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A relação entre unisidade, migração e comunicação: um estudo com histórias de vida midiática de estudantes cabodianos da Unisidade Federal do Ceará

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Academic year: 2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ INSTITUTO DE CULTURA E ARTE

CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL – HABILITAÇÃO EM JORNALISMO

CARLINA ROSS LIMA SANTOS

A RELAÇÃO ENTRE UNIVERSIDADE, MIGRAÇÃO E COMUNICAÇÃO: UM ESTUDO COM HISTÓRIAS DE VIDA MIDIÁTICA DE ESTUDANTES

CABO-VERDIANOS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

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CARLINA ROSS LIMA SANTOS

A RELAÇÃO ENTRE UNIVERSIDADE, MIGRAÇÃO E COMUNICAÇÃO: UM ESTUDO COM HISTÓRIAS DE VIDA MIDIÁTICA DE ESTUDANTES

CABO-VERDIANOS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

Monografia apresentada ao curso de Comunicação Social - Jornalismo - da Universidade Federal do Ceará, como requisito para obtenção do título de Jornalista.

Orientadora: Profa. Dra. Deisimer Gorczevski.

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CARLINA ROSS LIMA SANTOS

A RELAÇÃO ENTRE UNIVERSIDADE, MIGRAÇÃO E COMUNICAÇÃO: UM ESTUDO COM HISTÓRIAS DE VIDA MIDIÁTICA DE ESTUDANTES

CABO-VERDIANOS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

Monografia apresentada ao curso de Comunicação Social - Jornalismo - da Universidade Federal do Ceará, como requisito para obtenção do título de Jornalista.

Aprovada em ___/___/______.

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________ Profa. Dra. Deisimer Gorczevski (Orientadora)

Universidade Federal do Ceará - UFC

___________________________________________ Profa. Dra. Sandra Haydee Petit

Universidade Federal do Ceará - UFC

___________________________________________ Profa. Dra. Andrea Pinheiro Paiva Cavalcante

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AGRADECIMENTO

Primeiramente, gostaria de agradecer a Deus, que tem permanecido comigo sempre e me fez chegar até aqui, pois sei que é Ele quem tem me guiado e me capacitado.

Aos meus pais, Cândida e Paulino, meus irmãos, Anny, Lina, Celly, Rosy, Ety e Andy, sobrinhos, Perly, Ryan, Zé, Quintin, Paulinho e Nany, cunhados, Adriano, Peter, Guga e Emanuel e, em especial, ao Magno, que sempre está ao meu lado, me apoiando em todos os momentos. A todos os meus familiares que, com muito carinho, esforço e apoio, não mediram forças para que eu chegasse até aqui, alcançando esta etapa muito importante da minha vida, me incentivando a cada dia, para que eu não desistisse, permanecendo firme até o fim. Às minhas colegas de casa, minha querida prima Stephanie, Mel, Madá e Dirce, aos meus amigos da faculdade e da Igreja Adventista Central de Fortaleza, obrigada pelo acolhimento, amizade, pelos trabalhos que juntos realizamos, os momentos de reflexão, superação, alegria, entre outros. Enfim, a todos os meus amigos brasileiros e cabo-verdianos, Aida, Kátia, Rita, Diltino, Rui, Tania, Carmen, Júlia, Stephane, Michel, Airton, Lucy, Fredy, e para todos, que mesmo tão longe, fizeram-se bem presente durante esses quatro anos.

Aos meus professores e à orientadora, Deisimer Gorczevski, pelo encorajamento à pesquisa até nos momentos quando eu não acreditava que iria conseguir, não me deixando desistir e me ajudando a olhar a pesquisa com outros olhos. Às professoras Sandra Petit e Andrea Cavalcante que, de uma forma especial, aceitaram fazer parte da banca. E aos demais mestres da casa, gratidão pelos conhecimentos ensinados, pela paciência e dedicação na arte de fazer pensar sobre o saber. Ao coordenador do curso de Comunicação Social, Riverson Rios, e à Universidade Federal do Ceará, obrigada pela oportunidade de aqui estudar e pelo apoio institucional, através do convênio PEC-G.

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RESUMO

A pesquisa enfatiza os temas de Comunicação e Imigração e a relação com a Universidade. A escolha desses temas tem um sentido muito importante para mim, pois estou me formando em Comunicação Social – Jornalismo e, ao mesmo tempo, sou imigrante no Brasil. Nesse estudo, fiz o recorte entre os temas e a análise das experiências pessoais e acadêmicas de estudantes cabo-verdianos que migram para estudar na Universidade Federal do Ceará. A pesquisa apresenta dimensão qualitativa, buscando compor aspectos teórico-metodológicos, tendo como referências o método de História Oral, com a contribuição de Thompson (1992) trazendo, posteriormente, a história de vida midiática, apresentada por Bianchi (2008). Também foram realizadas observações e entrevistas com o objetivo de analisar como as mídias interferem nas decisões, escolhas e nos modos de viver e conviver dos estudantes migrantes, no país escolhido. Interessou também conhecer os usos que os estudantes fazem dos meios de comunicação antes de migrar, durante o deslocamento e no presente momento. Na pesquisa, foi possível constatar a presença dos meios de comunicação no processo de escolha e reconhecimento do lugar de imigração, bem como no estabelecimento de contatos com pessoas que vivem em Fortaleza. Os estudantes também afirmam a importância dos meios de comunicação na relação com o país de nascimento, durante o tempo de migração. Entre os meios de comunicação, a internet é o mais utilizado pelos imigrantes, sendo problematizado na pesquisa o conceito de “convergência dos meios de comunicação”. Um exemplo dos usos que os estudantes fazem da internet foi a criação de uma página, no

facebook, que possibilita a comunicação entre eles. No entanto, há pouco interesse dos estudantes em acessar os meios de comunicação da universidade, bem como em conviver com os brasileiros.

Palavras – chave: Comunicação, Universidade, Meios de Comunicação, Imigração e

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ABSTRACT

This research emphasizes the themes of Communication and Immigration and the relationship with the University. The choice of these themes is very important to me, since I'm majoring in Communication - Journalism and also, I am an immigrant in Brazil. In this study, I specifically address the themes and analysis of personal experiences and academic life among Cape Verdean students who migrate to study at the Federal University of Ceará. The research presents qualitative dimensions, seeking to build theoretical and methodological aspects, taking as reference the method of oral history, with contributions from Thompson (1992) bringing subsequently the life story media, presented by Bianchi (2008). We have conducted observations and interviews in order to analyze how the media interfere in the migrant students' decisions and choices or the modes of living and coexisting in the country selected. Also, we were interested to know the students utilized the media before migrating, during displacement and in the present moment. In research, we determined students utilized the media in the process of choosing the place of immigration as well as in establishing contacts with people living in Fortaleza. Students also affirm the importance of the media in relation to country of birth during the migration time. Among the media, the internet is the most used by immigrants, being questioned in the research the concept of "media convergence". An example of the primary use of media is students use the internet to create a page on facebook, which enables communication between them and others. However, there appears to be little student interest in accessing the media of the university or live with the Brazilians.

Keywords - Keywords: Communication, University, Media, Immigration and Cape Verdean

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 8

CAPÍTULO 1: UNIVERSIDADE, IMIGRAÇÃO E MEIOS DE COMUNICAÇÃO ... 10

1.1 Universidade e Comunicação ... 10

1.1.1 Festival de Cultura: "Ceará, África, Lusofonia: encontros e diálogos além mar" ... 22

1.2 Migração e a relação com os meios de comunicação ... 24

CAPÍTULO 2: METODOLOGIA DE PESQUISA ... 34

CAPÍTULO 3: A RELAÇÃO DOS ESTUDANTES CABO-VERDIANOS COM OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO E AS EXPERIÊNCIAS NA UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ ... 46

3.1 O papel dos meios de comunicação no processo de imigração ... 47

3.2 O uso dos meios de comunicação ... 49

3.3 A relação com os meios de comunicação na infância, na adolescência e na experiência como imigrante e estudante na UFC ... 56

3.4 Marcas e relações afetivas que lhes fazem lembrar Cabo Verde ... 58

3.5 Ser imigrante em Fortaleza segundo os estudantes cabo-verdianos ... 60

3.6 A relação com os meios de comunicação da UFC ... 63

3.7 Os meios de comunicação e o país de nascimento ... 64

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 67

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INTRODUÇÃO

Esta pesquisa parte da área de comunicação, voltando-se para pensar um pouco sobre a relação entre a universidade e os estudantes migrantes, especialmente, cabo-verdianos que estudam na UFC. Para iniciá-la, percorremos vários caminhos até encontrar pistas que nos levaram a pensar no tema da monografia. Das vivências, experiências, contato com outros estudantes, percebemos que teríamos um vasto caminho a desbravar.

