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INCLUSÃO COGNITIVA EM MATEMÁTICA: ESTUDO DE CASO COM ESPINHA BÍFIDA

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INCLUSÃO COGNITIVA EM MATEMÁTICA: ESTUDO DE CASO COM ESPINHA BÍFIDA

Tania Elisa Seibert

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Claudia Lisete Oliveira Groenwald

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Maria Aurelia Noda Herrera

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RESUMO

Esse artigo apresenta um recorte de um estudo de caso com um aluno com Espinha Bífida e Síndrome de Arnold Chiari em relação aos conceitos matemáticos dos anos iniciais do Ensino Fundamental. O aluno investigado tem 12 anos, cursa a 6ª série do Ensino Fundamental em uma escola da rede particular de ensino, da cidade de São Leopoldo, no Rio Grande do Sul. A questão norteadora dessa investigação foi: quais as dificuldades cognitivas em Matemática do aluno com Espinha Bífida e Síndrome de Arnold Chiari? O objetivo da investigação foi identificar as dificuldades cognitivas em Matemática desse sujeito, para subsidiar a implementação de uma sequência didática individualizada que terá como objetivo a autonomia social do aluno em Matemática. Para responder estas questões optou-se por uma pesquisa de cunho qualitativo, do tipo estudo de caso. Apresentam-se neste artigo os resultados da experiência realizada nos meses de março a agosto de 2010, de 20 horas, com sessões de estudo entre o estudante investigado e a pesquisadora, que apontam uma defasagem acentuada entre os conceitos matemáticos do aluno, os esperados para sua idade e os trabalhados na escola.

Palavras chave: Inclusão Cognitiva. Educação Matemática. Espinha Bífida. Síndrome de Arnold Chiari.

INTRODUÇÃO

Os registros históricos comprovam que vem de longo tempo a resistência para a aceitação social das pessoas com deficiência e demonstram como as suas vidas eram ameaçadas (CARDOSO, 2007).

Segundo Correia (1997), desde a Idade Antiga, as políticas eram extremas em relação à exclusão de crianças deficientes. Como exemplos cita Esparta, na antiga Grécia, onde crianças com deficiência eram abandonadas nas montanhas e Roma, onde eram atiradas nos rios. Na Idade Média as pessoas com algum tipo de deficiência eram associadas à imagem do diabo ou à bruxaria, e por isso eram perseguidos e executados. A mudança nesse

1 Mestre em Ensino de Ciências e Matemática (PPGECIM) e doutoranda do PPGECIM da ULBRA, professora do Curso de Matemática da ULBRA.

2 Doutora em Ciências da Educação pela Pontifícia de Salamanca, na Espanha e professora titular do Curso de Matemática Licenciatura e do PPGECIM da ULBRA.

3 Doutora em Ciências Matemáticas pela Universidade de La Laguna, Espanha e professora titular do Curso de Matemática da Universidade de La Laguna, Tenerife, Espanha.

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tratamento se dá no século XVI, quando as deficiências passam a ser tratadas como problema médico (CARDOSO, 2007; FERREIRA, 1994).

A Educação Especial surge no final do século XVIII e início do século XIX, nos países escandinavos e na América do Norte, mais com caráter assistencial que educativo, criando centros especiais que se caracterizaram pela segregação, pois tinham o objetivo de separar e isolar as crianças, assim protegendo a sociedade do contato com os anormais (JIMÉNEZ, 1993; CORREIA, 1997). Este sistema de ensino especial paralelo, criado para educar os possuidores de uma diferença, contribui também para que sejam segregados e excluídos da sociedade que os nega (CARDOSO, 2007).

É no final do século XX e início do século XXI, que programas escolares e a abertura das instituições, começam a se ampliar, trazendo às escolas regulares crianças chamadas, nessa época, de excepcionais. A terminologia adotada atualmente é a de pessoas com necessidades educativas especiais (NEE), que segundo Coll (2004) são os alunos que apresentam algum problema de aprendizagem ao longo de sua escolarização, que exige uma atenção mais específica e maiores recursos educacionais do que os necessários para os colegas de sua idade são alunos com necessidades educativas especiais. Para Cardoso (2007) o conceito de NEE remete às dificuldades de aprendizagem e também aos recursos educacionais necessários para atender essas necessidades e evitar essas dificuldades;

A essa escola que promove a genuína equalização de oportunidades, que reconhece e responde às necessidades diversas de seus alunos, acomodando ambos os estilos e ritmos de aprendizagem e assegurando uma educação de qualidade através de um currículo apropriado, arranjos educacionais, adequação de estratégias de ensino, uso de recursos e parceria com as comunidades, respeita e utiliza a Declaração de Salamanca (UNESCO, 2004), chama-se de escola inclusiva.

