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Fasceíte necrotizante com síndrome de choque tóxico estreptocócico : um caso pediátrico

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Academic year: 2021

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Clínica Universitária de Pediatria

Fasceíte Necrotizante com Síndrome de Choque

Tóxico Estreptocócico

- Um Caso Pediátrico

João Barata de Carvalho

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Clínica Universitária de Pediatria

Fasceíte Necrotizante com Síndrome de Choque

Tóxico Estreptocócico

- Um Caso Pediátrico

João Barata de Carvalho

Orientado por:

Prof. Doutor Paulo Oom

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Resumo

A fasceíte necrotizante representa um desafio diagnóstico de elevado grau de dificuldade para o profissional de saúde. Apesar da sua reduzida frequência, particularmente quando associada à ocorrência de Síndrome de Choque Estreptocócico Tóxico (provocado pelo microrganismo estreptococos de grupo-A beta-hemolítico) apresenta uma elevada taxa de mortalidade, mesmo nos casos em que se verifica o diagnóstico precoce e um tratamento agressivo. É fundamental, por isso mesmo, perante a suspeita clínica descartar esta hipótese diagnóstica, frequentemente diagnosticada de forma equivocada como uma infeção de tecidos moles de curso mais benigno.

Ainda que estejam a ser desenvolvidos esforços no sentido de alcançar novas terapêuticas que possam ter impacto positivo na mortalidade e morbilidade desta patologia, a terapia atualmente disponível pode ser essencialmente resumida em quatro pilares distintos: antibioterapia de largo espectro, terapia de suporte hemodinâmico, antecipação e gestão de falência multiorgânica e desbridamento cirúrgico.

No caso clínico apresentado, é descrita uma criança do sexo feminino com 14 anos de idade que desenvolveu um síndrome de choque tóxico estreptocócico associado a fasceíte necrotizante na região axilar direita. Um diagnóstico rápido da situação, em conjunto com uma antibioterapia de largo espectro e tratamento cirúrgico mostraram ser fundamentais para a evolução favorável do caso.

Palavras-chave: Fasceíte Necrotizante; Síndrome de Choque Tóxico Estreptocócico; Estreptococos Pyogenes, infeções de tecidos moles

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Abstract

Necrotizing fasciitis represents a highly difficult diagnostic challenge for the healthcare professional. Despite its reduced frequency, particularly when associated with

Streptococcal Toxic-like Shock Syndrome (caused by group-A beta-haemolytic

streptococcus), it presents a high mortality rate, even in cases where early diagnosis and aggressive treatment implementation are achieved. Therefore, it is crucial to exclude this diagnosis when in presence of a strong clinical suspicion, given that misdiagnosis as a more benign soft tissues infection is frequent.

Even though efforts are being put so that we can reach new therapies that bring about a positive impact in the disease’s mortality and morbidity rates, current therapy can be summarized in four key-factors: broad-spectrum antibiotics, hemodynamic supportive care, multi-organ failure anticipation and management and surgical debridement.

The featured clinical-report describes a 14-year-old female child who develops a Streptococcal Toxic-like Shock Syndrome associated with necrotizing fasciitis in the right axillary area. A quick diagnosis alongside broad-spectrum antibiotics and surgical treatment have shown to be fundamental for the favourable evolution of the case.

Keywords: Necrotizing Fasciitis, Streptococcal Toxic Shock Syndrome, Streptococcus Pyogenes, Soft-Tissue Infections

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Índice

Introdução ... 6 Caso Clínico ... 7 Discussão ... 10 Conclusão ... 22 Bibliografia ... 23

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Introdução

Fazendo parte dos microorganismos mais frequentemente isolados na população pediátrica, o estreptococo de grupo-A beta-hemolítico é responsável por uma variedade de infeções desde infeções da pele e faringe de curso mais benigno a infeções mais invasivas e de pior prognóstico como fasceíte e miosite necrotizantes ou Síndrome de Choque Tóxico Estreptocócico. Com o aumento da frequência do isolamento de estirpes estreptocócicas provocadoras de doença invasiva, registado desde a década de 19801, torna-se fundamental que o profissional de saúde seja capaz de realizar um diagnóstico precoce deste tipo de patologia. A terapêutica adequada deverá ser instituída o mais rapidamente possível, já que a fasceíte necrotizante, particularmente quando associada ao Síndrome de Choque Tóxico Estreptocócico, é um quadro agudo de rápida progressão e elevadas taxas de mortalidade e morbilidade.

Apresenta-se o caso clínico de uma criança do sexo feminino de 14 anos que desenvolve um Síndrome de Choque Tóxico Estreptocócico associado à ocorrência de fasceíte necrotizante na região axilar direita. Durante o internamento, e após instituição de antibioterapia de largo espectro e tratamento de suporte hemodinâmico, a doente é submetida a intervenção cirúrgica para desbridamento e drenagem da loca. Após realização posterior de cirurgias de revisão e otimização terapêutica, obteve-se a resolução do foco infecioso e a doente apresentou melhoria sintomática com resolução do quadro clínico.