A problemática e as perguntas que inquietaram e incitaram à pesquisa são as seguintes: Tendo universidades hoje em Cabo Verde, por que muitos estudantes ainda saem para estudar fora? Como eles se relacionam com os meios de comunicação e qual foi a contribuição destes no processo de imigração? Será que o contato com os meios de comunicação mudou depois da imigração? Quais as contribuições dos meios de comunicação na vida desses estudantes? Como os meios de comunicação interferem na relação dos estudantes cabo-verdianos com o país que escolhem para realizar a formação acadêmica? Como eles utilizam os meios de comunicação da universidade?

Sentimos a necessidade de abordar esse tema por ser algo que faz parte de nossa realidade, de nossas vivências todos os dias; e por conta da importância de se discutir isso, para poder deixar algum dado concreto na UFC, a fim de que a instituição possa conhecer um pouco mais os estudantes cabo-verdianos e contribuir, de alguma forma, para melhorar o relacionamento entre estes, a instituição de ensino e o convênio Programa de Estudantes-Convênio de Graduação (PEC-G)1, entre Brasil e Cabo Verde. Com este trabalho, pretendemos trazer contribuições que fortaleçam as conexões entre esses dois países, sendo um o nosso país de nascimento (Cabo Verde) e o outro onde realizamos nossa formação acadêmica (Brasil).

Começamos o trabalho fazendo uma pesquisa bibliográfica e documental a respeito da temática abordada, com a organização de um levantamento de livros e materiais impressos. Nesse sentido, tivemos como orientação os conceitos e palavras-chave da pesquisa: comunicação, universidade, imigração, meios de comunicação e estudantes cabo-verdianos na Universidade Federal do Ceará. Em seguida, iniciamos leituras e fichamentos de estudos teóricos e metodológicos.

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Com os estudos dos métodos de História Oral e História de Vida, encontramos referências de pesquisas voltadas à construção das histórias de vidas, considerando as relações dos sujeitos com os meios de comunicação, merecendo destaque os estudos de Bianchi (2008). Na composição dos métodos, foram realizadas observações e entrevistas semi- estruturadas com os estudantes e, a partir disso, tivemos bases para começar a escrever.

No primeiro capítulo, apresentamos a relação entre a universidade e a comunicação, destacamos algumas aproximações entre Cabo Verde e Brasil, por meio de relatos dos estudantes cabo-verdianosmigrantes em Fortaleza, e ainda um item abordando o tema “Migração e a relação com os meios de Comunicação”.

No segundo capítulo, trazemos a metodologia de pesquisa: o percurso, os métodos e procedimentos de estudo, como foi possível chegar nos estudantes, quem são eles (Curso, sexo, idade), quais foram os critérios de escolha, como chegamos à proposta de realizar entrevistas, como e onde foram feitas cada uma delas; e os autores com os quais dialogamos – aqueles que colaboraram na escolha metodológica.

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CAPÍTULO 1: UNIVERSIDADE, IMIGRAÇÃO E MEIOS DE COMUNICAÇÃO

1.1 Universidade e Comunicação

Ingressar em uma universidade é quase sempre algo temido e excitante para muitos. Depois de ter saído do país de nascimento2, sentido na pele, pela primeira vez, a experiência de ser imigrante, deixar a família para trás, não raramente, o estudante sente-se perdido, pois, além de estar em um país diferente, ele se vê em um meio rodeado por pessoas estranhas. Esse receio inicial não é nada que não possa ser ultrapassado, principalmente, com a semana dos “bichos” 3

: a recepção calorosa dos veteranos ajuda a quebrar o medo e o gelo criado, muitas vezes, pelo próprio novato.

A universidade passa a ser o “novo mundo” para o discente, onde este irá passar boa parte do tempo, por alguns anos. O espaço universitário é um centro de compartilhamento de conhecimento científico, cultural e até emocional, pois várias relações estabelecem-se dentro dessa instituição, as quais contribuem para o crescimento individual e profissional de cada um. As pessoas que embarcam no desafio de uma nova experiência acadêmica, às quais estamos nos referindo, são de um pequeno e pobre país, localizado na costa ocidental do continente africano, no Oceano Atlântico; descoberto e colonizado por portugueses em 1460/62; dependente do exterior ainda hoje, por ser desprovido de recursos naturais e riquezas para o sustento dos seus – o arquipélago de Cabo Verde.

Mapa 1- Ilhas de Cabo Verde

Fonte: Google.

2

Conceito que será abordado mais adiante, a partir da referência aos estudos de Cogo, Gutierrez e Huertas (2008).

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Mapa 2 - Localização das ilhas do arquipélago de Cabo Verde em relação à África:

Fonte: Google.

Como vemos, Cabo Verde fica na costa ocidental do Continente Africano, no Oceano Atlântico. Quando os portugueses ali chegaram, as ilhas estavam desertas, como podemos ver na voz do poeta Jorge Barbosa:

Quando o descobridor chegou a primeira ilha nem homens nus

nem mulheres nuas espreitando

inocentes e medrosos detrás da vegetação. [...] Havia somente

as aves canoras assobiando inéditas melodias. E a vegetação cujas sementes vieram presas

nas asas dos pássaros ao serem arrastadas para cá

pelas fúrias dos temporais.

(BARBOSA apud SANTOS, 2007, p. 13).

É-nos possível “visualizar”, em nosso imaginário, as condições em que se encontravam as ilhas quando elas foram descobertas pelos portugueses, mesmo sendo descritas na voz do poeta. Nas palavras de Santos (2007, p. 14-15):

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diferenças sociais, contudo a tendência decorreu no sentido de uma generalização da pobreza. Foram-se fixando, ao longo dos processos, as permutes culturais, fundidas em diferentes aspectos da vida diária, da estrutura social, das crenças, das formas musicais correntes, dos usos linguísticos, etc. Estava criada a sociedade crioula, consumada a transmissão cultural entre Europeus e Africanos, respondido o desafio da sobrevivência local.

Devido a sua localização geográfica e de acordo com o modelo do povoamento das ilhas, podemos dizer que Cabo Verde é um estado africano e europeu. Africano devido a sua posição geográfica e também pela cultura; europeu por seus colonizadores e pela cultura portuguesa imposta no país por eles, e assim nasceu a cultura cabo-verdiana:

Cabo Verde constitui o paradigma de Estado-arquipélago subdesenvolvido, cuja população cada vez mais numerosa vive fundamentalmente dos fracos recursos de uma agricultura de gêneros alimentícios de rendimentos relativamente baixos. (SANTOS, 2007, p. 21).

Nas palavras de Anjos (2002), em Cabo Verde, o país e seus governantes compõem o núcleo do poder como doador e também mediador de doações, ou seja um país de fracos recursos, que recebe ajuda das nações estrangeiras e as redistribui para a população.

A saída dos cabo-verdianos para o exterior é constante e muito significativa para o país de poucos recursos. Um dos motivos é o déficit que existe em relação ao ensino, pois existem poucas universidades, e elas foram criadas muito recentemente, a saber: Universidade de Cabo Verde (UNI-CV), Universidade Lusófona de Cabo Verde, Universidade Jean Piaget (UNI-PIAGET), Instituto Superior de Ciências do Mar (ISECMAR), Instituto Superior de Ciências Econômicas (ISCEE), Instituto Superior de Educação (ISE) e a Universidade de Mindelo.