A grande mudança, a partir da Declaração de Salamanca, no sistema de ensino no

Brasil, é a decisão do Poder Público, de integrar os educandos com NEE, nas classes de

ensino regular, em detrimento das classes especiais, apontando para a escola inclusiva em

substituição à escola especial (BRASIL, 1996). A partir dessa nova normatização, inicia-se no

Brasil, um período de muitas discussões em torno da inclusão de educandos com NEE nas

classes de ensino da escola regular. O processo inclusivo pode significar uma verdadeira

revolução educacional e envolve o descortinar de uma escola eficiente, diferente, aberta,

comunitária, solidária e democrática onde a multiplicidade leva-nos a ultrapassar o limite da

integração e alcançar a inclusão. Esse processo de inclusão implica numa reforma de gestão e

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no projeto pedagógico da escola, fundamentada na atenção à diversidade e no direito de todos à educação (CARDOSO, 2007).

Segundo Carvalho (2008) para que as escolas sejam de boa qualidade para todos, com todos e por toda vida, é necessário que os sistemas educacionais sofram transformações, apoiando-se na realidade e implementando ações de mudanças, segundo as especificidades de cada sistema, criando uma pauta de trabalho que prioriza necessidades, tais como: promover e garantir articulações internas entre os gestores da educação; efetiva integração entre as diferentes políticas públicas que tem em comum as questões educativas; rever os conceitos de ensino-aprendizagem, valorizando as contribuições da psicologia educativa, da psicanálise da educação e das neurociências da aprendizagem; garantir a acessibilidade de todos os alunos a qualquer escola, enfrentando as barreiras invisíveis, os estereótipos e os preconceitos.

Este trabalho apresenta um recorte da investigação que está sendo realizada com um aluno com Espinha Bífida e Síndrome de Arnold Chiari, objetivando detectar as dificuldades na aprendizagem dos conhecimentos matemáticos relativos aos anos iniciais do Ensino Fundamental. A importância desse estudo se justifica pela necessidade de apresentar subsídios, aos professores de Matemática, para a elaboração de recursos pedagógicos que objetivam a superação das dificuldades de aprendizagem em Matemática, auxiliando-os na inclusão de alunos com NEE, nas salas de aula e na escassa teoria sobre a cognição matemática de sujeitos com Espinha Bífida e Síndrome de Arnold Chiari.

1 TEMA E QUESTÕES DA INVESTIGAÇÃO

O tema da investigação é: Pessoas com Espinha Bífida e Síndrome de Arnold Chiari podem expandir suas competências e habilidades relacionadas à compreensão do sistema de numeração decimal e das operações de adição e subtração no conjunto dos Números Naturais em um contexto de resolução de problemas, com a aplicação de uma sequência didática individualizada? A partir desse tema levantam-se as seguintes questões de investigação:

a) Como as dificuldades próprias de pessoas com Espinha Bífida e Síndrome de Arnold Chiari interferem no desenvolvimento da compreensão do sistema de numeração decimal e das operações de adição e subtração no conjunto dos Números Naturais em um contexto de resolução de problemas?

b) A aplicação de uma sequência didática individualizada que utiliza diferentes recursos

didáticos, especialmente as TIC, pode auxiliar uma pessoa com Espinha Bífida e Síndrome de

Arnold Chiari a superar obstáculos de aprendizagem da compreensão do sistema de

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numeração decimal e das operações de adição e subtração no conjunto dos Números Naturais em um contexto de resolução de problemas?

2 OBJETIVOS

Esta pesquisa tem como objetivo geral investigar a compreensão do sistema de numeração decimal e das operações de adição e subtração no conjunto dos Números Naturais em um contexto de resolução de problemas.

