PONTIFICIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PEDRO HENRIQUE DE CARVALHO OLIVEIRA
As imagens do luxo: a relação entre o consumir e o ser
consumido
Mestrado em Comunicação e Semiótica
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
PUC SP
PEDRO HENRIQUE DE CARVALHO OLIVEIRA
As imagens do luxo: a relação entre o consumir e o ser
consumido
Mestrado em Comunicação e Semiótica
Dissertação apresentada à banca examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em Comunicação e Semiótica sob a orientação do(a) Prof.(a), Doutor(a) Norval Baitello Júnior.
Oliveira, Pedro Henrique Carvalho de
As imagens do luxo: a relação entre o consumir e o ser consumido/ Pedro
Henrique C. Oliveira - São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, 2010.; 311p.; 36 ilustrações.
Título em inglês: The images of luxury: the relationship between consuming
and being consumed.
Banca Examinadora
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AGRADECIMENTOS
Venho agradecer ao apoio de diversas pessoas durante esta longa e árdua jornada de mais de dois anos. Pessoas especiais que, do seu modo especial, facilitaram em algum aspecto meu caminho abrindo espaço em meio às muitas e muitas pedras, de diferentes tamanhos e formas, que vão surgindo do início ao fim. Chega então o momento especial de agradecê-las – espero não cometer a injustiça de não me lembrar de alguém.
Primeiramente, agradeço DEUS por ter me dado a oportunidade de estar neste mundo e podendo contribuir com outras pessoas nas mesmas condições que eu, todos em busca de um futuro profissional/acadêmico estável e criativo.
Mesmo tendo me pregado muitas peças, agradeço ao TEMPO, matéria-prima de tudo, por ter me dado um pouco de chance de concluir este mestrado, mesmo que em doses homeopáticas em um cotidiano tão complicado, onde 24 horas por dia representa cada vez menos tempo e os calendários se consomem em velocidade ímpar.
Agradeço meus familiares ESPECIAIS, pessoas que estiveram ao meu lado a me ajudar e apoiar nos momentos mais difíceis. Aos meus pais, Clea e Pedro, por acompanhar diariamente o meu processo de construção deste trabalho, bem como terem possibilitado a minha chegada até este momento de escrever estas palavras, num processo dos últimos 20 anos, longos ou curtos, depende do ponto de vista. Minha avó Zélia, que quase não tenho mais visitado, mesmo estando próxima.
Agradeço minha namorada Jackline, que com muito AMOR esteve comigo durante todo processo, praticamente sendo meu ponto de referência, enquanto estive lendo ou escrevendo nos momentos em que poderíamos ter curtido bons momentos juntos. Aguentou inclusive meu mau humor por diversas vezes, sem motivo praticamente.
Agradeço meu orientador, prof. Norval, pois NORTEOU as linhas gerais deste conteúdo que lhes apresento, mesmo com as dificuldades e indisponibilidades de ambos para encontros freqüentes. Minhas lembranças ainda aos professores que participaram da banca de qualificação, João Décio Passos, Regiane Miranda e Esmeralda Rizzo, realizada em Outubro de 2009.
Por fim, agradeço a mim mesmo, longe de ser egocêntrico, por ter tido força e ânimo de topar esta empreitada mesmo sob diversas dificuldades, enquanto muitas
pessoas me diziam “... não sei como você agüenta...” ou então “...não sei como tem
coragem de fazer isso tudo...”. Pois bem, tive coragem, enfrentei dignamente o desafio de frente e aqui estou. Seria desde já um vencedor? Creio que ainda não...
“O espetáculo é uma permanente Guerra do Ópio para confundir bem com mercadoria, satisfação com sobrevivência, regulando tudo segundo as suas próprias leis. Se o consumo da sobrevivência é algo que deve crescer sempre, é porque a privação nunca deve ser contida. E se ele não é contido, nem estancado, é porque não está para além da privação, é a própria privação enriquecida”.
RESUMO
Por meio de anúncios veiculados no mercado de luxo, o objetivo desta pesquisa é demonstrar como se estruturam os processos de compra vigentes no mercado de luxo, onde aquele que adquire o produto de grife é o mesmo indivíduo que é adquirido pela própria grife, existindo assim um processo de aquisição mútua entre as partes. A hipótese é a de que existem fatores implícitos nas ações de compra de luxo agindo sobre os consumidores, determinando-as implicitamente enquanto acreditam que são sujeitos de suas atitudes. Como metodologia, adotou-se a coleta de anúncios de produtos de luxo voltados a mercados bastante abastados, retirados de revistas com perfil de leitores da classe A, conforme o Critério Serasa Experian, instrumento nacional para determinação de classe social dos indivíduos a partir das condições de vida e possibilidades de ganhos. Tal análise é realizada principalmente a partir das visões da semiótica da cultura, antropologia e da teoria da imagem. Para o desenvolvimento do trabalho foi necessário proceder a um breve estudo, não apenas daquilo que se entende por mercado de luxo, mas também dos conteúdos referentes ao consumo como um fenômeno social e cultural, ambientes onde a aquisição por especialidade se insere. A base teórica para o desenvolvimento da pesquisa é oriunda de autores como Tomás Moulian, Gilles Lipovetsky, Jean Baudrilard, Zygmunt Bauman, além de Villém Flusser, Ivan Bystrina e Norval Baitello Jr. O corpus desta pesquisa é constituído basicamente por revistas consideradas de luxo brasileiras. Como recorte temático, há um foco especial nos anúncios relacionados a produtos de uso pessoal, não apenas pela importância das marcas e variedade de itens à disposição dos potenciais compradores, mas também pela própria abrangência deste mercado. Como hipóteses, no caso das aquisições de luxo, tem-se primeiramente que há implicitamente uma segunda forma de consumo, vinda da parte do produto para o comprador, que se denominou de consumo reverso. A segunda se prende ao fato de que, além de uma determinação do indivíduo, há um caráter de heterodeterminação no processo de compra baseado no outro, a partir de uma necessidade de favorável auto-afirmação social.
ABSTRACT
By means of ads run in the luxury market, this research aims to demonstrate how the procurement process in force in the luxury market is structured, where someone who purchases the designer product is the same person that is acquired by the brand itself, so there is an acquisition process between both parties. The hypothesis is that there are factors implicit in the actions of buying luxury acting on consumers, defining them implicitly while they believe that they are subjects of their own behaviors. The methodology adopted was to collect advertisements for luxury products aimed at the fairly affluent market, taken from magazines with a readership profile of class A, according to the Serasa Experian Criterion, the national method for measuring the social class of individuals based on the conditions of life and earning opportunities. Such an analysis is carried out mainly from the semiotic imagery of culture, anthropology and image theory. In order to develop the work it was necessary to complete a brief study, not just about what is meant by the luxury market, but also the claims related to consumption as a social and cultural phenomenon, environments where specialty acquisition belongs. The theoretical basis for the development of the research is from authors such as Tomás Moulian, Gilles Lipovetsky, Jean Baudrilard, Zygmunt Bauman, as well as Villém Flusser, Ivan Bystrina and Norval Baitello Jr. The body of this research is basically composed of Brazilian luxury magazines. As a thematic profile, there is a special focus on ads related to products for personal use, not just because of the importance of brands and the variety of items available to potential buyers, but also because of the scope of this market. As a hypothesis, in the case of luxury acquisitions, the first implication is that there is a second form of consumption coming from the product to the buyer, which is known as reverse consumption. The second relates to the fact that, in addition to the determination of the individual, there is a hetero-determination quality in the buying process based on the other, from a need for positive social self-assertion.