Imagem 1 - Universidade Jean Piaget na Cidade da Praia – Primeira universidade em Cabo Verde:

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Essas universidades não conseguem atender a demanda de vários cursos, e muitas pessoas precisam sair do país, por não existir todos os Cursos nas universidades, principalmente, na área da saúde.4

Depois da independência, no dia 5 de julho de 1975, muitos países começaram a cooperar com as ilhas em várias áreas, em especial, em relação ao ensino: é por isso que Portugal, Brasil, Cuba, China, Canárias e outros países estabelecem convênios com o governo cabo-verdiano, atribuindo certo número de vagas para que os estudantes possam ter acesso à formação superior. Os países mais solicitados pelos cabo-verdianos são Portugal e Brasil, principalmente, devido à união entre esses países através da língua portuguesa. As vagas concedidas aos países africanos fazem parte das diplomacias estabelecidas entre os governos desses países.

Hoje, em Fortaleza, na Universidade Federal do Ceará (UFC), há 46 estudantes cabo-verdianos ligados à universidade pelo Programa de Estudantes Convênio-Graduação (PEC-G), um programa de cooperação entre Brasil e alguns países da África e da América Latina, no qual o Brasil coopera com estes países quanto à formação superior de seus jovens, atribuindo vagas de estudos para que eles possam ter um nível de formação superior e, posteriormente, regressar para o país de nascimento. Atualmente, há, aproximadamente, 2.700 estudantes matriculados, através de convênio, em 72 instituições de Ensino Superior, todos com ingresso por matrícula inicial, gratuita e sem concurso vestibular, procedentes de 38 países.

A UFC contribuiu para a criação e instalação da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira, a (UNILAB), a qual iniciou suas atividades em março de 2011, no município de Redenção (CE), dando entrada ao mundo lusófono no Brasil e ampliando os laços entre os países africanos que falam a língua portuguesa. Trata-se de um novo convênio e uma nova oportunidade de estudo para os estudantes dos países africanos. Os cabo-verdianos têm o hábito de sair de seu país para estudar, pois antes não existiam universidades em Cabo Verde, e quem estudava fora era bem visto e considerado na sociedade. Hoje, mesmo com instalação de universidades, os estudantes continuam saindo, uns pelo hábito de sair, entre outros motivos. Não acreditamos ser uma desvalorização das instituições de ensino do país, mas sim a procura por melhores condições de aprendizagem. Tomando Cabo Verde como referência, muitos estudantes são obrigados a sair do país, por não existir formação superior em algumas áreas, como a medicina. Por isso, há um dilema

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muito conhecido por todos os cabo-verdianos: o “ter que partir, mas querer ficar”5, pois muitos acabam partindo para iniciar uma nova fase da vida nas universidades estrangeiras.

Segundo Santos (2004), a universidade foi criada segundo um modelo de relações unilaterais com a sociedade, e é esse modelo que subjaz a sua institucionalidade atual. As universidades públicas, nos últimos dez anos, vêm passando por algumas crises, por motivos diversos. A concentração na crise institucional foi fatal para a universidade, pois era e é, desde há pelo menos dois séculos, o elo mais fraco da universidade pública, porque a autonomia científica e pedagógica da universidade assenta na dependência financeira do Estado. De acordo com o autor, visto que o Estado reduziu o seu compromisso político com as universidades – defendendo que não precisam ser sustentadas exclusivamente pelo Estado – elas entraram em crise institucional, pois sua natureza não lucrativa não permite sua expansão.

A perda de recursos da universidade pública para a privada também contribui para as crises enfrentadas pela pública, ou seja, com a saída dos professores das públicas para as privadas, ou através da aposentadoria precoce.6

O modo selvagem e desregulado como este mercado emergiu e se desenvolveu [...] explicou a descapitalização e desestruturação da universidade pública a favor do emergente mercado universitário com transferências de recursos humanos que, por vezes, configuram um quadro de acumulação primitiva por parte do setor privado universitário a custa do setor público. [...] com a transformação da universidade num serviço que se tem acesso, não por via da cidadania, mas por via do consumo e, portanto, mediante pagamento, o direito à educação sofreu uma erosão radical. A eliminação da gratuidade de ensino universitário e a substituição de bolsas de estudo por empréstimos foram os instrumentos da transformação dos estudantes de cidadãos em consumidores. (SANTOS, 2004, p. 19-27).

Ainda nas palavras de Santos (2004), no contexto africano, a situação se apresentava de forma desfavorável para quase todas as universidades, com fracas infraestruturas, sem equipamentos, pouco ou nulo investimento em pesquisa e os docentes, miseravelmente, remunerados, assim desmotivados e propensos à corrupção. Desse modo, temos a seguinte situação.

O Banco Mundial diagnosticou [...] irremediável. Incapaz de incluir nos seus cálculos a importância da universidade na construção dos projetos de país e na criação de pensamentos crítico e de longo prazo, o Banco entendeu que as

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Frase popular citada nas ruas e muito frequente nas falas dos imigrantes ao explicarem que precisam sair das ilhas por falta de opções.

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universidades africanas não geravam suficiente “retorno”. Consequentemente, impôs aos países africanos que deixassem de investir na universidade, concentrando os seus poucos recursos no ensino primário e secundário e permitissem que o mercado global de educação superior lhes resolvesse o problema da universidade. Esta decisão teve um efeito devastador nas universidades dos países africanos. (SANTOS, 2004, p. 23-24).

Santos (2004) também afirma que as novas tecnologias de informação e comunicação possibilitam o ensino à distância, mas também chegam a atrapalhar a identidade e as funções da universidade, visto esta ser uma entidade com forte componente territorial associado ao regime de estudos, relações de troca e comunicação presencial que a fortalece. Com o uso das novas tecnologias, na forma de ensino e aprendizado, a territorialidade da universidade está se tornando em extraterritorialidade, e a presença física está sendo substituída pelo status online:

Nos países pluriétnicos e multinacionais, o conhecimento pluriversitário está a emergir ainda do interior da própria universidade quando os estudantes de grupos minoritários (étnicos ou outros) entram na universidade e verificam que a sua inclusão é uma forma de exclusão: confrontam-se com a tábua rasa que é feita das suas culturas e dos conhecimentos próprios das comunidades donde se sentem originários. (SANTOS, 2004, p. 44).

Como nos vem falando Santos (2004), a maior frustração da última década foi que o objetivo da democratização do acesso não foi conseguido, logo, em boa parte dos países, fatores de discriminação – quer sejam de classe, raça, sexo ou etnia – continuam fazendo com que o acesso às universidades seja uma mistura de mérito e privilégio, ou seja, através das cotas sociais e raciais. Essa inclusão mais parece separação: os negros e os menos favorecidos monetariamente têm de entrar pelos próprios esforços de igualdade e não pelas cotas.

Os problemas sociais e raciais não são recentes. Há muito tempo eles têm forçado uma luta constante dos cidadãos por direitos de igualdade. Os obstáculos enfrentados ainda hoje são reflexos do tempo da escravatura, em que os negros não tinham voz. Mudar essa realidade foi muito difícil, e ainda podemos ver essas marcas. Depois da abolição da escravatura, foi problemática a integração do escravo na sociedade, não dispondo ele de recursos para competir e sobreviver no mercado em que estava inserido.

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entrarem na universidade, para não ficarem em desvantagem e ser prejudicado durante a graduação.

De acordo com a Côco (2012), para entendermos melhor as políticas de inclusão social existentes hoje, devemos recorrer ao passado. É preciso lembrar que a sociedade brasileira foi colonizada por portugueses, mas já havia tribos indígenas com costumes próprios; então, houve uma resistência à imposição, o que causou certa desestabilidade. As guerras e o uso de armas aconteceram em nome da tentativa de resgatar a ordem e a instalação da república, anunciada como condição para superar as mazelas deixadas pelas relações escravocratas, mas não houve mudanças substanciais.

Constatar essa preocupação implica, indiscutivelmente, reconhecer a desumanização, não apenas como viabilidade ontológica, mas como realidade histórica. É também, a partir dessa dolorosa constatação, que os homens perguntam-se sobre outra viabilidade – a da sua humanização; ambas na raiz de sua inconclusão, que os inscreve num permanente movimento de busca. Humanização e desumanização, dentro da história, num contexto real, concreto, objetivo, são possibilidades dos homens como seres inconclusos e conscientes de sua inconclusão, como nos lembra Marcon (2012).

