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UMA FOLHA LITERÁRIA RIO-GRANDINA SOB UMA PERSPECT

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UMA FOLHA LITERÁRIA RIO-GRANDINA

SOB UMA PERSPECTIVA

HISTÓRICO-HISTORIOGRÁFICA

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FRANCISCO DAS NEVES ALVES' LUIZ HENRIQUE TORRES'

RESUMO

Ao final da década de 1860, a imprensa rio-grandina passava por um processo de crescimento e diversificação dos gêneros jornalísticos a circularem pela cidade. Nesse quadro, desenvolveu-se uma imprensa literária, cujo norte dos periódicos era a propagação de escritos, atividades e instituições que estivessem ligadas

A

à divulgação da literatura através da Província. Uma dessas folhas foi

a

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Arcadia, cuja importância foi marcante no contexto literário sul-rio-grandense. Este trabalho intenta estabelecer um breve histórico desse jornal, durante sua fase rio-grandina, bem como analisar sua fundamentação historiográfica.

PALAVRAS-CHAVE: Arcadia, imprensa, literatura, história.

1 INTRODUÇÃO

A imprensa rio-grandina no século XIX, uma das mais importantes no

contexto sul-rio-grandense, tanto pela antigüidade quanto pela longevidade

de suas folhas, teve a sua origem na década de trinta e, desde então, até os

anos quarenta, houve um amplo predomínio do jornalismo político-partidário,

marcado pelo confronto entre farroupilhas e legalistas e pelos demais

eventos da Revolução Farroupilha.

Já no período seguinte, compreendido entre a segunda metade da

década de quarenta e o final dos anos sessenta, a imprensa da cidade do

Rio Grande cresceu quantitativa e qualitativamente, com o surgimento de

grande número de jornais, alguns deles com razoável aprimoramento

tipográfico; além disso, nessa época, apareceram a maior parte dos grandes

diários rio-grandinos, como o R io-G randense (1845-1858), o D ia rio do R io

G rande (1848-1910), o C om m ercial (1857-1882), o Echo do Sul (1858-1937)

e oArtista (1862-1912).

Nessa segunda fase, o jornalismo rio-grandino passou por uma etapa

de significativo crescimento numérico, assim como por um processo de

diversificação, com a prática de diferentes estilos jornalísticos. De um lado,

• Professores do Dep. de Biblioteconomia e História - FURG.

(2)

II

IIII

I

manteve-se o jornalismo opinativo, através dos pasquins, os quais

colocaram de forma predominante, junto dos conflitos políticos já tradicionais

nos periódicos desde a fase anterior, os confrontos de cunho pessoal. Do

outro, estavam as folhas noticiosas, praticando um jornalismo

predominantemente informativo, e as literárias, visando um jornalismo mais

ameno, através da divulgaçao da literatura.

O jornalismo literário rio-grandino se desenvolveu desde a década de

sessenta até a virada do século XIX para o XX, com tftulos como

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Inubia

(1868), A G rinalda (1870-1), a Violeta (1878-9), o Arauto das Letras (1884),

o Litterato (1889), A Lanterna (1893-4), o C orreio Literário (1900) e O

R ecreio (1901), todos de curta duração e enfrentando amplas dificuldades

para garantirem a manutenção de sua

círcuíação.

Já o ápice da imprensa

literária rio-grandina foi representado pela sua folha mais organizada e

.perene - aArcadia.

A Arcadia teve um significativo papel no contexto literário regional, ao

congregar em suas páginas alguns dos mais destacados representantes da

intelectualidade gaúcha de então, constituindo o estudo dessa folha literária

o objeto deste trabalho. Na primeira parte, entabula-se um breve histórico do

jornal durante sua fase rio-grandina (1867-9), destacando seus aspectos

formais, padrão editorial, princípios programáticos e objetivos de redação. Já

na segunda parte, realiza-se um levantamento preliminar das orientações

historiográficas presentes na publicação.A

2 A FASE R10-GRANDINA DA ARCADIA: UM BREVE HISTÓRICO

Os últimos anos da década de 60 foram marcados pelo surgimento de

um novo gênero de imprensa na cidade do Rio Grande, os jornais literários.