RESUMEN
A través de los anuncios en el mercado del lujo, la investigación pretende demostrar cómo estructurar el proceso de compras vigentes en el mercado de lujo, donde aquel que adquire el producto de grife es el mismo individuo que es adquerido por la propia marca, existiendo asi un proceso de compra mutua entre las partes. La hipótesis es que existen factores implícitos en las acciones de compra de lujo actuando sobre los consumidores, determinandolas implícitamente mientras creen que son sujetos de sus actitudes. Como metodologia, se adoptou la colecta de los anuncios de los productos del lujo destinados al mercado muy ricos, retirados de revistas con el perfil de los lectores de una clase A, según el criterio Serasa Experian, el instrumento nacional para la medición de la clase social de los individuos a partir de las condiciones de la vida y las oportunidades de ganancias. Tal análisis se realiza principalmente a partir de la visión de la semiótica de la cultura, la antropología y la teoría de la imagen. Para el desarrollo del trabajo fue necesario proceder a un breve estudio, no apenas lo que se entiende por el mercado de lujo, pero también de los contenidos referentes al consumo como un fenómeno social y cultural, ambiente donde la compra por especialidad si inserta. La base teórica para el desarrollo de la investigación son oriundos de autores como Tomás Moulian, Gilles Lipovetsky, Jean Baudrilard, Zygmunt Bauman, además de Villa Flusser, Iván Bystrina y Norval Baitello Jr. El corpus de esta investigación es constituido básicamente de las revistas consideradas de lujo brasileñas. Como recorte temático, hay um énfasis especial en los anuncios relacionados con productos para uso personal, no apenas por la importancia de las marcas y la variedad de ítens disponibles a los compradores potenciales, pero también por la propia abarcancia de este mercado. Como hipótesis, en el caso de las compras de lujo, tiene primeramente que hay implicitamente una segunda forma de consumo, venida de la parte del producto para el comprador, que se denominou el consumo inverso. El segundo se refiere al hecho de que, además de una determinación del individuo, hay um carácter de heterodeterminação en el proceso de compra basada en el otro, a partir de una necesidad de favorable auto-afirmación social.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Gráfico de porcentagem de cada classe social no Brasil pelo novo
critério Serasa Experian ... 25
Figura 2 – Principal local de comércio de luxo em São Paulo: Rua Oscar Freire ... 30
Figura 3 – Descrição de divisões de marcado (teoria) ... 38
Figura 4 – Estruturação do mercado de luxo por segmentos ... 39
Figura 5 – Pirâmide de Maslow ... 107
Figura 6 - O cérebro humano em funcionamento durante as compras ... 115
Figura 7 – Desigualdades sociais evidentes do Brasil: bairro do Morumbi e favela de Paraisópolis, São Paulo – SP... 134
Figura 8 – Anúncios de instituições de crédito na esquina da Av. Paulista com Consolação (antes de vigorar a lei Cidade Limpa) ... 141
Figura 9 – Shopping Cidade Jardim, São Paulo – SP ... 148
Figura 10 – Loja da Daslu no Shopping Cidade Jardim, em São Paulo – SP... 149
Figura 11 – Loja da Ferrari/Maserati em São Paulo. Venda de carros e souvenirs da marca ... 151
Figura 12 – Distribuição Geográfica de Shoppings Centers no Brasil por porcentagem ... 153
Figura 13 – Loja da KaDeWe, na Alemanha ... 153
Figura 14 – Loja Villa Daslu, em São Paulo – SP ... 154
Figura 15 – Interior da loja Villa Daslu, em São Paulo – SP ... 155
Figura 16 – Site da KaDeWe ... 157
Figura 17 – Site da Daslu ... 158
Figura 18 – Esquema de descrição do modo como se constrói o envolvimento dos consumidores ... 169
capa, dezembro 2007 ... 223
Figura 21 – (esquerda) Hans Baldung Grien, Adão e Eva, 1531. (direita) Anúncio Bulgari, Audi Magazine, pag. 15, dezembro 2004 ... 225
Figura 22 – (esquerda) Agnolo Bronzino. Lucrecia di Cosimo, 1555, Óleo sobre tela ... 226
Figura 23 – Anúncio Mont Blanc ... 230
Figura 24 – Esquema analítico da composição da imagem ... 232
Figura 25 – Anúncio relógios Longines... 238
Figura 26 – Esquema analítico da composição da imagem ... 242
Figura 27 – Anúncio Lilica Ripilica ... 245
Figura 28 – Esquema analítico da composição da imagem ... 248
Figura 29 – Anúncio Cartier ... 253
Figura 30 – Esquema analítico da composição da imagem ... 256
Figura 31– Anúncio Shopping Cidade Jardim ... 259
Figura 32 – Esquema analítico da composição da imagem ... 264
Figura 33 – Anúncio Ermenegildo Zegna ... 266
Figura 34 – Esquema analítico da composição da imagem ... 268
Figura 35 – Anúncio Iates Azimute ... 271
Figura 36 – Anúncio Lufthansa ... 275
LISTA DE TABELAS
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO... 14
Objetivo... 19
Metodologia... 20
1 UM BREVE INTRODUTÓRIO... 21
1.1 As classes sociais no Brasil e seu potencial de consumo... 21
1.1.1 A população dividida sob o novo critério Serasa Experian... 23
1.1.2 Foco no mercado de luxo... 25
1.2 São Paulo: a metrópole do luxo no Brasil... 27
1.2.1 Rua Oscar Freire, a rua do luxo na metrópole... 28
1.3 O saber consumir do luxo... 31
2 O MERCADO DE LUXO E SUAS NUANCES... 32
2.1 O que é luxo?... 32
2.1.1 Etimologias e significações do termo... 32
2.1.2 Sinestesias e simbologias ligadas ao luxo... 34
2.2 Preconceitos por trás do luxo... 36
2.3 O que se entende por mercado de luxo?... 38
2.3.1 Conceitos sobre mercado, segmento e nicho... 38
2.4 As peculiaridades do mercado de luxo... 40
2.5 Quais são os segmentos do mercado de luxo... 43
2.6 O que seria um objeto de luxo?... 46
2.7 Perfil do consumidor de luxo... 48
2.7.1 Estímulos e motivações para realizar compras de luxo... 52
2.7.2 Consumo, logo EXISTO!... 57
2.8 A história do luxo... 59
2.9 O luxo em um país em desenvolvimento... 63
2.9.1 O ambiente brasileiro... 63
2.9.2 Um breve comparativo: o luxo na Rússia... 66
2.10 A força das marcas... 69
2.10.1. Marcas e posicionamento de mercado... 69
2.10.2 Aspectos de marketing relacionados ao luxo... 75
2.10.3 As empresas do luxo: o lado corporativo do negócio... 80
2.11 O papel dos profissionais de luxo no mundo corporativo... 82
2.11.1 A importância dos recursos humanos... 83
2.12 O luxo em números... 84
2.13 O crescimento do luxo no Brasil... 87
2.14 O Preço do Luxo... 91
2.15 O luxo sustentável... 95
2.15.1 O luxo “verde” e o cenário sustentável... 95
2.16 A sociedade de consumo (de luxo)... 98
3 O CONSUMO ME CONSOME: UMA DISCUSSÃO SOBRE O CONSUMO E SUAS IMPLICAÇÕES SOBRE O LUXO E A SOCIEDADE... 100
3.1 O que é “consumir”?... 100
3.1.1 Etimologia do termo consumo... 100
3.1.2 O consumir como ação... 101
3.1.3 O consumo enraizado no meio social... 103
3.1.4 Consumindo de acordo com a escala de necessidades... 106
3.1.5 Necessidades versus Desejos... 110
3.2 As Ciências do consumo... 112
3.2.1 A fisiologia do consumo: a neuroeconomia... 113
3.2.1.1 O que é?... 113
3.2.1.2 Manifestações do consumo sobre o corpo humano... 114
3.2.1.2.1 Os neurônios-espelho em ação... 116
3.2.1.2.2 Os marcadores somáticos... 119
3.2.1.2.3 Implicações dos neurônios-espelho e marcadores somáticos no consumo de luxo... 120
3.2.1.3 O consumo de luxo como fator perpetuador da própria espécie... 122
