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ESCOLA DE COMANDO E ESTADO-MAIOR DO EXÉRCITO ESCOLA MARECHAL CASTELLO BRANCO FERNANDO BOTAFOGO DE OLIVEIRA

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ESCOLA MARECHAL CASTELLO BRANCO

FERNANDO BOTAFOGO DE OLIVEIRA

TRANSFORMAÇÕES PARALELAS:

Um estudo comparativo entre os processos de transformação dos exércitos russo e brasileiro (2008-2018)

Rio de Janeiro 2019

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FERNANDO BOTAFOGO DE OLIVEIRA

TRANSFORMAÇÕES PARALELAS:

um estudo comparativo entre os processos de transformação dos exércitos russo e brasileiro

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Militares do Instituto Meira Mattos da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, como requisito para a obtenção do título de Mestre em Ciências Militares.

Rio de Janeiro 2019

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O48c Oliveira, Fernando Botafogo de

Conjuntura geopolítica e transformações paralelas: um estudo comparativo entre os processos de transformação dos exércitos russo e brasileiro (2008-2018) / Fernando Botafogo de Oliveira . 一2019.

199 fl. : il ; 30 cm.

Orientação: Hélio Caetano Farias

Dissertação (Mestrado em Ciências Militares)Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, Rio de Janeiro, 2019.

Bibliografia: fl 186-199.

1. BRASIL. 2. RÚSSIA. 3. GEOPOLÍTICA. 4. POLÍTICA DE DEFESA . 5. TRANSFORMAÇÃO MILITAR I. Título.

CDD 320.12

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AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer à Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, ao Instituto Meira Mattos, e ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Militares pela oportunidade ímpar de realizar meu mestrado em uma instituição de renome para o Brasil.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior pela bolsa de estudos que me apoiou durante a minha estada na cidade do Rio de Janeiro.

Ao meu orientador, Prof. Dr. Hélio Caetano Farias, que - com suas sugestões, ponderações, críticas e esforços - tornou essa dissertação possível de ser executada como foi.

Não obstante, minha família também merece meus agradecimentos por ter me apoiado de todas as maneiras possíveis.

Ao Maurício da Cunha Albuquerque, hoje doutorando em História, pela parceria em Pelotas e pelo trabalho que produzimos durante a minha graduação.

A Msa. Olya Dankova da Universidade de Kiev pelas aulas de Russo e traduções que foram importantes na realização deste trabalho, da mesma forma ao Ten. Cel.

Croce por ter me fornecido a tradução da Doutrina Militar Russa de 2014 entre outros documentos.

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RESUMO

Após a Guerra da Geórgia, em agosto de 2008, a Rússia anunciava um Programa de Rearmamento Estatal, que estabelecia a intenção de transformar o seu Exército.

Não era algo novo, já que, desde os tempos da antiga União Soviética, existia tal proposição por parte do Kremlin. A Guerra da Geórgia demonstrou aos oficiais do Exército Russo a necessidade de rever a estrutura de força, a doutrina militar e o material bélico de sua força. Nesse contexto, foram reaproveitados conceitos estratégicos e operacionais provindos do passado, além da revisão das percepções de ameaça que a Rússia tinha no sistema internacional. Na anexação da Crimeia, em 2014, pôde-se verificar os resultados dessa transformação anunciada em 2008.

A Rússia utilizou métodos não convencionais de guerra para conseguir a posse desse território, consolidando a sua transformação militar mediante o uso da força.

Semelhantemente, em 2008, o Brasil anunciava a sua Estratégia Nacional de Defesa por via do decreto 6703, que serve como orientação para capacitar as Forças Armadas Brasileiras. Esse documento estabelece justamente diretrizes para transformação do Exército Brasileiro e também informa as percepções de ameaça que o Brasil tem. Após a sua publicação, uma série de outros documentos que versam sobre a transformação do Exército Brasileiro é produzida para direcionar um processo de transformação militar no Brasil, o que inclui a criação de capacidades militares diferentes daquelas que existiam anteriormente. Visto desse ângulo, tanto Brasil quanto Rússia começaram, no mesmo período de tempo, um processo de transformação militar, entretanto ambos os países têm uma postura diferente no sistema internacional, no qual a Rússia faz uso da força, e o Brasil não. Tendo isso em vista, este trabalho procura encontrar nexos comparativos entre dois países que se comportam de maneira diferente, possuem recursos financeiros diferentes para seus processos, no entanto encontraram um caminho semelhante para realizar uma transformação em seus Exércitos. Assim, os objetivos dessa dissertação, são os de identificar estímulos que contribuíram para o Brasil e a Rússia realizarem este movimento, seus resultados e quais foram os fatores que influenciaram na mudança das percepções de ameaça dos respectivos países.

Palavras-chave: Brasil. Rússia. Geopolítica. Política de Defesa. Transformação Militar.

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ABSTRACT

After the Georgian War in August 2008, Russia had announced a State Rearmament Program which stablished an intention to transform its Army. This very intention was not something never seen before, since the Kremlin had been discussing since USSR times this idea. The Georgian War, a conflict that was the main reason to commence a transformation process, demonstrated to Russian Army officers a need to review its force structure, military doctrine, and the military equipment. Within this context, strategical and operational concepts from the past were reutilized, and the threat perceptions Russia were also changed. In 2014, once Crimea had been annexed, effects of this transformation were felt when Russia had used non- conventional war methods to claim possession over this territory, thus consolidating its transformation by use of force. Similarly, in 2008, Brazil had announced its National Defense Strategy through the decree 6703, a document responsible for orientating and capacitating Brazilian Armed Forces. The document proposes a Brazilian Army transformation and informs the Brazilian threat perceptions. After being published, a series of other documents regarding Brazilian army transformation were produced priming to direct a military transformation in the Brazilian Army, what also includes capacity creation different from those before. Both Brazil and Russia had started a military transformation process in the same time period, although both countries adopt different postures in the international, whereas Russia makes use of force, Brazil does not. Henceforth, this thesis primes to find comparative nexus between two countries that behave differently, have different financial resources for its processes, but found a similar path to transform its armies. Finally, the objectives are to identify stimuli that contributed to Brazil and Russia take this decision, as well as the results, and what were the factors to influence the threat perception change.

Keywords: Brazil. Russia. Geopolitics. Defense Politics. Transformation.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 A Rússia e suas regiões administrativas ... 42 Figura 2 A Pivot Area de Mackinder. ... 47 Figura 3 A Comunidade dos Estados Independentes em relação às suas

fronteiras com a Rússia ... 55 Figura 4 O Mapa Político do Brasil ... 61 Figura 5 Regiões do Brasil segundo Golbery do Couto e Silva (1967) e

suas relações com o processo de integração nacional. ... 71 Figura 6 Os Comando Militares de Área do Exército Brasileiro ... 73 Figura 7 Mapa do Posicionamento geográfico da Geórgia e suas fronteiras

em relação aos seus vizinhos na região transcaucásia. ... 77 Figura 8 A versão modernizada do T-72 em parceria com a Elbit Systems. ... 86 Figura 9 A versão modernizada do Carro de Combate T-90, chamada T-90

C ... 87 Figura 10 A Estrutura Organizacional do Presidente da Rússia e do Exército

Russo ... 91 Figura 11 As ideias de Comando e Controle antes e depois das Reformas

de 2008. ... 94 Figura 12 Os Distritos Militares da Rússia após a sua diminuição... 105 Figura 13 O entorno estratégico russo em relação às regiões que o

compõem. ... 109 Figura 14 As Bases Legais que se imbricam até atingirem a Doutrina Militar

de Defesa segundo Manual de Fundamentos: Doutrina Militar

Terrestre... 133 Figura 15 A FNC é a Força Naval Componente e a FAC é a Força Aérea