Mesmo que uma parte dos periódicos já se dedicassem à divulgação

literária, isso era feito de forma complementar e, em geral, a literatura

representava uma das seções das folhas. A imprensa literária, por sua vez,

consagrava-se de forma total ou praticamente integral ao desenvolvimento

da arte literária. Esses periódicos, vencendo uma série de obstáculos que

dificultavam a sua circulação 1

, tiveram fundamental importãncia para o

t A Inubia, uma folha literária contemporânea da Arcadia, comentava sobre essas

dificuldades, na edição de 5 de abril de 1868, em artigo intitulado "Redator", fazendo uma bem-humerada descrição dos obstáculos enfrentados pelos redatores para a composição de um periódico. Diante da argumentação de que a vida dos 'publicistas" era fácil, reagia, negando-a, quando se tratasse de folha literária, se comparada aos outros gêneros em circulação na época Destacava que, quando o periódico era 'comercial ou noticioso", a situação era mais simples, podendo-se publicar um "inesgotável catálogo das chegadas e saídas de pessoas i1ustres-, os preços dos mais variados produtos, "boatos falsos sobre a guerra", e, como 'siJbfune recurso', havia a possibilidade dos anúncios. Na mesma linha, destacava as

1 2 BIBlOS, Rio Grande, 10: 11-20, 1998.

enriquecimento cultural da Província, pois, tendo em vista o alto custo dos

livros, eles serviram para popularizar a leitura e para a divulgação da

incipiente literatura local e regional.2

A primeira folha literária rio-grandina foi a A rcadia , editada na cidade

entre 12 de maio de 1867 e 19 de julho de 1869. Considerava-se como um

jornal "literário, histórico e biográfico", pretendendo ser também "ilustrado".

Era semanal e custava 500 réis o número avulso e 10$000 a assinatura

anual, sendo impressa, no início, na Tipografia do D iario do R io G rande e,

posteriormente, em tipografia própria de seu diretor, Antônio Joaquim Dias"

Esse periódico utilizava uma técnica de publicação bastante diferenciada

para os moldes jornalísticos então praticados na cidade, através da qual

cada um dos jornais correspondia a um fascículo, cuja reunião permitia a

elaboração de um livro.

Pouco antes do surgimento do jornal, seu diretor anunciava o seu

lançamento, associando a idéia da presença de uma folha literária, com uma

das mais típicas características da cidade do Rio Grande do século XIX, ou

seja, o objetivo de transformar o principal porto da Província numa

localidade na qual se fizessem presentes os bafejas civilizatórios e

progressistas típicos de um moderno sítio urbano nos moldes europeus.

facilidades do redator de uma folha política, que podia proclamar, "num artigo de fundo, idéias de um extremo republicanismo, ou monarquismo", atacava ou elogiava o ministério e os deputados, falava "da vida alheia", enfim, vociferava "contra tudo". Já o redator de uma folha de tendência literária passava por problemas de bem mais difícil solução, principalmente quando os textos prometidos não eram encaminhados e, para que o jornal não ficasse incompleto, tinha de recorrer a "extrações de outras folhas"; isso, porém, não agradava os leitores exigentes, fazendo com que o próprio redator, á última hora, tivesse de, "por força, escrever alguma coisa".

2 De acordo com Baumgarten & Silveira, "o desenvolvimento da literatura

rio-grandense do século XIX está intimamente vinculado ao aparecimento da imprensa (...). Sabe-se que o grande número de periÓdicos literários, notadamente a partir da segunda metade do século, teve efetiva influência na produção literária" da Provincia "e na sua conseqüente diVUlgação. Os primeiros autores rio-grandenses recorriam aos órgãos de imprensa devido às grandes dificuldades que encontravam para a publicação e difusão de suas obras" (BAUMGARTEN, Carlos A!::;';clndre, SILVElRA, Carmem Consuelo. O Partenon Literário imprensa e sociedade literária. In: ZILBERMAN, Regina et aI. O Partenon Literário.' poesia e prosa. Porto Alegre: Escola Superior de Teologia São Lourenço de Brindes, Instituto Cultural PortugUês, 1980. p, 12).