Este trabalho propõe-se então, tendo por base o caso clínico, a aprofundar o conhecimento de duas patologias de possíveis consequências fatais: a fasceíte necrotizante e o síndrome de choque tóxico estreptocócico, qual a sua fisiopatologia, etiologia e de que forma podem ocorrer em associação. Pretende-se abordar as possíveis dificuldades que surgem no momento do diagnóstico e quais as ferramentas que nos podem socorrer enquanto profissionais de saúde de forma a excluir esta hipótese diagnóstica, tendo também como propósito reunir evidência sobre a terapêutica médico-cirúrgica atual e em investigação.

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Caso Clínico

Adolescente do sexo feminino, de 14 anos, caucasiana, que apresentava quadro com 4 dias de evolução caracterizado por sinais inflamatórios na palma da mão direita, com progressão da dor para o membro superior direito (MSD), vómitos incoercíveis e febre com duração de três dias. Associava-se história de lesão traumática na região palmar da mão direita causada por um lápis de carvão. A doente negava faringoamidgalite recente, dispneia, toracalgia ou palpitações, dor abdominal, diarreia, disúria ou exantema, bem como qualquer outra sintomatologia indiciadora de órgão ou sistema. Do historial clínico da doente não se destacavam antecedentes pessoais relevantes para o contexto clínico apresentado, não havendo referência a medicação habitual.

Ao exame objetivo apresentava rubor e edema da região do punho direito com dor à mobilização do punho, membro superior e ombro direitos, uma flictena única na palma da mão direita com conteúdo de natureza mucopurulenta, eritema circular na face posterior do punho direito não doloroso, eritema na face anterointerna do membro superior, ombro direito e da região anterior do tronco no hemitórax direito, com dor intensa à palpação, ainda que sem coleções visíveis ou outras alterações da pele. A temperatura timpânica era de 38,3º C, a frequência cardíaca de 110 batimentos por minuto e a Pressão Arterial de 93/36 mmHg. As análises laboratoriais realizadas à admissão demonstravam aumento dos parâmetros inflamatórios com presença de leucocitose (10.300 leucócitos/μl) com neutrofilia (95.6%), aumento da proteína C reactiva (29.0 mg/dl) e aumento da aspartato-aminotransferase (AST) e da alanina-aminotransferase (ALT) respetivamente de 71 e 108 UI/L. Foi também realizada radiografia do ombro direito que não revelou alterações valorizáveis e foram colhidas hemoculturas, que mais tarde vieram a revelar-se negativas.

Pelo quadro descrito de febre elevada, sinais inflamatórios exuberantes e aumento dos parâmetros laboratoriais inflamatórios, assumiu-se que se tratava de uma infeção bacteriana com sinais sistémicos, optando-se pelo internamento da doente no serviço de Pediatria do HBA com o diagnóstico de celulite do membro superior direito, tendo sido iniciada terapêutica com flucloxacilina na dose de 150 mg/kg/dia.

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Durante o segundo dia de internamento, a doente foi observada pela Urgência Interna por agravamento do quadro clínico caracterizado por taquicardia, eritrodermia (exantema macular difuso, com aumento da temperatura cutânea), hipotensão (PA – 94/34 mmHg) e disfunção renal, verificada laboratorialmente pelo aumento da creatinina (1.9 mg/dL), e da ureia (98 mg/dL), e por uma Taxa de Filtração Glomerular (TFG) de 35 ml/min/m2. Apresentava concomitantemente hiponatremia (128 mEq/L) e hipoalbuminémia (2.4 g/dL), com aumento simultâneo das transaminases (ALT de 71 UI/L e AST de 41 UI/L). e agravamento da leucocitose (14.9 leucócitos/μl). A doente foi estabilizada com fluidoterapia com bólus de soro fisiológico, apresentando boa resposta clínica. Por suspeita de reação adversa à flucloxacilina, este fármaco foi interrompido, tendo a doente iniciado terapêutica com clindamicina.

No quarto dia de internamento foi drenada a flictena purulenta presente na mão direita da doente, sendo a loca lavada e o material recolhido enviado para o laboratório, para realização do teste rápido de Strepto A e exame cultural. O resultado do teste rápido de Strepto A revelou-se positivo pelo que, associado a dois picos febris no mesmo dia da colheita se adicionou penicilina sódica IV à antibioterapia.

Ao sexto dia de internamento, realizou-se ecografia das partes moles torácica que revelou aspectos compatíveis com fasceíte e miosite extensas da massa muscular dos músculos peitorais direitos, sem evidência de coleções drenáveis, pelo que devido ao agravamento imagiológico, se retirou a Clindamicina e a Penicilina e se iniciou Meropenem.

