NEOLlBERALlSMO,
PÓS-MODERNIDADE
E EDUCAÇÃO:ALGUMAS
IMPLICAÇÕES
(SOME IMPLlCATION ABOUT NEWLlBERALlSM, POSTMODER
I
T
Y
AND EDUCATION)
RESUMO
A educação e aformação daforça de trabalho, do ponto de vista dos interesses das classes dominantes, são hoje compreendidas a partir de novos enfoques. A pôs-modemidade, o neolibera-lismo metamorfoseiam conceitos e práticas de ensino de acordo com as necessidades e interesses econô-micos capitalistas gerando como conseqüência a quase extinção do sentido humanista atribuído à educação.
A condição dita pós-moderna pretende repre-sentar o progresso histórico na perspectiva do desenvolvimento científico e tecnológico da socie-dade capitalista. O advento da assim chamada pós-modernidade encerra teorias acerca do conhecimento e saber, as quais rompem com a concepção moderna de ciência e com os pressupostos científicos que fundavam saber e métodos de investigação ditos
modernos.
Há divergência quanto ao sentido atribuído ao termo pós-moderno e não aceitação unânime deste conceito, porém a arte, a cultura, a arquitetura e parte do pensamento filosófico da
contempo-raneidade,dentre outros aspectos, apresentam modificações impossíveis de serem contestadas e estas trazem conseqüências para a vida humana nos seus diversos campos.
Palavras-chave: Globalização, Ciência Pós-Mo-derna, Privatização, Mercado
MARIA ONErE LOPES FERREIRA I
ABSTRACT
Nowadays education and workforce training from burgueoisie point of view are known from a new
sense. Postmodernism and newliberalism change the concepts and teaching duty according to economic capitalist interests, so it creates, as consequence, almost the extinction ofthe humanist sense assigned to education.
The condition called postmodern intends to appoint the historical progress in the perspective of scientific and technological development of the capitalist society. The advent of the postmodernism contains theory concerning knowledge that breaks with the modern conception of science and its research methods.
There is divergence about the sense of the postmodern word and not unanimous acceptance of this concept. However, nowadays culture, art, architecture and part of phiosophical thought show us some modification which are impossible to be contested and that, really bring consequence to human life in its diverses sense.
Keywords: Globalization, Postmodern Science, Privatization, Market
INTRODUÇÃO
o
presente tempo histórico se nos apresenta como um tempo no qual convivem simultâea e aparen-temente harmoniosa, duas realidades: uma virtual eI Doutoranda em Fundamentos da Educação pela Universidade Federal de São Carlos. (AÇÃO EMDEBATE- FORTALEZA· ANO 20 • NQ36 • p. 82-92 • 1998
outra colada à prática social concreta. Em verdade, esse é um tempo em que (especialmente no Brasil) coexistem diversas formas históricas de vida, desde a forma mais primitiva à mais desenvolvida.
Embora produto do desenvolvimento tecnoló-gico, a realidade dita virtual (e mercantilizada) não constitui uma realidade apartada da realidade sensível, marcada pela exploração do homem, pela exclusão social, pela fome. Antes, esta forma de manipulação das relações entre os homens e a natureza por eles transformada constitui uma espécie de falseamento da realidade. É uma forma utilitária de condução histórica na qual não existem sujeitos. Inegavelmente, esta realidade é produto de um mundo cujo desenvolvimento tecnológico é capaz de produzir realidades virtuais, inteligências artificiais. Entretanto, sem resolver antigos problemas que perseguem a humanidade e que ultrapassam, inclu-sive, fronteiras e revoluções, os quais contrastam com a riqueza e o desenvolvimento.
São estes fatos que me põem, ao mesmo tempo, diante tanto de desafios quanto de convicções construí das ao longo de minha formação. Os desafios referem-se à compreensão crítica dessa realidade e, conseqüentemente, ao modo de como nela intervir no sentido de transformá-Ia. Já as convicções estão no campo do método. Fico com o materialismo dialético.
Todavia, esse mesmo caminhar possibilita-me formular certas conclusões acerca dos acontecimentos que vão marcando a história, dentre as quais, a de que a propalada globalização produz no campo da educação um reducionismo das funções que deveriam constituí-Ia enquanto ciência. É sobre essa questão que me proponho a refletir neste artigo.
REALIDADE SOCIAL E PO
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EDUCACIONAL NO ATUA
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A atual realidade parece se nos apresentar de forma cada vez mais complexa. É representada pela chamada globalização no plano econômico (e, ao mesmo tempo, pela universalização da miséria, do sofrimento e danificação da vida humana no plano social. A existência de tais fatos só pode ser compreendida e explicada a partir dos sórdidos interesses definidos pela lógica da propriedade privada). Todavia diante de tal realidade, fica cada vez mais nítida a convicção de que compreendê-Ia só é possível a partir de um método capaz de equacionar
'devidamente as múltiplas determinações
exprimem o real. Ou, como propunha Marx. arrave-c do pensamento crítico e dialético.
Contudo, a praxis utilitária cotidiana. 'os' (1989), cria uma forma superficial de compree --da reali--dade. Nesta forma de compreensão, a reali-dade concreta dá lugar a uma pseudoconcreticida e. Posto que a utilitariedade da vida cotidiana coloca no lugar da realidade material, dos fenômenos que a constituem, apenas a aparência imediatamente manifestada por tais fenômenos.