3 Segundo Guilhermino Cesar, "Antônio Joaquim Dias, de nacionalidade portuguesa,

veio ainda jovem para o Rio Grande do Sul e fundou na cidade do Rio Grande o periódico

Arcadia, em Pelotas, o Jornal do C om ércio" e, "em 1875, o Correio M ercantil. A idéia da criação da Biblioteca Pública Pelotense foi sugerida eamparada por ele, numa das campanhas do seu jornal. (... ) A tenacidade com que Antônio Joaquim Dias, naqueles tempos. manteve a sua publicação (...) revela o admirável espirito de luta de uma geração. Bem cuidada. bem impressa, publicando o que se escrevia de melhor na Província, a Arcadia por mais de três anos divulgou exclusivamente matéria literária e pesquisas históricas" (CESAR. Guilhermino.

H istória da literatura no R io G rande do Sul. 2.ed. Porto Alegre: Globo, 1971. p. 166-167).

,..- ..

BIBLOS, Rio Grande. 10 11-20.1998. ~\fi'1 tOY~CA

1 3

ri . ~ ••"J ._. ' . - . b ~

(3)

Assim, Antônio Joaquim Dias argumentava que a cidade se ressentia,

"desde longa data, de um jornal que exclusivamente se dedicasse ao cultivo

e desenvolvimento da literatura", de modo a "adquirir noções para, com

saber, acompanhar os rápidos passos do progresso e civilização dos

povos". Dias considerava que o Rio Grande seria taxado "de retrógrado, se,

por qualquer subterfúgio, deixasse de dar impulso e sustentar com orgulho

um jornal que lhe proporcionasse como apreciar as lucubrações de seus

talentos e os harmoniosos cantos de seus vates"A4

Ainda ao anunciar a folha, o diretor garantia que a

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Arcadia se

dedicaria "íntima e exclusivamente às letras e literatura nacional, história

pátria, ciências, artes e costumes", assim como à "descrição de figurinos da

moda, considerações sobre o bem geral, estudos da língua e sducaçáo"."

Desse modo, o periódico desenvolveu-se em quatro "séries" (1867,

1868, 1869 e 1870), as três primeiras na cidade do Rio Grande. Na primeira

"série", o diretor apresentava o jornal como "um novo propagador da

literatura" e um "modesto arauto da civilização". Prometendo·-afastar-se dos

confrontos políticos ou pessoais que marcavam a imprensa, garantia que a

Arcadia estaria "alheia a esse rumor contínuo" no qual se agitava "o

jornalismo em geral" e venceria todas as dificuldades que lhe

obstacularizariam o caminho, tendo em vista "a dignidade de sua rnissào".

Depositava toda a confiança no público leitor, pois considerava que "pedir

auxílio para uma empresa" daquela ordem significava "apenas reclamar um

direito que os modernos tempos deviam ao progresso e civilização das

gerações", pois as letras representavam "a vivificante luz da razão"

(12/5/1867). Anunciava também que, além da parte literária, o jornal se

dedicaria às biografias e às gravuras de bustos e paisagens.

A primeira "série" trazia, junto dos textos literários em prosa e verso,

uma série de ensaios sobre outros assuntos, como: "Apontamentos

históricos, topográficos e descritivos da cidade do Rio Grande", "Cura da

cólera-morbus", "Apontamentos para a história da Revolução da Província

do Rio Grande do Sul", "A Guerra do Paraguai", "Brasil no século passado",

"Servidão no Brasil" e uma "Biografia de Andrade Neves"; além desses

estudos, eram publicados pensamentos, charadas e logogrifos.

A folha literária foi bem recebida pelos demais jornais rio-grandinos,

como no caso do Echo do Sul, ao noticiar que aquele periódico soubera

"corresponder à altura de seu programa, e que, a continuar assim, poderia

prestar bons serviços à literatura pátria", e ainda, que "o trabalho artístico da

Arcadia era perfeito", nada deixando "a desejar aos outros jornais de igual

gênero que se publicavam no Império e no estrangeiro"e, O D iario do R io

4 DIAS, Antonio Joaquim. Arcadia. Echo do Sul. Rio Grande, 23 mar. 1867. p. 2. 5 DIAS, 1867, p. 2.

6 ECHO DO SUL. Rio Grande, 12 maio 1867. p. 1.

BIBLOS. Rio Grande. 10: 11-20. 1998.

1 4

G rande destacava o caráter lúdico do jornal literário, ao descrevê-Io como

"exclusivamente dedicado à literatura e à história" e considerando-o como

"um ensaio de inteligências novéis" que prometiam, se fossem

"perseverantes, ofertar um agradável passatempo literário"?