Ao décimo dia de internamento, foi isolado o microorganismo Streptococcus Pyogenes no resultado do exame cultural do material purulento recolhido da flictena presente na mão direita sendo o mesmo sensível à Clindamicina, Benzilpenicilina e Trimetropim + Sulfametoxazol, decidindo-se, então, a reintrodução da Clindamicina no esquema terapêutico da doente, associada a Meropenem. No décimo segundo dia de internamento, por manutenção da febre e agravamento das queixas álgicas da região peitoral e axilar direitas, a doente realizou nova ecografia e tomografia computorizada que revelaram aspetos compatíveis com miosite e fasceíte dos músculos peitorais direitos, com presença de colecção pura no peitoral/axila direitos.

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Foi então decidido que a doente deveria ser submetida a intervenção cirúrgica, tendo esta ocorrido no décimo terceiro dia de internamento, realizando-se desbridamento de material necrótico e infetado das regiões peitoral e axilar direitas com colocação posterior de dreno aspirativo no local. Foi colhida amostra de material com aparência mucopurulenta, enviada depois para análise laboratorial.

O pós-operatório decorreu sem intercorrências sendo a doente retransferida para o serviço de Pediatria dois dias após a intervenção. O resultado do exame cultural realizado a partir da amostra recolhida aquando do desbridamento realizado pela equipa de Cirurgia Pediátrica do HBA revelou-se negativo, tendo-se decidido pela manutenção do mesmo esquema terapêutico. (Clindamicina e Meropenem)

Registou-se, após a intervenção cirúrgica, uma descida progressiva dos valores laboratoriais inflamatórios inicialmente elevados (Contagem de leucócitos, Proteíca-C Reactiva), bem como uma melhoria clínica da doente com melhoria dos sinais inflamatórios locais e apirexia por vários dias.

Durante o internamento a doente foi ao bloco operatório em outras duas ocasiões para drenagem de coleções purulentas remanescentes localizadas na região axilar e entre os músculos grande peitoral, pequeno peitoral e deltoide. Em ambas as intervenções foram colocados drenos na loca axilar e colhidas amostras para análise laboratorial, sendo em ambas o resultado do exame cultural negativo.

Registou-se ainda no vigésimo nono dia de internamento um novo pico febril, pelo que foi introduzida vancomicina no esquema terapêutico da doente, registando-se melhoria clínica e laboratorial da doente com resolução da febre.

O esquema terapêutico manteve-se inalterado no que se refere à antibioterapia até ao momento em que é obtido o resultado negativo do exame cultural referente ao material colhido do último dreno retirado no 55º dia de internamento. Ao 35º dia de internamento foi iniciada terapia em câmara hiperbárica, tendo a doente cumprido um total de vinte sessões. No total realizou 54 dias de clindamicina, 52 dias de meropenem e 21 dias de vancomicina.

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No dia 11/03/2017 (dia 56 de internamento) a doente teve alta clínica hemodinamicamente estável, apirética e sem sinais inflamatórios locais, com parâmetros laboratoriais inflamatórios, de funções renal e hepática normalizados. Foi referenciada para seguimento em consulta externa de Pediatria, com indicação para manter os tratamentos em câmara hiperbárica até reavaliação e para iniciar reabilitação motora em Fisioterapia.

Seis meses após a alta, na consulta de Pediatria, a doente apresentava-se clinicamente bem, sem sequelas no membro superior direito, com manutenção da mobilidade do braço, do antebraço e da mão, sem limitação ao movimento, força muscular de grau 5 e sensibilidade mantida sem dor associada.

Discussão

Os Streptococci do Grupo A Beta-hemolíticos são um grupo de microorganismos relativamente comuns na comunidade. O Streptoccocus pyogenes, em particular, é um dos microorganismos mais frequentemente isolados em infeções da região faríngea e da pele em doentes pediátricos1,2,3, estando associado a um amplo espectro de infeções, na sua grande maioria, de curta duração e curso benigno.1,2 Não obstante, o S. pyogenes, pelo facto de produzir diversas toxinas, entre as quais “superantigénios” (exotoxinas pirogénicas estreptocócicas) - fundamentais no decorrer da ativação da resposta imunitária do hospedeiro a este agente - pode provocar infeções mais graves, tais como a fasceíte e miosite necrotizantes e o síndrome de choque tóxico estreptocócico. É importante também referir a capacidade deste microorganismo para provocar produzir sequelas tardias não supurativas como a glomerulonefrite pós-estreptocócica e a febre reumática.

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Ainda que atualmente sejam poucos os casos documentados anualmente de doença invasiva provocada por S. pyogenes, vários estudos apontam para um aumento na frequência que deve ser estudado e entendido.1,4 No caso particular da fasceíte necrotizante o S. Pyogenes é o microrganismo mais frequentemente isolado, seguido do

Staphylococcus Epidermidis e Pseudomonas Aeruginosa.5 Os dados atualmente disponíveis apontam para um aumento no número de casos de fasceíte necrotizante em doentes pediátricos, causado pelo aumento de frequência de infeção por S. pyogenes capazes de provocar doença invasiva.2,5 Este aumento poderá, no entanto, ser parcialmente justificado com a melhoria do sistema de observação e registo do número de casos a nível mundial, mas também pela utilização abusiva de antibióticos, particularmente nos países desenvolvidos.6