Componente. ... 176

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 Rússia: gastos militares por % do PIB e em valores absolutos a

dólares constantes* (1994-2018) ... 43 Gráfico 2 Brasil: gastos militares por % do PIB e em valores absolutos a

dólares constantes* (1994-2018) ... 62

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LISTA DE ABREVIATURAS

CDSA Conselho de Defesa Sul Americano CEI Comunidade dos Estados Independentes CSN Conceito de Segurança Nacional

C2 Command and Control

C4ISR Command, Control, Communications, Computers, Intelligence, Surveillance, Reconnaissance

EB Exército Brasileiro

END Estratégia Nacional de Defesa EUA Estados Unidos da América FAR Forças Armadas da Rússia

FARC Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia FPI Fond Perspektivnykh Issledovaniy

FR Federação Russa

FTC Força Tarefa Componente

GLONASS Глобальная навигационная спутниковая система GPV Gosudartsvennaia programma vooruzheniia

ICBM Intercontinental Ballistic Missile IM Instituição Militar

MERCOSUL Mercado Comum do Sul

OTAN Organização do Tratado do Atlântico Norte PIB Produto Interno Bruto

PND Política Nacional de Defesa

PROFORÇA Projeto de Força do Exército Brasileiro RMA Revolution in Military Affairs

RMTC Revolução Militar Técnico-Científica UNASUL União das Nações Sul Americanas

URSS União das Repúblicas Socialistas Soviéticas VANTs Veículos Aéreos Não-Tripulados

VPK Voyenno-promyshlennaya komissya pri Pravitel’stye Rossiyskoi Federatssi

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 12

REFERENCIAL TEÓRICO ... 16

REFERENCIAL METODOLÓGICO ... 23

UMA APROXIMAÇÃO COM O MÉTODO HISTÓRICO-COMPARATIVO: ABORDAGENS, CONCEITOS E FUNDAMENTOS ... 25

MARCO TEMPORAL ... 29

APRESENTAÇÃO DOS CAPÍTULOS ... 32

1 REFORMAS EM CONTEXTO: A GEOPOLÍTICA DO PÓS-GUERRA FRIA E SUA RELAÇÃO COM OS EXÉRCITOS RUSSO E BRASILEIRO... 33

1.1 Introdução ... 33

1.2 O Sistema Internacional Do Pós-Guerra Fria... 34

1.2.1 A Persistência do Território como Instrumento de Poder ... 39

1.3 Características Geopolíticas da Rússia após a Queda da URSS ... 41

1.4 A Rússia e a Geopolítica do Sistema Internacional do Pós-Guerra Fria ... 44

1.5 As Reformas Militares Russas no Contexto Do Pós-Guerra Fria Até 1993 ... 50

1.5.1 Prioridades Regionais, Preocupações Antigas: As Relações entre a CEI e as Reformas Militares na Rússia Pós-Guerra Fria ... 54

1.5.2 Consolidando Novos Paradigmas: O Conceito Nacional de Segurança e a Doutrina Militar de 2000 da Federação Russa ... 58

1.6 Características Geopolíticas do Brasil no Pós-Guerra Fria ... 60

1.7 Território, Geopolítica e Brasil: A Questão da Posição Territorial Brasileira No Sistema Internacional Pós-Guerra Fria ... 63

1.7.1 A Geopolítica Do Território Brasileiro e suas Implicações para os Fins de seu Exército ... 71

2 AS REFORMAS MILITARES APÓS A CAMPANHA DA GEÓRGIA EM 2008 E SUAS CONSEQUÊNCIAS PARA O EXÉRCITO RUSSO... 75

2.1 A Guerra da Geórgia, suas Causas e Interesses Russos na Região ... 75

2.2 As Necessidades de Transformação Identificadas após o Conflito ... 78

2.3 Aquisição e Desenvolvimento de Novas Tecnologias Militares ... 81

2.3.1 Aquisição e Desenvolvimento de Novas Tecnologias Militares após a Guerra da Geórgia no Exército da Federação Russa ... 84

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2.3.2 A Expansão do Conceito de C2 e suas Tecnologias ... 92 2.4 A Prontidão de Combate das Brigadas e sua Relação com a Doutrina Militar Russa de 2014... 99 2.4.1 A Diminuição da Estrutura Organizacional de Pessoal Militar na Transformação do Exército Russo em 2008 ... 104 2.4.2 A Doutrina Militar Russa De 2014, suas Percepções de Ameaça e sua Relação com O Processo de Transformação do Exército Russo... 107 3 O PROCESSO DE TRANSFORMAÇÃO DO EXÉRCITO BRASILEIRO:

CAUSAS, DEFINIÇÕES, E PERCEPÇÕES DE AMEAÇA... 112 3.1 Transformação Militar: Definições e Fundamentos ... 113 3.1.1 Elementos Transformadores: Razões que Permeiam um Processo De Transformação Militar ... 114 3.2 Causa e Consequência: Os Motivos que Levaram o Brasil a Optar por uma Transformação de seu Exército ... 119 3.2.1 Pontos de Contato entre o Processo de Transforrmação do Exercito Brasileiro e os Documentos de Defesa Nacional ... 122 3.2.1.1 A Discussão como Capacidade para O Exército Brasileiro ... 123 3.2.1.1.1 A Estratégia Nacional de Defesa e O Processo de Transformação do Exército Brasileiro: Proximidades para o Futuro da Força Terrestre ... 127 3.3 Fatores Doutrinários Abordados no Processo de Transformação do Exército Brasileiro ... 129 4 OS NEXOS COMPARATIVOS ENTRE OS PROCESSOS DE TRANSFORMAÇÃO RUSSO E BRASILEIRO ... 135 4.1 Issersson e Svechin: suas Contribuições e Esforços para o Pensamento Militar Russo-Soviético ... 136 4.1.1 Isserson e suas Contribuições para O Pensamento Operacional Russo ... 141 4.1.1.1 Isserson e as Operações Em Profundidade: O Conceito e sua Repercussão ... 144 4.2 Doutrina ... 147 4.2.1 A Doutrina Militar Da Federação Russa Em 2014 ... 147 4.2.2 Os Fatores Doutrinários no Processo de Transformação do Exército Brasileiro e seus Paralelos com a Doutrina Militar da Federação Russa de 2014 .. 150 4.2.2.1 EB20-MF-10.102 Manual De Fundamentos: Doutrina Militar Terrestre ... 153 4.2.2.2 MD-33-M-12 Operações Interagências ... 155

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4.2.2.3 MD-30-M-01 Doutrina De Operações Conjuntas ... 156

4.3 Percepções de Ameaça ... 159

4.3.1 A Noção de uma Potência Extra Regional como uma Ameaça: Consequências para a Soberania e o Entorno Estratégico Regional de Brasil e Rússia ... 160

4.3.1.1 A Potência Extra Regional como uma Ameaça para a Soberania Russa na Ótica da Doutrina Militar de 2014 ... 161

4.3.1.2 A Potência Extra Regional como uma Ameaça para a Soberania Brasileira na Ótica dos Documentos de Defesa Nacional ... 164

4.3.1.2.1 Concepção de Transformação Do Exército ... 165

4.3.1.2.2 EB20-MF-10.102 Manual De Fundamentos: Doutrina Militar Terrestre ... 167

4.3.1.2.3 MD30-M-01 Doutrina De Operações Conjuntas ... 168

4.4 Estrutura De Força ... 169

4.4.1 A Mudança no Nível de Emprego do Exército Russo após O Processo de Transformação de 2008 ... 170

4.4.2 Concepção de Transformação do Exército ... 173

4.4.3 Bases Para a Transformação da Doutrina Militar Terrestre ... 174

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS... 178

REFERÊNCIAS ... 186

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INTRODUÇÃO

A invasão russa da Crimeia, em 2014, trouxe uma crescente atenção para as Forças Armadas Russas (FAR). Esse interesse foi ainda mais reforçado pelo envolvimento russo, a partir de 2015, com a Guerra na Síria e o combate ao Estado Islâmico em apoio ao aliado sírio. Antes desses acontecimentos, as potências militares ocidentais, como os Estados Unidos e Reino Unido, percebiam o desempenho das FAR por meios uma visão alicerçada nos resultados obtidos pela Rússia durante a Primeira e a Segunda Guerra da Chechênia (1994-1996/1999- 2009) (BBC, 2000).

