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DELIBERAÇÃO DO CONSELHO DIRECTIVO DA ENTIDADE REGULADORA DA SAÚDE

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DELIBERAÇÃO DO CONSELHO DIRECTIVO DA

ENTIDADE REGULADORA DA SAÚDE

Considerando as atribuições da Entidade Reguladora da Saúde (doravante ERS) conferidas pelo artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 309/2003, de 10 de Dezembro;

Considerando os objectivos da actividade reguladora da ERS estabelecidos no artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 309/2003, de 10 de Dezembro;

Considerando os poderes de supervisão da ERS estabelecidos no artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 309/2003, de 10 de Dezembro;

(2)

I. DO PROCESSO

I.1. Origem do processo

1. Por exposição enviada a 24 de Abril de 2008, e recebida pela ERS a 29 desse mês, o utente J., na qualidade de utente do Serviço Nacional de Saúde (SNS), apresentou uma reclamação relativa à Venerável Ordem Terceira de S. Francisco da Cidade, Instituição Particular de Solidariedade Social, que mantém o Hospital da Ordem Terceira de S. Francisco da Cidade (e doravante Hospital da Ordem Terceira), pessoa colectiva com o NIPC 502354542, com sede na Rua Serpa Pinto n.º 7, 1249-203, Lisboa, registada na Entidade Reguladora da Saúde (ERS) sob o número 16184.

2. Após análise da referida exposição, o Conselho Directivo da ERS, por despacho de 8 de Maio de 2008, ordenou a abertura de inquérito registado sob o n.º ERS/027/08;

3. Considerando que o inquérito entretanto desenvolvido pela ERS permitiu identificar diversas entidades que se encontrarão igualmente envolvidas pela exposição em questão, identifica-se doravante o inquérito dirigido ao Hospital da Ordem Terceira, por facilidade, como ERS/027/08 – A.

I.2. A exposição do utente

4. Na exposição, o reclamante queixa-se de uma alegada dificuldade de marcação de colonoscopia, na qualidade de utente do Serviço Nacional de Saúde (SNS), no Hospital da Ordem Terceira.

5. Efectivamente, veio o reclamante referir que

“Tendo um familiar meu necessidade de efectuar uma colonoscopia por

indicação do seu médico assistente, dirigi-me hoje ao Hospital da

Ordem Terceira para efectuar a respectiva marcação, foi com surpresa que fui informado que não aceitavam marcações para utentes do Serviço Nacional de Saúde e só a partir de Setembro me deveria dirigir novamente à instituição para então provavelmente marcar o exame. Face à minha insistência fui informado que se o exame fosse feito particularmente, isto é se fosse pago de imediato seria efectuada daqui a duas semanas.” – cfr.

(3)

6. O referido utente veio ainda a complementar a sua exposição inicial com a informação relativa às suas outras diligências infrutíferas de tentativa de marcação de um exame de colonoscopia em outras entidades convencionadas do SNS, de onde resultou o referido alargamento do âmbito do inquérito.

7. Uma vez que o utente, com base na listagem de entidades convencionadas do SNS que pretensamente executariam colonoscopias e que lhe havia sido enviada pelo Gabinete do Cidadão/Observatório Regional de Apoio ao Sistema SIM-Cidadão da ARS LVT, tentou proceder à marcação em diversas outras entidades;

8. Tendo comunicado à ERS, em 30 de Abril de 2008, o resultado de tais suas outras diligências:

“Com base na lista […], contactei diversas entidades que supostamente

executariam o exame que o meu familiar necessita (colonoscopia).

Até ao momento o resultado desses contactos é o que consta na lista abaixo.

[…]

HOSPITAL DA ORDEM TERCEIRA Resp.Téc DR. (…)

Rua Serpa Pinto, 7 1200 LISBOA

213230300 - serviço nacional de saúde só a partir de Setembro, particular duas semanas.

[…]

Como podem verificar, estas entidades, ou já não têm acordo com o SNS ou os prazos são muito longos devido à preferência dada a não utentes.” –

(4)

I.3. Diligências

9. No âmbito da investigação desenvolvida pela ERS, e considerando que a situação exposta pelo utente indiciava um âmbito subjectivo de prestadores alegadamente envolvidos potencialmente bastante lato, realizaram-se as diligências de obtenção de prova consubstanciadas

(i) em contactos telefónicos, estabelecidos nos dias 2 e 5 de Maio de 2008, com 24 dos 26 prestadores privados e do sector social, constantes da listagem de prestadores convencionados do SNS na valência de endoscopia gastrenterológica, fornecida pela ARS LVT1, com o intuito de marcação de exame de colonoscopia quer como utente do SNS, quer como utente particular;

(ii) em pedidos de elementos, de 20 e 21 de Maio de 2008, visando confrontar tais 24 prestadores privados e do sector social, constantes da listagem2 da ARS LVT, com os resultados das diligências da ERS efectuadas em 2 e 5 de Maio de 2008;

(iii) em consulta e pesquisa do Sistema de Registo de Estabelecimentos Regulados (SRER) da ERS;

(iv) em consulta e pesquisa das tabelas relativas às taxas moderadoras para o acto de colonoscopia (total e esquerda).

10. Foram ainda efectuadas as diligências tidas por necessárias ao esclarecimento de factos suscitados após análise de todas as respostas dos prestadores constantes da referida listagem aos pedidos de elementos da ERS e subsequentes cruzamentos das informações delas constantes com aquelas que haviam sido transmitidas aquando das diligências telefónicas da ERS de 2 e 5 de Maio de 2008;

1

Listagem de entidades convencionadas para a valência de endoscopia gastrenterológica, enviada à ERS pela ARS LVT em 15 de Abril de 2008 junta aos autos. De referir que de tal listagem consta a identificação de 26 prestadores privados, embora 2 já não exercerão qualquer actividade. Por outro lado, de tal listagem consta a identificação de prestadores públicos (hospitais do SNS), que não foram considerados na presente análise pelo facto de o acesso aos hospitais públicos obedecer a um procedimento distinto.