Enquanto o homem, especialmente aquele segmento que vive do trabalho, não for capaz de compreender os interesses que mascaram a realidade e geram a "inversão" da lógica que rege as relações sociais e de produção, ele será impedido de superar essa falsa consciência sobre a realidade. Será um ser alheio aos acontecimentos históricos por se tratar de uma história na qual ele não se reconhece. Enquanto isso, os discursos e a prática que materializam esta realidade, ainda que de forma fragmentada, vão sendo fabricados, impostos e assimilados com poucas chances de transformação em beneficio da maioria.
Assiste-se às mudanças históricas, às formas de denominação da cultura, da arte, da ciência, entretanto, sem razões historicamente comemoráveis. A história do século XX, do ponto de vista humano, é antes uma história pobre, ainda que marcada por "revoluções científico-tecnológicas". Mas, é em meio às contradições aparentemente inexplicáveis que o neoliberalismo vai se firmando e sua ideologia dando ao capital aquela energia que o faz parecer vitorioso e legitimador do "fim da história" e da era das ideologias.
De fato, as teses neoliberais, como alertam os críticos, têm sido agraciadas com um sucesso que talvez surpreenda aos seus próprios idealizadores. Provavelmente nenhuma outra alternativa teria logrado tanto êxito, do ponto de vista ideológico, na salvação do capitalismo da crise atualmente instalada. Embora a crise esteja aí, a convivência com os seus efeitos os naturalizam e os transformam num estado inerente ao próprio tempo. Conviver com os problemas dos dias de hoje tornou-se a única condição, não existem alternativas, salvem-se os que puderem!
O ideário neoliberal, para reoxigenar o fôlego do capitalismo, impõe, sobretudo pelo apara comunicativo e pela escola, a crença de que só rest ao mundo ajustar-se às regras da reestru u açã produtiva nos moldes da globalização cuja EDUCAÇÃO EM DEBATE· FORTALEZA· ANO 20 • NQ36 • p. 82-92 • 19 E•
rística mais visível é a exclusão da maioria da esfera do mercado. Tamanha é a força dessa ideologia que mesmo o senso comum já incorporou o seu jargão,
tornando a vida cotidiana ajustada à impotência que os gestores neoliberais impõem como a condição.
Como se vê, as ações que constituem o
chamado pensamento neoliberal e,que atendem pelo nome de desregulamentação, descentralização/ autonomia e privatização, dentre outros não causam mais indignações. Assiste-se passivamente à retirada,
do Estado de seu compromisso no campo dos direitos
sociais e trabalhistas de modo que o bem·intencionado
mercado amparado na imprescindível lógica do lucro,
passivamente, já se instalou.
A estabilidade no emprego, os ganhos de produtividade, o fundo de garantia, a aposentadoria,
direitos outrora conquistados através de pressões e lutas populares vão sendo extintos, porque, para a sobrevivência do capital faz-se necessário desregu-lamentar, privatizar (inclusive direitos) e gerar
autonomia para que os indivíduos possam competir
no mercado.
A descentralização, parceira da desregu-lamentação nessa empreitada, para sanar a crise fiscal dos Estados nacionais, falidos graças, sobretudo, aos credores internacionais, justifica as reformas administrativas, as quais, na prática representam demissões de funcionários públicos, crescimento do desemprego estrutural e insegurariça social e
individual.
Por seu turno, a privatização, sob a alegação da eficiência administrativa, gera como resultado a ascensão do mercado à condição de deus regulamen
-tador de todas as instâncias, mecanismos e até dos direitos que o homem um dia acreditou serem inerentes à sua condição. Nessa perspectiva, o direito à saúde, à educação, a uma moradia digna passam a ser bens cada vez mais caros para serem adquiridos.
A educação, a escola que, segundo a própria história, nada mais são do que a sistematização de
uma resposta necessária às questões da formação dos seres que fazem essa sociedade, certamente não poderia seguir por um caminho diferente. Do mesmo
modo que a Didática Magna de Comênio fora a
elaboração, segundo sua interpretação, das respostas no campo educacional, às demandas da sociedade
naquele momento, hoje a escola tem que ser
repensada, projetada para a satisfação das necessi-dades competitivas ditadas pelo mercado.
Assim, a chamada globalização ao direcionar
a formação humana para as demandas mercadológicas
pautadas na eficiência e qualidade produtivas, na
mesma medida, distancia homem e educação. Nessa
perspectiva, pode-se afirmar que o neoliberalismo
leva às últimas conseqüências a retirada do sentido humanista creditado à educação.
Daí, resulta a impossibilidade de compreendê -Ia dissociada de uma análise do próprio sistema, da ideologia que o exprime. Nesse sentido, qualquer que seja o aspecto da educação que se tome como objeto de análise, quando contextualizado na sociedade, deixa transparente sua subordinação às
teorias e interesses que dão sustentação ao neo
-liberalismo.
Governos e organismos internacionais, hoje,
pensam e articulam seus discursos referentes à formação escolar de modo a que a ênfase atribuída ao ensino básico (e sua relação com oconhecimento)
esteja voltada tão-somente para o mercado de trabalho, cujo lema já convencional, é competi -tividade, produtividade, desempenho, eqüidade,
consenso, integração, descentralização. Conceitos esvaziados de significação humana.
Esse novo enfoque atribuído à escola, contem-plador, por essência, das medidas "recomendadas"
pelo Banco Mundial enquanto mentor dosorganismos
internacionais, contem modificações que vão da administração da escola às reformas educacionais e pedagógicas, passando pelas formas de financiamen-tos da educação. Estas, com vistas à qualidade e eficiência das escolas (na lógica dos discursos),
justificam a diversificação na adoção de critérios financiadores. Porém o fim último de todas as mudan-ças consiste na implementação dos artifícios como
privatizaçãoparcerias, municipalização, por demais
necessários aos ajustes econômicos.
