dos DPs.

Os DPs foram distribuídos da seguinte forma: 7 na primeira história e 8 na segunda. Na versão 1, uma história continha 4 DPs com os adjetivos em posposição e 3 em anteposição distribuídos de forma aleatória. A outra história possuía 4 adjetivos antepostos e 4 pospostos distribuídos também aleatoriamente.

1.3. Método

As histórias foram gravadas com o uso do programa Sound Forge versão 8.0 através de um microfone acoplado a fone de ouvido que minimizava a movimentação do microfone. As 4 histórias de cada versão foram gravadas sem interrupções e segmentadas posteriormente. As versões foram gravadas em dias diferentes na ausência de crianças, no Laboratório do Centro de Humanidades da Universidade Federal de Juiz de Fora.

As gravações eram feitas em duas etapas em dias diferentes. Na primeira, o voluntário lia a versão 1, na segunda, o voluntário lia a versão 2 que possuía os grupos DPs em ordem invertida àquela apresentada na primeira etapa. Os voluntários receberam orientação para que lessem como se estivessem contando uma história para sua criança.

Cada voluntário leu um total de 15 sintagmas com adjetivo anteposto e 15 com adjetivo posposto. Foram analisadas as leituras de dois homens e duas mulheres. Para o presente artigo serão considerados somente os dados da IDS feminina perfazendo um total de 30 sintagmas antepostos e 30 sintagmas pospostos.

1.4. Participantes

As leituras foram efetuadas por 6 voluntários do sexo masculino e 6 do sexo feminino que mantêm contato direto com crianças. Desse total, duas mulheres foram descartadas por falhas no equipamento de gravação. Uma mulher e dois homens foram descartados por não comparecerem para a gravação da segunda versão. Uma mulher foi descartada porque sua leitura não apresentava características de IDS. Descartamos também a gravação de um homem que ao invés de ler as histórias, procedeu a uma interpretação das mesmas, não pronunciando os DPs alvo.

1.5 Resultados

As gravações foram analisadas através do software de análise acústica Praat, quantificando-se os valores de duração, intensidade e freqüência fundamental comparando os dois tipos de DPs complexos2. Os valores dos componentes da entoação – duração, intensidade e freqüência fundamental - foram compilados para cada componente do DP nas sílabas tônica, pré-tônica e pós-tônica e posteriormente foram extraídas as médias. As falas feminina e masculina foram analisadas separadamente.

Análise e discussão dos resultados da Duração

2 Para efeito de nomenclatura, adotaremos o seguinte padrão: para o DP constituído de DET + X + Y, convencionamos

(4)

Os valores de duração foram obtidos em milésimos de segundo (ms). Analisando-se os gráficos, podemos observar que há um alongamento das sílabas do segundo elemento com relação ao primeiro elemento, assim, seja ele qual for, o segundo elemento do DP tem uma maior duração.

No entanto, quando o adjetivo se encontra em segunda posição, as diferenças entre as tônicas aumentam significativamente. Com o adjetivo posposto, a diferença entre a tônica do segundo elemento (ADJ) e a tônica do primeiro elemento (N) é de 135,5ms (t(58)= 7,129; p<0.001).

Quando o adjetivo é anteposto, as diferenças entre as tônicas de N e ADJ cai para 18,1ms. Estatisticamente, esse valor não é significativo (t(58)=0,913; p= 0.365).

0 50 100 150 200 250 300

pre ton pos pre ton pos Adjetivo Nome Média da Duração (ms) 0 50 100 150 200 250 300 350

pre ton pos pre ton pos Nome Adjetivo

Média da Duração (ms)

Figuras 1 e 2: Médias da Duração na IDS feminina, na ausência da criança.

Esses resultados confirmam nossas previsões que, em termos da duração, o adjetivo possui propriedades específicas - quando em posposição, ADJ dura mais que N e, em anteposição faz com que as durações das sílabas tenham valores mais próximos. Esses dados são congruentes com os resultados de Serra (2005) mas as diferenças na situação de contação de história parecem ter sido mais acentuadas que na fala dirigida ao adulto. Na posposição, Serra obteve diferença de 51ms e em anteposição de 24ms.