3.3 Inversões e o caso Luciano Huck... 123
3.4 O consumo como tipo de desejo... 125
3.4.1 O mecanismo de funcionamento da insatisfação... 126
3.4.2 Moulian e a “sociedade do engano... 128
3.4.3 Aprendendo a consumir... 128
3.5 A construção hedonista do mundo... 130
3.6 Capitalismo e desperdício... 132
3.6.1 Os efeitos globais dos desperdícios de nosso tempo... 132
3.6.2 O ciclo de vida dos produtos... 135
3.7 A Fetichização do Dinheiro... 136
3.8 As Instituições de Facilitação do Consumo... 138
3.8.1 Para comprar, é preciso pagar... 142
3.9 Desvalorização do trabalho e sobrevalorização do consumo... 144
3.10 O Shopping e as catedrais do Consumo... 148
3.10.1 A KaDeWe... 153
3.10.2 A Daslu... 154
3.10.3 Semelhanças entre KaDeWe e Daslu... 156
3.10.3.1 As lojas KaDeWe e Daslu na Internet... 156
3.11 Identidade, Figuração e Consumo... 159
3.11.1 A falsificação dos artigos de luxo... 160
3.12 A paixão do consumo e a escravidão pelo consumo... 162
3.13 O consumo me consome: uma manifestação do consumo de luxo... 165
4. O CONTEXTO CULTURAL DO LUXO: O CONSUMO REVERSO E O SOCIOCONSUMO... 167
4.2 O consumo reverso e o luxo... 172
4.2.1 A primeira via do processo: consumidor-produto... 177
4.2.2 A segunda via do processo: produto – consumidor... 180
4.3 O luxo como manifestação cultural... 183
4.3.1 O que é cultura?... 185
4.3.2 Os rituais de consumo de luxo e a religião Versus consumo VIP... 187
4.3.2.1 Os rituais de consumo de luxo... 187
4.3.2.2 Fé Cristã contra a lógica da economia moderna... 190
4.4 O luxo como manifestação da soberba... 194
4.4.1 O socioconsumo... 197
4.4.2 A verticalização do luxo... 200
4.5 O luxo kitsch... 201
4.6 O tempo do luxo. Vencendo o efêmero... 203
4.6.1 O que é o tempo... 203
4.7 Comunicação simbólica entre humanos e o luxo... 206
4.8 Iconofagia, as devorações e antropofagia na comunicação... 208
4.8.1 As imagens no espaço e no tempo... 208
4.8.2 Imagens e espaços humanos... 209
4.8.3 Imagem e os corpos... 209
4.9 Para haver comunicação, é preciso haver vínculo... 210
4.10 O que as imagens querem?... 211
4.10.1 Imagens agem... 212
4.10.2 As devorações das imagens... 215
4.11 Devoramos as imagens ou somos devorados por elas... 218
4.12 Arte e luxo, uma construção da imagem percebida e sentida... 219
4.13 O luxo como forma de expressão da arte... 221
5 A COMUNICAÇÃO DE LUXO E SEUS ANÚNCIOS... 227
5.1 As mensagens por trás das imagens... 227
5.1.1 A mulher... 230
5.1.2 O homem... 238
5.1.3 A criança... 245
5.1.4 O objeto... 253
5.1.5 O lugar de se consumir... 259
5.1.6 O grupo... 266
5.2 Outros segmentos do luxo... 271
5.2.1 O ir e vir: transportes... 271
5.2.2 Serviços... 275
CONCLUSÃO... 280
BIBLIOGRAFIA... 283
INTRODUÇÃO
O luxo existe desde os primórdios da história humana em sociedades organizadas, em que objetos começaram a possuir gradativo valor superior ao de simples uso, mas seu comércio em termos de mercado organizado foi surgir muitos séculos depois, na Europa.
No Brasil, país economicamente considerado subdesenvolvido no cenário mundial, o mercado de luxo é uma realidade ainda emergente, porém não menos importante, num gradativo processo de crescimento e lucratividade por parte das empresas que operam no setor, das poucas fabricantes nacionais e das muitas importadoras e revendedoras. Por sinal, os mercados de países em desenvolvimento num cenário de crise, como a de 2008/2009 nos Estados Unidos, passaram à posição de opções interessantes como forma de compensar perdas nos mercados mais fortes, porém mais atingidos pela crise, fazendo com que tivessem seu valor reconhecido enquanto saiam da posição de meras coadjuvantes em termos de retorno comercial.
Ainda restrita a grandes metrópoles, em especial São Paulo e Rio de Janeiro, a realidade do comércio de luxo, mesmo em momentos de crise, é que ele tem se fortalecido junto ao público de classe A e B desde que as principais marcas começaram a entrar no país desde o final da década de 1970, com a maior abertura do mercado nacional e o interesse de uma classe rica em adquirir artigos de luxo no próprio Brasil, se desobrigando a comprá-los em escala limitada durante as viagens ao exterior.
Já se tem o costume de estudar o mercado de luxo e suas implicações sobre o consumo há muitos anos em diversos países da Europa e EUA, coisa que se iniciou no Brasil apenas há pouco tempo, com estudos promovidos principalmente nos campos da administração e do marketing. “Outros países já passaram pela fase de ostentação, enquanto o Brasil ainda está passando”, explica Kátia Faggiani; isto indica que o país ainda está de um modo geral num estágio inicial, de vislumbramento com o mercado de luxo a tal ponto da marca determinar a compra com mais freqüência que a própria comparação técnica dos itens, envolvendo maior racionalidade.
Por sinal, o que faz com que uma pessoa adquira um objeto por valor até 100 vezes superior, ou mais, ao semelhante de uso popular, caso de uma caneta, por exemplo? Ou um carro de valor superior a R$ 1,5 milhão? O luxo permite compras de valor superior até ao que muitas vezes nossa imaginação consegue atingir. Com certeza, já permitindo aqui uma prévia conclusão, existe um fator intangível que vai muito além do simples valor de uso, um elemento que agregue um valor superior ao dos itens empregados durante a fabricação, determinado muitas vezes pela própria marca. Sendo assim, fica a dúvida: será que realmente é o indivíduo que compra o artigo de luxo, ou será que ele é comprado pelo objeto? A esta dúvida se terá o maior prazer de esclarecer durante o desenvolvimento nas páginas desta pesquisa.
Assim, é importante entender o luxo como um todo, seja marca ou comunicação, pois dele bebem e se inspiram as marcas de uso popular, cujos contatos com os consumidores muitas vezes requerem o uso de uma comunicação que evidencie aspectos de compra irracionais, intangíveis e quantitativos para se diferir da concorrência, em ambientes cada vez mais competitivos, graças ao fortalecimento de relações comerciais globais, criando um vínculo muito mais forte do que necessariamente algo que venha a se diluir com especificações técnicas mirabolantes. O custo benefício de um produto muitas vezes não está presente, mas se constrói na imaginação do consumidor e nesse aspecto, nada como o luxo para trazer manuais de como fazer para se atingir estes objetivos específicos almejados.
Outro ponto importante e que será considerado nas próximas páginas é se as compras de luxo no caso permitem um deleite de quem compra por usar algo especial ou porque aquele item de valor desperta atenção e interesse das outras pessoas, mesmo que elas não possam comprar? Ou seriam as duas coisas. Esta é uma circunstância da qual analisaremos nas próximas páginas.
Por linhas gerais, o objetivo deste trabalho é mostrar por outro ponto de vista o mercado de luxo, analisando-o às luzes da semiótica da cultura e outras ciências que venham a agregar valor e sentido aos temas discorridos, bem como favorecer uma análise ao fim de anúncios veiculados em revistas voltadas ao público de classe A, relacionando-o com os processos de consumo de um mercado com uma lógica bastante peculiar, e por isso muito instigante.