A partir do objetivo geral, foram estabelecidos diferentes objetivos específicos. Este artigo enfocará o seguinte objetivo específico: averiguar, durante sessões de estudo com um aluno com Espinha Bífida e Síndrome de Arnold Chiari, o seu conhecimento sobre conceitos matemáticos dos anos iniciais do Ensino Fundamental, tais como: compreensão do número, das operações de adição e subtração no conjunto dos Números Naturais, das unidades de tempo, do sistema monetário e da resolução de problemas envolvendo situações do cotidiano, que deverão servir de suporte para criação de uma sequência individualizada que busca a sua autonomia social.

3 METODOLOGIA DA INVESTIGAÇÃO

Para desenvolver essa investigação optou-se pelo enfoque qualitativo, do tipo estudo de caso, pois seus pressupostos básicos adaptam-se as finalidades da pesquisa proposta. Um estudo de caso tem como objetivo aprofundar a descrição e o conhecimento de uma situação delimitada. Foram explorados os aspectos de cunho exploratório, que serviram para obter informações preliminares acerca do objeto de estudo, descritivo com o propósito essencial de descrever profundamente o caso, e analítico, que buscam problematizar, construir ou desenvolver a teoria a cerca do estudo ou confrontá-la com a teoria já existente (YIN, 1984, GIL, 1996, TRIVIÑOS, 1987).

Essa investigação tem seu foco em um menino, de 12 anos, que frequenta a mesma escola há 8 anos e está, atualmente, na 6ª série do Ensino Fundamental, de uma escola da rede particular de ensino, do município de São Leopoldo, Rio Grande do Sul, que conforme pareceres de avaliação da escola apresenta problemas de cognição. Buscou-se analisar as dificuldades de aprendizagem em Matemática, entre o mês de março e agosto de 2010, durante 20 sessões semanais de estudo, de 1 hora, de contato direto com a pesquisadora e o aluno.

Os instrumentos de coleta de dados utilizados nessa investigação foram entrevistas

com os pais e médicos do aluno investigado, análise de documentos médicos e escolares, as

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filmagens, as produções do mesmo durante as sessões de estudo e as observações dos encontros presenciais entre a pesquisadora e o aluno. Esses dados são considerados por Roesch (1999) os dados primários do estudo de caso. Ressalta-se que a sua vida escolar é analisada através da avaliação emitida pela escola (parecer descritivo), provas, cadernos e manifestações do aluno durante as sessões de estudo.

3.1 O ALUNO INVESTIGADO

O aluno investigado apresenta Espinha Bífida (defeito congênito), do tipo aberta, com protrusão cística

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, de desordem lipomielomeningocele, que se caracteriza por uma massa de gordura, coberta por pele, que se estende para a medula. Possui bexiga neurogênica, com perda constante de urina, amputação do membro inferior direito, colostomia, entre outras más formações. Já foi submetida a 25 cirurgias, tendo ficado hospitalizada em torno 700 dias, em função de cirurgias e outras complicações de ordem infecciosas. Cognitivamente apresenta problemas de fala, consequentemente de leitura e escrita, e dificuldades na aprendizagem dos conceitos matemáticos relativos a série que se encontra.

A Espinha Bífida é uma malformação congênita do Sistema Nervoso Central

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que se desenvolve no primeiro mês de gestação, no período da neurulação

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, ocasionando um defeito no fechamento das estruturas que formarão o dorso do embrião e que pode afetar não somente as vértebras, mas também a medula espinhal, meninges e até mesmo o encéfalo. Esses defeitos são geralmente denominados defeitos do tubo neural. Essa malformação congênita atinge a 0,5% da população brasileira (AEBH, 2010). A forma apresentada de Espinha Bífida, pelo aluno investigado, é do tipo aberta, denominada de Espinha Bífida Cística, que se caracteriza pelo defeito de fusão das vértebras que afetam o Sistema Nervoso e suas membranas protetoras

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. A malformação se estende à pele que se encontra distendida formando um cisto que contém líquido cefalorraquidiano em seu interior.