As reformas pedagógicas (Saviani, 1997), incluem alterações curriculares que privilegiam determinadas disciplinas (matemática no ensino de ciências exatas e linguagem na área de informática),
porque são consideradas mais significativas na formação da nova força de trabalho no sentido de deixá-Ia mais e mais ajustada às exigências das inovações tecnológicas.
No tocante à da formação de professores para
o ensino de 10e 20 graus, as propostas eprogramas
repetem o mesmo lema tornando-os totalmente distanciados da concepção reivindicada pelos movimentos populares na defesa de seus interesses e de um ensino de qualidade.
Nesse particular, o que se nota é que para a profissionalização dos professores as propostas são
... programas de capacitação a distância;
preparação pedagógica mais breve, menos
acadêmica; contratação de especialistas no setor produtivo; regime dededicação exclu
-sivasema contrapartida salarial; liberdade
para oscentros educativos na determinação
total ou parcial dos salários dos docentes,
deacordo com o projeto educativo (Saviani, 1997,p. 54).
Portanto, a partir de um olhar mais atento so-bre a realidade, não fica difícil concluir que o capi-talismo em sua versão neoliberal consegue como nunca, mediante seus aparatos ideológicos e sua ciên-cia pós-moderna exercer um poder de subordinação e controle sobre os destinos da humanidade cujos efeitos para a vida cotidiana, embora tragam como conseqüência o medo, a insegurança, o terror, conse -gue manter a todos, senão num estado de calma, ao menos numa espécie de inércia que naturaliza esses mesmos efeitos como uma condição frente à qual não existem alternativas.
Tal é o poder de convencimento dos artifícios neoliberais e neoconservadores, que aqueles que não aceitam suas receitas e se mostram dispostos a não transigir na luta ou no plano teórico parecem não cons-tituir, sequer, ameaça ou risco para esse projeto social. Mas, contra a vontade dos neoliberais e seus prepostos, ainda não chegamos ao fim da história e, autopia embora em refluxo, não morreu, tampouco pode entregar as armas porque a possibilidade de construção de uma nova sociedade continua depen-dendo da capacidade de resistência e luta dos que se negam a navegar nas ondas do neoliberalismo.
Todavia, as estratégias de ação terão que ser construí das em novas bases as quais dependem de uma sólida formação epistemológica acerca do real. Não há como intervir nessa sociedade sem um profundo entendimento da atual realidade, dos estratagemas ide-ológicos e dos engodos que a"filosofia" pós-moderna veicula como verdade imutável dos fatos.
Frigotto (in: Gentili e Silva, 1996), ao analisar os desafios para a formação e profissionalização do educador, sabiamente afirma que a condição preli-minar no plano educacional estar em
re-significar umconjunto de categorias e c
on-ceitos no campo educacional, que são
metamorfoseados e apropria os .:0 reducionista pela perspectiva q
'(1995) denomina de produtivist . contrapartida a uma perspectiva civil
crática.' (...)Dentreestes conceitos. estão o de formação (humana), profissionoli: -o qualidade, autonomia,formação geral, a s -trata, unitária, cidadania, liberdade, par
-ticularidade e universalidade, sujeito, subjetividade, etc.Essa resignificação,para não cair noplano escolástico ou meramente
estruturalista, necessita efetivar-se desde uma perspectiva histórica, ontológica, sociocultural, ético-política e epistemo
-lógica.Ou seja, os conceitos enquanto repre -sentações no plano do pensamento do
movimentoda realidade, não são alheios às
relaçõesdepoder e àsrelações declassepre -sentesnasociedade. Pelo contrário, são me
-diações de sua explicitação ou de seu
mascaramento (Frigotto, 1996,p.91). Porém, um entendimento claro do significado hoje atribuído a estes conceitos enquanto mediações das relações de classe passa, inicialmente, por uma compreensão crítica do que significa a dita ciência pós-moderna e de que forma ela se reflete na educa-ção, promovendo, conseqüentemente, o reducionismo das funções que lhe caberia enquanto prática social voltada para o desenvolvimento do homem em suas relações sociais e com o meio natural. Entretanto, a análise que aqui se fará acerca da pós-modernidade não esgotará a questão, terá apenas um caráter introdutório.
o
FENÔMENO PÓS-MODE
RNO E SUA
RELAÇÃO COM O ENS
I
NO
E O SABER
Antes de iniciar a reflexão sobre ós-mo er -nidade, faz-se necessário enfatizar que a eno inação pós-moderna tem diferentes visões e ignifi ados enquanto designação científica, históri a.,filosó 1 a. Não se constituindo também em definição unânime. Dentre os filósofos que produzem na atualidade Touraine em sua obra Crítica daModernidade (1995), por exemplo, prefere pensar numa sociedade programada para designar a atual conjuntura.
2 Segundooautoraperspectiva produtivista explicita-se fundamentalmente hoje, pelo ideário da reestruturação produtiva dopro -cesso de globalização exc/udente (..) eda superestrutura ideológica do neoliberalismo que a legitima (ibidem, ibidem, p.91)
Segundo o referido autor vive-se atualmente uma forma extremada de decomposição do modelo racionalizador da modernidade, mas não uma ruptura. Nesse sentido, as idéias ditas pós-modernas, (ibidem), constituem-se em interpretações sociológicas superficiais e, mais próximas das análises da sociedade industrial, do que de idéias que demons-trem uma ruptura com tais análises.