2 Idem.

(5)

11. Tendo, a esse título, sido realizadas, nos termos do artigo 34.º do Decreto-Lei n.º 309/2003, de 10 de Dezembro, acções de fiscalização;

12. Bem como tentativas de marcações in loco, junto de prestadores, de exame de colonoscopia quer como utente do SNS, quer como utente particular;

13. E que ocorreram nas instalações do Hospital da Ordem Terceira.

14. Por outro lado, e sempre com vista ao esclarecimento de factos suscitados na pendência do processo, foram também efectuadas diligências complementares oficiosamente decididas pela ERS, tendo-se a este título junto aos autos do processo a denúncia entretanto recebida pela ERS e apresentada pelo utente C.;

15. Tal como, em resultado da análise efectuada à pronúncia do Hospital da Ordem Terceira ao projecto de deliberação emitido pela ERS, foram solicitadas informações e esclarecimentos adicionais a tal prestador.

16. Os elementos resultantes de tais diligências complementares foram juntos aos autos do processo e igualmente notificados ao Hospital da Ordem Terceira para se pronunciar sobre os mesmos.

17. Por último, foram solicitados esclarecimentos à Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARS LVT), designadamente sobre o Acordo com o SNS do Hospital da Ordem Terceira.

II. DOS FACTOS

II.1 Os prestadores e os actos convencionados

18. Nos termos da listagem fornecida pela ARS LVT à ERS em 15 de Abril de 2008 e junta aos autos, surgem identificados como sendo de prestadores convencionados do SNS na valência de endoscopia gastrenterológica:

(i) Afonso Maldonado, Lda. - Rua de São Tomás de Aquino, 10 – D, 1600 Lisboa com o telefone 217277488 (1440 utentes/trimestre);

(ii) Dr. António José Guerreiro da Cruz Martins - Av. de Roma, 35-1º. Fte., 1700 Lisboa, com o telefone 217932002 ou 217933349 (720 utentes/trimestre);

(6)

(iii) Associação Socorros Mútuos Empregados Comércio de Lisboa - Largo de S. Cristóvão, 1, 1100 Lisboa com o telefone 218813355 (120 utentes/trimestre);

(iv) Centro Médico de Moscavide, Lda. - Rua Dr. João Gomes Patacão, 15A-B, 1885 Moscavide com o telefone 219457500 (240 utentes/trimestre);

(v) Clínica de Gastroenterologia e Endoscopia Digestiva Dr. Pontes, Lda. - Av. João II, Lote 1.13. 01, 3.º Piso, Fracção I – Parque Expo, 1990 Lisboa, com o telefone 218968125 (480 utentes/trimestre);

(vi) Clínica de Santo António - Av. Hospitais Civis, 2720 Reboleira com o telefone 214999300 (1800 utentes/trimestre);

(vii) Duogastro - Av. 25 de Abril, nº.27 - C, 1675 Pontinha, com o telefone 214788660 (84 utentes/trimestre);

(viii) Dr. Eduardo Manuel Nunes Torpes Santana - Rua Rosa Damasceno, 14 A, 1900 Lisboa, com o telefone 218120193 (144 utentes/trimestre);

(ix) Endogastro - Rua Marquês da Mata, Bloco l - lº. Rect., 2775 Carcavelos, com o telefone 214565566;

(x) Hospital Egas Moniz - Rua da Junqueira, 126, 1300 Lisboa, com o telefone 213650000;

(xi) Gastrocol – Diagnóstico Endoscópico, Lda. - Rua Duque de Palmela, 27 – 1º. Dtº, Lisboa, com o telefone 213534177 (360 utentes/trimestre);

(xii) Gastrodiagnóstico – Unidade de Gastroenterologia Dr. Mendonça Santos, Lda. (Clínica da Fidalga) - Av. Cidade de Londres, Lt. 121, 2735 Agualva-Cacém, com o telefone 21 9181118 (360 utentes/trimestre);

(xiii) Gastromedis - Centro Clínico - Campo Grande, 46-A, Lisboa, com o telefone 21010042697 (360 utentes/trimestre);

(xiv) Hospitalar Capuchos/Desterro - Al. de Santo António dos Capuchos, 1169-050 Lisboa com o telefone 21 3136300;

(xv) Hospital CUF - Trav. do Castro, 3, 1350 Lisboa, com o telefone 213926100 (Marcações de colonoscopia canceladas sine die);

(xvi) Hospital de Reinaldo dos Santos - Vila Franca de Xira, com o telefone 263276701/8;

(7)

(xvii) Hospital da Ordem Terceira - Rua Serpa Pinto, 7, 1200 Lisboa, com o telefone 213230300;

(xviii) Hospital Pulido Valente - Alameda das Linhas de Torres, 117, 1700 Lisboa, com o telefone 217548000;

(xix) Hospital S. Francisco Xavier - Estrada do Forte do Alto do Duque, 1400 Lisboa, com o telefone 210431000;

(xx) Instituto Português de Oncologia de Francisco Gentil (Centro Regional de Lisboa) - Av. Prof. Lima Basto, 1070 Lisboa, com o telefone 217229800;

(xxi) Lúmen – Gastrenterologia e Endoscopia Digestiva, Lda. - Rua dos Bombeiros, nº. 9-1º. Esq., 2675 Odivelas, com o telefone 21 9315351 (720 utentes/trimestre);

