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Afiliação(ões): [1] - Universidade Federal do Paraná, Faculdade de Medicina - Curitiba - Paraná - Brasil

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Academic year: 2022

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Número do manuscrito 520

Artigo Original

Interconsultas em reumatologia pediátrica:

casuística de hospital terciário no Sul do Brasil.

Pediatric rheumatology interconsultation: sample of a tertiary hospital in southern Brazil.

Ricardo Gullit Ribeiro

(Autor de Correspondência)

E-mail: ricardogullit@hotmail.com / E-mail alternativo: ricardogullit1@gmail.com

Afiliação(ões): [1] - Universidade Federal do Paraná, Faculdade de Medicina - Curitiba - Paraná - Brasil

Márcia Bandeira

E-mail: reumapedi@gmail.com

Afiliação(ões): [2] - Universidade Federal do Paraná, Departamento de Pediatria - Curitiba - Paraná - Brasil

Total: 2 Autores

RESUMO

Objetivo: Descrever o perfil clínico-epidemiológico de pacientes pediátricos atendidos via interconsultas em ambulatório de reumatologia pediátrica (RP).

Métodos: Estudo transversal e observacional que analisou os prontuários dos pacientes atendidos na forma de interconsultas em um ambulatório de RP de um hospital terciário durante 14 meses. Dados epidemiológicos, de história clínica e exames laboratoriais foram coletados e estatísticas descritivas foram realizadas.

Resultados: Foram incluídos 37 pacientes, 27 (73%) do sexo feminino e 10 (27%) do sexo masculino, com idade mediana de 12,4 anos (mín:1,3 máx:15,9). Já tendo realizado diversos exames complementares, os pacientes foram encaminhados por 13 especialidades diferentes, tendo predomínio da dermatologia pediátrica. Na primeira consulta com reumatologista pediátrico, as principais queixas foram artralgia (51,3%), manchas cutâneas (32,4%) e rash cutâneo (29,7%). O período compreendido entre o início dos sintomas e a consulta variou entre 16 e 4554 dias, com mediana de 730 dias. 20 (54,1%) pacientes tiveram como desfecho a exclusão de uma doença reumatologica, três (8,1%) perderam seguimento e 14 (37,8%) foram diagnosticados com doenças reumatológicas, sendo as mais comuns esclerodermia linear (28,6%), lúpus eritematoso sistêmica juvenil (28,6%), artrite idiopática juvenil (14,3%) e dermatomiosite juvenil (14,3%).

Conclusões: As principais queixas dos pacientes referenciados à RP foram artralgia e lesões cutâneas, com um longo período de evolução dos sintomas, além de ampla faixa etária e papel preponderante das pacientes do sexo feminino. Além disso, nota-se que previamente a avaliação do reumatologista pediátrico os pacientes consultaram várias especialidades e foram expostos a diversos exames complementares.

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DESCRITORES: Reumatologia. Pediatria. Encaminhamento e Consulta. Reumatologia pediátrica

ABSTRACT

Objective: To describe the clinico-epidemiological profile of pediatric patients seen via inter-consultation in a pediatric rheumatology (PR) outpatient clinic.

Methods: Cross-sectional and observational study that analyzed the medical records of patients seen in the form of inter-consultations in a PR outpatient clinic of a tertiary hospital for 14 months. Epidemiological, clinical history and laboratory tests data were collected and descriptive statistics were performed.

Results: 37 patients were included, 27 (73%) female and 10 (27%) male, with a median age of 12.4 years (min: 1.3 max: 15.9). Having performed several complementary exams, patients were referred by 13 different specialties, with a predominance of pediatric dermatology. In the first consultation with a pediatric rheumatologist, the main complaints were arthralgia (51.3%), skin blemishes (32.4%) and skin rash (29.7%). The period between the onset of symptoms and the consultation ranged between 16 and 4554 days, with a median of 730 days. Twenty (54.1%) patients had the exclusion of a rheumatological disease, three (8.1%) lost follow-up and 14 (37.8%) were diagnosed with rheumatological diseases, the most common being linear scleroderma (28, 6%), juvenile systemic lupus erythematosus (28.6%), juvenile idiopathic arthritis (14.3%) and juvenile dermatomyositis (14.3%).