O C om m ercial, por sua vez, apontou a Arcadia como "uma tentativa

útil, um campo aberto para nele colher sazonados frutos", uma vez que seus

articulantes se dignassem a "desempenhar o dever que a natureza

impôs-lhes". doando seus escritos "com subida inteligência, adornada e

desenvolvida pelos estudos". Neste sentido, aquele jornal diário pressagiava

para a folha literária "um risonho futuro", desde que esta não se afastasse de

seu cunho essencialmente literário e de que "o público amante das letras

compreendesse a necessidade de manter uma publicação hebdomadária

que renunciava a toda e qualquer intriga política, religiosa ou particular"."

Ao final de 1867, o diretor do jornal novamente dirigia-se ao público

para demarcar o encerramento da primeira "série", argumentando que tinha

empreendido "um lidar incessante" para superar os sacrifícios de um "árduo

e consecutivo trabalho" que resultara em "mãos calejadas, corpo cansado e

espírito atribulado". Destacava também o papel do "escritor público", naquele

momento, no qual o responsável pelo jornal, muitas vezes, assumia todas as

funções para a sua elaboração, pois, na impossibilidade de contratar

operários, fazia o "trabalho tipográfico", imprimia e distribuía a folha, além da

própria "contribuição intelectual" como um dos redatores. Orgulhava-se, no

entanto, de que a Arcadia pudesse contar "com uma ilustrada plêiade de

inteligentes colaboradores", os quais tornavam-se "os firmes sustentáculos

da estabilidade" do jornal. Também era motivo de orgulho o fato de a folha

não ter arredado "um só passo do caminho" antecipadamente estabelecido,

mantendo-se "sempre e exclusivamente literária".

Na "Introdução" à segunda "série" da Arcadia, encontravam-se a

renovação dos intentos puramente literários e uma crítica a outros periódicos

literários que se desviaram de seus rumos editoriais:

A literatura é o prim eiro elem ento da civilização dos povos.

N ecessária e útil, é sobre suas bases que sustentam -se os

m onum entais edifícios do progresso e da riqueza, ao tem po que

torna-se o m ais sublim e ornam ento de um a sociedade. (.. .)

À "Arceoie" sucederam -se na Província outros pequenos periódicos

que inculcavam -se literários, - porém quanto tem po perseveraram ,

quase todos, em bons princípios? Sem quererm os ofender,

lam entam os que, alguns deles, aberrando suas doutrinas, tenham -se

tornado vozes isoladas de paixões pessoais ou postes infam antes

7 OlARia 00 RIO GRANDE. Rio Grande, 13-14 maio 1867. p. 1. 8O COMMERCIAL. Rio Grande, 13-14 maio 1867. p. 2.

(4)

onde jungem -se honras

A

e reputações.

zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

A "Arca dia " nunca chafurdou nesses pantanais (. ..) e jam ais

representará em cenas tão asquerosas, porque o seu fim é 'dar

increm ento às letras pátrias, instruindo edeleitando. (16 fev. 1868).

No final da segunda "série", a direção da Arcadia comemorava "a

aurora da literatura", considerando-se responsável pelo crescimento da

imprensa literária na Província:

H á pouco m ais de um ano não havia umjornal literário na

Província. Surgiu a "Arca dia " (perdoem -nos a vaidade), e esse

prim eiro grito ecoou no coração dos verdadeiros am igos das letras e

da civilização. (. ..) D ez jornais, m ais ou m enos literários, têm

aparecido depois da "Arcadia": uns sucum biram , outros existem ,

cheios de vida e anim ação, esperançados no futuro que se antolha

risonho (27 out. 1868).

Na terceira e última "série" no Rio Grande, a Arcadia manifestava a

intenção de permanecer estritamente nas lides literárias, mantendo os

objetivos iniciais e lamentando o desaparecimento de um grande número de

folhas literárias rio-grandenses:

Jam ais desanim am os, na esperança única de um dia ver o resultado

das nossas fadigas. (. ..)

C rem os ter cum prido o nosso dever (. ..).

N inguém terá visto a "Arcadia" im ergir-se nos pauis da calúnia e da

intriga. (. ..)