Já na Primeira Guerra da Chechênia, a cidade de Grozny havia sido bombardeada sem a distinção de alvos civis e militares1, e, durante a Segunda Guerra na Chechênia, a Anistia Internacional, em seu relatório anual de 2001, indicou que as FAR frequentemente bombardeavam áreas e pessoal civil de maneira indiscriminada (AMNESTY INTERNATIONAL, 2001). Assim, a visão que potências militares ocidentais tinham das FAR era a de um aparato bélico que usava seu poderio de maneira a não distinguir os alvos civis dos alvos militares, fazendo uso de suas forças de maneira desproporcional aos adversários que combatiam.

Além de ter herdado um arsenal de material bélico, de grandes proporções, da União Soviética - boa parte desse arsenal ainda necessitava de modernizações tecnológicas. Essa necessidade existia porque uma parte substancial do arsenal russo estava desatualizado em relação às novas tecnologias militares desenvolvidas após a queda da URSS, como munições de precisão guiadas por satélite.

No tocante à parte doutrinária do Exército, os conceitos estratégicos, operacionais e táticos permaneciam os mesmos da antiga URSS, porém com modificações que correspondiam à complicada situação econômica que a Rússia passava logo após a queda da URSS (RENZ, 2018).

Tanto a desatualização doutrinária e tecnológica do material bélico russo quanto a indistinção de alvos civis e militares contribuíram ativamente para que os resultados vistos nas duas Guerras da Chechênia se concretizassem, e as FAR

1 Durante a primeira invasão russa da Chechênia, as ruas de Grozny, capital da região sob domínio russo, foram tomadas por cenas de bombardeio a alvos civis fazendo com que até mesmo o Palácio Presidencial da Chechênia fosse bombardeado pelas ações russas. Essas cenas se repetiriam durante a Segunda Guerra da Chechênia, em igual intensidade. Ver mais em: http://news.bbc.co.uk/2/hi/europe/482323.stm. Acesso em: 30 out. 2018.

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fossem vistas pelas potências militares ocidentais como forças que serviriam essencialmente para garantir a defesa do território russo.

Após a execução do pacote de transformações militares, aprovado em 2008, o que antes era um Exército - com material bélico que necessitava de modernizações, e operavam por conceitos de Guerra Convencional2 em situações de Guerra Irregular3 - agora era um Exército que limitava à aplicação de sua força utilizando-se de conceitos de guerra não-convencional e de sofisticadas tecnologias de comunicação e automação (RENZ, 2018).

Ao fim desse processo de transformação militar, houve pesquisas de institutos, como RAND Corporation e Royal United Services para desenvolver estudos sobre como a máquina militar soviética havia se tornado um refinado aparelho bélico que atingia, com mínimas baixas, os objetivos políticos de Moscou.

Destacam-se como principais esforços desses institutos as seguintes publicações: Russia’s New Ground Forces: Capabilities, Limitations and Implications for International Security (2017), Modern Political Warfare (2018), da RAND Corporation.

O processo de transformação responsável por permitir esse desempenho teve seu início no ano de 2008, após a Guerra da Geórgia. Esse conflito permitiu à Rússia identificar necessidades de modernização nos seus sistemas de Comando e Controle, Navegação e Localização (MCDERMOTT, 2014). A transformação das FAR é um assunto debatido na Rússia desde o início dos anos 90 por acadêmicos, políticos e membros do Ministério da Defesa, época em que a deterioração das FAR teve o seu início (RENZ, 2018).

Essa deterioração foi uma consequência da queda da URSS e atingiu seu ápice em 2000, quando, conforme Bettina Renz (2018), analistas militares russos afirmaram que tal processo atingira um ponto irreversível devido às dificuldades econômicas de recuperar o material bélico desatualizado.

2 Entenderemos Guerras em Larga Escala e Guerra Regular utilizando uma conceituação clausewitziana da Guerra. Para Clausewitz (1986), a Guerra Regular é definida como uma forma de fazer política por meios do uso da força, que, por sua vez, significa utilizar as Forças Armadas de um Estado para que este atinja seus objetivos políticos. Logo, uma Guerra de Larga Escala é uma Guerra cujos participantes utilizam plenamente os seus recursos militares de maneira interina.

3 Alessandro Visacro (2016) define Guerra Irregular ou não-convencional como uma forma de beligerância que está além dos meios militares convencionais, isto é, as Forças Armadas, e utilizam-se de tropas nativas, forças de guerrilhas, subversão, sabotagem e até mesmo do terrorismo.

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A transformação do Exército Russo, a partir de 2008, também não foi um resultado de um processo isolado, nem mesmo uma consequência de um só movimento russo. Tratou-se de um reposicionamento no sistema internacional4 que a Rússia pretendia realizar para que seu Exército tivesse a oportunidade de tornar-se apto para uma ordem internacional diferente daquela da Guerra Fria (FIORI;

ERICKSON, 2014).

Isso também significa que a própria visão geopolítica existente durante a URSS fora aproveitada, e esta visão definia a URSS como um país cercado pela OTAN que necessita manter seu status quo regional por intermédio do uso da força (ERICKSON, 2014).

Ao herdar os conceitos de Segurança que eram utilizados durante a Guerra Fria, a Rússia mantém a visão de que existe uma disputa de poder em relação ao seu entorno estratégico regional, onde as potências do sistema internacional5, nomeadamente os EUA, procuram conter ou cercear sua expansão por meio da presença no Leste Europeu (FIORI, 2014).

Nesta mesma linha, o mesmo pode ser dito sobre os conceitos doutrinários de Guerra Regular e Guerra Não-Convencional. De maneira geral, esses conceitos, mesmo após o processo de transformação iniciado em 2008, assinalam para antigas práticas de Guerra Política, maximizadas durante a Guerra Fria (SINCLAIR, 2016).

Tais práticas remetem à utilização de subversão, inteligência, operações de desinformação e outros conceitos comuns à Guerra Política6.

4 Inspirado em Fiori (2014), entende-se, nesta dissertação, que a diferença entre Sistema e Ordem Internacional está no fato de que o primeiro é um conjunto composto por Estados Nacionais, que, ao longo do tempo, adquire diferentes características e dinâmicas; trata-se de uma totalidade em movimento. Já a Ordem Internacional pode ser compreendida como um intervalo sustentado por regras e normas que mantêm uma relativa estabilidade entre as disputas de poder entre os Estados.

5 Neste trabalho, a compreensão do sistema internacional aproxima-se daquela formulada por Fiori (2014). O Sistema Internacional pode ser compreendido como um Sistema Interestatal Capitalista.

Trata-se de uma referência teórica que identifica, na expansão de poder dos Estados e dos mercados, uma unidade que é um produto da expansão dos mercados ou do capital de Estados europeus por meio do poder expansivo desses Estados (FIORI, 2014) que conquistaram e colonizaram territórios durante cinco séculos, criando uma lógica de conquista e monopolizações de posições de poder e de acumulação de riqueza (FIORI, 2014). Semelhantemente, essa percepção também é compartilhada por Farias (2017) quando descreve a ordem internacional do pós-Guerra Fria como uma competição geopolítica entre potências que disputam mercados tentando expandirem seus Estados, seja por meios políticos, econômicos ou ainda militares.