Infelizmente, há a hierarquização das raças, e a sociedade é dividida com um lugar próprio para os negros, outro para os índios e outro para os brancos. As políticas de ação afirmativas têm sido levadas a cabo por movimentos populares, de modo que eles requerem do Estado uma posição de compromisso com os grupos sociais historicamente excluídos, tentando mudar a realidade que os vem acompanhados por várias décadas, na tentativa de superar os problemas históricos. Essas ações têm sido muito importantes para o país: “[...] as experiências apontam para avanços relevantes que estão desmitificando concepções até então dominantes, como as de que aos índios e afrodescendentes falta capacidade para ocupar as funções desempenhadas por brancos.” (MARCON, 2012, p. 26).

Os problemas sociais e econômicos são visíveis e constituem uma marca profunda na sociedade brasileira e em várias outras sociedades. O recurso financeiro é um fator determinante para que o brasileiro tenha acesso à universidade, fato esse que tem levantado várias forças para tentar fazer algo diferente. As cotas e o programa ProUni são algumas dessas tentativas:

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Para solucionar alguns problemas enfrentados por essas classes, há também os Cursos Pré-Vestibulares Comunitários (CPVC), os quais ajudam os estudantes que deles precisarem, treinando-os para que possam entrar nas universidades. No entanto, esses cursos não possuem grandes condições financeiras e têm uma carência enorme. Com as políticas de inclusão, facilita-se o acesso dos excluídos às universidades e, consequentemente, abrem-se maiores chances no mercado de trabalho, o que permite melhoria nas condições de vida.

Contudo, os estudantes que conseguem, através da inclusão, ingressar numa universidade, certamente, vão precisar de um apoio para continuar. Isso acontece porque não é apenas entrar na universidade que o problema dessa classe desfavorecida irá desaparecer. Devido aos custos de transporte, livros, acesso à internet, entre outros, muitos acabam abandonam os bancos da universidade, por não conseguir arcar com os gastos que estar numa universidade exige do discente:

[...] o caso do Brasil –, frequentemente observamos a privação de direitos constitucionais, especialmente quando se trata dos setores de menor poder aquisitivo. Nesse sentido, entendemos ser de fundamental importância o desenvolvimento de ações educativas que favoreçam a permanência e a qualidade da aprendizagem de alunos de baixa renda, para que possam se inserir no sistema educacional em todos os níveis hoje oferecidos, inclusive no universitário. (MARCON, 2012, p. 73).

A inclusão ainda hoje suscita polêmicas, pois, de um lado, alguns argumentam que destinar uma porcentagem de vagas a grupos socialmente excluídos leva a uma queda na qualidade das atividades de ensino, pesquisa e extensão, enquanto outros consideram que há um grande contingente de talentos ocultos nos grupos excluídos que, em virtude de aspectos estruturais da sociedade brasileira, não conseguem realizar plenamente suas potencialidades, nem para si, nem para a sociedade. Consequentemente, uma política de inclusão eficiente poderia promover a melhoria da qualidade das universidades brasileiras. Mesmo em meio a essas dúvidas e especulações de ambas as partes, o dever do Estado é criar condições para que esses indivíduos também tenham acesso ao ensino, cumprindo o direito de igualdade para todos, como afirma Marcon (2012).

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de estudantes por dentro [...], procurando um ponto de observação privilegiado para discussão das trajetórias dos estudantes.” (CÔCO, 2012, p. 101).

É preciso um olhar aproximado, um exercício de sensibilidade, para capturar as nuanças, as belezas e a complexidade que vive a juventude. De longe, podemos incorrer no erro de considerar uma massa de projetos de gente com dilemas muito parecidos. É preciso sair da superfície para olhar os retratos da vida que chegam à universidade. (CÔCO, 2012, p. 98).

Cada jovem, em particular, ao chegar na universidade, traz consigo traços pessoais de sua vida, tendo cada um sua experiência e esforços feitos para ingressar na universidade. Os jovens de origem popular encontram-se em situação de maior vulnerabilidade social; por isso, a entrada e a permanência deles, na universidade, é marcada pela busca por incentivos financeiros, para lhes oferecer a possibilidade de adquirir e produzir conhecimentos científicos e, a partir disso, intervir em seu território de origem.

Segundo Côco (2012), os programas de incentivo financeiro possibilitam o monitoramento e a avaliação, pelos próprios estudantes, do impacto das políticas públicas desenvolvidas em espaços populares. Os participantes do programa recebem apoio financeiro e metodológico.

Além da falta de recurso financeiro, problema enfrentado por vários jovens, para estudar numa universidade, o racismo é outro fator que dificulta a entrada, por conta da discriminação:

Nas sociedades multiculturais e pluriversitários, onde o racismo, assumido ou não, é um fato, as discriminações raciais ou étnicas devem ser confrontadas enquanto tal com programas de ação afirmativa (cotas e outras medidas) que devem visar, não só o acesso, como também o acompanhamento, sobretudo durante os primeiros anos onde são por vezes altas as taxas de abandono. Sem dúvida que a discriminação racial ou étnica ocorre em conjunto com a discriminação de classe, mas não pode ser reduzida a esta e deve ser objeto de medidas específicas. No Brasil, as políticas de ação afirmativa assumem hoje grande destaque e merecem uma referência especial. Em resposta à crescente pressão de movimentos sociais pela democratização do acesso ao ensino superior, especialmente do movimento negro, o Governo Lula lançou no primeiro semestre de 2004 o programa “Universidade para Todos” (PROUNI) [...]. (SANTOS, 2004, p. 69-70).

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familiar máxima de três salários mínimos, bem como os professores da rede pública de ensino no efetivo exercício de licenciatura, como afirma Santos (2004).

A UFC, por sua vez, tem feito esforços para a absorção de um maior número de cotistas:

No conjunto das universidades brasileiras, a UFC se destaca com o terceiro maior orçamento dedicado à Assistência Estudantil. Também nos tornamos a universidade brasileira que mais recebe estudantes africanos. Ou seja, colocamos o aluno, de fato, em primeiro plano e o fazemos de maneira responsável. Agora, essa política de Assistência Estudantil encara um novo cenário, criado pela adoção das cotas sociais e raciais. Confiantes, nos preparamos para cumprir a determinação do Ministério da Educação de agregar ao quadro discente, através de critérios diferenciados, jovens oriundos das camadas mais pobres da população. Entenda-se que a nova Lei foi aprovada depois que o Orçamento da União já estava fechado. Não há recursos para garantir, aos beneficiários das cotas, o tratamento adequado que costumamos oferecer aos alunos. Eles irão necessitar de bolsas de estudo, refeições diárias e vagas nas residências ou auxílio-moradia. O orçamento das Instituições Federais de Ensino Superior, para 2013, não contempla essa nova realidade. Assim, para o próximo ano, não ousaríamos reservar mais que 12,5% por cento das vagas de cada curso de graduação para as cotas sociais e raciais. (FARIAS, 2012, s/p). Disponível em: http://www.ufc.br/noticias/noticias-de-2012/2454-ufc-reservara-12-5-das-vagas-para-ingresso-via-lei-de-cotas-em-2013. Acessado em 03/03/13.

Segundo o reitor da UFC, a reserva de 12,5% das vagas em cada um dos Cursos, em 2013, é o melhor a fazer agora. Para ele, não seria coerente disponibilizar 50% das vagas para as cotas sociais e raciais já no próximo ano, pois o orçamento não fora previsto antecipadamente. Primeiramente, terá de se avaliar o impacto da aplicação dos 12,5% e tentar aumentar esse percentual em 2014. O total aplicado representa 789 estudantes ingressados na universidade pelas cotas.

Podemos verificar que hoje, na UFC, os estudantes cotistas e os não cotistas estão tendo notas semelhantes, e a diferença que os separa é muito pequena, sendo que em alguns cursos os cotistas acabam atingindo as melhores notas. Disponível em: http://www.opovo.com.br/app/opovo/fortaleza/2013/03/05/noticiasjornalfortaleza,3016644/uf c-cotistas-e-nao-cotistas-tem-notas-semelhantes.shtml. Acessado em 14/03/13.