Conclusions: The main complaints of patients referred to RP were arthralgia and skin lesions, with a long period of symptom evolution, in addition to a wide age range and the predominant role of female patients. In addition, it is noted that previously the evaluation of the pediatric rheumatologist, patients consulted several specialties and were exposed to several complementary exams.

HEADINGS: Pediatrics. Rheumatology. Referral and Consultation. paediatric rheumatology

Fonte de financiamento: Não Conflito de interesses: Não É Ensaio Clínico? Não

Data de Submissão: Saturday, December 5, 2020 Decisão final: Wednesday, December 16, 2020

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INTRODUÇÃO

A reumatologia pediátrica (RP) é a especialidade médica que trata de um conjunto amplo e heterogêneo de doenças autoimunes e auto inflamatórias em crianças e adolescentes. Além de dolorosas e limitantes, estas podem ocasionar restrições físicas permanentes, redução da qualidade de vida, participação em atividades sociais e inserção no mercado de trabalho, além de elevados custos aos sistemas de saúde e até mesmo óbito.(1,2)

No entanto, a RP conta com apenas 171 profissionais certificados com área de atuação em reumatologia pediátrica de acordo com a Sociedade Brasileira de Pediatria, sagrando-se como uma das menores e mais recentes subespecialidades pediátricas, sendo desconhecida por parte dos médicos e sociedade.(3,4) Neste contexto, estudos epidemiológicos sobre doenças reumatológicas na infância e adolescência são escassos, contemplam poucos pacientes e apresentam baixa validade externa. Isto caracteriza um problema, uma vez que estes estudos são fundamentais para alertar os profissionais de saúde para diagnósticos precoces, fornecer substrato para o estudo de fatores raciais, genéticos e demográficos associados, revelar alvos para tratamentos e o curso natural das doenças, assim como apontar necessidades aos gestores de saúde.(5)

Ao encontro disso, o objetivo deste trabalho, realizado através da análise de prontuários médicos, é descrever o perfil clínico-epidemiológico dos pacientes atendidos durante 14 meses, na forma de interconsultas, em um ambulatório de reumatologia pediátrica de um hospital terciário no sul do Brasil.

MÉTODOS

O estudo foi realizado em um hospital terciário universitário, localizado no sul do Brasil, que atua como referência regional para diversas especialidades.

Em maio de 2018, foi inaugurado neste hospital um ambulatório de reumatologia pediátrica com o objetivo de atender crianças e adolescentes com demandas desta área através de interconsultas para outras especialidades pediátricas da instituição. O atendido é realizado exclusivamente via interconsultas neste ambulatório devido às características de contrato entre o hospital e seus contratantes.

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Com um delineamento transversal, observacional e individuado, o estudo foi realizado através da análise retrospectiva dos prontuários médicos dos pacientes atendidos neste ambulatório entre maio de 2018 e junho de 2019. As informações foram coletadas por único pesquisador entre abril e agosto de 2019 e agregadas em planilha eletrônicas Microsoft Excel.

Os prontuários foram acessados no serviço de arquivo médico do hospital e dados de identificação, história clínica e exames complementares foram coletados. Os dados obtidos enquadravam-se no período de tempo compreendido entre a entrada do paciente no serviço de saúde e o estabelecimento de um desfecho definido no ambulatório de RP. Definiu-se desfecho definido como a evolução no prontuário do paciente de um diagnóstico de doença reumatológica ou alta ambulatorial.

Considerou-se doenças reumatológicas as condições clínicas que são usualmente manejadas por médico reumatologista pediátrico, sendo os pacientes classificados de acordo com os critérios diagnósticos internacionais das principais doenças reumatológicas na infância e adolescência. Para os exames laboratoriais, foram considerados como provas de atividade inflamatória os exames velocidade de hemossedimentação e proteína C reativa, como exame do sistema imune a dosagem de complemento sérico e dosagem de imunoglobulinas séricas e como dosagem de auto anticorpos a dosagem de fator antinuclear, fator anti citoplasma de neutrófilos, anticorpos antifosfolipídeos, anticorpos anti-aminoacil-RNAt sintetase, anticorpo anticetrômero e anticorpo anti-Scl-70. Para as lesões cutâneas, utilizamos o conceito de mancha para alterações na coloração da pele, sem alterações de relevo associadas. Por outro lado, rash cutâneo foi considerado como uma lesão de pele composta por eritema, associado a pápula ou pústulas.