(xxii) Clínica Elite - Av. Cidade de Londres, Lt. 75, Quinta da Fidalga, 2735 Agualva - Cacém, com o telefone 219141714 (900 utentes/trimestre);

(xxiii) Dr. Jaime Manuel Marques Midões Correia - Praça 25 de Abril, 15 – 1º, 2560 Torres Vedras, com o telefone 261312550 (15 utentes/dia);

(xxiv) Magalhães & Venância, Lda. - Av. Vasco da Gama, 52 1º.Esq, 1100 Lisboa, com o telefone 213010844 (480 utentes/trimestre);

(xxv) Dr.ª Maria Perpétua Gomes Rocha - Av. Miguel Bombarda 123 – 1º.C, 1050 Lisboa, com o telefone 213544492 (120 utentes/trimestre);

(xxvi) Mediscop - Prestação de Serviços Médicos, Lda. - Rua Prof. Francisco Gentil, 21, 1º. Dtº, 1600 Lisboa, com o telefone 21 757 77 42 (720 utentes/trimestre);

(xxvii) Dr.ª Ana Cristina Hidalgo Medeiros Lino de Sousa - Rua 31 de Janeiro, 10, 2725 Mem Martins, com o telefone 219204270 (720 utentes/trimestre);

(xxviii) Pereira Coutinho & Associados – Prestação de Cuidados Médicos, Lda. - Av. 25 de Abril, nº. 10 – Cave/Pátio, 2750 Cascais, como telefone 21483 04 87 (288 utentes/trimestre);

(xxix) Teresa Antunes, Lda. - Av. da República, 62-3º. Dtº, 1050 - 197 Lisboa, com o telefone 217931034 ou 7972579 (300 utentes/trimestre);

(xxx) Unidade de Endoscopia Digestiva, no Hospital Particular - Rua Luis Bivar, 30, 1050 Lisboa com o telefone 21 3522554 (720 utentes/trimestre);

(8)

(xxxi) Unignóstico – Unidade de Profilaxia e Diagnóstico Gastrenterológico, Lda. - Rua da Estrela, 29 – 1º.Dtº., 1200 Lisboa com o telefone 213906413 (600 utentes/trimestre).

19. Os actos de colonoscopia total e a colonoscopia esquerda integram o conjunto dos actos da Tabela da Área F – Endoscopia Gastrenterológica do SNS (códigos 005.1 e 006.1, respectivamente).

20. De acordo com tal Tabela da Área F – Endoscopia Gastrenterológica, os preços praticados e em vigor em Janeiro 2008 são os constantes da tabela infra

Actos Valores SNS Colonoscopia esquerda Preço convencionado € 39,13 Taxa moderadora € 6,70 Valor total € 45,83 Colonoscopia total Preço convencionado € 51,21 Taxa moderadora € 6,70 Valor total € 57,91

II.2 – O Hospital da Ordem Terceira

21. O Hospital da Ordem Terceira de S. Francisco da Cidade (doravante Hospital da Ordem Terceira) é um prestador de cuidados de saúde, com sede Rua Serpa Pinto n.º 7, em Lisboa, e devidamente registado no SRER da ERS sob o n.º16184.

22. A ERS tomou conhecimento que a entidade Hospital da Ordem Terceira surge com a qualidade de prestador convencionado do SNS, para a valência de Endoscopia Gastrenterológica, na lista disponibilizada pela ARS LVT.

23. De igual forma, o Hospital da Ordem Terceira indica no SRER da ERS possuir convenção com o SNS para a referida valência.

24. Em diligência efectuada pela ERS no dia 2 de Maio de 2008, foi pelo referido Hospital comunicado que as marcações de colonoscopias para utentes do SNS apenas seriam realizadas a partir de Agosto, tendo as marcações que ser realizadas presencialmente – cfr. memorando da diligência junto aos autos.

25. Porém, em igual diligência efectuada pela ERS, no dia 5 de Maio de 2008, quando solicitada a marcação de tal acto mas na qualidade de particular, já foi referido pelo Hospital da Ordem Terceira que a marcação poderia ser efectuada para final do mês de Maio de 2008.

26. Pelo ofício da ERS de 21.05.2008, foi tal prestador confrontado com os factos resultantes da diligência vinda de referir e, entre outros elementos, foi-lhe

(9)

expressamente solicitado que apresentasse justificação completa e fundamentada da

diferença temporal praticada na marcação dos actos consoante a entidade financiadora do utente – cfr. pedido de elementos da ERS de 21.05.2008, junto aos

autos.

27. Na sua resposta a tal pedido de elementos, veio o Hospital da Ordem Terceira alegar que

“O presente acordo encontra-se em processo de actualização com a ARS, mas

ainda não foi possível concretizar todos os detalhes dessa mesma actualização.”

e que

“[…] atendendo ao número de solicitações de utentes da ARS tem havido por

parte dos médicos afectos a esse serviço, um esforço no prolongamento dos horários convencionados”

embora

“[…] lamenta[ndo] não poder encurtar tão rápido como gosta[riam] o tempo de

espera actual. […] Por isso mesmo encontram[-se] num processo de negociação

com o Corpo Médico, em poder vir a alargar o horário convencionado com a ARS para assim pode[rem] reduzir o mais rapidamente possível o tempo de espera.”

28. Ainda no que concerne ao acordo com a ARS, referiu o Hospital da Ordem Terceira que:

“[…] não [têm] acordo de exclusividade com a ARS e que não existe, neste

Hospital, qualquer discriminação de doentes/entidades financiadoras do utente.”;

29. Sendo “[…] os utentes da ARS […] atendidos na proporção de 3 para 1, relativamente

à totalidade de todos os outros sub-sistemas”.