6 Entendemos como Guerra Política o conjunto de ações empregadas por um Estado para atingir objetivos ou vantagens que não seriam possíveis de serem logrados por meio de acordos diplomáticos ou tratados econômicos. A Guerra Política tem como principal característica o uso de ações de inteligência, informação, e desinformação tendo como principal alvo um outro Estado (ROBINSON et al., 2018).

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Ainda que a adaptação de conceitos do passado exista no pensamento estratégico russo, os formuladores das políticas de defesa e teóricos militares também discutiam, desde a época da Guerra Fria, o processo de modernização militar em sentido semelhante ao do Exército Americano e a ideia de Revolution in Military Affairs (RMA). Se as ideias de Guerra Política da Guerra Fria foram adaptadas pela Rússia durante a transformação de 2008, o mesmo pode ser dito acerca do seu pensamento sobre Guerra Regular.

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REFERENCIAL TEÓRICO

Na Rússia, aquilo que nos EUA ficaria conhecido como RMA no ano de 1970, foi chamado de Revolução Militar Técnico-Científica (RMTC), em 1977, pelo então Chefe de Estado-Maior do Exército Nikolai Ogarkov. Para Ogarkov, a RMTC era “a process… which creates qualitatively new types of weapons and military technology as well as modernizing conventional “classical” means of combat and significantly their combat possibilities” (OGARKOV, 1978 apud HERSPRING, 1987, p. 30).

Mediante essa definição de Ogarkov (1978), é possível estabelecer a primeira baliza sobre transformações militares russas:

(I) a transformação militar possibilita a criação de novas capacidades de combate.

Novos meios de combate são uma das consequências que o desenvolvimento de novas tecnologias militares pode possibilitar, entretanto essas novas capacidades precisam ser articuladas com um fator que permita a execução de novas missões militares. Esse outro fator é a doutrina militar, que será abordada mais adiante como um elemento necessário para articular tanto a Política de Defesa de um país quanto as missões que seu exército desempenhará.

Os meios criados pela RMTC foram resultado de um contexto específico da Guerra Fria, um contexto marcado pela falta de opções às armas nucleares para a rivalidade entre as duas potências, que desencadeou caminhos para engendrar respostas ao crescente avanço tecnológico dos EUA em armas convencionais (FITZGERALD, 1987). A necessidade de encontrar respostas às tecnologias desenvolvidas pelos EUA, como GPS e mísseis cruzadores, ofereceu às Forças Armadas Soviéticas a capacidade de criar tecnologias relativamente equivalentes, como o GLONASS e o míssil cruzador 3M-54 Kalibr (FITZGERALD, 1987).

Nessa época, a ideia desenvolvida por Nikolai Ogarkov era a de manutenção da rivalidade geopolítica, entre EUA e URSS, na disputa pela hegemonia na Guerra Fria. Uma aproximação holística entre a RMA e a RMTC indica uma segunda baliza a esta dissertação, que pode ser sintetizada da seguinte forma: com estes fatos:

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(II) as transformações militares, impulsionadas pela necessidade de criar capacidades e novas missões, são consequências da dinâmica de poder do sistema internacional.

Se a primeira baliza versa sobre a criação de novos meios militares por vias da transformação de um Exército, e a segunda aborda os fatores que impulsionam os processos de transformação militar, é possível combinar essas duas balizas e criar a terceira baliza:

(III) o desenvolvimento de uma nova doutrina militar é também uma consequência da dinâmica de poder do sistema internacional.

Essa baliza se concretiza com o que foi identificado nos processos de transformação militar dos anos 70 tanto da Rússia quanto dos Estados Unidos. As disputas geradas pelo impasse nas tecnologias nucleares impulsionaram a buscar novos meios convencionais para criar vantagens sobre o adversário.

Observado desta perspectiva, o processo de transformação militar ocorrido, em 2008, na Rússia absorveu a inspiração que o antigo Chefe de Estado-Maior, Nikolai Ogarkov, havia estabelecido na década de 70. Serão destacadas três dessas inspirações e suas relações com a Ordem Internacional do pós-Guerra Fria. Assim, são as inspirações:

(I) adquirir e/ou desenvolver novas tecnologias militares;

(II) desenvolver uma doutrina para utilizar essas tecnologias e criar meios e missões;

(III) elaborar políticas de defesa que definam as percepções de ameaça da Rússia.

A primeira inspiração será desenvolvida desde a aquisição ou desenvolvimento de Tecnologias da Informação7 (IT) e de instrumentos de projeção

7 O A Dictionary of Physics (2014) define como Tecnologias da Informação o uso de computadores com fins de armazenar, acessar, transmitir ou manipular dados e informações.

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de força como Guerra Informacional8 e conceitos de Guerra Política, utilizados desde a época da Guerra Fria. Nessa baliza também será abordada a questão dos Sistemas de Localização via Satélite (GLONASS) e a melhoria nos sistemas de C4ISR (Comando, Controle, Comunicações, Computação, Inteligência, Monitoramento e Reconhecimento). Também será abordado o fato da relação intrínseca entre a natureza da guerra, em um sentido clausewitziano, e como os conceitos de Guerra Política e Informacional estão interligados no pensamento estratégico russo.

A segunda inspiração terá como principal enfoque a relação do desenvolvimento de uma doutrina que esteja interligada com a utilização das novas tecnologias desenvolvidas e como essa doutrina se articula com a Doutrina Militar Russa de 2014 e com a Estratégia Nacional de Segurança Russa de 2014. A abordagem tem como objetivo demonstrar que o processo de transformação de 2008 possibilitou ao Exército Russo reaproveitar antigos conceitos e os moldarem de acordo com as novas capacidades desenvolvidas e para as missões em que as FAR serão utilizadas.

Por último, na terceira inspiração, abordar-se-á a Estratégia Nacional de Segurança da Rússia primando por abordar as percepções de ameaças da Rússia em relação à ordem internacional e à dinâmica geopolítica existente nela. Após isso, as percepções russas de ameaças, e suas interpretações do que acontece no sistema internacional serão relacionadas com a sua Doutrina Militar. O principal objetivo desta parte é identificar elementos da Estratégia Nacional de Segurança na Doutrina Militar Russa de 2014 e demonstrar que uma doutrina militar exige uma Política de Defesa Nacional correspondente aos objetivos de emprego do Exército Russo e suas novas capacidades e missões.

Não obstante, o conceito de transformação militar abordado nesse trabalho será alicerçado nos moldes de Hervé Coutau-Bégarie (2011), Jackson (2013), Farrel (2013) e Posen (1984).

Finalmente, as chamadas Reformas de 2008 serão entendidas como um processo de transformação militar, que possibilitou, ao Exército Russo, novos meios

8 A Guerra Informacional é um conceito que envolve o uso e gerenciamento das tecnologias da informação e comunicação com fins de obter uma vantagem sobre um oponente, é o uso e a manipulação da informação com fins de fazer um adversário tomar decisões contra seu próprio interesse (JEROME, 1989).

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para desenvolver novas tecnologias e uma renovação doutrinária que permitiu ao Exército Russo realizar operações de Guerra Irregular na região da Crimeia.

As três balizas sintetizadas até então serão as referências para o estabelecimento dos nexos comparativos entre a transformação do Exército Russo e dois documentos nacionais de defesa do Brasil que versam sobre a transformação do Exército Brasileiro. Esses documentos serão as seguintes:

(I) Política Nacional de Defesa – 2012;

(II) Estratégia Nacional de Defesa – 2012.