A "Arcadia", com saudade, tem visto desaparecer um a um os seus

am igos de infância e com panheiros de jornada. N ão que seja m ais

vigorosa, é que sem pre teve m ais ânim o que eles; - não que conte

m ais recursos, é que dispõe de m ais vontade. Assim é que de um a

im ensidade de jornais exclusivam ente literários publicados na

província depois deseu aparecim ento, umnão existe!

E se isto é um pesar, tam bém é um a glória.

Alguém qualificou a "Arcadia" [como] heroína da pugna literária

(19 jul. 1869).

A quarta "série" da Arcadia foi publicada em Pelotas, devido ao

deslocamento de Antônio Joaquim Dias para aquela cidade. Durante a sua

existência, o jornal teve por colaboradores alguns dos mais destacados

nomes da literatura rio-grandense. como Apolinário e Aquiles Porto Alegre,

Aurélio de Bitencourt, Bernardo Taveira Júnior, Fernando Luiz Osório e

BIBLOS. Rio Grande. 10: 11-20. 1998.

16

Menezes Paredes, entre muitos outros. Assim, a Arcadia, como a "heroína

da pugna literária", marcou a sua época, servindo como fonte inspiradora e

dando incentivo à proliferação de jornais literários através da Provincia."

3 A HISTÓRIA NAS PÁGINAS DAARCADIA

A produção historiográfica do Rio Grande do Sul até a década de

1870 esteve voltada à conquista territorial e ao povoamento, pouco

identificada com os interesses regionais (salvo raras exceções) e na qual

avultam os viajantes estrangeiros e os funcionários delegados pelo governo

c e n t r a l " . Em 1855 foi fundado em Porto Alegre o Instituto Histórico e

Geográfico da Província de São Pedro, que em 1860 lançou uma revista que

foi editada até 1863. Os objetivos do Instituto eram os de "coligir, metodizar,

publicar e arquivar os documentos concernentes à história e topografia da

Província, e à arqueologia, etnografia e língua de seus indíqenas"!'. A

vinculação do Instituto a um ideário ligado ao papel militar e de constantes

guerras com os vizinhos platinas buscava resguardar ao Rio Grande do Sul

a nacionalidade brasileira e o vínculo com o Império:

A história do passado, com o do porvir desta província, não será um

m onum ento de exclusivo interesse para ela; não, os sucessos m ais

notáveis aqui passados estão intim am ente ligados à vida do Im pério,

que não haverá brasileiro que os não leia com o um a narrativa da

história geral do país. Os bravos que derram aram seu sangue nas

guerras da colônia, da Independência nacional, do Estado O riental,

9 Carfos Baumgarten destaca a importância do periódico: "dedicando-se

exdusivamente à difusão da literatura, publicou (...) poesias de nossos autores mais

representativos, bem como romances, contos, textos criticos e correspondência entre homens ligados ao movimento cultural da Província". O autor aborda também a importância e o apoio da Arcadia para o Partenon Literário, que se tornaria uma das mais importantes instituições culturais rio-grandenses (BAUMGARTEN, Carlos Alexandre. Literatura e crítica na im prensa do Rio G rande do Suf ( 1 8 6 8 a 1880). Porto Alegre: Escola Superior de Teologia São Lourenço de Brindes, 1 9 8 2 . p_2 6 - 2 7 ) .

ra AlMEIDA. Marlene_ Introdução ao estudo da historiografia rio-grandense: inovações e recorrénctas do discurso oficial (1920-35). Dissertação (Mestrado em Sociologia) Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 1983, p. 84.

t t CALDRE E FIÃO, José Antônio do VaUe (Relatar). R evista trim estral do Instituto

H istórico e G eográfico da Província de São Pedro. Porto Alegre, Tipografia do Conciliador, n, 1, ago. 1 8 6 0 _Reprod6zido pela Revista do Instituto H istórico e G eográfico do Rio G rande do

SU f,Porto Alegre, Imprensa Oficial do Estado, n. 100, 4. trim. 1945, p. 173. Os estatutos ainda previam a filjação ao Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e publicação de um folheto trimestral, que tivesse pelo menos doze folhas de impressão, com o titulo de R evista Trim estral do Instituto H istórico e G eográfico da Província de São Pedra. Foram editados seis números da Revista.