30. Subsequentemente, e no âmbito da acção de fiscalização realizada pela ERS a 17 de Julho de 2008 nas instalações do Hospital da Ordem Terceira, sitas na Rua Serpa Pinto, n.º 7, em Lisboa, o técnico da ERS, munido de uma Credencial do SNS, efectuou uma tentativa de marcação de Endoscopia Digestiva Alta, que foi marcada para o dia 19 de Agosto de 2008, depois de o funcionário administrativo ter dado em alternativa as datas de 19 e 20 de Agosto.

31. Nessa mesma diligência, foi efectuada, em momento posterior, mais uma tentativa de marcação de Endoscopia Digestiva Alta, como particular, que foi marcada para o dia 20 de Agosto.

(10)

32. Mas ainda no âmbito da mesma fiscalização realizada pela ERS a 17 de Julho de 2008, no referido Hospital, foi solicitada, por técnico da ERS, a marcação de uma colonoscopia como utente do SNS;

33. Tendo sido informado pela funcionária presente que não estavam a fazer marcações de colonoscopias para o SNS, sendo que as mesmas apenas abririam em Setembro.

34. Quando questionada a funcionária sobre a possibilidade de realização de tal exame já enquanto utente particular, a mesma informou que era possível marcar de imediato para o início do mês de Setembro – cfr. autos de ocorrência juntos aos autos.

35. Consequentemente, o Hospital da Ordem Terceira é um prestador convencionado do SNS para o exame de colonoscopia;

36. Mas realiza tais exames aos utentes do SNS em desigualdade de circunstâncias temporais relativamente a utentes de outras entidades financiadoras de utentes, designadamente “particulares”.

III. DAS DILIGÊNCIAS COMPLEMENTARES

37. Como já referido, a ERS efectuou diligências complementares oficiosamente decididas pela ERS.

38. Desde logo, procedeu-se à análise e junção aos autos da denúncia entretanto recebida pela ERS e apresentada por C., e pela qual é referido que

(i) no dia 10 de Julho de 2008, após consulta no seu centro de saúde, tentou proceder à marcação, por via telefónica, de um exame de colonoscopia total para a sua cônjuge, M., utente do SNS, no Hospital da Ordem Terceira de S. Francisco da Cidade;

(ii) ter-lhe-á sido então comunicado pelo Hospital que só podiam aceitar marcações para o final de Setembro e tendo a mesma que ser efectuada presencialmente;

(iii) após alguns dias, e através de segundo contacto telefónico para o Hospital da Ordem Terceira pelo referido reclamante, ter-lhe-á sido referido que “só podiam aceitar marcações, nos dias 2 e 3 de

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de Outubro de 2008 corresponderam, respectivamente, a uma quinta e sexta-feira;

(iv) assim sendo, no dia 2 de Outubro pelas 9 horas e 30 minutos, o reclamante dirigiu-se ao Hospital da Ordem Terceira para uma tentativa de marcação do referido exame, tendo-lhe sido comunicado que não podiam realizar o mesmo, “por não terem espaço temporal, além de

que as instalações onde se realizavam os mesmos, iam ser fechadas para obras de remodelação”;

(v) posteriormente, no dia 6 de Outubro de 2008, o mesmo reclamante procedeu à tentativa de marcação do exame de colonoscopia, desta feita como utente particular, já lhe tendo sido comunicado pelo Hospital da Ordem Terceira que o exame poderia ser realizado passados 8 dias.

39. Tal denúncia é, então, totalmente consentânea com os factos subjacentes à denúncia inicial, bem como com aqueles revelados pelas diligências efectuadas pela ERS;

40. E que respeitam à sujeição, pelo Hospital da Ordem Terceira, de maiores tempos de espera dos utentes do SNS, relativamente a utentes de outras entidades financiadoras e designadamente “particulares”, para a realização de exames de colonoscopia;

41. Pelo que, por Ofício da ERS de 19.01.2009, foi solicitada a pronúncia do Hospital relativamente a esta nova denúncia, com menção de que a mesma seria também considerada no âmbito do presente processo de inquérito.

42. Outrossim, e considerando que

(i) na pronúncia do Hospital da Ordem Terceira, de 6 de Janeiro de 2009 ao projecto de deliberação da ERS, era referido que o “[…] Hospital

cumpre o Acordo que tem estabelecido com a ARS de Lisboa, nos seus exactos termos e nos períodos de tempo acordados, que neste caso concreto é 5ª feira das 15H45 às 18H45 (cfr. doc. já junto aos autos)”;

(ii) na resposta do Hospital da Ordem Terceira de 11 de Junho de 2008 ao ofício de pedido de elementos da ERS de 21.05.2008, tinha sido apenas junta cópia do Acordo de Cooperação celebrado entre o referido Hospital e a ARS de Lisboa; e que

(iii) tais documentos eram omissos a qualquer referência concreta a um período de tempo acordado com a ARS LVT para a realização dos

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exames em questão aos utentes do SNS (e in concreto o período agora referido de 5ª feira das 15H45 às 18H45);

43. Solicitou-se, no mesmo Ofício da ERS de 19.01.2009, que o Hospital clarificasse a sua pronúncia, identificando qual o concreto “doc. já junto aos autos” a que pretenderiam fazer referência no âmbito da alegação da existência de tal período de tempo (5ª feira das 15H45 às 18H45) acordado com a ARS LVT;

44. Tal como se solicitou a confirmação da realização de exames de colonoscopias e/ou endoscopias em outros horários para além das 5ª feira das 15H45 às 18H45.