Além das iniciativas citadas, que foram criadas para melhorar o ensino, no Brasil, muitos investimentos financeiros foram realizados também com esse intuito. Outro fato é a expansão do Ensino Superior: mesmo que pouco expressiva, ela é acompanhada pela ampliação das vagas, sendo este um instrumento que serve para a democratização da educação e cria programas de inclusão, como o ProUni, segundo Franco (2008).

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consideração a qualidade das pesquisas, a qualidade do ensino, a avaliação do mercado de trabalho por pesquisadores renomados e os indicadores de inovação. Para a realização do ranking, um critério importante para a seleção das universidades foi o fato de considerarem somente as instituições mais completas, com ensino e pesquisa em diversas áreas de conhecimento, contanto assim com 191 universidades, distribuídas em 188 posições (devido a alguns empates). A Universidade Federal do Ceará ficara em 18º lugar, com 66,28 pontos no total – comprovando que a universidade adere à inclusão e nem por isso a qualidade de ensino, pesquisa e extensão fora negativamente afetada. (FOLHA DE SÃO PAULO, 2012). Disponível em: http://ruf.folha.uol.com.br/rankings/rankingdeuniversidades/. Acessado no dia 03/03/13.

Mas quem estuda nas universidades federais? Quem são esses estudantes que ocupam os bancos das universidades? De acordo com o relatório da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior - Fórum Nacional de Pró-reitores de Assuntos Comunitários e Estudantis (ANDIFES _ FONAPRACE, 2012), a UFC tem 68 Cursos e 22.691 estudantes. Com os resultados, foi possível classificar os estudantes por renda familiar, sendo que 41% das famílias recebem até três salários mínimos. Porém, há desigualdade nos resultados de região para região, chegando-se a atingir 50% e 63% no Nordeste e no Norte do país, com queda considerável no Sudeste, Sul e Centro-Oeste para 31, 32 e 33%. Muitos desses estudantes necessitam de assistência estudantil, como alimentação, moradia, bolsa de trabalho, atendimento médico-odontológico, psicológico, entre outras necessidades para sua permanência e conclusão do Curso: “Esse conjunto de informações reflete a queda de um “mito”, que ainda existe em alguns setores da sociedade brasileira, de que os estudantes das federais são, em sua maioria, os mais ricos.” (ANDIFES _ FONAPRACE, 2011, p. 21).

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chega a dobrar, sendo que 10% dos estudantes são beneficiados com o programa de transporte, cobrindo as classes C, D e E, e mais da metade utiliza o transporte coletivo, segundo dados da ANDIFES _ FONAPRACE do ano de 2011.

Ainda segundo dados da ANDIFES _ FONAPRACE (2011), as pesquisas de 1996/7 aponta que 14,6% dos estudantes deslocam-se para a universidade a pé, de carona ou de bicicleta; esse índice passou a 18% em 2003/4 e a 18,63% em 2010. Dos que utilizam os próprios transportes privados, a percentagem caiu de 24,8% em 1996/7, para 19,7% em 2003/4 e voltou a crescer em 2010 para 21,62%. Podemos afirmar que esse conjunto de dados reflete a queda de um “mito” que ainda existe em alguns setores da sociedade brasileira: o de que os estudantes das universidades federais se dirigem às instituições com carro próprio:

Os estudantes de raça/cor/etnia branca são maioria (54% contra 59% em 2004), em especial na classe A (74%). O percentual de estudantes de raça/cor/etnia preta aumentou de 5,9% em 2004 para 8,7% em 2010. Este aumento ocorreu em todas as regiões, com destaque para a região Norte, que praticamente dobrou o seu percentual (13,4% contra 6,8% em 2004), e a região Nordeste, que teve um aumento de 46% (12,5% contra 8,6% em 2004). O universo de estudantes de raça/cor/etnia preta e parda também aumentou (40,8% contra 34,2% em 2004) e sua maior concentração está nas classes C, D e E (53,3% contra 43,7% em 2004). Esta nova configuração é resultante, sobretudo, da institucionalização nestes últimos anos das várias políticas de inclusão, em especial das várias modalidades de ações afirmativas e também do programa de expansão das Universidades Federais. O aumento do universo de estudantes de raça/cor/etnia preta e parda, majoritariamente nas classes C, D e E, evidencia o importante papel dessas políticas na democratização do acesso à universidade pública. Não obstante, verificou-se uma diminuição da população indígena (0,9% contra 2,0% em 2004), concentrando-se majoritariamente na classe E. Verifica-se uma grande elevação no percentual de pretos e pardos com substancial redução dos brancos. Entre as pesquisas de 2003/4 e 2010 a elevação do número de brancos foi de 75.060 alunos e a elevação de pretos adicionados aos pardos foi de 107.188. Houve, também, uma diminuição no número de indígenas e no número dos estudantes considerados amarelos. (ANDIFES _ FONAPRACE, 2011, p. 23-24).

Esses são os universitários que estudam nas universidades federais e, mais especificamente, na UFC, estudantes de diversas raças, classes sociais, com culturas e hábitos diferentes: uns que necessitam de ajuda financeira mais do que outros, entre outras diferenças gritantes, mas todos dentro de uma mesma instituição, com o mesmo objetivo de aprendizagem.

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universidade, como a bolsa Projeto Milton Santos de Acesso ao Ensino Superior (Promisaes) e a bolsa mérito, no valor de um salário mínimo. Além de recebê-los dentro da instituição, a universidade também tenta aproximá-los; uma das edições do Festival de Cultura foi uma boa oportunidade para que isso acontecesse. Esse evento ocorreu durante uma semana inteira de atividades intensas voltadas para o Ceará e a África, uma semana diferente de tudo o que já presenciamos na UFC, onde a proximidade entre as pessoas e a curiosidade por um evento tão diferenciado despertou os olhares de muitos.

1.1.1 Festival de Cultura: "Ceará, África, Lusofonia: encontros e diálogos além mar"

Para qualquer africano, falar sobre o seu continente é algo muito bom e emocionante, principalmente, quando se está longe. Não foi diferente com os estudantes africanos, na UFC, quando a universidade realizou o III Festival de Cultura, realizado de 18 a 22 de outubro de 2010, sob o tema "Ceará, África, Lusofonia: encontros e diálogos além mar". O objetivo do evento foi homenagear a África e os países que falam a língua portuguesa. A UFC tentou refletir as influências e os diálogos sobre o continente e o Ceará, aprofundando, assim, as relações entre ambos, pois se, em 1884, o Ceará ganhou destaque nacional ao se tornar a primeira província do país a abolir a escravidão, hoje os africanos são presença maciça na terra da luz, através, principalmente, do intercâmbio acadêmico. Disso provém a importância desse tema durante o Festival, pois mais de 100 estudantes da UFC são africanos, nomeadamente da Angola, Cabo Verde, Moçambique, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe, entre outros países. Era a “nossa universidade” representando o “nosso continente”. Foi a melhor experiência que a autora deste estudo viveu na UFC e, possivelmente, também foi assim para outros estudantes, que participaram nas atividades, procurando fazer de tudo para representar o continente da melhor forma possível.

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de alegria, ao som da música. Realizamos um desfile com as roupas tradicionais da África e tivemos uma oficina de penteados coordenado por nós, mostrando os penteados africanos. Durante os dias do Festival, vários brasileiros e pessoas de outras nacionalidades desfilaram nos arredores da universidade com os penteados. Foi algo novo, interessante, que despertou a atenção de muitos, e para a maioria dos africanos, estava sendo a primeira experiência nos festivais de cultura da universidade.

Foi o evento realizado pela universidade que mais aproximou os estudantes africanos da instituição, pois nunca se tinha notado uma presença em massa deles nesse tipo de evento. Trata-se de uma iniciativa louvável que deveria desencadear outras atividades com a mesma finalidade, dando continuidade ao que fora iniciado em 2010. Pudemos sentir, no Festival, o início do diálogo com a diferença, com a minoria, um diálogo que começou bem, mas que perdeu depois daquela semana festiva. Houve alguns desdobramentos positivos depois do evento que não poderíamos deixar de ressaltar: o Festival ajudou os africanos a estar em contato com a universidade, com os meios de comunicação dela, acompanhando o que estava acontecendo. Numa entrevista com um estudante africano, tivemos esta declaração:

Olha eu vou ser bem sincero com você, eu acho que... eu lembro que quando estava acontecendo o festival de cultura em 2010, eu entrei no site pra tentar acompanhar, eu sei que foi a minha única vez... mas assim eu não me lembro de ter entrado depois dessa época. Olha não sei por quê, não sei. (Andy, 25 anos, Comunicação Social – Publicidade).