Por consumo reverso, entende-se o modo como o mercado de luxo parte de uma forma de consumo tradicional consumidor-produto, clara e aberta a todos, para um estímulo implícito que se estrutura a partir da relação produto-consumidor, num processo igualmente de consumo, onde as pessoas são arrebatadas em busca de ideais que visam a agregar para si em prol da construção de uma imagem pessoal “artificial”, exógena, mediada pelo simbolismo dos produtos utilizados e de valor em relação ao grupo.
Este trabalho será subdividido sob diversos temas, ao longo de 5 capítulos, dos quais seguem a descrição mais abaixo. Deste modo, há uma organização do conteúdo de acordo com a ordem de importância, criando-se subsídio para que ao fim seja feita a análise de anúncios impressos veiculados em revistas voltadas à classe A.
No primeiro capítulo, se discorrerá a respeito de alguns parâmetros para o desenvolvimento do conteúdo do trabalho, como um entendimento a respeito de classes sociais no Brasil, onde o foco dos estudos se dará sobre a classe A, além de oferecer informações a respeito da praça onde se dará a pesquisa, no caso, a cidade de São Paulo.
O segundo capítulo seguirá observando os aspectos e peculiaridades do que é o mercado de luxo, suas características básicas e conceitos que o fazem um mercado especial e diferenciado em relação ao de outros produtos, tornando-o referência de qualidade e requinte junto a fabricantes de produtos considerados de “massa”, que visam agregar a seus produtos a mesma aura dos artigos de luxo, que por ventura garantem aos produtos qualidades intangíveis e menos baseados no custo-benefício.
O terceiro capítulo aborda a temática do consumo de luxo e suas características em relação aos outros mercados e comportamentos específicos dos consumidores.
O quinto capítulo irá alinhavar os aspectos considerados no conteúdo da pesquisa com anúncios veiculados em revistas voltadas ao mercado de luxo, de acordo com o modo como o anúncio se constrói.
Ao longo das páginas desta leitura, é importante se considerar a visão não de um adepto do mercado de luxo nem de um profundo apreciador dos itens oferecidos para o público de classe A, mas sim de um grande interessado no tema e pesquisador das características e qualidades que fazem deste mercado tão especial. Assim como Gilles Lipovetsky afirma, a importância do luxo não reside no tema em si, mas sim no modo como ele se constrói suas bases a fim de despertar o interesse das pessoas, fazendo com que ele saia cada vez mais do eixo dos temas academicamente menores para entrar no hall das atividades regulares de pesquisas referentes a perfis de mercado e categorização de consumidores, entre outros. De fato o luxo é um tema rico para ser trabalhado e vai muito além apenas do dispêndio de dinheiro a todo direito, demonstrando que em geral é a visão errônea das pessoas que prejudica que o tema se aprofunde mais.
A intenção desta pesquisa é gerar outra visão do mercado de luxo a partir de uma análise orientada pelas teorias do consumo e da semiótica da cultura, contribuindo com algo que vai muito além das lições da administração e do marketing, que por sinal são uma constante na maioria dos trabalhos sobre mercado de luxo, talvez por causa da realidade profissional e da formação central dos autores, que escrevem baseados em suas experiências principalmente.
OBJETIVO
O objetivo desta pesquisa é demonstrar, por meio de anúncios veiculados em
revistas voltadas ao mercado de luxo, como se estruturam os processos de compra
a partir da teoria do consumo reverso.
Além disso, há uma relação entre marcas de luxo e indivíduos que vão muito
além dos desejos pessoais, em que o consumir se torna uma expressão social de
fato, que se relaciona diretamente com uma segunda realidade construída por meio
da mídia (as semelhanças e contrariedades entre o eu real e o eu imaginário) e do
grupo em que se vive a que vem a se chamar socioconsumo.
A partir de uma visão ampla do mercado de luxo e da comunicação voltada a
este ambiente de consumo, se fará uma análise crítica que não visa criar uma
opinião condenatória ou que venha a adular este tipo de consumo seletivo, mas sim
entender melhor como a relação homem-produto se constrói e se perpetua, dentro
de uma convergência de situações dominadas por muitas marcas e desejada por
outras várias, visando distinguir os itens oferecidos como itens que excedem as
próprias qualidades e passam a carregar consigo qualidades intangíveis, agregáveis
METODOLOGIA
A base metodológica desta dissertação foi construída da seguinte forma
durante o processo de montagem deste trabalho:
- Montagem inicial de um roteiro de estudos com definição dos itens a serem
pesquisados de acordo com o tema escolhido.
- Pesquisa bibliográfica dentro dos elementos definidos pelo roteiro de
estudos, com coleta empírica de anúncios de produtos de luxo voltados a mercados
bastante abastados, retirados de revistas com perfil de leitores da classe A,
conforme o Critério Serasa Experian, instrumento nacional para determinação de
classe social dos indivíduos a partir das condições de vida e possibilidades de
ganhos.
- Seleção e posterior análise dos anúncios realizada principalmente a partir
das teorias visões da semiótica da cultura, antropologia do consumo e da teoria da
imagem.
- Desenvolvimento de idéias e conceitos a partir das leituras e constatações
obtidas durante a realização do trabalho.
- Organização e fichamento dos dados coletados e analisados dentro do
21
CAPÍTULO 1 – UM BREVE INTRODUTÓRIO
Para o bom desenvolvimento dos conteúdos deste trabalho, inicialmente é
interessante se promover uma base teórica que visa guarnecer os leitores de
algumas informações importantes no que tange não apenas números e dados
quantitativos a respeito do cenário do mercado de luxo, principalmente no mercado
nacional, mas também identificar elementos inerentes à praça de pesquisa e o
modo como o assunto pode ser adequadamente desenvolvido. Este é o intuito de
desenvolver este capítulo.
Espera-se que constem nas páginas deste capítulo conteúdos que sejam
pertinentes ao entendimento de muitas colocações e considerações expostas mais
adiante.
1.1 As classes sociais no Brasil e seu potencial de consumo
O Brasil, mesmo considerado um país em desenvolvimento, possui uma
constituição um tanto heterogênea em termos sócio-econômicos, com grandes
diferenças entre membros de classes sociais. Estas diferenças podem propriamente
se tornar verdadeiros abismos quando comparados o poder de consumo das
classes sociais mais ricas àquelas mais baixas. Independentemente de uma
condição de subdesenvolvimento, há no Brasil um extrato social muito pequeno apto
a adquirir itens de luxo, todavia é um grupo que consome bastante e que sustenta o
crescimento deste mercado nos últimos anos.
Esta diversidade econômica presente no Brasil, além de um tanto peculiar, traz a
tona um desafio: como identificar quando começa e onde termina uma classe
Num primeiro momento, para esta pesquisa, optou-se por definir a classe A
nacional tendo em vista os parâmetros do hoje muito utilizado Critério Brasil,
desenvolvido para mensurar a classe social a partir do cruzamento das informações
referentes a bens de consumo básicos adquiridos e infraestrutura habitacional, bem
como renda familiar total. Porém, obviamente, este critério, embora continuasse
relevante, trazia uma série de distorções e porque não dizer óbvias, que dificultavam
um uso mais aprofundado com base científica.
Pelo Critério Brasil, por exemplo, considerava-se de modo geral que integram o
topo da pirâmide brasileira pessoas com rendimento domiciliar (ou seja, da família
como um todo), acima de 20 salários mínimos (R$ 10,2 mil), tendo caracterizadas
como classe B o grupo com renda domiciliar entre 10 e 20 salários mínimos e C
entre 3 e 10 salários mínimos. A base de cálculo é o salário mínimo atual nacional,
estabelecido como R$ 510,00 (este valor independe dos pisos estabelecidos pelo
poder executivo de cada unidade da federação- estados – como teto).