45. Resumidamente, e sobre os factos apresentados na nova denúncia, o Hospital da Ordem Terceira veio afirmar que

“[…] Confirmamos que efectivamente o Serviço entrou em obras uns dias

mais cedo que o previsto […]

A possibilidade de realizar o exame um pouco mais cedo, por outra entidade/particular que não ARS, insere-se na questão deste Serviço estar também aberto e convencionado a outras entidades/particulares que dispõem de outros dias e de outros tempos que, havendo muito menos procura, permite que o exame se realize mais breve, como é óbvio, relativamente à data da marcação. Que neste caso sub-judice não atingia a data prevista para o início das obras atrás referidas.

Devemos referir que este Serviço, independentemente do subsistema ARS/particular, quando referido pelo Utente e indicado/confirmado pelo médico assistente com indicação de urgência, o Utente é atendido o mais breve que nos for possível.” – cfr. resposta do Hospital da Ordem Terceira

de 02.02.2009, junta aos autos.

46. Já quanto aos esclarecimentos e informações adicionais solicitadas pela ERS, veio o Hospital da Ordem Terceira,

(i) juntar cópia do documento correspondente àquele “doc. já junto aos

autos” a que pretenderiam fazer referência no âmbito da alegação da

existência de tal período de tempo (5ª feira das 15H45 às 18H45) acordado com a ARS LVT, e que se consubstancia num documento intitulado “Ficha Técnica”, elaborado pelo próprio Hospital, e que entre

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outros elementos refere, com interesse para a questão em análise nos presentes autos,

“V – CAPACIDADE DE ATENDIMENTO: horário: 5ªs feiras das 15H45

às 18H45”; e

(ii) esclarecer, entre outros elementos, que “[…] o Acordo/Convenção com

a ARS é referente a exames de colonoscopia e endoscopia, como os próprios mapas juntos como Doc. 2 comprovam e também já nas nossas anteriores respostas havíamos referido que o alargamento dos períodos de atendimento foi feito com o intuito único e exclusivo de encurtar o período de espera dos utentes, tendo em conta o processo de negociação e actualização da Ficha Técnica com a ARS/Lisboa.” –

cfr. resposta do Hospital da Ordem Terceira de 02.02.2009, junta aos autos.

47. Por último, a ERS solicitou junto da ARS LVT alguns esclarecimentos tendo por base o quadro factual supra exposto, a qual, por resposta de 10.02.2009, e no que concretamente à actual situação da entidade convencionada Hospital da Ordem Terceira respeita, veio informar que

“HOSPITAL DA ORDEM TERCEIRA

Resp. Téc. DR (…)

Rua Serpa Pinto, 7, 1200 LISBOA

Acordo Portaria S/N – IPSS

• Exames vídeo-endoscopia (não indicou capacidade de atendimento)

• Facturou colonoscopia total e esquerda em 2008” – cfr. resposta da ARS LVT de 10.02.2009, junta aos autos, destaque nosso.

(14)

IV. DO DIREITO

IV.1 Enquadramento Geral

48. De acordo com o art. 3.º do Decreto-Lei n.º 309/2003, de 10 de Dezembro, a ERS tem por objecto a regulação, a supervisão e o acompanhamento, nos termos previstos naquele diploma, da actividade dos estabelecimentos, instituições e serviços prestadores de cuidados de saúde.

49. As atribuições da ERS, de acordo com o art. 6.º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 309/2003, de 10 de Dezembro, compreendem

“a regulação e a supervisão dos estabelecimentos, instituições e serviços

prestadores de cuidados de saúde, no que respeita ao cumprimento das suas obrigações legais e contratuais relativas ao acesso dos utentes aos cuidados de saúde, à observância dos níveis de qualidade e à segurança e aos direitos dos utentes”;

50. Constituindo atribuição desta Entidade Reguladora, nos termos do n.º 2 alínea a) daquele preceito legal, “defender os interesses dos utentes”.

51. Constitui objectivo da ERS, em geral, nos termos da alínea a) do art. 25.º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 309/2003, de 10 de Dezembro “assegurar o direito de acesso universal

e igual a todas as pessoas ao serviço público de saúde”, bem como, nos termos da

alínea c) do mesmo preceito legal, “assegurar os direitos e interesses legítimos dos

utentes”.

52. Mais se concretiza na alínea a) do n.º 2 daquela norma, que, para efeito de assegurar o direito de acesso dos utentes, incumbe à ERS “zelar pelo respeito da liberdade de

escolha nas unidades de saúde privadas”.

53. À ERS cabe, entre outras competências, prevenir e punir os actos de rejeição

discriminatória ou infundada de pacientes nos estabelecimentos do SNS, enquanto

concretização da garantia do direito de acesso universal e igual a todas as pessoas ao

serviço público de saúde – cfr. al. d) do n.º 2 do artigo 25.º do Decreto-Lei n.º

309/2003, de 10 de Dezembro;

54. Por outro lado, recorde-se que se encontram sujeitos à regulação da ERS, entre outros,

“As entidades, estabelecimentos, instituições e serviços prestadores de

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saúde, independentemente da sua natureza jurídica” – cfr. al. a) do n.º 1 do

art. 8.º do Decreto-Lei n.º 309/2003, de 10 de Dezembro;

55. Sendo, consequentemente, o Hospital da Ordem Terceira um operador, para efeitos do referido art. 8.º do Decreto-Lei n.º 309/2003, de 10 de Dezembro.