Estatísticas descritivas foram realizadas utilizando o software estatístico R (R Core Team, 2019) versão 3.6.1, de forma que os resultados de variáveis quantitativas foram descritos por médias, desvios padrões, medianas, valores mínimos e máximos. Para variáveis categóricas foram apresentadas frequências e percentuais. O estudo foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa em seres humanos da instituição.

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RESULTADOS

Foram estudados os prontuários de 37 pacientes, 27 (73%) do sexo feminino e 10 (27%) do sexo masculino, sendo a mediana da idade na entrada do ambulatório de RP de 12,4 anos (mín:1,3 máx:15,9). Do total, 15 pacientes (40,5%) eram da capital do estado, 10 (27,1%) da região metropolitana e 12 (32,4%) de cidades do interior.

Diversas especialidades foram as responsáveis pelos pedidos de consulta para a reumatologia pediátrica, sendo a dermatologia pediátrica predominante, perfazendo 35,1% dos casos. A tabela 1 expõe o percentual de cada especialidade dentre os PC recebidos pelo ambulatório de reumatologia pediátrica no período estudado. O período compreendido entre o início dos sintomas e consulta com a especialidade variou entre 16 e 4554 dias, tendo como tempo mediano 730 dias.

Tabela 1 - FREQUÊNCIA DE ENCAMINHAMENTOS POR ESPECIALIDADE NO AMBULATÓRIO DE RP.

Especialidade

Frequência absoluta

Frequência relativa (%)

Dermatologia pediátrica 13 35,1

Cancerologia pediátrica 5 13,5

Alergologia pediátrica 4 10,8

Nefrologia pediátrica 3 8,1

Infectologia pediátrica 3 8,1

Pediatria geral 2 5,4

Departamento de emergência 2 5,4

Unidade de terapia intensiva

pediátrica 1 2,7

Reumatologia 1 2,7

Pneumologia pediátrica 1 2,7

Neurologia pediátrica 1 2,7

Endocrinologia pediátrica 1 2,7

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A maioria dos pacientes apresentavam exames complementares prévios a avaliação reumatologica: 31 (83,8%) haviam realizado um hemograma, 30 (81,1%) provas de atividade inflamatória, 20 (54%) exame do sistema imune e 13 (35,1%) dosagem de autoanticorpos. Além disso, 15 (40,5%) deles haviam realizado uma ultrassonografia, 12 (32,43%) uma radiografia, nove (24,3%) uma tomografia computadorizada e cinco (13,5%) uma ressonância magnética.

Diversas queixas clínicas foram relatadas durante a interconsulta com médico reumatologista pediátrico. As mais comuns foram artralgia e lesões de pele, estando os principais sintomas referidos apresentados na tabela 2.

Tabela 2 - QUEIXAS DOS PACIENTES NA ENTRADA DO AMBULATÓRIO DE RP

Queixa

Frequência absoluta

Frequência relativa (%)

Artralgia 19 51,3

Mancha cutânea 12 32,4

Rash cutâneo 11 29,7

Dor musculoesquelética 10 27

Febre 8 21,6

Úlceras orais 6 16,2

Alopecia 5 13,5

Dor abdominal 3 8,1

Alterações oculares 2 5,4

Cefaleia 2 5,4

Perda de peso 1 2,7

Dentre os 19 pacientes com artralgia, os membros inferiores foram os responsáveis pela maior parte dos casos, com 12 (63,1%) pacientes referindo dor em joelho e sete (36,8%) em tornozelo. Além disso, os membros superiores também foram acometidos, com seis (31,6%) pacientes com dor em mãos e três (15,8%) em cotovelo.

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Após avaliação clínica, a investigação laboratorial no ambulatório de RP foi realizada com hemograma em 20 (54%) pacientes, provas de atividade inflamatória em 31 (83,8%), dosagem de auto anticorpos em 27 (73%) e exame do sistema imune em 19 (51,3%). O fator anti nuclear (FAN) foi solicitado para 22 (59,4%) pacientes e mostrou-se reagente em 10 (45,4%), com títulos variando entre 1/80 e 1/640. Dentre os exames de imagem, dois (5,4%) pacientes realizam ressonância magnética, dois (5,4%) ultrassonografia e um (2,7%) radiografia.