Os principais problemas a respeito do Critério Brasil são que, a partir de um
levantamento se levando em conta o todo da população do país, as bases de
funcionamento passam a ser seriamente comprometidas graças ao já citado caráter
heterogêneo da população. Por exemplo, uma família que habita uma cidade com
custo de vida mais alto, como Brasília ou São Paulo, perde poder aquisitivo se
comparada a outras famílias residentes em cidades menores e com características
mais rurais. Outro problema é que só o salário de uma família não é o suficiente
para determinar se ela pode ou não pertencer a um grupo mais abastado, pois o
importante para tal avaliação não é o quanto se ganha como salário, mas na
verdade o modo como se gasta ou investe esse dinheiro; isto pode desse modo, vir
a ser analisado é que para o Critério Brasil não importam as especificações, mas o
fato de se possuir um aparelho ou equipamento em si. Se a TV que uma família tem
em casa for uma de 14 polegadas, velha, no final ela ganha o mesmo peso de uma
TV recém lançada de LCD com 60 polegadas e conversor integrado para sistema
digital. Com tantas distorções, obviamente se percebe que o próprio critério começa
a entrar em desuso por não permitir uma aferição mais precisa daquilo que se quer
analisar.
Assim sendo, quase como uma necessidade das empresas e dos profissionais
de pesquisa de mercado, a consultoria Serasa Experian desenvolveu um novo
critério, muito mais completo e adequado, agora respeitando os princípios
antropológicos e a diferenciação da população em termos econômicos.
Primeiramente, é necessário se entender como funciona o novo critério Serasa
Experian.
1.1.1 A população dividida sob o novo critério Serasa Experian
A população brasileira está dividida pelo novo critério em dez grupo sociais, de
acordo com os parâmetros estabelecidos pela consultoria Serasa Experian, um
opcional mais completo ao anterior, o Critério Brasil. Essas classes ao todo são:
- Classe A: ricos, sofisticados e influentes;
- Classe B: prósperos e moradores urbanos;
- Classe C: assalariados urbanos;
- Classe D: empreendedores e comerciantes;
- Classe E: aspirantes sociais;
- Classe F: periferia jovem;
29 - Classe H: aposentadoria tranqüila;
- Classe I: envelhecendo no interior;
- Classe J: Brasil Rural.
Esta divisão sob novas definições representa de forma mais fiel as
necessidades, os comportamentos e os desejos da população do que as
classificações por faixa de renda ou classe social, permitindo às empresas
repensarem seus produtos e serviços até mesmo criar soluções novas para o
público que estavam eventualmente encobertos e fora do sistema, por avaliações
menos criteriosas.
A população brasileira está distribuída conforme a nova classificação do
seguinte modo:
Tabela 1 – Classes sociais do Brasil pelo novo critério Serasa Experian
Classe Social Composição % na população brasileira
A Ricos, sofisticados e influentes 1,86%
B Prósperos moradores urbanos 5,26%
C Assalariados urbanos 8,93%
D Empreendedores e comerciantes 5,01%
E Aspirantes sociais 9,74%
F Periferia jovem 20,92%
G Envelhecendo na periferia 8,04%
H Aposentadoria tranqüila 14,99%
I Envelhecendo no interior 9,19%
J Brasil Rural 16,05%
Gráfico de porcentagem de cada classe social no Brasil pelo novo critério Serasa Experian
Fig. 1 SERASA EXPERIAN (2010)
Como padrão de referência nesta pesquisa, utilizou-se este método
desenvolvido pela Serasa Experian, opção que se justifica por garantir uma
diversificação maior das classes se comparado ao Critério Brasil, pois se adequa
em maior fidelidade com a realidade sócio-econômica e de consumo de cada
indivíduo. Não era possível precisar ao certo a diferenciação de classe social a partir
da renda familiar, já que o Brasil infelizmente é um país com muitas desigualdades,
bem como disparidades abissais em termos de custo de vida. Por este aspecto,
passa a ser importante não a renda, o quanto que uma família recebe, mas centra
as atenções no modo como se gasta ou investe este dinheiro.
1.1.2 Foco no mercado de luxo
Para este trabalho se optou como grupo de estudo os padrões e hábitos de
representa menos de 2% da população nacional, atendo-se ainda a uma classe
também importante que representa 5,86% da população, conhecida como prósperos
moradores urbanos – potenciais membros da classe A. Esta classe A, num universo
de 192,5 milhões de brasileiros (IBGE, 2010), corresponde a 3.580.500 pessoas.
Estima-se, porém, que realmente consumam bens de luxo apenas 0,27% da
população nacional (MCF Concultoria, 2009), ou seja, o equivalente a quase
520.000 pessoas, um extrato pequeno dentro da fração de pessoas que compõem a
classe A da população nacional.
Com o crescimento da economia brasileira na primeira década do século XXI,
mesmo com algumas tensas situações de crises internacionais de grande porte e
guerras, não apenas as classes mais necessitadas obtiveram uma melhora na
qualidade de vida. O rendimento médio da classe A é, em 2010, 48% superior ao
mesmo parâmetro de rendimentos apurados em 2002, sem que para isso houvesse
uma mudança expressiva para mais na participação da classe A na população
brasileira (Estado de S. Paulo, 2010). Ou seja, avalia-se tal informação como uma
constatação que a classe A manteve uma estabilidade de membros, porém está
mais bem remunerada, muito além da infração acumulada no período.
Ao todo, o Brasil passou a ter 303 mil novas famílias com padrão de vida
classe A de 2002 a 2009; desde 2006, o Brasil abriga mais de 1 milhão de famílias
na classe A. Para comparar, no mesmo período a classe B aumentou 1,146 de
famílias, enquanto a classe C aumentou 7,772 milhões. Apesar das diferenças entre
cada classe, o crescimento de renda não foi muito diferente entre as categorias:
dobrou na classe A, cresceu 116% na classe B e 142% na classe C (Estado de S.
Mesmo nesse grupo há muita disparidade de ganhos, abrangendo pessoas
com R$ 10 mil mensais de renda para gastar e outras com mais de R$ 50 mil para
suas necessidades de consumo.
Sendo um grupo tão seleto, requer não apenas produtos, mas também
atenções especiais antes, durante e depois da compra, necessitando de uma série
de aparatos diferentes para sua satisfação plena.
1.2 São Paulo: a metrópole do luxo no Brasil
No Brasil, São Paulo é a cidade líder em consumo de luxo, responsável por
75% das vendas neste mercado (MCF Consultoria, 2010). Logo atrás vem Rio de
Janeiro e Brasília (motivada principalmente pelas compras dos bem assalariados
servidores públicos da administração federal).
Porém, muito se iludem aqueles que acreditam que fazem compras de luxo
na cidade apenas moradores paulistanos; numa cidade que reúne pessoas de
praticamente todas as nacionalidades, mesmo que descendentes até 3ª geração,
habitantes de diversas cidades de todo país vem até a cidade para realizar seus
impulsos de compra, incluindo alguns estrangeiros, atraídos pela queda dos preços
que algumas coleções de produtos sofrem ao entrar no mercado nacional (a maioria
entra no país com um atraso em relação aos lançamentos nos principais mercados
de luxo, o que justifica tal queda nos preços). Assim sendo, a cidade de São Paulo
será o principal pólo de informações para o desenvolvimento desta pesquisa,
fornecendo algumas diretrizes importantes para o desenvolvimento e embasamento
deste trabalho, incluindo campo para algumas análises in loco.
Embora consuma mais, São Paulo ainda tem características de
nacional. O Rio de Janeiro tem mais personalidade para consumir luxo que busca e
consegue ter um estilo próprio, tem uma leitura diferente dos itens e marcas, com
certo despojamento. Há inclusive muitos cariocas que já aprenderam a substituir o
brilho ostensivo dar marcas por um jeans - milionário - da italiana Diesel,
reconhecido a quilômetros por quem gosta e entende do assunto. Em terceiro lugar
no ranking nacional está Brasília, com uma mentalidade mais antiga sobre mercado
de luxo, ainda apostando mais na ostentação do que na personalidade dos
produtos.