Estatísticas apontam que 35% das crianças com Espinha Bífida apresentam deficiência cognitiva, a maioria de grau leve, destacando dificuldades na percepção, atenção, concentração, motricidade, memória e para lidar com números (REDE SARAH DE HOSPITAIS DE REABILITAÇÃO, 2007). Dificuldades na escola são, portanto, frequentes e requerem atenção e orientação adequada. Segundo Tabaquim (2007) o desenvolvimento

4 Cisto na medula.

5 Sistema formado pelo encéfalo e a medula espinhal.

6 São as modificações que ocorrem na fase inicial da embriogênese e que darão origem ao Sistema Nervoso Central: placa neural, tubo neural, encéfalo primitivo (DOMINGUES, 2005).

7 Meninges

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motor anormal da criança acometida por essa deficiência proporciona a ausência de experimentação do meio, podendo dificultar as aquisições cognitivas próprias da idade.

A Síndrome de Arnold Chiari, do tipo II, é uma anomalia presente em alguns portadores de Espinha Bífida, principalmente do tipo mielomeningocele

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, porque o saco herniano pode conter partes da medula espinhal, das membranas espinhais e do líquido cefalorraquidiano. Nessa malformação as estruturas que normalmente estariam contidas na porção mais inferior do crânio, encontram-se parcialmente acomodadas dentro da coluna cervical e podem inferir na circulação do líquido cefalorraquiano. As anomalias da base do cérebro resultam em herniação de algumas estruturas cerebrais para dentro do canal vertebral.

Caracteriza-se por protrusão caudal do vérmis

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cerebelar e da porção inferior do tronco cerebral no canal espinhal. É comumente vista abaixo da segunda vértebra da coluna cervical (C

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) (MORO, 1999).

A malformação de Chiari pode provocar disfunção da medula espinhal com quadro clínico de disestesia

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de tronco e extremidade, paresia

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de membros superiores, com hipo/atrofia da musculatura das mãos, espaticidade

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nos membros inferiores, perdas sensitivas dissociadas

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no tronco e membros superiores. Ocasiona sensação anormal dos sentidos da sensibilidade nos braços, mãos, pernas, pés e dedos e dificuldade para focar a imagem ao ler e perda de memória (MORO, 1999; MARTÍNEZ, 2004).

4 OS CONHECIMENTOS MATEMÁTICOS DO ALUNO INVESTIGADO

Nas sessões de estudo, realizadas entre G e a pesquisadora, foram aplicadas atividades com os seguintes conceitos: número, cardinalidade, ordinalidade, quantificadores, sistema de numeração decimal, operação de adição e subtração, espacialidade, unidades de medida de tempo, sistema monetário, problemas lógicos e resolução de problemas do cotidiano envolvendo os conceitos citados. Neste artigo estão relatados os resultados relevantes desse período da investigação.

Na primeira entrevista escrita de G foi possível verificar que este não possui o domínio do sistema de numeração decimal, pois predominaram em suas respostas a escrita de

8 Protusão de bolsa subcutânea contendo tecido nervoso central, ou seja, a medula espinhal lesada com raízes nervosas.

9 Parte mediana, alongada e transversalmente sulcada do cerebelo.

10 Perturbação (aumento ou diminuição) da ação dos sentidos.

11 Paralisia incompleta de um nervo ou músculo, como conseqüência de uma lesão nervosa; paralisia ligeira ou temporária.

12 Rigidez ou espasmos musculares. Aumento do tônus muscular, no momento da contração, causado por uma condição neurológica anormal.

13 Dor/temperatura.

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números, na forma decomposta, conforme se observa na figura 1. O número do seu apartamento é 303, mas G registrou como sendo 3003.

Figura 1 – Registro do número do apartamento de G

Na mesma semana, na escola, G fez uma prova de Matemática. Na prova acertou 6 questões de 20, entre elas questões que pediam o título de um gráfico e interpretação de informações. A figura 2 é um exemplo de questão da prova.

Figura 2 - Questão da prova de Matemática de G

Pelas respostas emitidas por G, tanto na figura 1 quanto na figura 2, foi possível verificar que este não compreende o conceito do valor posicional de um algarismo no sistema de numeração decimal, nem mesmo nas centenas. Portanto, G não tem condições de responder a questão da prova, o que demonstra que a escola está solicitando conceitos acima da sua capacidade cognitiva atual.