Passada a primeira consulta, três pacientes perderam seguimento ambulatorial, de forma que apenas 34 tiveram um desfecho definido. Desses, 14 (41,2%) foram diagnosticados com doenças reumatológicas e 20 (58,8%) tiveram uma condição não reumatológica como desfecho no ambulatório. Dentre os últimos, 15 (75%) tiveram como desfecho a exclusão de uma reumatológica.

A tabela 3 ilustra os desfechos dos pacientes no ambulatório.

Tabela 3 - DESFECHOS NO AMBULATÓRIO DE RP

Desfecho

Frequência absoluta

Frequência relativa (%)

CONDIÇÕES REUMATOLÓGICAS

Esclerodermia linear 4 28,6

Lúpus eritematoso sistêmica juvenil 4 28,6

Artrite idiopática juvenil 2 14,3

Dermatomiosite juvenil 2 14,3

Fibromialgia juvenil 1 7,1

Artrite reativa 1 7,1

CONDIÇÕES NÃO REUMATOLÓGICAS

Descartada doença reumatológica 15 75

Alteração mecânica 3 15

Dor em membro inespecífica 2 10

FONTE: O autor (2019)

Com a definição do desfecho no ambulatório de RP, diversas condutas foram adotas. Dentre os 34 pacientes que mantiveram seguimento ambulatorial, 20 (58,8%) receberam a prescrição de um tratamento farmacológico. Destes, as drogas antirreumáticas modificadoras de doença (DMARD), indicadas para sete

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(35%) pacientes, foram as mais utilizadas. As DMARD empregadas foram Metotrexato e Hidroxicloroquina. Além delas, anti-inflamatórios não esteroidais foram prescritos para quatro (20%) pacientes, drogas imunossupressoras para três (15%), antidepressivo tricíclico para um (5%) e anti agregante plaquetário para um (5%). Somado a isto, quatro (20%) pacientes receberam como prescrição a suplementação de vitamina D. As drogas imunossupressoras utilizadas foram Micofenolato de mofetila, Tacrolimus e Ciclofosfamida.

DISCUSSÃO

Em um cenário nacional de escassos estudos epidemiológicos em reumatologia pediátrica, este trabalho demonstra as características clínicas e epidemiológicas dos pacientes atendidos na forma de interconsultas em um hospital terciário do sul do Brasil, contribuindo para a elucidação das principais características dos pacientes atendidos pela especialidade em nosso meio.

Em nosso estudo, a grande maioria dos pacientes foi do sexo feminino, perfazendo 73% dos atendimentos. Esse resultado pode ser parcialmente explicado pelo fato das condições mais diagnosticadas no ambulatório serem mais prevalentes no sexo feminino.(6,7) Na literatura, dados sobre predominância de sexos são variáveis, tendo casuísticas demonstrando predominância do sexo feminino, masculino e igualdade entre os sexos, sendo a preponderância determinada principalmente pela prevalência das diferentes doenças nas regiões.(8,9)

Nas doenças autoimunes iniciadas na infância, o viés sexual é geralmente menos evidente do que nos adultos, provavelmente devido aos diferentes níveis hormonais, sendo os estrogênios fortemente envolvidos no desenvolvimento da autoimunidade.(10) Ainda assim, algumas condições reumáticas, como a artrite idiopática juvenil (AIJ), mostram uma forte predileção por meninas, e diferenças podem existir entre homens e mulheres quanto ao resultado da doença. Por exemplo, a uveíte anterior crônica associada à AIJ afeta mais comumente meninas, mas os meninos tendem a ter um curso mais grave.(11)

Como as doenças reumatológicas na infância e adolescência constituem um grupo heterogêneo de mais de 150 condições clínicas, pacientes de

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diferentes idades são atendidos pelo reumatologista pediátrico. A variação de 1,3 até 15,9 anos encontrada em nosso estudo, com mediana de 12,4 anos, é consistente com o demonstrado nos continentes africano, asiático, europeu e norte americano.(9,12–14)