1.2.1 – Rua Oscar Freire, a rua do luxo na metrópole
A Rua Oscar Freire, localizada em uma área nobre e movimentada no centro
de São Paulo. Ela começa na Alameda Casa Branca (ao lado do parque Trianon) e
termina na movimentada Av. Dr. Arnaldo, alternando de sobradinhos antigos do
início do século XX aos comércios mais populares, passando obviamente pelo seu
trecho nobre – entre as ruas Melo Alves e Padre João Manuel, razão de ser deste
tópico, tudo em uma extensão de aproximadamente três quilômetros.
Com o declínio da Rua Augusta como uma das mais nobres da cidade, por
volta dos anos 1970, a Oscar Freire começou a oferecer próximo dali uma ótima
opção de entretenimento e compras. Freqüentada por políticos, nobres da região e
jovens new age, a rua passou a atrair lojas de luxo com o início da abertura das
importações no início da década de 1990, conforme projeto do então presidente
Fernando Collor de Melo. Por sinal, as lojas foram parar no local não apenas pelo
fluxo de pessoas endinheiradas circulando, mas porque o local era freqüentado pela
fechado entre consumidores e apreciadores de luxo e artigos nobres, geralmente
moradores dos bairros vizinhos do Jd. América e Jd. Paulista.
Hoje, a Rua Oscar Freire é famosa pela crítica de luxo internacional como
uma das 10 mais nobres do mundo, de acordo com a Mystery Shopping
International. Tanto renome permitiu com que os lojistas da região formassem uma
associação para defender melhorias e garantir a manutenção do status do local. No
caso, a Associação dos Lojistas da Rua Oscar Freire não abrange apenas
comerciantes da rua, mas de todo o entorno que abriga lojas de grifes e marcas
famosas. Atualmente ela conta com 120 estabelecimentos e 400 pontos comerciais.
Como principal conquista, a associação intermediou o processo junto ao poder
público de reformulação do local, alargando e reurbanizando as ruas,
transformando-as em bulevares ao estilo europeu, isso no ano de 2006, ao custo de
R$ 8,5 milhões.
Na própria Oscar Freire estão situadas lojas como Diesel, La Perla, Le Lis
Blanc, Tommy Hilfiger, Forum, Oskley, H. Stern e Ellus. Nas imediações
encontramos lojas de marcas como Christian Dior, Louis Vuitton, Salvatore
Ferragamo, Bulgari, Cartier, Giorgio Armani, Versace e de gastronomia, como o
restaurante Fasano.
No entanto, a própria Oscar Freire possui nuances muito claras de como luxo
e pobreza se misturam em questão de algumas quadras. Enquanto pessoas
compram jóias e desfilam em carros de primeira linha na área nobre, crianças de
rua e adolescentes usam drogas, sustentando os vícios com pequenos furtos nas
proximidades da estação Sumaré do metrô, em meio a comércios fechados e
mais próxima da Alameda Casa Branca de Oscar Fake (fake em inglês é o mesmo
que falso), por possuir lojas de grifes pequenas, algumas até próprias, e de menor
valor em termos de marca. Vale salientar que estes trechos menos nobres não
foram contemplados no projeto de revitalização local, ou seja, não foi uma coisa
pensada para beneficiar um todo, mas apenas um grupo freqüentador do local.
As diferenças por quem circula na rua são claras para os pedestres que por
ela passeiam. Aos que vem da Av. Rebouças, ao andar dois quarteirões, se tem um
verdadeiro choque. A sensação é de ter se teletransportado para outro país, numa
outra realidade. As pessoas mudam, as lojas mudam, a rua reurbanizada cria todo
um clima especial para gerar um ambiente especial. Até os carros estacionados e
circulando pelas ruas locais são diferentes, em sua maioria de marcas
reconhecidamente nobres e importados.
Principal local de comércio de luxo em São Paulo: Rua Oscar Freire
1.3 O saber consumir do luxo
Saber consumir bem e adequadamente é um dos princípios mais importantes
do mercado de luxo que, para produzir vendas, está muito além de se basear no
trinômio loja, preço e marca. Cabe a cada consumidor estabelecer para si não
apenas os itens, mas os valores que ele deseja agregar para si próprio ao comprar
seus produtos, pois em cima disso é que ele vai construir uma experiência
circunstancial do que é usá-los.
A nobreza do luxo se torna uma evidência para todos os que o tocam, pois
jamais se fica insensível à beleza do gesto de um artesão da arte. As pessoas se
arrumam, se enfeitam (perfumes, beleza, cuidados, alta-costura, prets-à-porter dos
costureiros, peleterias, joalheria, bagageria) e embelezam o ambiente em que vivem
- artes de decoração e artes de mesa cristaleria, porcelana, faiança, ourivesaria.
Assim sendo, há necessidade de se compreender a natureza e a hierarquia das
necessidades e desejos que se encaminham para essas indústrias, da composição
da escala das aquisições dos compradores e do papel simbólico atualmente
CAPÍTULO 2 - O MERCADO DE LUXO E SUAS NUANCES
Nem só de produtos sofisticados e muito dinheiro se faz um mercado como o
de luxo, onde por trás de cada compra, um conjunto de sentimentos e experiências
emerge a fim de que seus membros perpetuem parâmetros de gosto, satisfação e
requinte. Por isso, é de suma importância que se faça um entendimento amplo do
que é e como funciona a dinâmica do luxo e das marcas que o constituem.
Embora seja um pouco complexo de entendê-lo, principalmente por causa de
suas peculiaridades, o mercado de luxo é uma excelente forma de se buscar a
complexidade com o qual é possível gerar satisfação por meio de um processo de
compra simples. Num primeiro momento, para facilitar tal compreensão, é preciso
se desfazer uma série de mal entendidos e impressões errôneas que as pessoas
costumam ter em relação ao luxo:
2.1 O que é luxo?
2.1.1 Etimologias e significações do termo
Etimologicamente, luxo significava fascinação e brilho. Por meio de um
retorno às origens etimológicas do termo ou de uma busca na história do Ocidente,
pode-se pensar sobre o que o luxo significou e, ainda, significa às pessoas numa
sociedade em pleno século XXI. Alguns definiam o luxo como luz, aquilo que ilumina
ou traz brilho. Do latim luxus, ou luxu, que significa excesso em geral ou mesmo
indulgência dos sentidos, o verbete luxo também guarda a familiaridade com a
noção de luxúria: exuberância, profusão, vida voluptuosa. Etimologicamente, “luxo”
e “luz” têm a mesma origem, já que ambas vêm do latim “lux”, que significa “luz”. De
conceitos tais como brilho, esplendor, distinção perceptível ou resplandecente e
vigor (JOÃO BRAGA, 2004).
Definir o conceito do que é luxo é uma das dificuldades iniciais de estudar
este mercado. Segundo os dicionários mais recentes, encontramos a respeito deste
verbete:
1. Modo de vida caracterizado por grandes despesas supérfluas e pelo gosto da ostentação e do prazer; fausto, ostentação, magnificência;
2. Caráter do que é custoso e suntuoso;
3. Bem ou prazer custoso e supérfluo; superfluidade, luxaria;
4. Viço, vigor, esplendor”.
Buscar a etimologia mais adequada da palavra luxo a partir da definição de
seus significados no passado bem como nas interpretações relevantes a respeito do
que ele significa hoje e de seu destino no futuro é um exercício de extrema
complexidade para os teóricos da área, já que as possibilidades de análise são
múltiplas, bem como os pontos de vista a respeito. Neste sentido, é preciso
entender o luxo como um conceito heterogêneo, bastante dinâmico e de caráter um
tanto relativo. Em vez de se falar em luxo de modo singular, é necessário pensar em
luxos, com sentidos múltiplos, abrangendo uma série de aspectos relevantes.