Para F orrester (1997), este é o tempo do triunfo do liberalismo, do "horror econômico". Tempo de "violência da calma", em que, no que pese a aparência de nos encontrarmos num mundo virtual, entretidos com crises, vive-se uma nova era sem conseguir observá-Ia. Ou, o que é pior, sem a consciência de que a época anterior desapareceu e que seus problemas, são as normas dos dias de.hoje. Porém, essa é a época do liberalismo (ibidem, ibidem), porque este
soube impor sua filosofia sem ter realmente que formulá-Ia e nem mesmo elaborar qualquer doutrina, de tal modo ela estava encarnadaeativa antes mesmo de ser notada. Seu domínio anima um sistema imperioso, totalitário, em suma, mas,por enquanto em torno da democracia e,portanto, temperado, limitado, sussurrado, calafetado, sem nada de ostentatório. Estamos realmente na violência da calma.
Calma e violência que desembocam em postulados estabelecidos sobre o principio
da omissão - a omissão da miséria e dos miseráveis - criados e sacrificados por elas com uma desventura pontificante (Forrester, 1997, p.45-6).
Lyotard e Chauí, a partir de perspectivas diferenciadas, analisam a assim chamada pós-modernidade, enfatizando os efeitos das políticas e ideologia neoliberais para a vida em geral e para o saber e a educação em particular. É com base, especialmente, nestes autores que serão discutidas as conseqüências da pós-modernidade para o saber e para o ensino.
É fato que nesse mundo de "vestígios de uma era desaparecida", em que a massa humana se tornou desnecessária e os que ainda são úteis são apenas consumidores (o conceito de cidadania perdeu o seu significado revolucionário e em seu lugar
emprega-se apenas a palavra consumidor ou cliente), a
educação ou a formação escolar, conforme já se
afirmou, éentendida de uma nova forma, possui um novo papel.
Já há algum tempo certos educadores ou
intelectuais que publicam sobre a educação, dentre os quais Tomaz Tadeu da Silva, insistem que para os liberais a escola tem um papel estratégico importante a cumprir em seu projeto neoliberal. Mesmo a televisão, os jornais, os meios de comunicação de massa em geral nos dizem isso a todo momento, mas convém aprofundar essa discussão, introduzindo nela a contribuição da filosofia e dos filósofos.
Para Lyotard (1989), a ciência vive original-mente em conflitos com as narrativas. A filosofia seria o discurso criado para legitimar o que é verda-deiro. O metadiscurso, as grandes narrativas (dialética do espírito, hermenêutica do sentido, emancipação do sujeito racional) foram a legitimação à qual teria recorrido a ciência moderna. O critério de verdade na ciência moderna repousaria sobre uma unanimi-dade racional possível. Assim, a legitimação do iluminismo se encontrava na boa finalidade ético-política que o definia: a paz universal.
Nessa perspectiva de análise, o saber uma vez legitimado por uma metanarrativa (... ) o que implica uma filosofia da história, se é conduzido a questionar a validade das instituições que regem o vínculo social, pois também elas exigem ser legitimadas. (Lyotard, 1989, p.12). Hoje esse discurso não encontra mais um lugar, portanto, a modernidade estaria esgotada.
A pós-modernidade, segundo Lyotard, seria, então, a designação do atual estado da cultura nas sociedades desenvolvidas, isto é, a condição pós-moderna diz respeito ao ( ...) estado da cultura após as transformações que afetaram as regras dos jogos das ciências, da literatura e das artes a partir do final do século XIX (Lyotard, 1989, p.11). Definida no extremo da simplificação, a pós-modernidade representa uma condição decorrente do progresso da ciência, tendo como fundamento a incredulidade em relação às metanarrativas.
A função narrativa perde os seus functores, o grande herói, os grandes perigos, os grandes périplos e o grande objectivo. Ela dispersa-se em nuvens de elementos de linguagem narrativos, mas também denota-tivos,prescritivos, descritivos, etc. veiculan-do cada um consigo valências pragmáticas sui generis. Cada um de nós vive em encruzi-lhada de muitas delas. Nós não formamos combinações de linguagem necessariamente 6 •EDUCAÇÃO EMDEBATE· FORTALEZA· ANO 20 • NQ36 • p.82-92 • 1998
estáveis e as propriedades das que formamos
não são necessariamente comunicáveis.
Assim, a sociedade que se avizinha
releva menos de uma antropologia newto
-niana (como o estruturalismo ou a teoria dos
sistemas) e mais de uma pragmática das partículas de linguagem: é a heterogeneidade
dos elementos. Eles permitem a instituição
apenas por setores: é o determinismo local
(Lyotard, 1989,p.12).
-firma Lyotard que, apesar dos "jogos de
=em" pós-modernos conduzirem ao
deter-local, os decisores tentam legitimar as
- e social idade" (socialité) por meio de uma
"que implica a comensurabilidade dos
•• ~ ..•-..-.vse a determinalidade do todo". A própria
ana fica destinada ao crescimento do poder,
- imação
tanto em matéria de justiça social como de verdade científica, adviria da optimização
das performances do sistema, da eficácia.
A aplicação destes critérios a todos os nossos jogos é acompanhada de algum
terror, doce ou duro: "sejam operatórios, isto é, comensuráveis, ou desapareçam"
(Lyotard, 1989, p.12-13).