Da mesma forma, na literatura é muito variável o tempo transcorrido entre o início dos sintomas e consulta com médico reumatologista pediátrico. Dados norte-americanos demonstram um intervalo médio de 12,6 ± 20,3 meses, indo ao encontro do demonstrada na Nigéria, com um intervalo médio de 18,4 ± 9 meses. (13,15) No Iêmen o tempo mediano registrado de 12 meses (min: 0,13 máx: 98,4), enquanto em nosso estudo esse tempo foi de 24,3 meses (min: 0,5 máx: 151,8).(16)

Uma das possíveis explicações para este achado é a impossibilidade de encaminhamento dos pacientes à RP que existia antes da abertura do ambulatório estudado, fazendo com que estes, mesmo com sintomas sugestivos de doenças reumatológicas, ficassem represados na especialidade de origem.

Além disso, nos estudos supracitados os pacientes eram encaminhados diretamente da atenção primária para o centro de referência em RP, dinâmica diferente da ocorrida em nosso hospital, no qual os atendimentos ocorriam na forma de interconsultas em um hospital terciário. Essa dinâmica fazia com que o reumatologista pediátrico fosse, no mínimo, o terceiro médico a avaliar o paciente, podendo ser este outro fator que contribuiu para um maior intervalo entre início dos sintomas e consulta com o especialista.

Em nosso estudo, em consonância com o demonstrado na literatura, 13 especialidades distintas foram as responsáveis pelos encaminhamentos. Além disso, a dermatologia pediátrica foi a especialidade autora da maioria dos referenciamentos.

Este achado pode ser um reflexo da grande interrelação entre reumatologia e dermatologia, que compartilham o manejo de diversas doenças.(17) Ao encontro disso, discute-se na literatura a criação de clínicas compartilhadas entre as especialidades, visando diminuir o número de consultas médicas as quais os pacientes são submetidos e uniformizar a prescrição de tratamentos.(18,19) Frente aos nossos resultados, trabalhos que avaliem a

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eficácia destas clínicas compartilhadas em nosso meio podem ser úteis, uma vez que a maioria dos pacientes de nossa casuística se deslocavam grandes distâncias até o centro médico.

O caráter multissistêmico das doenças reumatológicas também pode ser observado analisando as principais queixas dos pacientes na entrada do ambulatório de RP. Em nosso estudo, que teve como principais diagnósticos lúpus eritematoso sistêmica juvenil (LESJ) e esclerodermia linear, os principais sintomas referidos pelos pacientes foram artralgia e lesões cutâneas. Já no estudo conduzido por Karadag e colaboradores na Turquia, que teve como principal diagnóstico as síndromes auto inflamatórias humanas, os principais sintomas descritos foram artralgia e febre recorrente associada a dor abdominal.(20) Da mesma forma, em um estudo realizado no Iêmen por Haifa Dahman os principais sintomas relatados foram artralgia, edema articular e febre, em um cenário onde as doenças mais comuns foram AIJ e LESJ.(16) Tais dados sugerem que os sintomas mais referidos pelos pacientes em serviços de reumatologia pediátrica tem relação com as doenças mais incidentes na região, mas que a artralgia tem sempre papel importante nas casuísticas.

Sendo as doenças reumatológicas na infância e adolescência condições raras, mas que fazem diagnóstico diferencial com condições clínicas comuns, o estabelecimento de critérios de encaminhamento ao reumatologista pediátrico é uma tarefa complexa. Isto pode explicar parcialmente as altas taxas relatadas na literatura de condições não reumatológicas referenciadas à especialidade. Em nosso estudo, apenas 41,2% dos encaminhamentos tiveram como desfecho uma condição reumatológica, valor comparável aos 40,5% relatados nos EUA, 31,6% no Canadá, 40% na Nigéria, 52,3% na Turquia e 51,2% em Israel. (15,20) Outro fator que pode contribuir para estes dados é o baixo conhecimento dos médicos no tocante a avaliação do sistema musculoesquelético, fazendo com que condições benignas e autolimitadas, que deveriam ser manejadas em um primeiro atendimento clínico, sejam encaminhadas para avaliação pelo especialista.(21)