O Síndrome de Choque Tóxico (SCT) é um quadro multisistémico grave e raro na população pediátrica, provocado por estirpes de Estafilococos e Estreptococos produtores de toxina, sento os Estreptococos de proteína de superfície M 1,3,12 e 28 os mais frequentemente isolados em doentes que apresentam choque e falência multiorgânica, particularmente aqueles com idade inferior a 10 anos.7

A principal diferença entre o SCT e o Choque Séptico está na sua fisiopatologia: neste último a resposta imunitária é mediada predominantemente pela produção de citocinas pró-inflamatórias, enquanto que, no SCT, a inflamação é provocada diretamente pelas exotoxinas pirogénicas, que estimulam a resposta dos linfócitos T. Esta estimulação é realizada através da ligação destes superantigénios ao complexo MHC II de células apresentadoras de antigénio e à região Vβ dos recetores de células T.8 Uma vez que nem todos os microrganismos têm a capacidade de produzir estas exotoxinas, também estes serão diferentes conforme o processo fisiopatológico em questão.

Define-se como uma doença aguda que provoca uma resposta inflamatória sistémica à toxina libertada pelo agente patogénico, por estimulação dos linfócitos T9. Embora seja classicamente associada ao microrganismo Staphyloccocus Aureus (S. Aureus), também um subgrupo de Estreptococos é referido, desde 1987 como potencial causa, quando um trabalho desenvolvido por Cone et al descreveu dois doentes com infeção severa estreptocócica de grupo A com sintomatologia semelhante à de síndrome de choque tóxico estafilocócico.4 Nos casos em que o isolamento de uma estirpe estreptocócica é

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realizado, falamos em Síndrome de Choque Tóxico estreptocócico (SCTE), estando incluídos no diagnóstico diferencial desta patologia o Choque Tóxico por gram-negativos, a dengue severa e o Síndrome de Choque Tóxico estafilocócico.7 Refira-se que para o diagnóstico do SCTE é necessário, para além do cumprimento de critérios clínicos, o isolamento duma estirpe estreptocócica, algo que não acontece no SCT causado por S.

Aureus.9

A apresentação clínica deste Síndrome é muito variável, verificando-se, no entanto, em praticamente todos os doentes febre alta. Em adição a este sintoma, Rodriguez et al2, numa das maiores séries de doentes pediátricos com SCTE estudadas até hoje, verificaram

que, a maioria dos sintomas apresentados pelos doentes se centravam no aparelho gastrointestinal. Vómitos, diarreia e dor abdominal foram sintomas frequentemente referidos, algo que, segundo os autores, podia promover diagnósticos alternativos e muito mais frequentes, como abdómen agudo ou gastroenterite aguda. Outras manifestações clínicas verificadas de forma consistente foram lesões da pele (27,7%), sintomas respiratórios (21,9%), faringite (14.6%), exantema (12.2%), alterações da consciência (12,2%), celulite (9,7%) e artralgias (7,3%). No caso descrito a doente apresentava, à admissão, febre elevada com duração de três dias, vómitos incoercíveis e uma lesão da pele na palma da mão direita. Referia também mialgias e artralgias no membro superior direito, que se encontrava edemaciado e com sinais claros de inflamação, diagnosticando-se numa primeira instância celulite. Os sinais e sintomas clínicos da doente na chegada à Urgência estavam, então, enquadrados com os sintomas referidos pelos doentes da série anteriormente referida.

Em 1993, perante o reconhecimento do aumento da ocorrência de infeções severas provocadas por espécies estreptocócicas de grupo A, foi criado um grupo de trabalho composto por médicos, epidemiologistas e microbiólogos com o intuito de alcançar um conjunto de critérios que acelerassem o processo de diagnóstico do STCE.4 O que se procurava era que a instauração da terapêutica fosse realizada o mais precocemente possível, por forma a melhorar o prognóstico do doente. Do trabalho desenvolvido surgiram os critérios diagnósticos do Síndrome de Choque Tóxico Estreptocócico de Grupo A, que rapidamente se tornaram numa ferramenta fundamental na gestão desta patologia e que, também no caso clínico apresentado, foram importantes para alcançar o diagnóstico na doente descrita.

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O primeiro passo no diagnóstico da patologia passa pelo isolamento duma espécie estreptocócica de grupo A. Dependendo do local onde esta seja isolada, caso o doente apresente os restantes critérios diagnósticos, tratar-se-á de um caso definitivo ou provável de SCTE. Caso o isolamento seja realizado num local normalmente estéril e o doente cumpra os restantes critérios de STCE, então estaremos perante um caso definitivo de STCE. Se o doente apresentar todos os critérios de infeção grave de STCE, mas o isolamento do Streptococcus de grupo A for realizado num local normalmente não estéril, então não poderemos falar de um caso definitivo, mas sim de um caso provável de STCE. O local em que o isolamento for realizado será também fundamental para entender o tipo de infeção associado. (pneumonia, fasceíte, peritonite)4