- verte, ainda Lyotard, que a condição
pós-x=~r.=.a não é uma condição tranqüila, posto que,
- mão das metanarrativas, deixa vazio o
- legitimidade. Não estaria neste ponto, a
_ ita pós-moderna se apoiando também num I-;!~::~5 urso, o da não vaI idade das grandes
•••. -:e--~··:as?
eixando de lado a contradição e voltando
samento de Lyotard ... diz-nos o autor que
_ a da sociedade na dita pós-modernidade
ma mudança no estatuto do saber. As
.: rm aç õ es tecnológicas que hoje c
arac-___ -_ as relações no setor produtivo afetam o
as suas duas principais funções: a de
gação e a de transmissão de conhecimentos. rescente das máquinas informacionais
:0
a circulação do conhecimento de forma_~ somente o saber traduzido em quantidade
-: mação, em linguagem de máquina será
::erado. A hegemonia da informática imporá
ógica que terá como conseqüência a
~''Y''''_'r.ãoentre saber e sabedor.
Nesse sentido, afirma Lyotard,
pode-se, desde logo, esperar uma forte
separação do saber relativamente ao "sabe -dor", qualquer que seja o ponto que este
ocupe no processo de conhecimento. O
antigo princípio de que a aquisição dosaber
é indissociável da formação (Bildung) do espírito, e mesmo da pessoa, cai e cairá cada vez mais em desuso. A relação dos fornecedores e dos utilizadores do conhecimento com este tende e tenderá a
revestir-se da forma que os produtores e consumidores de mercadorias têm com estas últimas, ou seja, a forma de valor. O saber é e será produzido para ser vendido e é e
será consumido para ser valorizado numa nova produção: em ambos os casos, para ser trocado. Ele deixa de ser, para si mesmo, a sua própria finalidade, perdendo o seu
"valor de uso" (Lyotard, 1989,p.18).
o
saber (Lyotard, 1989) tornou-se a principal força de produção. Em conseqüência disso houve uma modificação na composição da população ativa nos países desenvolvidos, constituindo também o principal pólo de estrangulamento para os países considerados em vias de desenvolvimento. De acordo com o autor, a ciência conservará e reforçará ainda mais a sua importância na "bateria das capacidades produtivas dos estados-nações". Este seria também um fator que provocaria um afastamento ainda maior dos países desenvolvidos em relação aos ditos emviasde desenvolvimento.
Outro aspecto a ser considerado e, que
complementa o primeiro é que
...sob aforma de mercadoria informacional,
indispensável à capacidade produtiva, o
saber já é eserá uma aposta maior, talve: a
mais importante, na compelição mundial
pelo poder. Assim como os estados-nações se bateram para dominar os territôrios,
depois para dominar o acesso e a explo -ração dematérias-primas e da mão-de-obra barata, é pensável que eles se baterão no futuro para dominar as informações. En
-contra-se, assim, em aberto um novo campo para as estratégias industriais e comerciais
e para as estratégias militares e políticas
(Lyotard, 1989,p.19-20)
Todavia, o próprio Lyotard adverte que tal perspectiva não seria tão simples, posto que a mercantilização do saber altera também o privilégio dos estados-nações modernos relativamente á produção e difusão dos conhecimentos. O conhecimento enquanto derivação do "cérebro" ou "espírito" da sociedade, representado pelo Estado, sucumbiria mediante a prevalência de um princípio inverso: o de que o progresso social fica na dependência da riqueza das informações fáceis de decodificar que circulam na sociedade. O Estado, então, apareceria como um obstáculo aos interesses de uma ideologia "transparente". Estaria, portanto gerando-se uma tensão nas relações entre instâncias econômicas e estatais.
O caminho por onde têm seguido as sociedades amparadas na ideologia do conhecimento as tem levado na direção apontada por Lyotard ao escrever esta obra no final dos anos 80, isto é, tem esboçado uma situação em que não se difunde conhecimentos pela sua importância política, administrativa,
diplomática, pelo seu valor formador, mas a partir do reforço de uma lógica idêntica à da circulação de moeda. A ignorância (Lyotard, 1989) não é mais a contra-referência do saber, agora, mais claramente, os termos passaram a ser:
conhecimento depagamento/conhecimento de investimento ". isto éconhecimento tro-cado no quadro de manutenção da vida
quotidiana (reconstituição da força de
trabalho, "sobrevivência ") versus crédito
de conhecimentos tendo em vista a
opti-mização das perfomances de um programa
(1989, p.22).
Refletindo-se sobre a nossa realidade, é possível encontrar nela os mesmos traços apontados por Lyotard. Portanto, talvez em um único ponto seja possível estabelecer com ele uma discordância: na sua restrição à atribuição da chamada condição pós-moderna apenas às sociedades desenvolvidas (todavia, é bem possível que seja coerente com a época em que o texto foi escrito). As análises mais atuais possivelmente não poderiam fazer esse corte. Refletir hoje sobre a realidade, mesmo nos chamados "países emergentes", condição em que é enquadrado o Brasil na linguagem econômica, no
intuito de compreendê-Ia criticamente, dada as
onseqüências da dita "globalização" só seria ssí ela partir de pontos de vista mais gerais. Ainda
que seja possível encontrar elementos diferenciados
em cada so iedade parece impossível compreender
uma realidade se a tomarmos nos limites de sua
própria configuração econômica. A condição de emergente éem sitomada relativamente a uma outra situação. Não é uma condição isolada.
Ademais, a rapidez mesma com que os fatos derrubam e atravessam as fronteiras e se difundem por toda a terra impediria qualquer análise pura e localista. As diferenças regionais impõem particu-laridades que diferenciam a manifestação e as conseqüências dos fenômenos que precisam ser consideradas, porém elas não podem encerrar teorias "dotadas de latitude", ao menos nos dias de hoje.