Com base nesses dados e podemos dizer que no DP, o elemento que se encontra em segunda posição possui uma duração maior, mas esse comportamento não é uniforme. Quando o segundo elemento é ocupado por um adjetivo, as sílabas foram muito mais longas. Mais ainda, quando o adjetivo ocupa a segunda posição, a diferença entre a duração da tônica do segundo elemento com relação ao primeiro elemento chega a ser 10 vezes maior. O segundo elemento “perde força” quando o adjetivo se encontra anteposto. Com isso, defendemos que o adjetivo altera os valores do parâmetro duração, marcando sua posição dentro do DP.

Valor da duração no eixo paradigmático:

Ainda analisando os valores de duração, efetuamos o cálculo da diferença do valor da tônica do primeiro e segundo elemento no eixo paradigmático. A comparação é feita com ADJ e N inseridos em DPs diferentes mas na mesma posição estrutural - ou seja, ocupando a mesma posição no DP. Os valores médios são dados na tabela 1:

Fala Feminina

1o elemento 2o elemento

ADJ N

Pré-tônica Tônica Pós-tônica Pré-tônica Tônica Pós-tônica

146,3 236,2 139,3 167,1 254,3 204,1

(5)

163,2 176,7 142,8 168,5 312,2 220,0 Tabela 1: valores médios de duração (ms) na IDS feminina, na ausência da criança.

Quando o adjetivo se encontra na posição de primeiro elemento o valor médio da sua tônica é 59,5ms maior que a tônica de N ocupando a primeira posição (t(58)=3,380; p<0.01). Quando o adjetivo está em segunda posição, a duração de sua tônica com relação à tônica de N na mesma posição é 57,9ms maior (t(58)=2,541; p<0.02).

Os resultados apresentados apontam fortemente para distinções entre ADJ e N no parâmetro da duração, pois embora os maiores valores de duração estejam no segundo elemento, o adjetivo “carrega” consigo o seu efeito de alongamento independente da posição que ocupar dentro do DP, diminuindo a diferença quando em anteposição e realçando a diferença em posposição. No que diz respeito à duração, a estrutura prosódica não é, portanto, indiferente à mudança de ordem.

Análise e discussão dos resultados de Intensidade

Os valores de intensidade foram obtidos em decibéis (dB) e foram extraídos no ponto de maior intensidade da sílaba. As curvas são apresentadas a seguir.

Figuras 3 e 4: Média da intensidade na anteposição e posposição do adjetivo, na IDS feminina, na ausência da criança, em dB.

Analisando a curva de intensidade da IDS na ausência da criança, observamos o seguinte padrão3 na curva ADJ-N: a intensidade cresce até a tônica do primeiro elemento, decresce até a pós-tônica do primeiro elemento e cresce de novo até a pós-tônica do segundo elemento. A partir da pré-tônica do segundo elemento, a curva continua em sentido decrescente. A curva de N-ADJ apresentou um padrão diferente: a curva decresce ao longo do primeiro elemento e sobe em sentido crescente na pré-tônica do segundo elemento, decrescendo depois da tônica.

Com o adjetivo em anteposição, o valor médio de intensidade da tônica do primeiro elemento (ADJ) foi significativamente maior que da tônica do segundo elemento (N), (t(58)=3,498; p < 0.001). No entanto, com o adjetivo em posposição a diferença entre as tônicas não foi significativa (t(58)=0,346; p=0.731).

Parece que, para o parâmetro intensidade, existem propriedades distintas para as curvas das categorias ADJ e N (a curva de N é decrescente a partir da pré-tônica e a curva de ADJ cresce até a tônica para depois decrescer) e embora a sílaba tônica seja sempre a segunda (palavras paroxítonas), o pico de intensidade da palavra, no caso de N, cai sobre a pré-tônica.

A análise dos nossos dados sugere que a elevação intensidade se dá apenas na tônica do adjetivo e não na do nome. Isso evidencia a colocação de uma “força” extra no adjetivo que parece “realçá-lo” no DP.

3 Esse padrão foi encontrado tanto na fala feminina quanto na masculina, na ausência da criança (ver Matsuoka, 2007)

Curva da Média de Intensidade - Fala Feminina 6,2 6,4 6,6 6,8 7 7,2 7,4 7,6

pre ton pos pre ton pos

Adj-N

Curva da Média de Intensidade - Fala Feminina 6,2 6,4 6,6 6,8 7 7,2 7,4 7,6

pre ton pos pre ton pos

(6)

Análise de discussão dos resultados da Freqüência Fundamental (F0)

Os valores de F0 foram obtidos em Hertz (Hz) e foram extraídos no ponto de maior intensidade da sílaba. Os pontos que não apresentaram F0 ou pitch não foram computados para a média geral. Os gráficos de F0 são apresentados a seguir.