Houve também resultados literários, com o lançamento de um livro sobre a África, o que ajuda a suprir a necessidade da falta de material didático:

O Departamento de História e a Coordenadoria de Comunicação Social e Marketing Institucional lançaram no Museu de Arte da Universidade Federal do Ceará (MAUC), o livro "África, Brasil, Portugal – História e Ensino de História", fruto do III Festival UFC de Cultura.” Os organizadores da publicação são os professores Eurípedes Funes, Francisco Régis Lopes, Franck Ribard e Kênia Sousa Rios. A obra leva o selo das Edições UFC e reúne artigos de pesquisadores cearenses, africanos e portugueses. O objetivo dos autores é divulgar o livro junto às instituições de ensino, secretarias de educação e instituições afins, para diminuir a carência por materiais didáticos sobre a temática afro-brasileira, cuja inclusão no currículo da Educação Básica é exigida pela Lei nº 10.639/2003. Disponível em http://www.ufc.br/noticias/noticias-de-2011/2155-livro-sobre-ensino-de-historia-da-africa-sera-lancado-no-mauc. Acessado em 03/03/13.

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1.2 Migração e a relação com os meios de comunicação

Para a pesquisa em si e para este subseção em particular, contamos com a contribuição do livro Migraciones Transnacionales y Medios de Comunicación, organizado por Cogo, Gutierrez e Huertas (2008), em especial, os capítulos de Gorczevski, Kuhn Junior e Silva (2008): “Trayectos migratorios: factores que influyen en la decisión”, e o de Bailén e Brignol (2008): “Consumo y uso de los medios de comunicación por parte de los migrantes”, entre outras contribuições. Os capítulos tratam da migração, dos fatores que influenciam na hora de migrar e do consumo dos meios de comunicação e informação, alguns dos aspectos que iremos abordar. O livro é o resultado de uma investigação7 que surgiu a partir da necessidade de se estudar a interação existente entre os meios de comunicação e os processos migratórios.

A migração é um fenômeno muito antigo, mas que continua marcando as sociedades. Hoje em dia, fatores políticos, sociais, econômicos, naturais, entre outros, impulsionam o deslocamento dos seres humanos em todos os lugares; essa é também a realidade em Cabo Verde, caracterizado pelo clima árido e semiárido, o que impulsiona as pessoas a sair de Cabo Verde em direção a outros destinos, procurando novas oportunidades e melhores condições de vida. Para Alencar (2010), a migração ocorre por motivos aleatórios, podendo ser de ordem econômica, cultural, social, em que os cidadãos provenientes de terras menos privilegiadas migram buscando novas oportunidades – procuradas em países mais desenvolvidos economicamente. De acordo com o que nos dizem Cogo e Gorczevski (2012), os jovens com idade entre 15 e 30 anos sempre constituíram e seguem constituindo uma proporção importante dessas pessoas em constante deslocamento para outros lugares, a maioria procedente dos países em vias de desenvolvimento.8

Segundo Leonora Corsini (2010), há, hoje, cerca de 200 milhões de migrantes em movimento no mundo, número bastante expressivo, que permite pensar a existência de um outro continente, o sexto continente, móvel e que corresponde a 3% da população mundial, ou seja, mais ou menos o tamanho da população brasileira que vive circulando pelo mundo em

7

A pesquisa integrou o Programa Acadêmico de Cooperação Internacional Brasil-Espanha, financiada por CAPES (Brasil) e Ministerio de Educación y Ciencia (Espanha), e contou com a participação de pesquisadores do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Unisinos e do Departamento de Publicidade e Comunicação Audiovisual da Universidade Autônoma de Barcelona (UAB). Além das autoras desse artigo, integraram o projeto outros 29 pesquisadores, entre professores e alunos brasileiros e espanhóis. Os resultados da pesquisa estão publicados na obra coordenada por Cogo, Gutiérrez e Huertas (2008).

8 As autoras advertem que o uso de termos como “países em desenvolvimento” se deve ao fato

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processo migrante; seria como imaginar o Brasil em constante movimento, migrando pelo mundo.9

Um fato interessante encontrado na leitura de Corsini (2010), citado anteriormente, é que, depois de mais de três décadas de “saída” de brasileiros, o Governo Lula decidiu convidar uma centena desses brasileiros espalhados nos mais diversos cantos do mundo para se reunirem no Palácio do Itamaraty, no Rio de Janeiro, tendo como objetivo criar um canal de comunicação com os emigrados, um meio para que eles pudessem falar de seus problemas e apresentar propostas, um canal institucional de diálogo e troca com as comunidades de brasileiros que vivem fora do Brasil.

Iniciativas como essa deveriam ser tomadas em relação aos estudantes que vivem no exterior, sendo uma forma de cada país saber o que se passa com seus universitários em outros países, por vezes, seria um meio de resolver ou evitar certos problemas e dificuldades enfrentadas em terras distantes, pois, já que existe essa mobilidade de estudantes, é necessário também um acompanhamento.

Outra questão ligada ao que foi apresentado anteriormente e que trazemos para discussão é a exigência de várias universidades brasileiras, federais ou não, de revalidação dos diplomas conseguidos em cursos superiores em países estrangeiros. Hoje, o deslocamento de estudantes e docentes é enorme, o que exige uma postura diferente em relação aos Cursos e diplomas conferidos no estrangeiro, pois a mobilidade de pessoas implica a mobilidade e troca de conhecimentos e saberes, como lembra Corsini (2010).

Com toda essa mobilidade de estudantes, somos levados a pensar no conceito de imigração e nas diferenciações entre migração e emigração. Jacinto (2009) considera como migração o movimento de entrada de pessoas de um país para outro, de caráter permanente ou temporário e com a intenção de trabalho e/ou residência. Um imigrante é diferente de um turista que entra num país apenas com a intenção de visitá-lo, regressando posteriormente a seu país. Segundo Ruivo (2006), todo imigrante é emigrante e vice-versa: o processo de migração refere-se ao movimento de entrada em um determinado país, região ou cidade, em que o indivíduo imigrante, no país estrangeiro, é emigrante no país de nascimento.

Trazemos agora outros autores que tratam das migrações, em uma outra perspectiva, abordando a autonomia das migrações:

“Falar sobre a autonomia das migrações”, escrevem Papadopoulos, Stephenson e Tsianos, “pressupõe entender a migração como um movimento social no sentido literal, não como uma simples resposta aos problemas sociais e econômicos”. E

9Ver mais detalhes no artigo “O Brasil e a nova Lei de Estrangeiros”

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prosseguem: “A abordagem da autonomia das migrações não considera, obviamente, a migração isolada das estruturas sociais, culturais e econômicas. É justamente o oposto: a migração é entendida como uma força criativa no interior dessas estruturas”. (PAPADOPOULOS; STEPHENSON; TSIANOS, 2008, p. 202).

Mezzadra (2012) traz um outro olhar ao falar da autonomia das migrações, afirmando ser necessário uma sensibilidade diferente ao falar sobre este tema:

Adotar a perspectiva da autonomia das migrações requer, portanto, uma “sensibilidade diferente”, um olhar diferente, eu diria. Significa olhar os movimentos e os conflitos migratórios em termos que priorizem as práticas subjetivas, os desejos, as expectativas, e os comportamentos dos próprios migrantes. [...] Isto não quer dizer, contudo, ‘romantizar’ a migração; ao contrário, a ambivalência dessas práticas e experiências subjetivas deve ser sempre levada em conta. No âmbito do fenômeno das migrações enquanto movimentos sociais, novos dispositivos de dominação e exploração são forjados, ao lado de novas práticas de liberdade e igualdade. A abordagem da autonomia das migrações deve, neste sentido, ser compreendida como uma nova perspectiva de análise das “políticas de mobilidade” – que enfatiza a dimensão subjetiva no interior das lutas e enfrentamentos que constituem materialmente o terreno dessas políticas. [...] a abordagem autonomista permite-nos analisar a produção da condição de irregularidade não como processo unilateral de exclusão e dominação perpetrado pelo Estado e pela lei, mas como um processo tenso e movido por conflitos, no qual os movimentos subjetivos e as lutas dos migrantes constituem um elemento ativo e fundamental. (MEZZADRA, 2012. p. 73-74).