Conforme nos mostram determinadas análises ou mesmo os noticiários veiculados pela mídia,
primeiro e terceiro mundo (velhos chavões utilizados
para designar as economias quando ainda existia o comunismo), de um ponto de vista geral, não são maneiras de desenvolvimento com fronteiras rigidamente definidas. A diferença éque em alguns países ou regiões predomina uma ou outra situação,
mas é tão possível ver situações típicas de "terceiro mundo" no coração da Europa ou nos ricos Estados Unidos, como de "primeiro mundo" no Brasil.
Ainda que na condição de "emergente", é possível afirmar-se que o atraso brasileiro com relação aos países ditos desenvolvidos já não é tão grande quanto no passado. O problema é que aqui convivem lado a lado e harmoniosamente, atraso e desenvolvimento sendo o primeiro a forma dominante.
Ambas as situações são facilmente identifi-cáveis em qualquer que seja a área que se queira fo-calizar (econômica, social, educacional, cultural).
Nessa mesma direção aponta a análise de Marilena Chauí, de quem, sinteticamente tomaremos as idéias concernentes à educação, notadamente as referentes a universidade brasileira.
NEOLlBERALlSMO E UNIVERSIDADE
Para Chauí a pós-modernidade corresponde ao principal subproduto da ideologia neoliberal e se define pela tomada do ser da realidade a partir da fragmentação econômico-social e da compressão espaço-temporal gerada pelas novas tecnologias e pelo percurso do capital financeiro.
Na vida cotidiana, sobretudo de determinados segmentos sociais, a pós-rnodernidade (Chauí, 1997), se traduz por uma forma de vida determinada pela DEBATE• FORTALEZA· ANO 20 • NQ36 • p. 82-92 • 1998
insegurança e violência institucionalizada pelo mercado.
Na análise de Chauí as principais
carac-terísticas da vida pós-moderna são: I. a insegurança,
que tem levado as pessoas a investirem tanto nos
mercados de futuro quanto nos de ouro; 2.dispersão, aprocura por autoridades políticas fortes e com perfil despótico; 3. medo, que tem estimulado o reforço a
antigas instituições (família, retorno às formas
místicas e fundamentalistas de religião) e 4. o
sentimento do efêmero e da destruição da memória e, que leva ao reforço de suportes subjetivos da
memória (fotografias, diários, biografias).
Para a educação, ou antes, para
o
saber, após-modernidade representaria uma inversão histórica da
iência moderna, uma ruptura e não sua superação.
Enquanto a modernidade pretendia uma filosofia e
iência com vistas à libertação da humanidade das
amarras hostis impostas pela natureza. Ou seja,
enquanto a modernidade via na racionalidade o
aminho para que homens e mulheres pudessem
ompreender a distinção entre ciência e natureza, bem
orno o sentido da história na compreensão da
ealidade, a ciência pós-moderna afirma o inverso ao
pretender que a ciência constrói a realidade " intelec-aI e experimentalmente nos laboratórios".
Na visão pós-moderna (Chauí, 1997), a ciência
é confundida com engenharia, não é conhecimento,
desconsiderando, portanto (...) a opacidade do real e
as difíceis condições para instituir as relações entre
o subjetivo e o objetivo. Nesse sentido, estaria
levando à ilusão de "que os homens realizam hoje, o
sonho dos magos da Renascença, isto é,serem deuses
porque capazes de criar a própria realidade e,agora, aprópria vida" (Chauí, 1997, p.21)
Tal como acontecera com a ciência moderna em
relação à antiga, em nossos dias, a ciência sofre uma
mudança de estatuto que, igualmente, se reflete no
estatuto da técnica. Na antigüidade ciência e técnica
eram autônomas, constituindo-se a técnica em arte
apaz de solucionar os problemas práticos (sem
qualquer relação com a ciência). Para a ciência
moderna os objetos técnicos são transformado- e
objetos tecnológicos. Muda-se a natureza dos mesmo .
pois os objetos viram "ciência materializada .
Porém a ciência contemporânea, pós-moderna
Chauí (1997), vai além, ela transforma objetos
técnicos em autômatos. Nela a realidade atua como
um sistema de objetos auto-referidos, auto-regulados
e dotados de lógica própria, capazes de intervir não
só sobre teorias e práticas, mas sobre a organização
social e política. (... ) Como sabemos, aciência e a
técnica contemporâneas tornaram-se forças produti -vas e trouxeram um crescimento brutal do poderio
humano sobre o todo da realidade que, afinal, é
construída pelos próprios homens (1997, p.22). Nesse contexto, a análise que a autora faz da
educação, sobretudo do papel da universidade revela uma submissão quase total desta instituição - sobre a
qual recai com mais força a responsabilidade pela
produção do conhecimento - aos postulados neoliberais. A transparência dessa submissão é notória nas
pautas de discussões em congressos, em especial os
de fórum próprio - Conselho de Reitores -, nas
políticas de administração e mesmo na existência de um nível de"institucionalidade informal" que é hoje sobreposta à institucionalidade legal da universidade.
Essa "institucionalidade informal", referida pela professora, diz respeito às funções ou às formas
de representação que a universidade acabou assu
-mindo informalmente (não correspondentes à sua
divisão institucional). A Universidade de São Paulo
(USP), entre as mais reconhecidas do país, é citada
como exemplo. Nesta universidade, conforme analisa
Chauí (1997), em qualquer de seus institutos ou
faculdades, existem três tipo de escolas não
estabelecidos pela sua divisão institucional. Existe:
I) a universidade que dá prestígio curri ular ao
docente; 2) a escola que oferece complementa ão
salarial ao docente e 3) a uni ersidade públi a.'