Quanto à ordinalidade G reconhece a posição de objetos em uma fila, responde e escreve por extenso corretamente, mas comete erros na representação matemática. Por exemplo, em algumas atividades representou oitavo como: 8, 8º e 1/8. A notação 1/8 foi utilizada quando iniciou, na escola, o estudo dos Números Racionais, fato que demonstra sua incompreensão em relação a esses conceitos.

Em uma das sessões de estudo foram aplicadas as provas de diagnóstico clínico de Piaget, tendo como guia para aplicá-las e avaliá-las o livro “Manual de Provas de Diagnóstico Operatório” (Mac Donnel, 1979), que tem como objetivo determinar o grau de aquisição de noções chaves do desenvolvimento cognitivo. Em cada prova é possível avaliar o grau de construção que a criança alcança a respeito da noção que se está estudando. Basicamente podem ser determinados três níveis desta construção: nível um (ausência do conceito), nível dois (etapa ou nível intermediário) e nível três (êxito).

No quadro da figura 3 encontra-se um resumo do desempenho de G nestas provas.

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Figura 3 – Quadro resumo do desempenho de G nas provas de diagnóstico clínico de Piaget

Classificação Mudança de critério/dicotomia Nível 2 – utiliza apenas um critério (cor) para separar as figuras.

Intersecção de classes Nível 2 – não percebe a intersecção.

Quantificação da inclusão de classes Nível 3 Conservação Pequenos conjuntos discretos de elementos Nível 3

Quantidade de líquido (transvasamento) Nível intermediário entre 2 e 3 - apenas não percebe um transvasamento.

Quantidade de matéria Nível intermediário entre 2 e 3 - apenas não percebe uma transformação.

Peso Nível 1 – não possui conservação de peso.

Largura ou comprimento Nível 3

Superfície Nível 3

A análise dos dados coletados, durante a aplicação das provas de diagnóstico operatório, demonstra que G está no nível 2, isto é, na fase intermediária, pois oscila, entre a conservação e não conservação, ou seja, em uma prova, quando realizada uma deformação, altera seus julgamentos. Suas justificativas são pouco explícitas, e outras vezes não percebe a conservação. Esta estrutura de pensamento é típica de crianças com idade em torno de seis ou sete anos, demonstrando a defasagem de G nessas estruturas de pensamento.

Quanto à seriação G encontra dificuldades para completar uma série com mais de um critério e quando lhe é apresentada uma série de elementos de tamanhos diferentes, não utiliza uma estratégia organizativa para resolver um problema que lhe é apresentado. Novamente não é um resultado esperado, já que aos 7 ou 8 anos a criança deve ter atingido o método sistemático que consiste em identificar, primeiro, o elemento menor ou maior de todos, depois o menor dos que restaram e assim sucessivamente, pois testemunha que um elemento qualquer X é, ao mesmo tempo, maior do que os precedentes e menor do que os seguintes (em uma ordem decrescente) (PIAGET; INHELDER, 1983). Segundo os autores o domínio dos conceitos de seriação e quantificação é fundamental, pois originam a gênese do número.

Em relação à classificação diferentes atividades foram aplicadas. Alguns jogos permitiam separar o conjunto de peças em até seis subconjuntos, utilizando critérios de semelhança e diferenças. Porém, G percebeu apenas um critério, o da cor.

Segundo Piaget e Inhelder (1983), é possível estabelecer paralelos entre a

classificação e a seriação, ou seja, na seriação e na classificação estão presentes os conceitos

de compreensão e extensão. A compreensão diz respeito à ordem de diferenças em que os

elementos são seriados, enquanto que a extensão é o conjunto de seus elementos. Por

exemplo, a classe-inclusão, é um tipo de classificação, na qual a criança demonstra ou não a

compreensão das relações entre um conjunto e seus subconjuntos. Segundo os autores a

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classe-inclusão é indispensável para a compreensão do número. G, apesar de estar na 5ª série, no ano de 2010, ainda apresenta dificuldades na seriação e na classificação.

Na realização de uma atividade de associação de quantidade ao seu numeral, (figura 4), foi possível perceber a necessidade de G contar os objetos, para identificar o numeral correspondente, mesmo em pequenas quantidades, como o 3 e 4. Além disso, conta de forma desordenada e por vezes necessita repetir a contagem.