A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), através de uma adaptação de critérios elaborados pelo Colégio Americano de Reumatologia em 1997, sugere que um paciente seja encaminhado para reumatologia pediátrica quando possuir

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febre prolongada de origem indeterminada, perda de função no aparelho ósteo- articular, dor ou edema articular sem causa aparente, alteração de testes laboratoriais reumatológicos e suspeita de doença autoimune, além de avaliação diagnóstica e seguimento em longo prazo de crianças e adolescentes com suspeita diagnóstica ou diagnóstico definitivo de doenças reumatológicas.(22)

Todos os pacientes avaliados em nosso estudo enquadravam-se nos critérios sugeridos pela SBP. No entanto, 32,4% dos pacientes referiam na primeira consulta manchas na pele e 29,7% rash cutâneo. Essas manifestações, apesar de comuns e com grande evidência na literatura, não se encontram nos critérios de encaminhamento postulados pela SBP.(23) Dessa forma, revela-se a necessidade de estudos epidemiológicos nacionais visando fortalecer os achados do presente estudo, fornecendo substrato para possíveis atualizações dos critérios de encaminhamento, tornando-os mais adequados ao nosso meio.

Sabe-se que as doenças reumatológicas tem incidência variada nas diferentes partes do globo, com interferência de diversos fatores, como econômicos, demográficos e étnicos.(24) No único estudo brasileiro com a incidência destas condições em pediatria, Maria Terreri e colaboradores demonstraram que a AIJ, púrpura de Henoch-Schönlein e LESJ foram, em ordem, as doenças com maior incidência no estado de São Paulo em 2010, indo ao encontro do relatado na literatura mundial.(25,26) Em nosso estudo, o baixo número de pacientes com doenças reumatológicas limita a comparabilidade dos achados. Porém, nota-se papel importante da esclerodermia linear, que é relatada com baixa frequência nas casuísticas mundiais. Essa condição é referida em 8,1% dos pacientes no Iêmen, 6,5% em Singapura, 1,7% na Índia e 0,9% na Tailândia.(8,9,16,27) Uma das hipóteses para explicar a incidência de 28,6% em nosso estudo é o alto número de pacientes que foram referenciados pela dermatologia pediátrica, uma vez que as manifestações cutâneas são predominantes nessa doença.(28)

Além disso, nenhum paciente foi diagnosticado com púrpura de Henoch- Schönlein, que foi a doença reumatológica mais frequente no trabalho conduzido por Tan e colaboradores em Singapura e que ocupa papel importante nos centros de referência em reumatologia pediátrica no mundo.(23,27) Uma provável razão para isso é o caráter autolimitado das principais manifestações

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desta vasculite, que tendem a desaparecer em poucas semanas.(29) Como a maioria dos pacientes apresentaram um tempo entre o início dos sintomas e consulta com reumatologista pediátrico de dezenas de meses, mesmo que o diagnóstico inicial fosse de púrpura de Henoch-Schönlein, na entrada do ambulatório sinais e sintomas desta condição já teriam desaparecido.

Em conclusão, as características demográficas dos pacientes atendidos no ambulatório estudado foram similares a outras casuísticas mundiais.

Entretanto, a incidência das doenças relatadas diferiu do demonstrado na literatura, assim como o tempo transcorrido entre o início dos sintomas e consulta com médico reumatologista pediátrico. Estes dados possivelmente estão relacionados à dinâmica de interconsultas na qual os pacientes de nosso estudo foram atendidos.

Uma das limitações do trabalho é a coleta de dados de forma retrospectiva através de prontuários médicos, limitando a avaliação do caso ao evoluído no prontuário pelo médico assistente, o que pode omitir características importantes.

Outra limitação é a dinâmica de atendimento dos pacientes sob a forma de interconsultas, uma vez que isto torna a análise dependente das características das outras especialidades do hospital.

Nesse sentido, estudos epidemiológicos nacionais que avaliem pacientes encaminhados diretamente da rede de atenção à saúde para o reumatologista pediátrico mostram-se úteis para contribuir com o entendimento da epidemiologia das doenças reumatológicas na infância e adolescência. Como as doenças em questão são raras, sugere-se a realização de estudos multicêntricos nacionais para aumentar a validade externa dos achados.

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Anexos

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Referências

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