Figura 5 e 6: Média de F0 (Hz) na anteposição e posposição do adjetivo na IDS feminina, na ausência da criança.

Existe uma semelhança entre os gráficos de F0. Independente da categoria do primeiro elemento – N ou ADJ – a tônica possui sempre o maior valor de pitch do DP. O comportamento da curva também é mantido, ainda que bem mais acentuada com o adjetivo anteposto. A curva de F0 terá seu ápice na tônica do primeiro elemento havendo uma queda até a pós-tônica do segundo.

Analisando no eixo paradigmático, no entanto, podemos perceber um aumento do valor de F0 quando a primeira posição é ocupada por um adjetivo. A diferença entre os valores médios da tônica do adjetivo (284,0Hz) para a tônica do nome (228,6Hz) foi significativa (t(56)=3,387; p <0.01).

A variação de pitch observada na fala feminina na IDS sem a presença da criança foi acentuadamente maior quando o adjetivo está anteposto. Sabemos que a IDS registra maiores variações de pitch e essa pode ser a explicação desse evento.

2 DISCUSSÃO GERAL DOS RESULTADOS DA ATIVIDADE EXPERIMENTAL I Os dados de duração, intensidade e F0 analisados separadamente apresentaram propriedades distintas para as categorias ADJ e N. Para a duração, o adjetivo é salientado com um alongamento das sílabas quando comparado ao nome em qualquer posição que ocupe. O desenho da curva entoacional de intensidade do sintagma evidencia o adjetivo através de um “peso” maior dado às sílabas pré-tônica e tônica do adjetivo, independente de sua posição no DP. Para F0, as falantes tendem a elevar o pitch da tônica do elemento em primeira posição quando esse elemento é um adjetivo e como a elevação do F0 torna a fala perceptualmente mais aguda, isso poderia destacar ADJ dentro do DP.

Segundo nossas previsões, a posição do adjetivo é marcada, como na fala dirigida ao adulto (Serra, 2005), e os índices de duração, intensidade e F0 são sensíveis à posição do adjetivo no DP. Mais ainda, as propriedades entoacionais de ADJ revelaram valores amplificados pelo menos no parâmetro da duração e curvas mais acentuadas para a categoria, na intensidade, destacando essa categoria dentro do DP.

Vale ressaltar, no entanto, que tais análises decorrem de estímulos que não são de fala espontânea. Dada a dificuldade de coleta de dados de fala espontânea em que haja DPs tanto com adjetivos antepostos quanto pospostos, que possam ser comparáveis, optamos por uma atividade em que pudéssemos controlar os DPs e obter estímulos próximos de IDS para a análise – daí a leitura de histórias infantis criadas para esse fim, realizada em laboratório. Seguindo Fernald (1994), que encontrou variações maiores de pitch na IDS quando na presença da criança e dada a dificuldade de se

Curva da Média de Freqüência Fundamental - Fala Feminina

150,0 175,0 200,0 225,0 250,0 275,0 300,0

pre ton pos pre ton pos

N-Adj

Curva da Média de Freqüência Fundam ental - Fala Fem inina

150,0 175,0 200,0 225,0 250,0 275,0 300,0

pr e t on pos pre t on pos

(7)

obter uma fala mais espontânea em situação de leitura, realizamos uma segunda atividade na presença da criança, relatada na próxima seção.

3 ATIVIDADE EXPERIMENTAL II - Valores parciais de duração da IDS na presença da criança

Nesse segundo experimento, ainda em andamento, pretendemos proceder a uma investigação que seja mais próxima da natural. Na atividade experimental II, as gravações foram feitas com a presença da criança, e além disso, ao invés de utilizarmos o procedimento da leitura de pranchas, optamos por solicitar que a participante criasse a história a partir das ilustrações dispostas em um livro criado especialmente para esse fim.

3.1. Objetivos

Esta atividade tem como objetivo mapear as características prosódicas distintivas de ADJ e N na IDS em função da posição no DP.

3.2. Procedimento

Foi realizada a gravação de uma história infantil contendo DPs complexos do tipo DET–N– ADJ cujos adjetivos pudessem ser posicionados tanto na ordem não-marcada como na ordem marcada. Posteriormente, foi efetuada análise acústica dos DPs complexos através do software de análise acústica Praat.