Quando analisamos a definição dos dicionários, observamos que o termo
abrange uma dimensão muito concreta. Ainda segundo a observação de João
Braga (2004), existem muitos aspectos intocáveis ligados ao conceito, pois o luxo
“deixa de estar ligado a um objeto para se associar a um signo, a um código, a um
comportamento, à vaidade, ao conforto, a um estilo de vida, a valores éticos e
2.1.2 Sinestesias e simbologias ligadas ao luxo
O luxo é, no geral, uma grande construção cultural e política que define
claramente zonas de domínio humano específicas, de exclusividade e poder; se
pensarmos nestas implicações numa sociedade, o luxo seria a materialização do
que há de mais valioso e estimado dentro daquele grupo de membros, muitas vezes
um bem de gênero raro, diferente, inacessível ou impedido de ser apropriado ou
aproveitado pela maioria. Um deleite restrito a poucos.
Um artigo de luxo não precisa ser um bem tão raro em quantidade, mas deve
ser seletivo e proibitivo. Assim sendo, o caráter do luxo como exclusivo em si é
segundo Sérgio Lages Carvalho (2008), qualitativamente socializado dentro de um
pequeno e privilegiado grupo que goza de poderes ou privilégios mágicos,
carismáticos, políticos, religiosos ou econômicos. Isso pode ser facilmente
entendido a partir do fato de que, se um produto for amplamente acessível a todo
coletivo social de uma sociedade, ele perde o valor de exclusividade e importância a
partir do momento em que todos sabem que podem tê-lo facilmente. O que é
comum não chama tanta atenção nem desperta tanto interesse, já que se torna um
objetivo tangível e que não gera o mesmo fascínio e anseio. Aquilo que é fácil não
garante o mesmo prazer da conquista.
O valor do luxo está no campo dos sentidos atribuídos pelo próprio homem
por razões diversas junto ao mundo inanimado, significativamente diferenciado das
demais, onde o objeto se torna dotado de “poderes” que excedem sua própria forma
e conteúdo. O luxo é um atributo de caráter semi-simbólico, se situando na ordem
do prazer sensorial e estético, dos desejos, do fascínio e das emoções que são
capazes de causar nas pessoas. Luxo traduz uma espécie de somatório de
emoções e experimentações dotadas de sentido e significação pelos homens. É
uma criação humana e cultural, longe da ordem da natureza ou inscrita em algum
gene do DNA. Sua natureza se expressa e se define pela magia e sensualismo que
despertam sentimentos de paixão, apropriação e cobiça. É mais que signo de
exceção e raridade, poder ou status, pertença, diferenciação ou reconhecimento.
Dom, caráter especial ou conteúdo espiritual são qualidades individuais comuns,
diante das diversas que o luxo proporciona ao seu portador. As pessoas animam e
preenchem certas coisas elegidas, de um sentido único e imaterial, de onde afloram
sensações e sentimentos agradáveis, bem como os sentidos: a dimensão física,
psíquica e espiritual do homem.
O valor de um artigo de luxo é sentido não apenas nos estímulos fortes que
projeta na consciência e no desejo humano, mas no seu valor manifesto, nas
esferas da vida e da realidade econômica, social, política e cultural; sua posse
indica que o portador de um artigo do gênero é detentor de um poder mágico,
religioso ou político. A posse ou acesso aos bens ou privilégios do luxo ajudam a
dizer quem somos e quanto diferentes e únicas são nossas existências, mesmo que
não seja preciso dizer uma palavra sequer. Os indivíduos usufruem da aura e do
fascínio que está corporificado nos bens de exceção, pois simplesmente eles
projetam uma imagem de um eu grandioso, para não dizer satisfeito e feliz consigo
mesmo.
Sabe-se que o luxo não se revela e nem se manifesta pela razão, mas é
criado e percebido na pulsão e no desejo que provoca no coração e na mente dos
indivíduos pertencentes aos mais diversos grupos: emoções estas tão intensas que
ampliam os sentidos.
O prazer de possuir e usar um artigo de luxo reside principalmente na
sentido de cair bem no corpo ou numa situação de uso, e sim no de garantir
segurança para que trafeguemos de modo seguro em diversas esferas da vida
social, na maior parte dos grupos, ao passo que não nos desampara, aumentando o
ego enquanto nos insere num contexto que realmente nos faz acreditar que somos
especiais e diferentes, ou melhor, pessoas bem sucedidas, muito mais próximas da
auto-realização do que a maioria das pessoas de fato, mesmo que isto não
corresponda com a realidade vivida.
Não basta ser, mas é preciso parecer e principalmente se sentir rico. E o luxo
se traduz em todos os nossos sentidos: visão (design arrojado e artigos belíssimos),
audição (sonoridade ou o som de um automóvel potente acelerando), paladar (alta
gastronomia), olfato (perfumes diversos) e tato (tecidos finos e roupas de caimento
impecável). É preciso mexer com os sentidos para que se possa entender o que o
produto realmente representa ao indivíduo não apenas que usa, mas na
organização de todo grupo em que ele se insere, a permitir com que se crie uma
espécie de atalho para nosso inconsciente e manifeste nossos desejos e
satisfações mais íntimos, o que justificaria a cobrança de um valor maior no ato de
comercialização.
2.2 Preconceitos por trás do luxo
Embora possa não parecer, o ato de portar ou simplesmente possuir um
artigo de luxo pode suscitar uma série de preconceitos, não da posição do mais rico
para os menos abastados, mas simplesmente o contrário. Uma vez que o luxo
evidencia a pessoa, esta pode simplesmente ser excluída de alguns grupos por ser
pré-julgada como fútil, egocêntrica, vaidosa em excesso etc.. A partir do momento
ele está vulnerável às críticas de quem vê esta atitude como exagero, em que a
pessoa não tem qualidades por si só a oferecer. Isso em nada tem a ver com um
comportamento apoiado em soberba, mas exclusivamente um modo como se
constituiu uma inversão cultural sobre aquilo que o próprio luxo representa,
desfrutado por sinal por pessoas mais humildes.
O luxo se confunde constantemente com a idéia de uma existência vivida por
meio de grandes despesas, envolta em elegância e exagero, modo de vida rodeado
por objetos caros e sem necessidade, que nos dão prazer e são expressões de
vaidades pessoais para mera ostentação gratuita. Por base, pode-se entender que o
luxo ainda não foi “desculpabilizado”, pois, talvez, imerso numa sociedade
culturalmente desenvolvida sobre bases Cristãs, a transgressão e o prazer por meio
dos objetos, a partir de hábitos de consumo e ações simples, ainda não foi
conseguido em escala coletiva, até motivado pelo caráter heterogêneo e pelos
aspectos peculiarmente culturais das quais se constitui nossa população.
Geralmente, estando em uma posição de inferioridade numérica e, não por
isso, menos influente, adeptos do mercado de luxo são consideradas pessoas sem
solidariedade e egoístas, cujos pensamentos centrais são de acumulação em
caráter não coletivo, para se focar exclusivamente no próprio bem estar num caráter
restrito; isso não corresponde com a realidade, mas sim, com a formação e
educação dada durante o desenvolvimento de alguém como ser humano, e isso de
fato indifere da classe social e da conta bancária.
Há também, como já é de se esperar, uma pitada de inveja nesse composto,
alimentado pela idéia de inversão aqui comentada. Neste caso, o usuário de artigos
de luxo passa da posição de vítima de um sentimento alheio ruim para uma posição
de infrator, ao esbanjar prosperidade em locais muitas vezes imersos na pobreza.
Assim, o que passa a valer é o equilíbrio entre razão e emoção, pois qualquer
desvio sobre isso pode gerar uma situação de conflito.
2.3 O que se entende por mercado de luxo?
2.3.1 Conceitos sobre mercado, segmento e nicho
De modo geral, seguindo os conceitos trabalhados por referências na área de
marketing e administração, como Philip Kotler (2006), por mercado se entende o
ambiente de consumo onde se reúnem fornecedores e compradores com o objetivo
de realizarem trocas e transações capazes de satisfazer necessidades em comum.