Sair da terra natal para morar no estrangeiro faz com que o migrante carregue consigo sua cultura, lembranças do lugar de nascimento, do lugar que lhe dá conforto por causa das raízes que ali ficaram. Para Gorczevski, Kuhn Junior e Silva (2008), na análise das referências ao lugar de nascimento, o lugar não é apenas o geográfico, mas é tido como espaço de identificação simbólica e pertencimento. Sendo assim, vemos os lugares de nascimento realizando refencialidade identitária e produzindo um ambiente de segurança para os sujeitos se relacionarem, principalmente, nessas circunstâncias de migração e desencaixes espacio-temporais.

De acordo com Trigueiro (2011), estamos cercados, de todos os lados, por vários sistemas de comunicação, assim, estudar comunicação social se tornou uma necessidade de todas as pessoas, em qualquer lugar, pois é preciso conhecer e dominar os sistemas de informação e de comunicação, imprescindíveis no mundo globalizado em que vivemos. Segundo o autor, a comunicação é um processo que possibilita a interação entre pessoas, um processo cada vez mais marcante nas relações sociais humanas modernas, já que os meios de comunicação possibilitam a difusão da informação e facilitam a troca de mensagens.

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comunicação podem ser úteis de várias formas na vida do imigrante, antes e depois da migração, dependendo do interesse e da experiência de cada um, pode ser uma forma de obter conhecimento, de aproximação, um lugar para expressar o que se sente, as dificuldades e as vitórias conseguidas perante a nova realidade.

Para Rosa e Tavares (2011, p. 9), “[...] a identidade dos cabo-verdianos depende, para existir naquele novo contexto, de algo fora dela: a saber, de outra identidade, de uma identidade que ela não é, mas que fornece as condições para que ela exista.” Os autores continuam, afirmando que “[...] essa marcação da diferença também pode apresentar problemas como a negação de similaridades, constituindo os outros como estranhos.” Assim, para quebrar as barreiras devido às diferenças, o uso dos meios constitui algo de grande valor para aproximar as culturas diferentes:

Assim, parece estar aumentando a consciência social de que “não há sociedade multicultural possível sem o recurso a um princípio universalista que permita a comunicação entre indivíduos e grupos sociais culturalmente diferentes.” (TOURAINE, 1997, p. 225, apud TAVARES; ROSA; 2011, p. 2).

Sendo assim, é permitido aos seres humanos compartilhar experiências jamais imaginadas, promovendo a união de muitas pessoas culturalmente diferentes, através dos meios de comunicação.

Cabo Verde é um país pobre que, devido a essa pobreza, tornou-se um país de imigrantes, o que gerou, ao longo dos anos de tanta migração, a diáspora, fato que resulta da dispersão de pessoas com a mesma nacionalidade por diferentes lugares no mundo. As diásporas acabam se juntando em comunidades mesmo na dispersão, fortalecendo os laços identitários e o contato com o país de origem. (COGO; ELHAJJI; HUERTAS, 2012). É aqui que os meios de comunicação entram, podendo aproximar a diáspora.

Os meios de comunicação ajudam na hora de migrar, pois, através deles, podemos encontrar informações do país de destino, contatos e lugares importantes, “aprendemos” a nos localizar, mesmo que virtualmente, entre outras coisas. Falamos isso por experiência própria, pois, antes de viajar para Fortaleza, viajamos, várias vezes, virtualmente, e isso ajudou muito, quer para saber o endereço da universidade, do hospital mais perto ou da igreja mais próxima de casa:

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tiene que adaptarse. Es como si a través de estas relaciones mediatizada s (vía email, teléfono o carta) se reforza ra esa red de seguridad que le proporciona el sentirse que pertenece a un espacio/tiempo concreto. La mayoría de los entrevistados mantiene este tipo de contactos diaria o semanalmente. (MARIN; POZOBON, 2008, p. 66).

A necessidade de estar em contato com o país de nascimento e com os familiares é vital para muitos imigrantes; é uma forma de adquirirem forças para continuar no país de migração. Pensar e falar na vida de um imigrante é também falar e pensar em mudanças, viagens, deslocamentos, novas formas de viver, contato com outras pessoas, culturas e costumes. Várias comunidades estrangeiras, ao se fixarem num determinado lugar, sofrem preconceitos, perseguições e dificuldades, pois as pessoas e os meios costumam associar os imigrantes a delinquência, pobreza, roubo do trabalho da população local, levando a aumentar a taxa de desemprego etc, segundo Cogo et al. (2008).

Como essa é a imagem veiculada pelas mídias com maior frequência, ela acaba sendo a imagem e a opinião das pessoas, pois são geradores de opinião pública. Querendo ou não, alguns estudantes africanos já passaram por constrangimentos similares. A proposta aqui é exatamente saber as experiências vividas pelos cabo-verdianos em Fortaleza, ouvir da própria boca desses imigrantes como é o dia a dia deles e tentar ajudar de alguma forma a “melhorar” os relacionamentos estabelecidos ao longo da estadia no Brasil. Portanto, acreditamos que as mídias tenham as seguintes funções:

As mídias podem operar, transnacionalmente, em termos de apelo e fortalecimento do desejo de vinculação a uma diáspora ao possibilitar a construção e compartilhamento de imaginários simbólicos comuns entre os migrantes em um tempo em que as diásporas são fluidas, móveis, flutuantes, contemporâneas e em permanente “via de constituição”. (MEDAM, 1993; SCOPSI, 2009, p. 87, apud COGO; ELHAJJI; HUERTAS, 2012, p. 48).

Concluímos, assim, que as mídias (imprensa, rádio, televisão, jornal, internet, telefone, teatro, cinema etc.) agem como racionalidade produtora e organizadora de sentidos e como configuradora da realidade social. Já os processos midiáticos constituem-se da dinâmica, operando como conformadora de imaginários sociais ligados à memória10, protagonizada pelos próprios indivíduos, de forma coletiva e individual, o que ajuda na constituição de diferentes modos de produção e circulação dos diversos meios de comunicação, como afirma Cogo et al. (2010). Ainda segundo os mesmos teóricos:

10O conceito de “memória”

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A interrelação entre processos midiáticos e memória nos permite perceber o quanto as mídias se convertem em cenários cotidianos de reconhecimento social na medida em que se encarregam de construir, expressar, oferecer e selecionar imaginários sociais relacionados a modos de ser, a expectativas, a desejos, a temores, a esperanças que aparecem (re)construídos pela memória. O que nos sugere, segundo sintetiza Martín-Barbero (2005, p. 63), que nos meios de comunicação “não apenas se reproduzem ideologias, mas também se faz e se refaz a cultura das maiorias, não somente se comercializam formatos, mas recriam-se as narrativas nas quais se entrelaça o imaginário mercantil com a memória coletiva.” (BARBERO, 2005, p. 63, apud COGO; BRIGNOL, 2012).

Vivemos em sociedades onde há uma convergência de múltiplas culturas nos espaços geográficos. Alguns autores tratam da capacidade dos meios de fundir valores e modos de raciocínio, de sua influência na construção de uma realidade social, sendo o meio um gerador de opinião pública, como ressaltam, Cogo et al. (2008).

Devido a essa convergência de culturas nos meios sociais, as pessoas estão vulneráveis a mudanças, principalmente, com o contato com novas culturas e ideologias. Hoje, temos os meios de comunicação como uma fonte importante de contato com novas culturas, sem mesmo sairmos da nossa própria casa. Com um clique na internet, derrubamos barreiras que a distância constrói e rompemos a limitação do espaço geográfico físico, aproximando as pessoas entre si e o mundo também, como vemos nas palavras de Cogo et al.:

[…] la propia condición de migrante es inevitablemente generadora de modalidades particulares de consume y usos midiáticos. La necesidad de mantener vínculos con el país de nacimiento y la ubicación en entornos culturales diferentes al propio condicionan su comportamiento como receptor-audiencia. Al mismo tiempo, esta circunstancia resulta un estímulo hacia la participación directa en los medios, a título individual y/o colectivo, ya sea como gestores o como creadores de mensajes. De ahí el crecimiento de los llamados medios étnicos, que dan especial visibilidad a las demandas y preocupaciones de este sector de la población. Estas matizaciones nos llevan a hablar del concepto de cuidadanía comunicativa [...]. (MATA, 2006, apud COGO; GUTIÍRREZ; HUERTAS, 2008, p. 11).