O material utilizado para o experimento foi: 1 laptop; 1 livrinho de história contendo 11 gravuras criadas para o experimento ;1 microfone acoplado a fone de ouvido; software de gravação digital Sound Forge versão 8,0, software de análise acústica Praat.

3.3. Método

Os DPs foram inseridos em gravuras alternadas com as distratoras. Nas gravuras não há texto explícito, sendo as mães são instruídas a inventar uma história e a cada página, utilizando as palavras que fazem parte da página. Entre elas DPs, expressões e verbos (ver anexo 2) As gravações são feitas com a criança sentada ao colo da mãe através do software de gravação Sound Forge com o mesmo equipamento da Atividade Experimental I. As gravações foram analisadas para a extração dos valores de duração, através do software Praat.

A história foi gravadas em versão única, através de um microfone acoplado a fone de ouvido que minimizava a movimentação do microfone. A criança foi sentada ao colo da mãe e participou livremente da história. Cada mãe produziu um total de 6 sintagmas, 3 com adjetivo anteposto e 3 com adjetivo posposto. Foram analisadas as gravações de duas mulheres para o presente artigo.

3.4. Resultados

Os resultados desse segundo experimento ainda são parciais, mas na IDS na presença da criança, mesmo em anteposição, os valores de ADJ foram superiores a N. Apresentamos os resultados dos valores médios da duração da IDS na presença da criança na tabela 2.

Adjetivo Nome

Pré-tônica Tônica Pós-tônica Pré-tônica Tônica Pós-tônica

154,7 224 142,7 123,7 143,6 120,2

Nome Adjetivo

104,2 235,5 160,5 273,3 311,6 204

(8)

Observando-se a tabela 2, considerando-se o eixo sintagmático a duração da tônica de ADJ é sempre maior que a tônica de N independentemente de sua posição no DP. Em anteposição, a tônica de ADJ foi significativamente maior (t(6)=3,761; p<0,001). Na posposição, embora a média da tônica de ADJ tenha sido superior, as diferenças entre as tônicas não foi significativa (t(6) 0,896; p=0.405). Conclusão

Concluímos que propriedades prosódicas da IDS poderiam ser usadas como pistas, de modo a facilitar o mapeamento, pela criança, do elemento seguinte a DET como sendo N ou ADJ, facilitando assim, a identificação deste elemento como membro de uma das categorias. Entretanto, ainda falta se determinar “o que realmente há de necessário, suficiente ou irrelevante na forma prosódica do input para servir de gatilho”, nas palavras de Scarpa (1999).

Os dados obtidos na Atividade Experimental I dão sustentação ao modelo do Bootstrapping Fonológico/Prosódico, pois, no que tange às propriedades prosódicas de duração, intensidade e F0, as categorias lexicais ADJ e N apresentaram características distintivas na IDS. Retomando os dados de duração, comparando-se os valores das tônicas de ADJ e N, o adjetivo apresentou sílabas relativamente maiores. Em posposição, houve amplificação das diferenças dos valores de duração entre primeiro e segundo elementos e, em anteposição, minimização dessas diferenças. Os dados de intensidade sinalizam que a tônica de ADJ está entre os maiores valores de intensidade do DP, tanto na anteposição quanto na posposição, enquanto a tônica de N não teve mesmo comportamento. Quanto aos resultados de F0, as curvas refletem uma maior variação de pitch quando o adjetivo se encontra anteposto, o que perceptualmente pode evidenciá-lo dentro do DP. Os resultados da Atividade Experimental II, ainda que não sejam conclusivos, apresentaram dados de duração congruentes as dados da IDS na ausência da criança, e mais ainda, os valores de duração de ADJ foram superiores, na comparação sintagmática, tanto na posposição quanto na anteposição.

Assim, a ausência do pareamento preciso entre a prosódia e sintaxe não descarta a importância da prosódia no processo de AL, pois, de acordo com nossos resultados, os contornos entoacionais podem oferecer um vislumbre da estruturação sintática do fluxo de fala. Além disso, as pistas prosódicas da fala dirigida à criança poderiam acorrer a outras pistas perceptíveis aos bebês também presentes no ambiente lingüístico e assim, agindo em conjunto, desencadear os processos de segmentação de palavras bem como auxiliar na formação de seu léxico alavancando aquisição da sintaxe de sua língua.

Referências

CHRISTOPHE, A., GUASTI, T., NESPOR, M. DUPOUX, E. & OOYEN, B.V. Reflections on phonological bootstrapping: it’s role for lexical and syntactic acquisition. Language and Cognitive Processes, vol. 12, no. 5/6, 585-612, 1997.