IV.2 – Do enquadramento legal aplicável às Instituições Particulares de Solidariedade Social na prestação de cuidados de saúde a utentes do SNS

56. O Decreto Lei n.º 119/83, de 25 de Fevereiro, que aprovou o Estatuto das Instituições Particulares de Solidariedade Social3 resultou - conforme se retira do preâmbulo - da “[…] vontade firme do Governo criar condições adequadas para o alargamento e

consolidação de uma das principais formas de afirmação organizada das energias associativas e da capacidade de altruísmo dos cidadãos […]”.

57. Acrescentando que “[…] quer as instituições prossigam objectivos sociais por assim

dizer complementares dos que integram esquemas oficiais de protecção social […] quer representem a intervenção principal do respectivo sector […] em todas estas situações está em causa o respeito e a preservação do princípio de que a acção das organizações particulares de fins não lucrativos é fundamental para a própria consecução, mais rica e diversificada, dos objectivos de desenvolvimento social global de que o Estado é o superior garante”.

58. Nele se definem as IPSS como instituições que são “[…] constituídas sem finalidade

lucrativa, por iniciativa de particulares, com o propósito de dar expressão organizada ao dever moral de solidariedade e de justiça entre os indivíduos e desde que não sejam administradas pelo Estado ou por um corpo autárquico, para prosseguir, entre outros, os seguintes objectivos, mediante a concessão de bens e prestação de serviços […]” (sublinhado nosso) – cfr. n.º 1 do art. 1.º.

59. Designadamente, a “[…] Promoção e protecção da saúde, nomeadamente através da

prestação de cuidados de medicina preventiva, curativa e de reabilitação […]” – cfr. al.

e) do n.º 1 do art. 1.º.

60. Na prossecução deste objectivo deve o Estado aceitar, apoiar e valorizar o contributo destas instituições, sendo que contributo destas últimas e o apoio que lhes é prestado

3

Posteriormente alterado pelo Decreto-Lei n.º 402/85, de 11 de Outubro e pelo Decreto-Lei n.º 29/86, de 19 de Fevereiro.

(16)

“[…] concretizam-se em formas de cooperação a estabelecer mediante acordos.” – cfr. n.º 1 e n.º 2 do art. 4.º;

61. Devendo as IPSS agir sempre com respeito pelos beneficiários, cujos “interesses e os

direitos […] preferem aos das próprias instituições, dos associados ou dos fundadores.” não podendo aqueles ser discriminados com base em “[…] critérios ideológicos, políticos, confessionais e raciais” – cfr. n.º 1 e 2 do art. 5.º

62. Só não se considerando como “[…] discriminações que desrespeitem o número

anterior as restrições de âmbito de acção que correspondem a carências específicas de determinados grupos ou categorias de pessoas.” – cfr. n.º 3.

63. A este título deve ainda sublinhar-se que a celebração de acordos de cooperação com as IPSS rege-se igualmente pela Portaria sem número do Ministério da Saúde de 07 de Julho de 19884, que aprovou o Regulamento dos Acordos a estabelecer entre as Administrações Regionais de Saúde e as Misericórdias e outras IPSS;

64. Tendo estado na sua origem as […] manifestações de vontade das Misericórdias e

outras instituições particulares de solidariedade social no sentido de retomarem a actividade hospitalar, actividade que afinal corresponde ao seu primeiro destino histórico.”; e

65. A crença do Governo de que […] a gestão privada assegurará não só uma melhoria

de cuidados às populações utentes com um maior e mais eficaz aproveitamento dos recursos humanos e materiais disponíveis e uma melhor mobilização das comunidades envolvidas, inseriu no seu programa a devolução progressiva dos hospitais das Misericórdias, sempre que tal seja viável e por elas seja manifestada, de novo, a vontade da prestação de cuidados de saúde ao cidadão” (cfr. Preâmbulo da

Portaria sem número do Ministério da Saúde de 07 de Julho de 1988).

66. Ora, prescreve o n.º 1 do art. 2.º daquela Portaria que “[…] os acordos a estabelecer

nos termos do artigo anterior envolvem a prestação de cuidados de saúde aos utentes do Serviço Nacional de Saúde, através das unidades pertencentes às Misericórdias e outras instituições particulares de solidariedade social […]”.

4

A portaria aprovou o Regulamento dos Acordos a estabelecer entre as ARS e as Misericórdias e outras IPSS. Aquela portaria veio regulamentar o disposto no n.º 2 do art. 4.º do Estatuto das IPSS e foi alterada posteriormente pela Portaria 143/91 publicada na II série do DR de 02 de Maio de 1991.

(17)

67. Uma vez celebrados cada um dos acordos, caberá a cada uma das IPSS, designadamente, garantir o bom funcionamento das instalações e dos equipamentos das suas unidades de saúde, bem como a qualidade dos serviços nelas prestados.

68. No caso sub judice o acordo de cooperação com o SNS detido pela Venerável Ordem Terceira de S. Francisco da Cidade, Instituição Particular de Solidariedade Social, foi celebrado com a então Administração Regional de Saúde de Lisboa, para vigorar nas instalações do Hospital da Ordem Terceira, a partir de 90 dias a contar do despacho da sua homologação, tendo este último ocorrido em 09.03.1993; e

69. Durante o período de um ano “[…] prorrogável por iguais períodos, se as partes o não

denunciarem com a antecedência mínima de 90 dias” – cfr. Cláusula XIV do acordo de

cooperação celebrado entre a Administração Regional de Saúde de Lisboa e a Venerável Ordem Terceira de S. Francisco da Cidade, Instituição Particular de Solidariedade Social, junto aos autos;

70. Destinando-se o Acordo de Cooperação à prestação aos utentes do SNS de serviços de análises clínicas e histológicas, ecografias, cardiologia, endoscopia gastroenterológica e intervenções cirúrgicas – Cláusulas I e II do Acordo.