O segundo requisito para confirmar o diagnóstico de STCE é a presença de sinais e sintomas de infeção grave, particularmente aqueles que indiquem presença de choque e envolvimento ou falência multisistémica, podendo estes ser verificados clinicamente ou através de análises laboratoriais. É indispensável a presença de hipotensão, com tensão sistólica inferior ao percentil 5 correspondente ao sexo e à altura do doente. O doente com SCTE apresentará também, tipicamente, algum nível de disfunção renal previamente ao desenvolvimento de uma situação de choque7, estando presente nos critérios de diagnóstico o aumento do nível da creatinina para um nível igual ou superior ao dobro do limite superior correspondente à idade. Também a disfunção hepática, representada pelo aumento das transaminases (ALT e AST) e a presença de sinais e sintomas de síndrome de dificuldade respiratória aguda (SDRA), tais como a taquipneia ou a hipoxemia3 estão contemplados nos critérios. Outros sinais contemplados nos critérios de diagnóstico são a presença de coagulopatia, definida por um número de plaquetas inferior a 100 000 por milímetro cúbico ou a presença de coagulação disseminada intravascular, a presença de eritema descamativo generalizado ou de uma infeção necrotizante dos tecidos moles como fasceíte ou miosite. Num estudo retrospetivo multicêntrico realizado em Espanha, verificou-se que apesar de todos os doentes com SCTE terem desenvolvido choque, a disfunção orgânica ocorreu de maneira variável, existindo, no entanto, um predomínio da coagulopatia e falência respiratória.2,7

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No segundo dia de internamento a doente apresentava pressão arterial de 94/34 mmHg, uma creatinina de 1,94 mg/dL, AST de 71 UI/L e ALT de 108 UI/L. Além destes valores laboratoriais, verificava-se a presença de um exantema macular eritematoso difuso. Apresentava por isso mesmo, o cumprimento dos critérios diagnósticos de choque estreptocócico tóxico10 IIA e IIB, adaptados ao doente pediátrico através da utilização das curvas de percentil correspondentes à idade, sexo e altura, adicionando-se a estes o isolamento do microorganismo S. pyogenes na amostra recolhida do pús da flictena que a doente apresentava. Pelo facto de este ser normalmente um local não-estéril, cumpria-se então, cumpria-segundo a mesma classificação, o critério IB, estando precumpria-sentes todos os critérios por definição de um caso provável de Síndrome de Choque Tóxico Estreptocócico (SCTE), uma vez que não se encontravam disponíveis dados que sugerissem uma qualquer outra etiologia para o contexto clínico verificado.

O papel destes critérios diagnósticos na rápida atuação perante um possível caso de SCTE é fundamental. Mesmo realizando um diagnóstico precoce e instaurando todas as medidas terapêuticas disponíveis, esta é uma patologia que representa um enorme perigo para o doente, tendo uma elevada taxa de mortalidade que varia entre 30% e 70%9 no adulto. No doente pediátrico não se conhece o valor exato da taxa de mortalidade, ainda que todos os estudos apontem para um valor inferior àquele verificado no adulto.11,2 Num artigo publicado, são apresentados três casos pediátricos em que, apesar do diagnóstico precoce, a instauração de medidas terapêuticas imediatas com antibioterapia, medidas de reanimação e suporte artificial como resposta à falência multiorgânica verificada, a evolução da doença foi desfavorável caracterizando-se por uma progressão fulminante num curto período de tempo com resposta nula ao tratamento e consequente falecimento dos três doentes, por choque refratário e falência multiorgânica.9 Deste modo se pode constatar que, mesmo com o diagnóstico precoce e a instauração de terapêutica o mais rápido possível, a progressão da doença pode ser fulminante e de consequências fatais.

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Além de ser o microrganismo na base do Síndrome de Choque Tóxico Estreptocócico, o S. pyogenes é também o principal agente patológico da fasceíte necrotizante em população pediátrica. Esta infeção bacteriana dos tecidos moles tem uma progressão fulminante e elevada taxa de mortalidade e morbilidade, particularmente quando associada à ocorrência de SCTE.

Esta doença é normalmente classificada em dois tipos diferentes: o tipo 1, provocado por uma infeção polimicrobiana onde podem ser isolados grupos de diferentes microorganismos gram-positivos, gram-negativos e anaeróbios, mais frequentemente espécies estreptocócicas, estafilocócicas e bacterióides, e o tipo 2, provocado por uma única espécie bacteriana, classicamente por espécies estreptocócicas do grupo A (GAS), particularmente na América do Norte e Europa.7 Ao contrário dos casos que ocorrem em doentes adultos, nos doentes pediátricos a fasceíte necrotizante é mais frequentemente provocada por um único microorganismo,11 neste caso mais frequentemente pelo S. Pyogenes, sendo apenas em raros casos uma infeção polimicrobiana.5 Em doentes adultos, jovens e imunocompetentes é mais frequente também este último tipo de infeção.