Figura 4 - Atividade de contagem construída no software JClic

Um dos problemas aplicados (figura 5) teve como principal objetivo verificar se G percebia as informações numéricas com seus dois registros: por extenso e representado por seu numeral.

Figura 5 - Atividade de resolução de problemas

Duas informações numéricas foram apresentadas neste problema: G tem três amigos e Clara tem 8 anos. Na pergunta: quantos amigos G têm, ele respondeu rapidamente e sem refletir 8, porque percebeu apenas o número 8, que estava representado por seu numeral.

Mesmo relendo o problema não percebeu o número três, e com auxílio do cursor contou quantos eram os amigos, contando os seus nomes. Em outros problemas com o mesmo objetivo G também não reconheceu os números escritos por extenso.

Nos problemas que exigiam utilizar a operação de adição na resolução, foi possível

verificar que G possui poucos fatos numéricos, que necessita utilizar os dedos das mãos,

mesmo para pequenas quantidades. Após ser explicado que poderia colocar o maior dos

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números “na cabeça” e partir deste para acrescentar a outra parcela, adotou esse procedimento, mas esquecia de uma semana para outra. Além disso, demonstrou apreensão quando a adição ultrapassava uma dezena. Para subtrair G utilizou o recurso de desenhar traços para representar o minuendo, riscando a quantidade que representa o subtraendo e contando os traços restantes para encontrar o resto. Quando as quantidades eram pequenas utilizou os dedos das mãos, como por exemplo, para realizar a operação 3 – 1.

Para verificar o conhecimento de G sobre as unidades de medida de tempo (horas, minutos, dias da semana, meses) e a leitura de relógios analógicos foi criada uma sequência didática, no software Jclic, com 26 atividades. G não conseguiu resolver grande parte das atividades, conseguindo apenas ler os relógios que marcavam a hora exata, mesmo assim sem conseguir diferenciar quando era dia ou noite. Além desse aspecto G não responde corretamente o horário em que realiza atividades rotineiras, como acordar, fazer as refeições, ir à escola, entre outros, além de não ter domínio da sequência dos dias da semana e dos meses do ano.

CONCLUSÃO

É importante salientar que G ainda está na fase decodificadora em relação à leitura, unindo pausadamente as sílabas para formar as palavras e não respeitando as pontuações, o que dificulta a leitura interpretativa, interferindo na compreensão e na resolução de problemas.

Quanto à memória, em diferentes sessões, G deixou evidente, em função de suas atitudes, que esquecia, de uma semana para outra, do significado de palavras, de conceitos e de estratégias utilizadas por ele. Por exemplo, para adicionar, colocar o número maior “na cabeça”. Na análise da filmagem da sessão oito, percebeu-se que uma das atividades chamou especial atenção de G, pois este comentou que era linda e que deveria ter sido muito difícil construí-la. Para averiguar a sua memória, depois de duas semanas, a atividade foi repetida.

Questionado sobre a mesma G afirmou que “não se lembrava de ter realizado esta atividade”.

Os problemas de lidar com números e as situações relacionadas a eles, são citados nos estudos da Rede Sarah de Hospitais de Reabilitação (2007), Tabaquim (2007) e Martínez (2004). Durante as sessões de estudo essas afirmações foram comprovadas, pois o aluno apresenta despreparo diante de problemas que envolvem números e operações.

Os estudos de Barnes (2005, 2006) em crianças e adultos com Espinha Bífida em

relação ao número e operações aritméticas, salientam que, não obstante ao seu status de

leitura, têm dificuldades com a estimação numérica, a recuperação de fatos que envolvem

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números, com contagem verbal, visão espacial e em resolver problemas aritméticos, tanto em crianças como em adultos.

Para dar continuidade a essa investigação será criada uma sequência didática individualizada, com diferentes recursos didáticos, que terá como objetivo central, a autonomia social de G em Matemática. Entende-se por autonomia social em Matemática a compreensão das operações de adição e subtração, do sistema de unidades de tempo, do sistema monetário, da utilização da calculadora e da resolução de problemas do cotidiano.

Consideram-se estas as competências matemáticas básicas que permitem ao indivíduo realizar pequenas compras e se localizar no tempo e no espaço.

REFERÊNCIAS

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Referências

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