71. Ora, nos termos da Cláusula VII do Acordo, o Hospital da Ordem Terceira “[…] não

pode recusar o atendimento dos utentes [do SNS]”, com excepção de situações de

avarias de equipamentos ou em que não seja clinicamente aconselhável a realização dos actos requisitados.

72. Recorde-se que do enquadramento legal supra destacado retira-se que devem as IPSS agir sempre com respeito pelos beneficiários, cujos “interesses e os direitos […]

preferem aos das próprias instituições, dos associados ou dos fundadores” não

podendo aqueles ser discriminados com base em “[…] critérios ideológicos, políticos,

confessionais e raciais” – cfr. n.º 1 e 2 do art. 5.º do Decreto - Lei n.º 119/83, de 25 de

Fevereiro.

73. Neste seguimento, é beneficiário cada um dos utentes do SNS que se dirige ao Hospital da Ordem Terceira e aufere dos serviços – no caso, serviços de saúde que lhe são prestados - não podendo este ser discriminado, salvo as restrições decorrentes de uma “[…] acção que correspondem a carências específicas de

determinados grupos ou categorias de pessoas.” – cfr. n.º 3 do art. 5.º do Decreto - Lei

n.º 119/83, de 25 de Fevereiro.

74. A este título, recorde-se que o direito à saúde é realizado através de um serviço nacional de saúde “[…] universal e geral e , tendo em conta as condições económicas

(18)

e sociais dos cidadão, tendencialmente gratuito […]” (cfr. n.º 1 do artigo 64.º da CRP);

e que

75. Na prossecução desse direito, deve o Estado “garantir o acesso a todos os cidadãos,

independentemente da sua situação económica, aos cuidados da medicina preventiva, curativa e de reabilitação” (cfr. al. a) do n.º 3 do artigo 64.º da CRP).

76. Nesse sentido, a Lei de Bases da Saúde (Lei n.º 48/90) consagra a complementaridade e o carácter concorrencial do sector privado e de economia social

na prestação de cuidados de saúde;

77. Recordando-se, a este respeito, que “Para efectivação do direito à protecção da

saúde, o Estado actua através de serviços próprios, celebra acordos com entidades privadas para a prestação de cuidados e apoia e fiscaliza a restante actividade privada na área da saúde.” – cfr. n.º 2 da Base IV da Lei de Bases da Saúde (Lei n.º 48/90, de

24 de Agosto).

78. Ou seja, pode o Estado fazer recurso a entidades privadas ou do sector social, enquanto auxílio à prossecução da sua missão – e imposição constitucional – de garantia de acesso a cuidados de saúde pelos utentes do SNS.

79. É assim que

“O Ministério da Saúde e as administrações regionais de saúde podem

contratar com entidades privadas a prestação de cuidados de saúde aos beneficiários do Serviço Nacional de Saúde sempre que tal se afigure vantajoso, nomeadamente face à consideração do binómio qualidade-custos, e desde que esteja garantido o direito de acesso.”

Sendo certo que

“A rede nacional de prestação de cuidados de saúde abrange os estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde e os estabelecimentos privados e os profissionais em regime liberal com quem sejam celebrados contratos nos termos do número anterior.” – cfr. n.ºs 3 e 4 da Base XII da

Lei de Bases da Saúde, destaque nosso.

80. Em tais casos de contratação com entidades privadas ou do sector social, os cuidados de saúde são prestados ao abrigo de acordos específicos, por intermédio dos quais o Estado incumbe essas entidades não públicas da missão de interesse público inerente à prestação de cuidados de saúde no âmbito do SNS, passando essas instituições a fazer parte da rede nacional de prestação de cuidados de saúde, tal como definida no

(19)

n.º 4 da Base XII da Lei de Bases da Saúde, isto é, do conjunto de operadores, públicos, sociais e privados, que garantem a imposição constitucional de prestação de cuidados públicos de saúde.

81. Ou seja, quando o Estado opte por, efectivamente, estender a rede nacional de prestação de cuidados de saúde por via do recurso à contratação de entidades do sector social ou privado, é ainda sempre e somente da rede nacional de prestação de cuidados de saúde – em toda a sua envolvente, complexidade, quadro legal e missão – que se cuida.

82. E faz-se notar que

“O Estatuto [do SNS] aplica-se às instituições e serviços que constituem o

Serviço Nacional de Saúde e às entidades particulares e profissionais em regime liberal integradas na rede nacional de prestação de cuidados de saúde, quando articuladas com o Serviço Nacional de Saúde.” – cfr. artigo

2.º do Estatuto do SNS aprovado pelo Decreto-Lei n.º 11/93, de 15 de Janeiro de 1993;

83. Tudo concorre, assim, para a imposição clara e inequívoca das regras do SNS às entidades do sector social e privado quando o Estado, como referido, opte ou necessite de estender a predita rede nacional de prestação de cuidados de saúde, por via do recurso à contratação, a tais entidades.

84. Constitui, então, dever das entidades convencionadas receber e cuidar dos utentes, em função do grau de urgência, nos termos dos contratos que hajam celebrado, bem como, nos termos do n.º 2 do artigo 37.º do Estatuto do SNS, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 11/93, de 15 de Janeiro, “cuidar dos doentes com oportunidade e de forma adequada à situação”, isto é, de forma pronta e não discriminatória.