São vários os factores de risco para o desenvolvimento de fasceíte necrotizante associada a SCTE no doente pediátrico. Neles incluem-se doença crónica, trauma, cirurgia prévia, infeção vírica recente (Influenza, Varicela) e o uso de fármacos anti-inflamatórios durante a mesma, parto prematuro, doença cardíaca congénita e estados de imunossupressão.2,6 Embora a doença se possa desenvolver em doentes que não apresentem qualquer fator de risco prévio, no caso apresentado a doente apresentava história de trauma recente, que foi a porta de entrada para a infeção que ocorreu posteriormente.

À semelhança do que ocorre no STCE, o diagnóstico da fasceíte necrotizante representa um difícil desafio ao profissional de saúde pela sua apresentação clínica inespecífica. No doente pediátrico não raramente a falta de achados clínicos significativos ao exame objetivo é um fator-chave na imprecisão do diagnóstico clínico inicial desta patologia, sendo os doentes erroneamente diagnosticados com outras infeções de tecidos moles de menor gravidade como a celulite ou a erisipela, retardando o início do tratamento correto da doença.5

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A manifestação clínica inicial clássica da fasceíte necrotizante caracteriza-se por uma dor desproporcionada relativamente aos achados clínicos encontrados no exame objetivo. Frequentemente os únicos sinais visíveis no início da infeção são sinais inflamatórios locais da pele como eritema, edema ou rubor. Tal ocorre pela forma como a infeção se propaga, afetando primariamente as camadas de tecido mole subcutâneas e profundas, sem afetar a pele mais superficial, com consequências muito mais graves do que a aparência exterior poderia fazer pensar.

À medida que a doença progride, a vesiculação, crepitação e necrose podem tornar-se evidentes, sendo importante ter em mente que, não raramente, a extensão de área envolvida será superior àquela apreciada ao exame objetivo e que esta só poderá ser verdadeiramente conhecida no intraoperatório aquando do desbridamento cirúrgico. Esta lesão extensa do tecido e a libertação de toxina na circulação sanguínea poderão, mais adiante, entre as 24 e as 48 horas de progressão da doença, desenvolver choque séptico, ou falência multiorgânica, manifestando-se através de febre elevada, hipotensão ou sintomas de alteração do estado mental.12

O diagnóstico da fasceíte necrotizante não pode ser realizado, tal como referido anteriormente, pela aparência do local envolvido, uma vez que nenhum dos achados inicais são patognómicos de fasceíte necrotizante. Quando a necrose da pele ocorre, este é já um sinal tardio e habitualmente de mau prognóstico, devendo o clínico socorrer-se de exames complementares de diagnóstico para alcançar o diagnóstico mais rapidamente. Refira-se, no entanto, que perante um caso de elevada suspeita de fasceíte necrotizante não se deve atrasar a instauração da terapêutica na tentativa de obtenção do diagnóstico.

Utilizada no diagnóstico do caso clínico apresentado, a ecografia dos tecidos moles e a tomografia computorizada apresentam um elevado valor diagnóstico na deteção de coleções, e avaliação da sua evolução pós-operatória. No entanto, é a ressonância magnética (RM) o método de imagem que melhor permite a deteção de edema de tecidos moles que infiltrem os planos da fáscia, permitindo desta forma detetar o envolvimento de tecidos moles na infeção de forma mais precoce. Por sua vez, a radiografia simples apresenta, normalmente, resultados inalterados, não aportando por isso mesmo mais-valias ao diagnóstico.

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É importante, no entanto, reafirmar que, embora a RM aporte mais-valia ao diagnóstico da FN, perante uma elevada suspeita, o tratamento cirúrgico não deve aguardar a realização da RM. Aguardar pelos resultados do exame imagiológico servirá, em alguns casos, apenas para atrasar a realização da intervenção cirúrgica necessária, aumentando o risco de complicações sistémicas, que poderão contribuir para o aumento da mortalidade e morbilidade no doente.

A intervenção cirúrgica com intuito exploratório deverá inclusivamente ser realizada em situações em que a RM não demonstre a presença de alterações compatíveis com FN, mas nas quais o índice de suspeita seja muito elevado.

No caso apresentado verificou-se a enorme dificuldade que o diagnóstico desta doença representa. Os achados clínicos de edema generalizado do membro superior, com uma PCR elevada e leucocitose detetadas no sangue sugeriam primariamente uma infeção de tecidos moles mais superficial e menos grave. A progressão dos sintomas e cumprimento dos critérios de diagnóstico de síndrome de choque estreptocócico tóxico no segundo dia de internamento combinados com os achados da ecografia torácica das partes moles realizada, que demonstrava a presença de uma coleção na região peitoral que afetava a fáscia e o tecido muscular, levaram ao diagnóstico de uma infeção de tecidos moles necrotizante mais profunda.

A importância do diagnóstico precoce na FN é algo bem sublinhado em diversos estudos5,6,13 que apontam para uma relação entre a diminuição na taxa de mortalidade e morbilidade e o diagnóstico e início da terapêutica precoces, particularmente quando associada ao SCTE. Nesta situação, a progressão para o choque e a falência multiorgânica pode ocorrer em poucas horas,3 sendo inquestionável o valor que algoritmos que permitam este diagnóstico de forma o mais precoce possível aportam.