(5)

em penharam -se por lutas nacionais,

zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

os sucessos acontecidos nela

eram ou deviam ser registra dos na história geral do país. O que há de

particular

A

é som ente civil, só os seus sucessos são os que tocam

individualm ente .12

mesma batalha: "a da divulgação de nossa história - a história do nosso

pago - e a da cultura de nosso povo, incentivando nele o amor ao que é

nosso, rio-grandense e, por isso, profundamente brasileiro". 1 5

A historiografia até 1870 é rarefeita em número de publicações. A

prim eira história do R io Grande do Sul, os Anais de José Feliciano

Fernandes Pinheiro, persistiu como obra de referência m ais consistente

desse período. O livro alia pesquisa documental com um relato linear e de

tempo breve, característico da história factual. A interpretação de uma

formação histórica portuguesa, mas onde o Prata não é um "corpo estranho"

ao Brasil, é associada à aversão à obra da Companhia de Jesus e ao apoio

à prática pombalina anti-jesuítica. Os trabalhos deAntônio Câmara eAntônio

Camargo, mantêm-se fiéis aos princípios monarquistas e bragantinos do

Im pério. Os poucos trabalhos disponíveis fazem com que a produção de

cronistas como Augusto Saint-H ilaire, N icolau Dreys, Arséne Isabel/e,

Joseph Hbrmeyer e Robert Avé-Lal/emant torne-se fonte de consulta e

citação de observações, quase sempre de acentuado cunho etnocêntrico e

destituídas de uma pesquisa em fontes documentais. A criação do Instituto

H istórico e G eográfico da Província de São Pedro e seu curto período de

atuação comprovam a ausência de uma com unidade intelectual efetiva. O

m ovim ento republicano e a defesa federalista desencadeados nas duas

últimas décadas do século XIX trazem uma diversificação e ampliação dos

estudos. A adesão do rio-grandense ao Im pério será questionada, numa

releitura de resgate dos prinC ípios de autonomia presentes na Revolução

Farroupilha, e na busca de uma identidade republicana para o R io Grande

do Sul.

Na apresentação do prim eiro exemplar da Arcadia, em 12 de m aio de

1867, Antônio Joaquim D ias ressalta que "as letras são a vivificante luz da

razão", acreditando que "os sábios sempre aprendem, e as sociedades

requerem para seu grêm io membros que as ilustrem e acendam os fachos

do saber em proveito do raciocínio e legítim a rnorar'". Nesta busca da razão

através das letras, a história recebeu um permanente espaço ao lado da

poesia e crônica.

Os estudos históricos aparecem constantemente na Arcadia e tratam

basicamente de três temas centrais: a Revolução Farroupilha, a Guerra do

Paraguai e a H istória da cidade do R io Grande 1 7 A narrativa historiográfica

1 SSPALDING, Walter. A revista do velho Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande

do Sul (reedição). R evista do Instituto H istórico e G eográfico do R io G rande do Sul. Porto Alegre, Imprensa Oficial do Estado, n. 100, 4. trim. 1945, p. 169.

1 6 DIAS, A. J. Ao público. Arcadia, Jornal ilustrado, literário, histórico e biográfico Rio

Grande, p, 7, 1867.

1 7 Outros assuntos de caráter histórico também são esporadicamente tratados: Brasil

no século passado; Restauração de Portugal; documentos sobre a Revolução desta Província (1835-45); Vila de Piratini - notícia hístórica, topográfica e descritiva.

/

O papel dos rio-grandenses/seria o de resguardar as fronteiras do

im pério contra agressões. O Rio Grande do Sul era definido como o teatro

de contínuas guerras. As finalidades presentes quando da criação do

Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro" eram semelhantes às do Instituto