Começando pela primeira baliza, as novas capacidades que o Exército Brasileiro desenvolveu ou pretende desenvolver serão abordadas por meio da Política Nacional de Defesa (PND)9 e da Estratégia Nacional de Defesa (END)10. Essas novas capacidades também servirão como fundamento para abordar a questão encontrada em O Processo de Transformação do Exército, no 1° Vetor, sobre o desenvolvimento de uma doutrina correspondente às percepções de ameaça do Brasil em um mundo pós-Guerra Fria.

Ambos os documentos foram escolhidos porque tratam do processo de transformação militar do Exército Brasileiro (EB) e estabeleceram o caminho para o início desse processo em questão. Não apenas, mas como será visto no Terceiro Capítulo, os dois documentos têm uma função estruturante quando abordam a questão da percepção do próprio EB em relação ao contexto, entorno estratégico regional do Brasil e suas visões de possíveis ameaças para o futuro.

Serão utilizados, também, alguns breves elementos de dois manuais de campo sobre Operações Conjuntas e Operações Interagências no sentido de complementar a abordagem dos Documentos de Defesa Nacional do Brasil e O Processo de Transformação do Exército Brasileiro.

9 A Política Nacional de Defesa, criada em 2005 mediante o decreto número 5.484, aprovada em 2008, revisada em 2012, é o documento que será utilizado nesta dissertação. Logo, daqui em diante, a versão que será utilizada deste documento será a de 2012 dado que a revisão de 2016 ainda não está disponível.

10 A Estratégia Nacional de Defesa foi formulada em 2008 com o decreto número 6.703, e também foi revista em 2012. Este trabalho utilizará justamente a versão revisada após 2012 como referência para realizar seus esforços. Então, toda vez que houver citação direta ou indireta da END será baseada nesta revisão realizada em 2012.

(22)

Na segunda baliza, a dinâmica do sistema internacional, percebida pelos Documentos de Defesa Nacional, serão analisadas a Política Nacional de Defesa (2012), e a Estratégia Nacional de Defesa (2012). Para realizar essa tarefa, uma abordagem geopolítica da relação entre a dinâmica de poder do sistema internacional em face às ameaças difusas será utilizada.

As articulações dessa dinâmica e sua relação com os Documentos de Defesa Nacional assumiram que as ameaças percebidas tanto pelo Brasil quanto pela Rússia, em seus documentos, não são “novas ameaças”, mas, sim, ameaças difusas e complexas, fruto de uma ordem multipolar marcada pela constante disputa entre Estados pela acumulação de poder e riqueza.

Continuando, se, nas FAR anteriores à reforma de 2008, havia oportunidades de modernização em equipamentos bélicos que ainda não dispunham de tecnologias militares correspondentes às do século XXI, principalmente no que concerne à ideia de Guerra Irregular, o mesmo será verificado no Exército Brasileiro (EB). Além disso, as oportunidades de transformação servirão como base para uma análise posterior dos Projetos Estratégicos do Exército (PEE) em documentos como O Processo de Transformação do Exército, Projeto de Força do Exército (PROFORÇA) e o Manual do Exército Brasileiro EB20-MF-10.101.

Estabelecida a maneira que os nexos comparativos serão abordados e sua articulação entre si, é possível definir qual é o problema de pesquisa deste trabalho. Define-se que os processos de transformações dos Exércitos do Brasil e da Rússia relacionam-se entre si por meio dos nexos comparativos, e como as mudanças na ordem geopolítica internacional pós-Guerra Fria, em especial após 2008, moldaram as percepções de ameaças.

Esse problema de pesquisa, por sua vez, revela a pergunta que irá guiar os esforços deste trabalho. Desse modo, a pergunta de pesquisa que se apresenta é a seguinte: Por que dois países de diferentes capacidades militares transformam seus Exércitos para responderem a estímulos da ordem internacional do pós-Guerra Fria?

Para responder essa pergunta, foi formulada a seguinte hipótese:

Os processos de transformações militares são instrumentos tanto para a manutenção das preocupações e aspirações regionais tanto da Rússia quanto do Brasil, bem como ferramentas para transformar seus exércitos em relação às mudanças em segurança e defesa no sistema internacional.

(23)

Assim, os aspectos que serão analisados nas transformações dos exércitos serão:

(I) as influências das percepções de ameaça geopolítica no Pós-Guerra Fria em Documentos de Defesa Nacional;

(II) a atualização do material bélico de maneira correspondente às percepções de ameaças do pós-Guerra Fria;

(III) a formulação de uma doutrina militar em consonância com os objetivos e capacidades militares relacionados ao emprego e uso da força.

Baseado nos três aspectos a serem analisados, este trabalho tem como objetivo geral identificar nexos comparativos entre o processo de transformação do Exército Russo, em 2008, e os Documentos de Defesa Nacional do Exército Brasileiro que indiquem as características de seus processos de transformação militar como respostas aos estímulos internacionais.

Esse objetivo geral descortina outros dois objetivos específicos que servirão como maneira de aprofundar o objetivo geral já disposto. São eles os seguintes:

(I) identificar quais estímulos que a dinâmica do sistema internacional levaram tanto o Brasil quanto a Rússia a transformarem seus Exércitos;

(II) analisar as realidades que existem na geopolítica mundial em 2008 e suas possíveis implicações para o processo de transformação de ambos os Exércitos em questão.

A escolha da Rússia como objeto de estudo comparativo com o Brasil deu-se após verificarem-se semelhanças no que concerne às necessidades que existiam no Exército Russo e que desencadearam o processo de transformação de 2008. Isso foi feito com base em um nexo de comparação com o documento O Processo de Transformação do Exército. Então, foram encontrados dois nexos comparativos:

(I) a necessidade de desenvolver uma doutrina para responder às ameaças complexas comuns ao ambiente de defesa do século XXI;

(II) a primazia de atualizar a situação da aquisição e desenvolvimento tecnológico em material bélico do Exército Brasileiro.

(24)

Comparativamente, a transformação do Exército Russo foi causada pelos mesmos dois nexos comparativos encontrados no documento brasileiro supracitado.

Outro fator de igual importância é que tanto o Brasil quanto a Rússia têm preocupações de defesa relativas aos seus respectivos entornos estratégicos regionais.

Apoiados nos dois nexos comparativos, os esforços contidos nesta pesquisa justificam-se mediante os objetivos russos e brasileiros para com seu entorno estratégico regional, suas necessidades militares nas áreas doutrinária e tecnológica e os seus posicionamentos no sistema internacional.

(25)

REFERENCIAL METODOLÓGICO

Para realizar este trabalho, primando por atingir os objetivos dispostos até aqui, será utilizada uma metodologia qualitativa, embasada em uma revisão bibliográfica, e uma consulta bibliográfica de fontes primárias documentais dos Documentos de Defesa Nacional do Brasil e da Rússia. A revisão bibliográfica se sustenta em livros acadêmicos de institutos internacionais que têm os estudos de defesa como principal objeto. Destacam-se os seguintes: RAND Corporation, Royal United Services, Center for Strategic and International Studies, Council on Foreign Relations, Congressional Research Archive, European Parliament Think Tank, U.S Army School of Command and General Staff, Naval Post Graduate School, Strategic Studies Institute, Palgrave Macmilan e Valdai Group.

No que concerne à metodologia qualitativa, é necessário especificá-la já que este trabalho é um estudo comparativo entre os processos de transformação dos Exércitos Russo e Brasileiro.