O score Laboratory Risk Indicator for Necrotizing Fasciitis (LRINEC), desenvolvido em 2004, é uma ferramenta de diagnóstico validada para o diagnóstico de fasceíte necrotizante em doentes adultos.13 Combinando os valores laboratoriais da hemoglobina, contagem de glóbulos brancos, natrémia, glicose, creatinina e PCR, a sua utilidade no que se refere ao doente pediátrico permanece, ainda assim, desconhecida, pela possibilidade de falsos negativos.

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Um sub-grupo das variáveis que compõem o score LRINEC poderia, segundo Putman et al,13 ter uma maior eficácia no diagnóstico da fasceíte necrotizante no doente pediátrico: o p-LRINEC, composto apenas pelas variáveis PCR e natremia. As suas conclusões, embora retiradas de uma população de número reduzido, apontam no sentido de as restantes variáveis do score LRINEC serem demasiado semelhantes na população com fasceíte necrotizante e na população com outro tipo de infeções, identificando a PCR como a variável de maior sensibilidade (com um valor máximo de cutoff de PCR>20 mg/L) e a natrémia como a variável de maior especificidade no diagnóstico da fasceíte necrotizante, sendo o ponto de corte máximo quando esta se apresenta inferior a 135 mEq/L. Ora, tendo em conta o caso apresentado, verifica-se que estas variáveis são efetivamente cumpridas (hiponatremia < 135mEq/L (128 mEq/L) + PCR>20 mg/L (29.0)), pelo que esta poderia ter sido mais uma ferramenta de auxílio no diagnóstico. Torna-se então importante, aquando da admissão do doente pediátrico, ter em atenção que, em casos de manifestações clínicas que façam suspeitar de uma possível celulite em que se apresente uma PCR superior a 20 mg/L, o médico deverá ficar de sobreaviso para uma possível infeção necrotizante dos tecidos moles. Adicionalmente, em situações em que além desta alteração o doente apresentar também uma descida na concentração de sódio sanguínea abaixo de 135mEq/L a suspeita deverá ser maior. Seria, no entanto, interessante verificar a validade deste score em doentes pediátricos em estudos de maior amplitude e a sua utilidade no diagnóstico e instituição da terapêutica apropriada, de forma o mais precoce possível.

Perante um caso de fasceíte necrotizante associada ao STCE, a literatura atual diz-nos que a terapia a realizar passa essencialmente por quatro fatores-chave: a abordagem cirúrgica através do desbridamento cirúrgico e posterior drenagem da loca operada, a antecipação e gestão de falência multiorgânica, podendo inclusivamente chegar a ser necessária a diálise no doente, a antibioterapia parenteral apropriada e a terapia de suporte hemodinâmico. Nesta última estão incluídos a reposição de líquidos e o aporte nutricional apropriado, ambos relacionados com uma menor frequência de complicações.5,6 Um quinto pilar terapêutico, a utilização de imunoglobulina-G intravenosa, é referido em alguns trabalhos, não tendo no entanto sido utilizado no caso descrito, como explicado mais adiante, por não existir um consenso relativo à sua eficácia na redução da mortalidade e tempo de internamento.

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Começando pelo suporte hemodinâmico, a reposição volémica aquando da reanimação do doente pediátrico não deve nunca ser realizada com soros hipotónicos ou com base em dextrose. Uma infusão de soro fisiológico ou lactato de Ringer em bólus (20 ml/Kg realizada durante 10 minutos) será a mais apropriada sendo necessária em muitos casos terapêutica adicional. Em casos onde esteja presente hipotensão pode ser também necessária a utilização de agentes vasopressores.3

Uma intervenção cirúrgica precoce através do desbridamento extenso de material necrotizado e purulento é considerada uma prática fundamental na otimização da terapêutica da fasceíte necrotizante. O objetivo desta cirurgia é a remoção total do tecido necrótico afetado até obter margens cirúrgicas saudáveis, sangrantes e livres de infeção. A necessidade de intervenções cirúrgicas adicionais é frequente, sendo necessários em média três desbridamentos posteriores ao inicial para remover todo o tecido afetado.12 A importância dada à realização de uma cirurgia precoce prende-se com o facto de, independentemente da antibioterapia realizada, a concentração do fármaco a alcançar os tecidos afetados ser reduzida devido à necrose liquefactiva e a trombose local características desta patologia. Vários estudos3 apontam no sentido de uma pior progressão nos casos em que a intervenção cirúrgica é atrasada por mais de 24 horas, sendo inclusivamente a precocidade deste tipo de intervenção um dos principais fatores de bom prognóstico na avaliação do doente.

No caso apresentado, a doente foi submetida a cirurgia no 13º dia de internamento para desbridamento cirúrgico da região peitoral e axilar direita tendo sido colocado dreno na loca intervencionada. Foi necessária a reintervenção cirúrgica em outras duas ocasiões, sem intercorrências dignas de registo durante o recobro, fundamentais para impedir a propagação e agravamento da doença.