Segundo Marilena Chauí a efi iên ia e a
qualidade da universidade não é dis u ida no plano
acadêmico da docência e da pesquisa. O parâmetro
para a discussão é a produtividade e a ompetição.
Auniversidade que dá prestígio é aquela em que o docente não é pesquisador e nem tem dedicação exclusiva. Leciona apenas
algumas horas por semana, a profissão principal éexerci da num consultório. escritório ou empresa privada, contudo a apresentação enquanto professor da USP vale clientes ricos ou um bom cargo na firma. O segundo tipo éaquela cujas pesquisas são patrocinadas por empresas e organismos privados que subsidiam a montagem e manutenção dos laboratórios. bibliotecas, equipamentos, financiam congressos, viagens, cursos noexterior. Sendo os recursos vinculados autonomamente entre institutos. departamentos e órgãos financiadores. Em função dos financiamentos privados. os resultados das pesquisas também não são publicados. antes têm uso privado. Esta éa universidade considerada moderna porque pratica a"cooperação entre universidade e sociedade civil".
A terceira é a universidade pública propriamente dita. A que os docentes dedicam tempo integral ao ensino e à pesquisa e
dependem inteiramente dos recursos públicos. Énesta também que são realizadas as pesquisas fundamentais.
Conseqüentemente, as discussões giram em torno da atribuição de pontos às publicações, artigos, livros.
Sobre se vale mais pontos artigos publicados em revistas estrangeiras ou nacionais ...
Ainda de acordo com Chauí tal discussão encontrou eco na universidade exatamente porque ela absorveu a ideologia neoliberal. Esse foi um passo importante para a aceitação: primeiro da idéia de avaliação universitária desvinculada do ensino de primeiro e segundo graus; segundo da avaliação acadêmica pelo critério das publicações e titulação,
desprezando-se a docência (critério semelhante ao das universidades particulares americanas); terceiro
distribuição de recursos para pesquisa pelo critério de "linha de pesquisa", critério que não faz sentido
na área de humanas e, quarto privatização e
terceirização da atividade universitária como
sinônimo de modernização racionalizadora
(participação da universidade na economia e na
sociedade como prestadora de serviço às empresas privadas e nenhum compromisso com a pesquisa fundamental e de longo prazo). Este é o retrato das universidades no Brasil.
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ACERCA
DO ENSINO DE 1
0E 2
0GRAUS
A análise do discurso relativo ao ensino de 10
e 20 graus mostrará que neste campo as perspectivas
são as mesmas. Para discutir esta problemática o texto
tomará como referencial o pensamento de Pablo
Gentili, cuja idéia básica é a de que a crise e desmoronamento da "era de ouro" vivenciada pelo capital a partir dos anos 70 trouxe uma alteração substantiva para a função econômica atribuída à escolaridade, de sorte que as políticas educacionais
deste final de século são um forte reflexo das
transformações vividas na economia.
A tese formulada por Gentili éa de que oatual
estágio de desenvolvimento econômico deslocou o eixo da formação escolar - que na "era de ouro" se
caracterizou pela promessa de formação para o
emprego tendo, por conseguinte, promovido a expansão dos sistemas educacionais. Hoje o eixo seria formar para a"flexibilização", ou em última análise,
formar para o desemprego, uma vez que apenas alguns encontrarão postos de trabalho no mercado.
Esse fenômeno o autor analisa como momento de
desintegração da promessa integradora.
A promessa integradora fora fruto do rec
onhe-cimento, pelas classes dominantes e mesmo dos que
luta am pela democratização da escola, de que os
sistemas educacionais representavam um importante
mecanismo institucional de integração social (a teoria
do capital humano e a criação da disciplina economia
da educação foi parte desse reconhecimento).
As razões básicas da promessa integradora
(Gentili, 1997), nascem com a necessidade de
definição de estratégias voltadas para a criação de
condições "educacionais" favoráveis a um mercado
de trabalho em expansão eque inspirava a confiança de atingir o pleno emprego.
A escola, ao qualificar a força de trabalho,
estaria oferecendo aquele elemento necessário para garantir a competitividade e,aomesmo tempo, estaria proporcionando o incremento da riqueza social e individual- o capital humano.
Mas, a economia, conforme mostra a história,
seguiu por outro caminho e durante esse percurso a promessa integradora sofreu profundas modificações
nos discursos oficiais enas narrativas acadêmicas que
pretendiam legitimá-lo, Nesse ínterim, a promessa se desintegrou .... contudo, adesintegração da promessa não significa a negação da contribuição da escolaridade para o mercado. A essência do papel desempenhado
pela escola é que sofre uma transformação, houve uma
"privatização da função econômica atribuída à escola". Nas palavra de Gentili:
passou-se de umalógica da integração em
função de necessidades e demandas de
caráter coletivo (a economia nacional, a
competitividade das empresas, a riqueza social, etc.) a uma lógica econômica e
stri-tamente privada eguiada pela ênfase nas
capacidades e competências que cada pessoa deve adquirir no mercado educacional para
atingir uma melhor posição no mercadode
trabalho. Morta definitivamente a promessa do pleno emprego,restará ao indivíduo(e não ao Estado, às instâncias deplanejamento ou às empresas) definir suas próprias opções,
suaspróprias escolhas que permitem ou não conquistar uma posição mais competitiva.A
desintegração da promessa integradora deixará lugar auma nova promessa, agora sim de caráter estritamente privado: a promessa da empregabilidade (Gentili,1997,
p.8-9).