______. , DUPOUX, E. The role of prosodic structure. The Linguistic Rewiew, 13, p.383-142, 1996. CHOMSKY, N. The Minimalistic Program. Mass.: The MIT Press, 1995.

CORRÊA, L. M. S. Conciliando processamento lingüístico e teoria de língua no estudo da aquisição da linguagem. In: CORRÊA, L. M. S. Aquisição da linguagem e problemas do desenvolvimento lingüístico. Rio de Janeiro: Editora PUC-RJ, 2006.

FERNALD, A. Human maternal vocalizations to infants as biologically relevant signals. In BLOOM, P. (Ed.) Language acquisition core readings. Cambridge, MA: The MIT Press, 1994. KOPONEN, E. & LACERDA, F. Final lengthening in infant directed speech may function as a cue to phrase constituents. In: PHONUM 9, 9-12, 2003. http://www.lingumu.se/fonetik2003/

SCARPA, E. Sons preenchedores e guardadores de lugar: relações entre fatos sintáticos e prosódicos na aquisição da linguagem.In: SCARPA, E. (Ed) Estudos de Prosódia.Campinas: UNICAMP, 1999.

(9)

SERRA, C. R. A ordem dos adjetivos no percurso histórico: variação e prosódia. Dissertação de Mestrado em Língua Portuguesa. UFRJ, Faculdade de Pós-graduação em Letras Vernáculas, 2005. TRAINOR & DESJARDINS (2002) Pitch characteristics of infant-directed speech affect infants’ ability to discriminate vowels. Psychonomic Bulletin & Review, 9 (2). 333-340, 2002.

MATSUOKA, A. A marcação prosódica da posição do adjetivo no DP na fala dirigida à criança. Dissertação de Mestrado em Letras. UFJF, Curso de Pós-graduação em Letras, 2007.

(10)

ANEXO 1

Lista de DPs – Atividade Experimental I

ADJ-NOME POSIÇÃO DO ADJ SENTIDO

1 gorila charmoso Posposto Pos

2 pesada barriga Anteposto Neg

3 barulho terrível Posposto Neg

4 valente coruja Anteposto Pos

5 temível cachorro Anteposto Neg

6 gafanhoto petulante Posposto Neg

7 gorila mimosa Posposto Pos

8 teimoso menino Anteposto Neg

9 comida gostosa Posposto Pos

10 maravilhosas delícias Anteposto Pos

11 sanduíche delicioso Posposto Pos

12 bolinho saboroso Posposto Pos

13 suculenta banana Anteposto Pos

14 malvado repolho Anteposto Neg

15 cenoura levada Posposto Neg

ANEXO 2

Lista de DPs e Distratoras - Atividade Experimental II

Gorila-charmoso N-ADJ DP posposto

Caixa de madeira distratora

Lanchonete da floresta distratora

Delicioso sanduíche ADJ-N DP anteposto Petulante gafanhoto ADJ-N DP anteposto

Valente coruja ADJ-N DP anteposto

Pedir distratora

Ter uma idéia distratora

Bolinho saboroso N-ADJ DP posposto

Aceitar a oferta distratora

Referências

Documentos relacionados

177 Em relação às funções sintáticas desempenhadas pelas estruturas inalienáveis, da mesma forma como acontece para os tipos de estruturas inalienáveis, é curioso o fato de que,

The challenge, therefore, is not methodological - not that this is not relevant - but the challenge is to understand school institutions and knowledge (school

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Este estudo teve como propósito apresentar o interesse de graduados do curso de Arquivologia, em relação à publicação de seus TCC’s após o término do

Desenvolver gelado comestível a partir da polpa de jaca liofilizada; avaliar a qualidade microbiológica dos produtos desenvolvidos; Caracterizar do ponto de

If teachers are provided with professional development opportunities that helps them develop a learning environment that is relevant to and reflective of students'

Sabe-se que as praticas de ações de marketing social tem inúmeras funções, dentre estas o papel de atuar na mudança de valores, crenças e atitudes, porém os alunos da

Esse tipo de aprendizagem funciona não no regime da recognição (DELEUZE, 1988), que se volta a um saber memorizado para significar o que acontece, mas atra- vés da invenção de

Os dados foram discutidos conforme análise estatística sobre o efeito isolado do produto Tiametoxam e a interação ambiente/armazenamento no qual se obtiveram as seguintes