Desde o primeiro dia de internamento, a doente foi também submetida a antibioterapia, tal como recomendado pela literatura atualmente disponível. 5,6

No tratamento da fasceíte necrotizante preconiza-se a utilização de antibiótico de largo espectro até que seja realizado o exame cultural e o teste de sensibilidade do agente (TSA). Vários regimes terapêuticos podem ser realizados, sendo comummente aceite um esquema composto pela combinação uma penicilina, um aminoglicosídeo e clindamicina. Esta última, responsável pela supressão da toxina estreptocócica e da proteína de superfície M, representa a primeira linha de antibioterapia nestas situações, não devendo,

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no entanto, ser utilizada isoladamente sem obter previamente o resultado do TSA, devido à resistência apresentada por algumas estirpes de S. Pyogenes.1,6 Uma associação com penicilina apresenta então melhores resultados no que diz respeito à erradicação do microorganismo, particularmente em casos de infeções mais graves como a fasceíte necrotizante. A vancomicina pode também ser um agente antibiótico de utilidade, particularmente em casos de S. Aureus Meticilina-resistentes (MRSA) ou doentes alérgicos à penicilina.

Durante o internamento, a doente foi inicialmente medicada com flucloxacilina. Devido à progressão desfavorável da doença com a antibioterapia em curso, foi realizada terapêutica com meropenem e clindamicina, para as quais o microorganismo isolado demonstrou ser sensível no TSA. Por fim, após período de apirexia seguido de picos febris e agravamento laboratorial dos parâmetros inflamatórios (aumento da leucocitose e PCR) não contrariados pela antibioterapia em curso, foi decidida a introdução de vancomicina no esquema terapêutico.

No tratamento realizado foi também importante a realização de sessões de tratamento em câmara hiperbárica. A utilização de oxigénio hiperbárico, cuja ação visa aumentar a atividade leucocitária e promover a angiogénese, parece, segundo dados atualmente disponíveis, diminuir a viabilidade dos microorganismos anaeróbios, tendo também um efeito sinérgico com a antibioterapia. Embora alguns autores defendam a diminuição da mortalidade em doentes com fasceíte necrotizante através desta prática, outros negam a existência de benefícios reais na descida da mortalidade, sendo necessários estudos mais aprofundados na matéria.

Como referido anteriormente, alguns estudos apontam no sentido da existência de um quinto pilar na terapêutica da fasceíte necrotizante associada ao SCTE, a utilização de IVIG (imunoglobulina G intra-venosa). A teoria que está por base nesta terapêutica3 prende-se com a ação da imunoglobulina, que ao estabelecer uma ligação com a toxina, inibe a sua interação com a célula T, diminuindo simultaneamente a produção de factor tumoral de necrose alfa, uma citocina associada à sequelas clínicas do SCTE. São necessários, no entanto, mais estudos relativos à sua utilização neste contexto clínico, já que na literatura atual não existem resultados que permitam um consenso relativamente à descida da mortalidade e do período de internamento.

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Relativamente à descida da temperatura e resolução da febre, esta poderá em alguns casos ocorrer até 7 a 10 dias após o início da terapêutica apropriada. 3 Refira-se, no entanto, que a manutenção de uma febre elevada e persistente poderá sugerir um foco piogénico de infeção não drenado, obrigando em alguns casos a uma repetição dos exames imagiológicos realizados e, se necessário, nova intervenção cirúrgica. Foi também fundamental durante o internamento da doente a gestão da dor através de tratamento analgésico agressivo. É no entanto importante realçar que a presença de dor severa persistente é sugestiva de necrose tecidual e deverá sempre ser um sinal de alarme no que se refere à realização de intervenções cirúrgicas adicionais.

Por fim, apenas com o trabalho duma equipa multidisciplinar, que incluiu profissionais de diversas áreas como Psicologia, Fisioterapia e Nutrição, foi possível prevenir situações de ansiedade e depressão, associadas ao desfiguramento corporal provocado pela infeção, alcançando desta forma, a recuperação total da doente.

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Conclusão

A fasceíte necrotizante, continua a representar um desafio diagnóstico para o profissional de saúde, sendo necessário o desenvolvimento de métodos de diagnóstico que permitam melhores resultados na sua deteção. A progressão desta doença, particularmente se associada ao Síndrome de Choque Tóxico Estreptocócico, pode ser fulminante, sendo fundamentais o diagnóstico precoce e posterior instauração de medidas de tratamento agressivas para um melhor prognóstico do doente.

A antibioterapia de largo espectro, a reanimação e gestão da falência multiorgânica e o desbridamento cirúrgico são fundamentais, mas mesmo quando todos os procedimentos são realizados de maneira precoce e adequada, a taxa de mortalidade e morbilidade desta doença permanecem elevadas.

O doente terá habitualmente um internamento de longa duração, para o qual é fundamental o trabalho de uma equipa multidisciplinar, sendo o principal fator de prognóstico a rapidez com que este é submetido a uma intervenção cirúrgica desde o momento em que exista um elevado índice de suspeita de fasceíte necrotizante.

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Referências

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