Para tanto, o método histórico-comparativo será uma referência para os esforços que serão realizados no decorrer desses escritos por um teste de hipótese a ser realizado. O teste da hipótese será realizado por meio da verificação das três balizas comparativas que, se sustentadas como válidas até a conclusão desta dissertação, servirão para atestar que existem nexos de comparação entre os processos de transformação dos exércitos da Rússia e do Brasil.

A aproximação com a metodologia histórico-comparativa fora escolhida pela natureza qualitativa desta pesquisa, decisão tomada após consultar a obra de Stephen van Evera (1997), intitulada A Guide to Methods for Students of Political Science, na qual se constatou a necessidade de utilizar-se desse método para embasar os estudos comparativos de processos de transformação militar.

Ainda no que concerne à metodologia, serão utilizados os seguintes autores de história comparada como embasamento para sustentar a metodologia proposta por van Evera (1997), José D’Assunção Barros (2007), Maria Lígia Coelho Prado (2005), Neyde Theml (2007), Raquel Lima Assis (2018).

A geopolítica e o realismo, presentes nas teorias das Relações Internacionais, serão sustentados por aportes provindos de Fiori (2014) e Mearsheimer (2014;

2018), para uma leitura dos fundamentos e características da competição e cooperação dos Estados no sistema internacional. Mearsheimer (2012), por

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exemplo, conceitua o sistema internacional como anárquico, competitivo, multipolar e marcado por interações multipolares entre potências.

Já as características geopolíticas da Rússia e do Brasil, principalmente o território, as fronteiras e o entorno estratégico, serão abordadas pelas palavras de Meira Mattos (2011), Mackinder (1919), Travassos (1931), e Dugin (2016), Moniz Bandeira (2017), junto aos Documentos de Defesa dos respectivos países. O uso dos autores aqui mencionados servirá como uma forma de propor possíveis semelhanças entre o Brasil e a Rússia, segundo as características acima descritas.

Para complementar as aproximações fornecidas pelos autores acima citados, serão utilizados John Stuart Mill em sua obra A system of Logic para auxiliar na formulação das considerações finais desta dissertação.

Assim, serão empregadas algumas ideias de René Remmond (2003), em Introdução à História do Nosso Tempo, para trilhar um caminho em direção ao estabelecimento dos nexos comparativos entre os processos de transformação dos exércitos russo e brasileiro e na definição do marco temporal.

(27)

UMA APROXIMAÇÃO COM O MÉTODO HISTÓRICO-COMPARATIVO:

ABORDAGENS, CONCEITOS E FUNDAMENTOS

A ideia de história comparada pode ser entendida como a escolha de um determinado espaço e tempo que obrigará o pesquisador a atravessar duas ou mais realidades socioeconômicas, políticas ou culturais distintas (BARROS, 2007, p. 2).

Essa maneira de pesquisar a história tem seu início no período entre guerras quando a exacerbação estava em declínio devido aos fortes impactos sociais que a Primeira Guerra Mundial trouxe consigo (THEML; BUSTAMANTE, 2007).

A questão do pós-guerra nos traz um marco histórico para delinear as origens da história comparada como disciplina da história e como instrumento de análise de duas ou mais realidades temporais e geográficas, conforme Raquel Anne Lima de Assis (2018) nos revela:

Weber fez uma comparação entre sociedades afastadas no tempo para estudar o fenômeno urbano. Assim, o autor desenvolve uma comparação entre a cidade antiga, a cidade medieval e a cidade contemporânea através da construção dos “tipos ideais” de cidades.

Apesar do trabalho de Weber e outros que utilizaram do comparativismo, foi com Marc Bloch que a História Comparada ganhou um caráter sistematizado com a obra Os Reis Taumaturgos (1924) e, posteriormente, um artigo intitulado Por uma história comparada das sociedades europeias (1928) (ASSIS, 2018, p. 54).

Por via das palavras de Assis (2018), é perceptível o uso do termo Comparativismo em contraste à História Comparada. Os motivos que sustentam esta distinção são explanados da seguinte maneira:

O comparativismo adotado por Marc Bloch se distinguia daquele proposto por Max Weber para as Ciências Sociais. Para este, através do cotejamento entre traços de um período e os encontrados em outros, procurava-se ver o que não estava lá, ou seja, entender a ausência específica. Weber analisa aspectos parciais e selecionados dos processos em confronto, mesmo que distantes temporalmente, a partir de “probabilidades típicas de acontecer” [...], abordando certos temas, tais como a burocracia) [...]. A abordagem weberiana envolveria, portanto, sociedades francamente heterogêneas e/ou muito afastadas temporalmente, procurando desvelar o que é

“peculiar” a cada e não operando na busca do “comum” a várias ou todas as configurações históricas (THEML; BUSTAMANTE, 2007, p.

5).

(28)

Então, considera-se que a História Comparada como explanado por Theml e Bustamante (2007) tem como objetivo encontrar o que há de comum entre dois objetos de estudo, enquanto o comparativismo de Max Weber trata das diferenças entre ambos os objetos que se pretende estudar.

No caso do presente trabalho, o que se pretende encontrar são semelhanças entre os processos de transformação dos Exércitos Russo e Brasileiro, porém sem deixar de lado as diferenças como os investimentos em pesquisa tecnológica-militar e o fato de que a Rússia, enquanto potência e situada em um tabuleiro geopolítico de intensos conflitos, faz uso da força na resolução de suas contendas, e o Brasil não. Como será visto, durante o desenrolar desta dissertação, o fato de o Brasil e de o Exército Brasileiro manterem uma tradição legalista no Sistema Internacional será abordada no terceiro capítulo, enquanto, no quarto, isso será contrastado com o comportamento russo no nível internacional.

Assim, a diferença, enquanto instrumento de comparação, também pode ser encontrada com nexo entre dois objetos estudados. Veja-se como isso se sustenta:

Em outras palavras, com a comparação podemos encontrar condições gerais que possibilitam prever o futuro dentro de um limite de opções variadas prováveis ou possibilidades, mas que não se trata de clarividência, isto é, não é uma previsão precisa por estar sujeita às diversas circunstâncias transformadoras e imprevisíveis e especificidades de cada contexto. [...] Essas especificidades também podem ser encontradas por meio da comparação ao identificarmos o que está ausente, isto é, só podemos saber o que é único em uma realidade ao compararmos com outras e assim observarmos o que está faltando nas demais (ASSIS, 2018, p. 5).

Se a diferença entre dois objetos que pretendem ser estudados pode também aproximá-los, contato que o que é único entre os dois objetos seja contrastado em relação ao que também é único em outra, a diferença entre o Brasil e a Rússia no que concerne às suas posturas no sistema internacional também servirá como sustentação para a comparação entre os dois processos de transformação militar.

Essa questão da diferença e da semelhança entre dois objetos como maneira de compará-los é também um fenômeno estudado por John Stuart Mill em seu livro A System of Logic (1843) no qual o filósofo britânico aborda o seguinte:

(29)

If two or more instances of the phenomenon under investigation have only one circumstance in common, the circumstance in which alone all the instances agree, is the cause (or effect) of the given phenomenon11 (MILL, 1843, p. 454)

Nesse caso, John Stuart Mill (1843) relata a possibilidade da comparação de fenômenos que têm uma circunstância em comum, dado que essa circunstância seja a causa do que se estuda. No caso da comparação pela diferença, Mill (1843) descreve isso como:

If an instance in which the phenomenon under investigation occurs, and an instance in which it does not occur, have every circumstance save one in common, that the one occurring only in the former; the circumstance in which alone the two instances differ, is the effect, or cause, or a necessary part of the cause, of the phenomenon12 (MILL, 1843, p. 455).