Em síntese, aquele contexto histórico, marcado pelo crescimento econômico em escala mundial e pelo
Estado do Bem-estar nos países mais desenvolvidos
e, que no plano político foi possível transformar a
promessa integradora em necessidade," sofreu uma
.inversão". Hoje, o discurso aponta para outra
direção. A finalidade da educação ainda é formar para
omercado, mas, agora para um mercado de oportuni-ades reduzidas. Nas entrelinhas do discurso
percebe-e que formar para a "flexibilização" subentende-se
ormação também para o desemprego, afinal a lógica
e desenvolvimento hoje é conduzida pela ausência
oemprego.
As poucas chances de emprego disponíveis
erão que ser disputadas entre aqueles que reunirem
competências individuais mais flexíveis e capaci-ades melhor desenvolvidas. A escola continuará
sendo um dos lugares para a busca dessas qua
-idades (não será o único). Porém, está claro é que
esta instituição, concordando com Géntili (1997), fi ará cada vez mais esvaziada de suas funções
sociais, porém com mais chances de tornar
reconhecida sua produtividade institucional que
oderá ser reconhecida (... ) nas habilidades que os
seus clientes-alunos disponham para responder aos
.iesafios que um mercado altamente seletivo impõe
Gentili, 1997, p.20).
Entretanto, se como Paulo Freire (1997), zoncordamos que "formar" é muito mais que "treinar"
- seres humanos no desempenho de destrezas. Como
_.e, temos de nos inquietar diante do "cinismo da
eologia neoliberal" e, de modo algum assumir um
- de observador imparcial. É com esse espírito e
sentimento e, tomando como referência uma
concep-:-0de escola cujo interesse seja
C .. )
desenvolver em: da indivíduo humano a cultura .geral ainda
diferenciada, o poder fundamental de pensar e de
s ber se orientar na vida (Gramsci, 1932, p.61), que
.:e emos nos contrapor a essa ideologia.
Evidentemente, a realidade com que se deparava
ramsci naquele momento não era idêntica àde hoje. - problemas que motivavam seu pensamento, em
:: eeram outros, o neoliberalismo não havia, sequer
- ogestado. Hayek, Friedman, Popper, etc. são frutos
- década seguinte, entretanto o autor já chamava a
nção para a relação de dependência entre a crise
ial e a crise da escola. Mesmo que sua bronca com
a escola tivesse como razão de ser o seu des on
-tentamento com relação à formação de "quadro
intelectuais", ele compreendia que aquele era apenas
parte de um problema cuja raiz estava na estrutura
social. Era fruto de uma política educacional "caótica"
e sem "princípios claros e precisos". A crise do
programa e da organização escolar, isto é,da orientação
geral de uma política de formação dos modernos
quadros intelectuais é em grande parte um aspecto de uma complicação de uma crise orgânica mais ampla e geral (Gramsci, 1932, p.62).
Sem dúvidas, o problema hoje é muito mais profundo. Não vivemos apenas a crise de uma sociedade sem "quadros intelectuais", vivemos numa sociedade em que os intelectuais (no sentido gramsciano) passam a ser uma espécie considerada fora da realidade, incompatível com os tempos.
Todavia, e pensando novamente com Paulo Freire, parece-me conveniente reafirmar que ainda é tempo de reconhecer que a História é tempo de possibilidade e não de determinismo, que o futuro
(..) éproblemático e não inexorável. (Freire, 1997,
p.21).
CONCLUSÃO
o
modo de produção capitalista dos dias atu-ais requisita dos trabalhadores um tipo de qualifica-ção historicamente novo, baseado numa formação
escolar capaz de promover o desenvolvimento de ca
-pacidades abstratas e habilidades técnicas que até
então não preocupavam àescola capitalista.
Contudo, a formação que concretiza a escola
hoje reivindicada, não corresponde a uma educação
realmente geral e básica conforme apregoa o discurso.
Ao menos não representa aquilo que o entendimento
crítico considera educação geral básica.
Como se tenta demonstrar ao longo do texto, o
entendimento do saber na dita condição pós-moderna
diverge da concepção considerada moderna do
conhecimento. A escola desen 01 e um tipo de
formação mais próxima do entendimento pós -moderno acerca do conhecimento do que de uma
formação geral baseada num saber oltado para a
emancipação do homem.
Para Gentili a promessa integradora se reverteu em necessidade generalizada: para o mercado de trabalho que demandava rabalhadores qualificados; para o Estado porque este estava comprometido com as metas de desenvolvimento do mercado; para
asinstituições escolares que cujo parâmetro em suas políticas eram asexigências do mercado; para os sindicatos que autilizava como ferramenta para ser utilizada nos acordos de negociação egestão e para os indivíduos que dependiam da educação como
investimento para oaumento de suas rendas individuais.
A universidade também se encantou com a
ideologia neoliberal, embarcou nesse discurso e, a
avaliação que ela faz de si mesma, conforme nos
induz o pensamento de Marilena Chauí, não tem sido
capaz de equacionar devidamente as determinações
históricas, econômicas, sociais e políticas geradoras
dessa realidade, de forma que sua atividade vai se
tornando cada vez mais esvaziada do compromisso
com o conhecimento crítico.
Nesse sentido, Frigotto foi extremamente f
e-liz ao afirmar a necessidade de se re-significar todo
o conjunto de categorias e conceitos empregados pelo
jargão neoliberal, sobretudo no campo educativo.
Essa tarefa é extremamente necessária para a
recu-peração do verdadeiro sentido da educação.
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