criado na província do Rio Grande do Sul. Na R evista do Instituto foram

publicados documentos político-administrativos (decretos, atas, levantamento

geográfico e estatístico da Província, notícias topográficas e discursos de

sócios ou autoridades. O caráter descritivo das notícias geográficas,' de

campanhas militares e de povoamento estava associado ao papel do Rio

Grande do Sul como defensor dos interesses patrióticos ligados ao Império

brasileiro. Sobre as Missões, somente um levantamento da população

missioneira foi apresentado por Manoel da Silva Pereira do Lago,

referindo-se ao estado de decadência dos antigos povoados missioneiros e da

população guarani: "deveriam ter administradores, para os obrigarem ao

trabalho, porque os índios jamais serão capazes de se manterem sem que

sejam administrados, e ao contrário andarão como andam, vagando por toda

a' parte, cometendo imensos roubos e assassinatos, tudo por falta de polícia,

que os obriguem ao trabalho"!'. Porém, jesuítas ou guaranis não eram alvo

de considerações relativas ao período colonial. Foram publicados

documentos que enfatizam a normalidade da vida administrativa sem

maiores contribuições ao campo da política ou da formação histórica, pois a

identidade rio-grandense era associada ao papel militar e ao heroísmo de

sua população na defesa dos princípios de unidade do Império. Conforme

Walter Spalding, num comentário geral à R evista, "há nela, é bem verdade,

trabalhos de pouco valor e anotações desprovidas de qualquer interesse

atualmente". E complementou, sobre a veneração àqueles que batalharam a

1 2 CALDRE E FIÃO, Revista trim estraL., op. cit., p. 171. Além de José Antônio do

Valle Caldre e Fião, tiveram uma participação atuante, no Instituto, Manuel Marques de Souza (Conde de Porto Alegre) e Manoel Ferreira da Silva.

1 3Criado em 16 de agosto de 1838, o artigo 1.° dos Estatutos do Instituto, sediado no

Rio de Janeiro, serviu de modelo para o Instituto criado no Rio Grande do Sul: "O Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro tem por fim coligir, metodizar, publicar ou arquivar os documentos necessários para a história e geografia do Império do Brasil" (Revista do Instituto H istórico e G eográfico do Brasil. 3.ed. Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, n. 1, 1. trim. 1839, reimpressão do original, 1908).

1 4 LAGO, Manoel da Silva Pereira do. Notas anexas ao mapa que apresento ao limo.

Sr. Dr. José Marcelino da Rocha Cabra/. R evista do Instituto H istórico e G eográfico da Província de São Pedro, n. 1, 1860. Revista do Instituto Histórico e G eográfico do R io G rande do Sul, Porto Alegre, Imprensa Oficial do Estado, n. 100, 4. trim. 1945, p. 193.

1 8 BIBLOS. Rio Grande. 10:11-20, 1998

BIBLOS. Rio Grande. 10: 11-20.1998.

(6)

prende-se ao desenrolar dos acontecimentos através de uma leitura dos

fatos politicos, numa seqüência linear e cronológica, sem análises de caráter

social ou econômico O, realce do caráter heróico e do exemplo moral de

alguns personagens ~"o referencial que conduz uma narrativa com

acentuado cunho teleológico: personalidades que se destacam em

detérminada época, canalizam as aspirações e traduzem os anseios de

segmentos sociais majoritários, sintetizam o momento histórico a partir da

ação individual. Uma matéria sobre a utilidade da história converge para o

conhecimento histórico enquanto uma "escola moral para todos os homens",

afinal "ela descreve os vicios, desmascara as falsas virtudes, desengana os

prejudicados e dissipa o prestígio encantador das riquezas e de todo este

vão brilho que deslumbra os homens, ela demonstra por mil exemplos mais

persuasivos que todos os raciocinios, que há ai de grande e de louvável

senão a honra e a probidade"18 O paradigma historiográfico idealista está

claramente presente nestes enfoques que privilegiam os atos individuais

enquanto expressão do coletivo. A presença de componentes positivistas,

como o recurso linear, cronológico, factual, episódico, e especialmente a

legitimação de estar respaldando em documentos históricos a análise

desenvolvida, indica a conciliação entre os paradigmas positivista e idealista,

na leitura do passado histórico. Esse encaminhamento teve continuidade na

historiografia nas décadas sequintes."

Como ficou constatado nesta análise, a

mlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

Arcadia, além do

encaminhamento literário, também apresentou espaço para ensaios sobre o

passado rio-grandense e brasileiro. A valorização do conhecimento histórico

enquanto um referencial para o presente funda-se num acentuado caráter

idealista canalizado num discurso factual que garantiria o estatuto de

cientificidade deste saber.A

1 8 ULRICH, A. L. Utilidade da história. Arcadia, Jornal ilustrado, literário, histórico e

biográfico. Rio Grande, p. 105, 1867.

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Referências

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