Nota-se que a diferença entre dois ou mais objetos a serem estudados também é contemplada por Mill (1843) conforme o trecho acima citado. Os dois métodos até aqui descritos dialogam, mesmo que de maneira indireta, com as aproximações que Marc Bloch nos fornece sobre História Comparada e suas possíveis abordagens. O que torna Mill uma interessante contribuição metodológica para este trabalho é justamente o seu método conjunto da diferença e da semelhança. Ele o descreve como:

If two or more instances in which the phenomenon occurs have only one circumstance in common, while two or more instances in which it does not occur have nothing in common save the absence of that circumstance; the circumstance in which alone the two sets of instances differ, is the effect, or cause, or a necessary part of the cause, of the phenomenon13 (MILL, 1843, p. 463).

11 Dois exemplos onde um fenômeno ocorre, onde existe uma única circunstância que acontece nos dois exemplos e faz com que eles se tornem comuns um ao outro. Isto é, a circunstância que existe nos dois exemplos em questão faz com que eles sejam comparativamente concordantes, e essa circunstância é a causa ou o efeito do fenômeno estudado (MILL, 1843, p. 454, tradução nossa).

12 Se em um exemplo em que o fenômeno estudado ocorre, e em outro exemplo ele não ocorre, dado que cada outra circunstância esse fenômeno esteja presente, a circunstância na qual os exemplos discordam pode ser a causa, o efeito, ou parte necessária da causa do fenômeno (MILL, 1843, p. 455, tradução nossa).

13 Se em duas ou mais circunstâncias nas quais um fenômeno ocorre há só uma circunstância em comum, e em dois ou mais exemplos que ele não ocorre não há nada em comum a não ser a ausência daquela circunstância, a circunstância que sozinha difere os dois conjuntos de exemplos será o efeito, a causa ou a parte necessária do fenômeno em questão (MILL, 1843, p. 463, tradução nossa).

(30)

Essa contribuição de Mill funciona como uma ponte que liga ambos os métodos da semelhança e da diferença, o que possibilita, por sua vez, a comparação entre um país que não faz uso da força no sistema internacional, o Brasil, e o outro que faz, a Rússia. Assim, há o auxílio em relação à possibilidade de encontrar nexos comparativos entre processos de transformação militar de ambos os Exércitos mediante a consulta a seus Documentos de Defesa Nacional.

Por conseguinte, este trabalho utilizará um recurso de abordagem, inspirado nos estudos de história comparada, e nos três métodos de Mill (1843), descritos até aqui como meios para sustentar os nexos comparativos. A seguir, será exposto o recorte de tempo no qual essa dissertação concentrará seus esforços.

(31)

MARCO TEMPORAL

Identificadas e descritas as referências para a análise comparativa entre o Brasil e Rússia, é possível definir as razões pelas quais o recorte temporal de 2008 e 2018 fora escolhido como maneira de balizar o contexto histórico desta pesquisa.

O Final da Guerra Fria é um importante fato que leva a escolha do ano de 2008 como marco temporal inicial. As razões para tanto são descritas por René Rémond (2003) em seu livro Introdução à História do Nosso Tempo: do Antigo Regime aos nossos Dias:

Gorbatchev subtrai o Estado ao domínio do partido e faz-se eleger para presidente da União (URSS). O dado absolutamente novo do sistema internacional que a personalidade de Gorbatchev introduz conduziu a uma reação em cadeia nos países satélites. A União Soviética não está em situação de se opor: esgotara-se nas intervenções em todos os continentes; asfixiada pela corrida aos armamentos, em que não conseguiu acompanhar os Estados Unidos [...]. Mas há mais: como consequência, as nacionalidades do interior da União reerguem a cabeça e reclamam a independência [...]. O desmembramento do império soviético é o último capítulo da história da descolonização, a conclusão do grande movimento histórico que, desde a Revolução Francesa, se encaminhava para a independência de todas as nacionalidades (RÉMOND, 2003, p. 403-404).

Pelas palavras do historiador francês, é possível observar o que significou tanto o final da Guerra Fria quanto a queda da URSS na ordem geopolítica internacional, e para a História, dos anos posteriores. Também se observa, pelos relatos de Rémond (2003), que a URSS não conseguiu acompanhar o avanço tecnológico estadunidense durante a Guerra Fria, sendo este um dos motivos que levaram a URSS a tornar-se insustentável.

A Federação Russa, país que assume o lugar da URSS, consequentemente também sofre desse déficit tecnológico em relação aos sistemas de armas dos Estados Unidos. Essa constatação leva a uma disputa russa para se manter na condição de potência militar, isso porque houve disputas no entorno estratégico regional da Federação Russa nomeadamente naqueles territórios do Cáucaso que pertenciam ou à URSS, ou ao Império Russo:

[...] and after the Soviet collapse, the region became extremely unstable. Conflicts arose in Dagestan (1997-1999), between Armenians and Azerbaijanis in the Nagorno-Karabakh territory (1988- 1994), between Russia and Georgia because of the Abkhazia (1992-

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1993) and South Ossetia enclaves (2008), in Chechnya (1994-1996 and 1999 and 2009) and in Ingushetia (2007), caused by jihadists who’d fled from Chechnya, etc14 (BANDEIRA, 2017, p. 2–3).

As razões para tantos conflitos nessa região também são explicadas por Moniz Bandeira (2017) quando:

The region has always been of vital geo-strategic importance to Russia. Its mountains to the south are a natural bulwark in the defense of the agricultural plains in the north. The loss of Georgia, Armenia and Azerbaijan, with the economic and military penetration of the United States/NATO, however, pushed Russian borders toward the northern part of the Caucasus15 (BANDEIRA, 2017, p. 3).

Esses trechos permitem concluir que, desde o final da Guerra Fria, a Rússia se vê em uma situação de disputa com a OTAN, e os EUA, em relação a uma região que anteriormente estava sob sua influência. O ano de 2008, consequentemente, torna-se um marco temporal importante porque foi nele que a Rússia entra em conflito com a Geórgia, apoiada e treinada pelos EUA, para anexar a região da Ossétia do Sul e torná-la um enclave com a Abecásia (BANDEIRA, 2017).

Como será analisado mais adiante, o ano de 2008 também foi quando a Rússia inicia um processo de transformação militar devido ao seu desempenho no conflito da Geórgia. Dessa forma, as tensões na região do Cáucaso em 2008 - além do avanço da OTAN e dos EUA nessa região por meios econômicos e militares, em conjunto com o processo de transformação militar iniciado na Rússia - sustentam a escolha desse ano como marco temporal inicial.

Já no tocante ao ano de 2018, esse fora escolhido, pois foi quando houve uma alteração no Plano de Rearmamento do Estado (GPV 2011-2020) da Rússia e acabou adiado para 2018-2025 (CONNOLY; BOULÈGE, 2018). As razões para isso serão visualizadas no decorrer desta dissertação. Por fim, têm-se, então, as razões

14 [...] e após o colapso soviético, a região se tornou extremamente instável. Conflitos surgiram no Dagestão (1997-1999), entre armênios e azerbaijanos no território de Nagorno-Karabakh (1988- 1994), entre Rússia e Geórgia devido aos enclaves da Abecásia (1992-1993) e da Ossétia do Sul (2008), na Chechênia (1994-1996 e em 1999 e 2009) e na Inguchétia (2007), causado por jihadistas que fugiram da Chechênia, etc. (BANDEIRA, 2017, p. 2-3, tradução nossa).

15 A região sempre fora de uma importância geoestratégica vital para a Rússia. Suas montanhas ao sul são uma barreira natural para a defesa das suas planícies agrícolas ao norte. A perda da Geórgia, Armênia e Azerbaijão, com a penetração econômica e militar dos Estados Unidos/OTAN, entretanto, forçou as fronteiras russas em direção a parte norte do Cáucaso (BANDEIRA, 2017, p. 3, tradução nossa).