Com a necessidade de uso e consumo dos meios de comunicação pelos migrantes, para manterem vínculo com o país de origem, tratando do conceito de cidadania comunicativa, podemos ver também a mesma abordagem mediante a visão de outros autores:

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consolidar redes de competência e colaboração. (RETIS, 2006, p. 35, apud COGO; ELHAJJI; HUERTAS, 2012, p. 49).

Ainda de acordo com Retis (2006), ele fala sobre a migração abordando um outro conceito que gostaria de trazer aqui, a cidadania comunicativa:

No interior do percurso tecido por Retis, esse texto busca analisar como as migrações latino-americanas dinamizam, em âmbito transnacional, o que denominamos, de cidadania comunicativa concebida em termos de possibilidades de democratização do acesso e participação da sociedade na propriedade, gestão, produção e distribuição dos recursos comunicacionais. Entendemos os meios de comunicação como espaços estratégicos para a expressão, mobilização, transformação sociocultural e política e para a produção de igualdade em que a comunicação midiática e não se restringe a conteúdos e efeitos, mas a processos que possibilitam usos dos recursos midiáticos por parte da diferentes setores sociais, como é o caso das migrações. (RETIS, 2006, p. 35, apud COGO; ELHAJJI; HUERTAS, 2012, p. 49).

Os africanos que estudam na UFC também criaram um meio para terem mais contato uns com os outros, através de um grupo no facebook, disponível em: https://www.facebook.com/groups/153560678047279/, ambiente em que eles partilham notícias, eventos e outras coisas que lhes interessam. A internet aproxima-os e é um meio de comunicação que ajuda os imigrantes recém-chegados em Fortaleza.

Podemos dizer que a elevada centralização na internet pode levar a uma convergência dos meios de comunicação, o que podemos ver posteriormente (no terceiro capítulo), quando os estudantes falam do consumo dos meios de comunicação, nos levando a concluir que está acontecendo uma convergência dos meios de comunicação. Mas será que se trata de convergência quando pessoas passam a utilizar um meio de comunicação com mais frequência em relação aos outros? Os outros meios de comunicação cairão no esquecimento e no desuso?

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Os mercados midiáticos estão passando por mais uma mudança de paradigma. Acontece de tempos em tempos. Nos anos 1990, a retórica da revolução digital continha uma suposição implícita, e às vezes explícita, de que os novos meios de comunicação eliminariam os antigos, que a Internet substituiria a rádio difusão e que tudo isso permitiria aos consumidores acessar mais facilmente o conteúdo que mais lhes interessasse. [...] Economistas, políticos e gurus de negócios fazem a convergência soar tão fácil; olham para os gráficos de concentração de propriedade dos meios de comunicação como se os gráficos garantissem que todas as partes trabalharão juntas para alcançar lucro máximo. Mas, observando de baixo, muitos dos gigantes das mídias parecem enormes famílias disfuncionais, cujos membros não conversam entre si, cuidando de seus próprios interesses imediatos, mesmo à custa de outras divisões da mesma empresa. (JENKINS, 2008, p. 31-34).

Ainda segundo Jenkins (2008), de acordo com os professores de História, os velhos meios de comunicação não morrem e muito menos desaparecem pelo fato de novos meios surgirem; o que morre são as ferramentas, ou as tecnologias de distribuição, como por exemplo, a fita cassete, substituída por outras tecnologias de distribuição. Portanto, cada meio de comunicação antigo é obrigado a conviver e a partilhar o espaço com os novos meios que vão surgindo. As pessoas, hoje em dia, andam sempre com um aparelho em mãos e o utilizam de acordo com o lugar onde se encontram, segundo as necessidades do momento. Esses aparelhos são essenciais para suprir as necessidades dos consumidores, com base nas particularidades de consumo de cada um –“[...] como ninguém sabe que tipos de funções que devem ser combinados, somos forçados a comprar uma série de aparelhos especializados e incompatíveis”. (JENKINS, 2008, p. 43):

Boa parte do discurso contemporâneo sobre convergência começa e termina com o que chamo de Falácia da Caixa Preta. Mais cedo ou mais tarde, diz a falácia, todos os conteúdos midiáticos irão fluir por uma única caixa preta em nossa sala de estar (ou, no cenário dos celulares, através de caixas pretas que carregamos conosco para todo lugar). (JENKINS, 2008, p. 42).

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A convergência não envolve apenas materiais e serviços produzidos comercialmente, circulando por circuitos regulados e previsíveis. Não envolve apenas as reuniões entre empresas de telefonia celular e produtoras de cinema para decidirem quando e onde vamos assistir à estreia de um filme. A convergência também ocorre quando as pessoas assumem o controle das mídias. Entretenimento não é a única coisa que flui pelos múltiplos suportes midiáticos. Nossa vida, nossos relacionamentos, memórias, fantasias e desejos também fluem pelos canais de mídia. Ser amante, mãe ou professor ocorre em suportes múltiplos. Às vezes, colocamos nossos filhos na cama à noite e outras vezes nos comunicamos com eles por mensagem instantânea, do outro lado do globo. A convergência exige que as empresas midiáticas repensem antigas suposições sobre o que significa consumir mídias, suposições que moldam tanto decisões de programação quanto de marketing. Se os antigos consumidores eram tidos como passivos, os novos consumidores são ativos. Se os antigos consumidores eram previsíveis e ficavam onde mandavam que ficassem, os novos consumidores são migratórios, demonstrando uma declinante lealdade a redes ou a meios de comunicação. Se os antigos consumidores eram indivíduos isolados, os novos consumidores são mais conectados socialmente. Se o trabalho de consumidores de mídia já foi silencioso e invisível, os novos consumidores são agora barulhentos e públicos. Os produtores de mídia estão reagindo a esses recém-poderosos consumidores de formas contraditórias, às vezes encorajando a mudança, outras vezes resistindo ao que consideram um comportamento renegado. E os consumidores, por sua vez, estão perplexos com o que interpretam como sinais confusos sobre a quantidade e o tipo de participação que podem desfrutar. À medida que passam por essas transformações, as empresas midiáticas não estão se comportando de forma monolítica; com frequência, setores diferentes da mesma empresa estão procurando estratégias radicalmente diferentes, refletindo a incerteza a respeito de como proceder. Por um lado, a convergência representa uma oportunidade de expansão aos conglomerados das mídias, já que o conteúdo bem-sucedido num setor pode se espalhar por outros suportes. Por outro lado, a convergência representa um risco, já que a maioria dessas empresas teme uma fragmentação ou uma erosão em seus mercados. Cada vez que deslocam um espectador, digamos, da televisão para a Internet, há o risco de ele não voltar mais. (JENKINS, 2008, p. 45-47).

Acreditamos que cada pessoa em particular tem a necessidade de acessar os meios de comunicação de acordo com o que procura e deseja no momento, baseando-se nisso para a escolha do meio, que deverá ser usado e levando em conta as vantagens e praticidades do uso de um meio de comunicação em relação a outro, sem que os meios menos utilizados caiam no esquecimento. Esses conceitos que abordamos nomeadamente meios de comunicação, migração e convergência, são discutidos no terceiro capítulo, ao trazermos para análise as entrevistas realizadas com os estudantes migrantes cabo-verdianos e o consumo dos meios de comunicação por eles.

Com a leitura do livro organizado por Cogo, Gutierrez e Huertas (2008), levantamos algumas perguntas que contribuíram para a pesquisa: Visto que a “[...] internet es

el medio que más cambios ha provocado en la vida del migrante.” (BAILÉN, BRIGNOL

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Tabela 1 - Cursos escolhidos pelos estudantes africanos:
Tabela 2  –  Meios de comunicação mais usados pelos entrevistados:

Referências

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