Com a complexidade de itens oferecidos e a quantidade de ofertas disponíveis entre
uma imensidão de consumidores com necessidades diversas e poderes aquisitivos
diferenciados, foi necessário desmembrar o mercado comum para abranger apenas
itens específicos, como por exemplo, o mercado de arroz, de carros, de talheres etc.
Descrição de divisões de mercado (teoria)
Figura. 3 KOTLER (2006)
No entanto, mesmo os mercados mais simples passaram a oferecer produtos
preferências, com foco não na totalidade do mercado, mas de potenciais
interessados em determinados itens, o que originou a noção de segmento.
Por sinal, a idéia de segmento já não é mais suficiente para adequar
diferentes opções voltadas ao mesmo grupo de consumidores em especial, por
fornecedores cada vez mais competitivos, gerando a noção de nicho (que diversos
autores já se sentem a vontade de apontar mais subdivisões, sob denominações
diferentes).
É imprescindível por sinal entendermos a construção desse tipo de divisão
para que se possa entender as peculiaridades do mercado de luxo e porque ele é
considerado um caso a parte dentro destes conceitos apresentados acima.
Abaixo está demonstrada a maneira como se estruturam os conceitos
apresentados (a serem trabalhados mais detalhadamente no item 2.4):
Estruturação do mercado de luxo por segmentos
2.4 As peculiaridades do mercado de luxo
O mercado de luxo já traz suas peculiaridades e curiosidades logo na
definição do termo. A princípio, se compõe por uma somatória de segmentos de
especialidade de diversos mercados diferentes, compondo um conjunto de opções
voltadas a um público extremamente seleto e com grande potencial de consumo de
itens superiores. Por exemplo, existem opções de luxo para imóveis, serviços,
alimentos, itens de uso pessoal etc.. Mesmo com fornecedores produzindo produtos
em larga escala para atender classes mais baixas, a custos menores, sempre há
espaço para atender algum consumidor que quer algo a mais do que o trivial,
requerendo um esforço maior dos produtores e comerciantes em troca de valores na
negociação final superiores.
O mercado de luxo, por ser um segmento um tanto complexo e diversificado,
exige diversas adaptações constantemente, para que assim haja uma possível
prosperidade nesse ramo um tanto peculiar, porém muito concorrido entre si, já que
o núcleo de consumidores potenciais costuma ser o mesmo para todos, enquanto
que os artigos adquiridos tendem a possuir uma vida útil maior e em bom estado de
uso. Ou seja, o luxo está sempre se reconfigurando e se reinventando, num
processo totalmente contínuo.
Porém, qual a lógica de oferecer um produto a valor muito superior aos
concorrentes comuns, demandando atenção e custos de produção maiores,
matérias-primas diferenciadas e por fim uma demanda inferior? Em linhas gerais,
poderia se falar nenhuma, mas os fabricantes e comerciantes de artigos de luxo
operam com um plano de ações diferenciado, sempre com novidades para oferecer
unitários superiores que não os levem a depender de vendas massivas, fidelização
de clientes pela marca, etc.
A evolução da grande tendência do segmento é vista tanto por Jorge Forbes,
psicanalista, como pelo pensador Gilles Lipovetsky como algo bem além do sentido
de acumulação exibicionista dos objetos caros. “... o que vemos hoje é atração pelo
luxo dos sentidos, do prazer e da sensibilidade sentido na intimidade por cada
indivíduo e não o luxo exterior, da exibição e da opulência, que visa simplesmente
demonstrar status” (LIPOVETSKY, 2004). O luxo ganha sua face mais atual de
experiência, emocional e sensual. Isso significa uma mudança de sua expressão e
não uma elitização do luxo, da ostentação, voltada principalmente ao prazer
individual de se sentir diferente e para admiração de um terceiro. É a mudança da
tendência de um luxo exibitório para o lado intimista, mais pessoal. Isso também se
intensifica com a desigualdade entre pessoas causadas pela democratização das
sociedades. O luxo passa a ser mais centrado nas sensações (prazer e
sensualidade) e menos na aparência. Apesar desta nova tendência um tanto
intimista, vale ressaltar que a presença do Outro na motivação de compra e nas
sensações inerentes ao uso continua presente, pois é disto que de certa maneira o
luxo se mantém e se edifica.
Analisando em contexto geral, podemos afirmar que uma característica da
espécie humana é o desejo pelo luxo. Jorge Forbes (2003) em uma de suas
palestras afirma: “... o luxo pode ser definido como algo além da necessidade, mas
que não é por isso menos fundamental”. O desejo pelo luxo traduz inspirações
profundamente humanas, tais como: elegância, sensualidade, prazer, qualidade, um
tipo ideal, de beleza. Como explica Lipovetsky (2005), “... não se pode deter o
existam indivíduos que não têm acesso ao elementar. Isso sim é inaceitável!”. Os
seres humanos sentem necessidades diversas, não só ao nível de subsistência ou
de sua sobrevivência, mas também muito mais sofisticadas: de prestígio, de
imagem social, de posse, de prazer.
Podemos dizer que a compra e consumo de produtos é o resultado da imagem
social de uma pessoa. O mesmo fenômeno ocorre com seu auto-conceito (como a
pessoa se percebe e pensa a respeito de si própria): as impressões do tipo de
pessoa que se é depende, parcialmente, daquilo que se possui em termos materiais
e financeiros (de fato isto ocorre). O auto-conceito se refere a uma conjunção
composta de diversos atributos, dos quais podemos destacar:
A auto-estima, que se refere a quão positivo é o auto-conceito da pessoa. A
aceitação social está relacionada com esse nível de positividade que pode
ser influenciado por esforços de comunicação de marketing, na medida em
que estes instigam um processo de comparação social;
O Eu real e o Eu ideal: o Eu ideal seria aquele que almejaríamos ser, é
parcialmente moldado por elementos da cultura do próprio indivíduo,
correlacionados com modelos de beleza ou sucesso. Podemos comprar
produtos que sejam coerentes com os objetivos, ou que nos ajudem a atingir
os mesmos;
A fantasia (ou sonho): para escapar de problemas reais ou uma falta de
estímulos externos, muitos consumidores buscam a “fantasia”;
A expressão das necessidades é o que chamamos de desejo e, sem ele,
estas não podem ser satisfeitas. Isso fica claro na frase de Alleres, 2000: “Se
subjetivas, mais instáveis, mais irracionais, os desejos dependem do domínio
do irracional, do sonho e das fantasias. Desse modo, se as necessidades
objetivas têm um limite, o campo dos desejos é ilimitado”. Os bens ligados ao
lazer, ostentação, prazer, apresentação pessoal, decoração e conforto, não
se traduzem apenas em necessidade, mas sim em sonhos, fantasias,
desejos... Podemos chamar de entidades necessárias à passagem para a
ação de consumir (sendo uma real e outra imaginária) e dos símbolos, a
necessidade e o desejo. Conclui-se que: “... o objetivo de uma sociedade de
consumo muito desenvolvida é permitir que todos os desejos, fantasias,
projetos, paixões e exigências se materializem em signos, logomarcas,
códigos, símbolos, chegando à escolha e aquisição de objetos”. (ALLERES,
2000)
2.5 Quais são os segmentos do mercado de luxo
É relativamente fácil montar uma lista de produtos e serviços que, na nossa
percepção, fazem parte do universo de luxo. Porém como agrupá-los em segmentos
específicos visando organizá-los a partir de semelhanças em termos de uso? Nesse
caso, autores como Castaréde (1992) e Allérès (1999-2000), em seus estudos sobre
o universo do luxo, nos permite chegar a uma subdivisão adequada e que atenda ao
critério de segmentação de mercado. Sendo assim, podemos incluir no “universo do
luxo” os seguintes sub-setores:
Serviços: hotéis, restaurantes, spas, vôos de primeira classe, etc.;
Objetos de decoração equipamentos domésticos em geral: cristais,