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pelas quais os anos de 2008 e 2018 foram escolhidos para delimitar o recorte temporal que existe neste trabalho.

Em relação ao Brasil, o ano de 2008 foi escolhido como marco inicial, pois é o ano em que a END se torna pública, e, em 2018, tanto a END quanto a PND foram aprovadas mediante o Decreto Legislativo 137/2018 (SENADO NOTÍCIAS, 2018).

Também é importante ressaltar que, entre 2008 e 2018, documentos importantes sobre a transformação do Exército Brasileiro são publicados, sendo eles:

(I) O Processo de Transformação do Exército, 2010;

(II) Concepção de Transformação do Exército, 2013;

(III) Bases para a Transformação da Doutrina Militar Terrestre, 2013;

(IV) EB20-MF-10.102 Manual de Fundamentos: Doutrina Militar Terrestre, 2014;

(V) Projeto de força do Exército Brasileiro, 2012.

Agora, será visto como serão estruturados os esforços dos capítulos dessa dissertação.

(34)

APRESENTAÇÃO DOS CAPÍTULOS

No primeiro capítulo, será realizada uma análise entre as semelhanças entre o Brasil e Rússia em quesitos geopolíticos como PIB, Território, Fronteiras e População. Nessa mesma parte, também se encontra uma aproximação histórica entre as doutrinas militares da Rússia antes do início de sua transformação militar.

As semelhanças geopolíticas entre o Brasil e a Rússia, da mesma maneira que a abordagem histórica da Doutrina Militar da Federação Russa, também será aplicada ao Brasil com o objetivo de estabelecer o início dos nexos comparativos entre o processo de transformação militar russo e brasileiro.

Já no segundo capítulo, será abordada a transformação do Exército Russo segundo as três balizas descritas anteriormente, procurando atingir, também, as três inspirações que possibilitaram a execução desse processo e suas consequências para o Exército Russo após sua conclusão. Nesse capítulo, as percepções de ameaça da Rússia em relação ao desenvolvimento de sua Estratégia Nacional de Segurança também serão abordadas, do mesmo modo que as consequências disso para a transformação de suas Forças Armadas.

No terceiro capítulo, os nexos comparativos serão abordados em face dos Documentos de Defesa Nacional do Brasil, expressos nesta seção, procurando estabelecer conexões entre as causas que desencadearam o processo de transformação do Exército Brasileiro por via dos Documentos de Defesa Nacional.

Essa parte lidará com a tradição pacífica e legalista que o Brasil e o Exército Brasileiro mantêm ao longo de sua história e se verificará se os Documentos de Defesa Nacional possuem uma posição que endosse essas duas características.

Ao longo do quarto capítulo, serão estabelecidos os nexos comparativos por meio dos esforços até aqui empreendidos para verificar a hipótese e as balizas comparativas desenvolvidas nessa introdução.

Por fim, as considerações finais serão responsáveis por verificarem o que foi possível se realizar com o material trabalhado até o quarto capítulo com o objetivo de desenvolver uma verificação dos objetivos gerais e específicos dispostos até aqui. Não só isso: serão realizados esforços nessa sessão para averiguar a possibilidade de outros estudos que possam avançar e aprofundar a questão da transformação militar do Exército Brasileiro.

(35)

1 REFORMAS EM CONTEXTO: A GEOPOLÍTICA DO PÓS-GUERRA FRIA E SUA RELAÇÃO COM OS EXÉRCITOS RUSSO E BRASILEIRO

1.1 INTRODUÇÃO

Este capítulo será responsável por contextualizar as transformações geopolíticas do sistema internacional das décadas de 1990 e 2000 e como elas atingiram o Brasil e a Rússia ao longo desse recorte temporal. Além disso, serão visualizadas as maneiras como ambos os países responderam aos estímulos e câmbios no contexto da dinâmica da geopolítica internacional, e como essas mudanças conjunturais influenciaram os respectivos processos de transformação dos Exércitos da Rússia e do Brasil.

Após essa contextualização, serão estabelecidos alguns elementos comparativos entre Brasil e Rússia nos seguintes quesitos geopolíticos:

(I) Território;

(II) População;

(III) PIB;

(IV) Fronteiras.

Uma vez feita a demonstração dessas semelhanças, elas servirão como instrumentos analíticos para sustentar a existência de Forças Armadas aptas e atualizadas aos desafios e ameaças impostas pela dinâmica conflitiva do sistema internacional. Também serão descritas as capacidades militares russas e brasileiras que antecedem o início de seus processos de transformação.

Dessa forma, o presente capítulo tem como objetivo descrever as formas como a dinâmica da mudança da conjuntura da geopolítica internacional atuou sobre as capacidades militares do Brasil e da Rússia, anteriores aos seus processos de transformação. Pretende-se também propor que as quatro semelhanças geopolíticas, a serem estabelecidas, são uma das razões que explicam a necessidade da execução de processos de transformação militar no caso brasileiro e no caso russo.

Para tanto, serão utilizados conceitos de geopolítica de Halford Mackinder (1904;1919), principalmente a ideia de heartland, e de autores, como Carlos Meira

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Mattos (2011), Golbery do Couto e Silva (1967), Wanderley Messias Costa (2016;

2015), José Luis Fiori (2014), e Graciela Conti Pagliari (2009). Esses conceitos auxiliarão no estabelecimento das quatro semelhanças já descritas e servirão posteriormente no que concerne à visualização da dinâmica da mudança geopolítica no sistema internacional e suas relações com o Brasil e a Rússia.

Sendo assim, iniciar-se-á analisando o sistema internacional do pós-Guerra Fria, suas dinâmicas de poder e principais características.

1.2 O SISTEMA INTERNACIONAL DO PÓS-GUERRA FRIA

A queda do Muro de Berlim e a eliminação da concorrência soviética redefiniram o poder e a hierarquia do Sistema Internacional após o fim da Guerra Fria, porém, não havia outra potência que pudesse limitar ou ainda negociar com os Estados Unidos em termos de poderio econômico e militar (FIORI, 2007). Isso significou que a queda da URSS deu aos EUA a possibilidade de tornarem-se o hegemon no sistema internacional.

A ideia de hegemon é aquela descrita por Mearsheimer (2014), segundo a qual:

Hegemony means domination of the system, which is usually interpreted to mean the entire world. It is possible, however, to apply the concept of a system more narrowly and use it to describe particular regions such as Europe, Northeast Asia, and the Western Hemisphere. Thus, one can distinguish between global hegemons, which dominate the world, and regional hegemons, which dominate the distinct geographical areas. The United States has been a regional hegemon in the Western Hemisphere for at least the past one hundred years. No other state in the Americas has sufficient military might to challenge it, which is why the United States is widely recognized as the only great power in its region16 (MEARSHEIMER, 2014, p. 35).

16 Hegemonia significa a dominação do sistema, o que geralmente é interpretado como o mundo inteiro. É possível, entretanto, aplicar o conceito de um sistema de maneira mais estrita e usá- lo para descrever regiões particulares como Europa, Nordeste Asiático e Hemisfério Ocidental.

Portanto, é possível distinguir entre hegemons globais, que dominam o mundo inteiro, e hegemons regionais, que dominam áreas geográficas distintas. Os Estados Unidos têm sido o hegemon regional no Hemisfério Ocidental por pelo menos os últimos cem anos. Nenhum outro Estado nas Américas tem poder militar suficiente para o desafiar, e é por isso que os Estados Unidos são vastamente reconhecidos como a única grande potência na sua região (MEARSHEIMER, 2014, p. 35, tradução nossa).

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