85. De tanto resulta, então, que a Venerável Ordem Terceira de S. Francisco da Cidade, Instituição Particular de Solidariedade Social, enquanto entidade que celebrou um Acordo de Cooperação com o SNS para prestação de cuidados de saúde a utentes do SNS, não pode alhear-se daquele que é o quadro legal conformador do direito fundamental de acesso dos utentes do SNS aos cuidados de saúde;

86. Nem tampouco dos próprios direitos dos utentes do SNS que do mesmo decorrem.

87. Nesta medida, o Hospital da Ordem Terceira, tal como todos os prestadores convencionados do SNS para o exame de colonoscopia, deverão atender todos os utentes portadores de credenciais emitidas pelos respectivos Centros de Saúde na qualidade de utentes do SNS e nunca a título particular;

(20)

88. O que significa, designadamente, que aos utentes do SNS apenas poderão ser cobradas as taxas moderadoras correspondentes aos actos em causa, sem prejuízo das isenções previstas no art. 2.º do Decreto-Lei n.º 173/2003, de 1 de Agosto.

89. E note-se que ao referir a equidade na distribuição de recursos e na utilização de serviços de saúde, a Base II da Lei de Bases da Saúde quer significar igual tratamento para igual necessidade ou, dito de outra forma, tratamento distribuído de acordo com as necessidades;

90. Aplicando-se um tal conceito independentemente da fonte de financiamento, aliás em conformidade com a política de saúde e princípios constitucionais.

91. Assim sendo, não podem tais entidades convencionadas para o exame de colonoscopia recusar a prestação de cuidados de saúde a utentes do SNS com base em quaisquer motivos de ordem financeira, de gestão ou outra, sob pena de colocarem em crise a missão de interesse público que o Estado lhes atribuiu mediante a celebração de convenção com o SNS;

92. Tal como não podem as mesmas sujeitar os utentes a diferentes tempos de espera consoante as suas entidades financiadoras.

93. Assim, decorre do exposto a inadmissibilidade das justificações apresentadas pelo Hospital da Ordem Terceira, que se verificou realizar tais exames em desigualdade de circunstâncias temporais relativamente a utentes de outras entidades financiadoras de utentes, e concretamente quanto aos utentes “particulares”.

94. Note-se que, de acordo com as diligências efectuadas pela ERS, a dilação da marcação do exame de colonoscopia em prejuízo dos utentes do SNS praticada por tal prestador podia ascender a cerca de 4 meses;

95. O que configura uma clara sujeição, pelo prestador em questão, dos utentes do SNS a maiores tempos de espera para dar preferência ao atendimento de outros utentes (designadamente, particulares), consubstanciando, assim, uma discriminação negativa dos primeiros face aos segundos.

96. Ora, faz-se ainda notar que já no âmbito do processo ERS/067/07, que correu termos na ERS, o Hospital da Ordem Terceira, havia sido denunciado por um utente do SNS precisamente por sujeição a tratamento discriminatório em função da entidade financiadora.

97. Em tal procedimento, veio a ERS a proceder, a final, ao arquivamento dos autos por o Hospital da Ordem Terceira ter, em sede de audiência de interessados, vindo […]

(21)

teria exactamente o mesmo tipo tratamento, sem diferenciação de utente/sistema/subsistema de saúde ou entidade financiadora”.

98. Ora, verifica-se agora que tanto não somente não corresponderá à realidade, como o Hospital da Ordem Terceira terá reiterado as suas práticas discriminatórias dos utentes do SNS;

99. Pelo que, em conclusão, ao atender os seus utentes em função da entidade financiadora – e não da estrita ordem de chegada dos utentes ou do carácter prioritário da concreta situação clínica, o Hospital da Ordem Terceira de S. Francisco da Cidade, enquanto entidade integrada na rede nacional de prestação de cuidados de saúde, violou o dever que impende sobre as entidades convencionadas receber e cuidar dos utentes, em função do grau de urgência, nos termos dos contratos que hajam celebrado, bem como, nos termos do n.º 2 do artigo 37.º do Estatuto do SNS, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 11/93, de 15 de Janeiro, de “cuidar dos doentes com oportunidade e de forma adequada à situação”, isto é, de forma pronta e não discriminatória.

V. DA AUDIÊNCIA DE INTERESSADOS

V.I Da pronúncia do Hospital da Ordem Terceira

100. Em cumprimento do disposto no n.º 1 do artigo 101.º do Código de Procedimento Administrativo, notificou-se o Hospital da Ordem Terceira para, querendo, se pronunciar sobre o conteúdo do projecto de deliberação que lhe foi dado a conhecer.

101. O Hospital da Ordem Terceira exerceu, efectivamente, tal direito de pronúncia e, sumariamente, veio aos autos dizer que:

“[…]

1. Em primeiro lugar, reafirmamos que este Hospital não tem Acordo de exclusividade com a ARS/Lisboa.

2. Reafirmamos igualmente que não existe neste Hospital qualquer discriminação de doentes/entidades financiadoras dos utentes.

3. Neste particular incumbe-nos, em especial, esclarecer que este Hospital cumpre o Acordo que tem estabelecido com a ARS de Lisboa, nos seus

(22)

exactos termos e nos períodos de tempo acordados, que neste caso concreto é 5ª feira das 15H45 às 18H45 […]

4. Apesar do Acordo firmado com a ARS/Lisboa ser só para este período de tempo, e mediante a procura dos utentes, este Hospital alargou os períodos de tempo contratados de modo a poder atender mais utentes, sem qualquer contrapartida adicional.

5. Significa isto que este Hospital passou a atender utentes do SNS para além do período de tempo contratado, com o único e exclusivo objectivo de servir os doentes e encurtar o período de espera desses mesmos doentes.

6. Mais reafirmamos que, para ultrapassar total e definitivamente esta questão, já solicitámos à ARS/Lisboa o ALARGAMENTO do período inicialmente contratado.

7. Transmitimos de igual modo que, relativamente aos pontos 28 e 29 do projecto de deliberação, a situação concreta nelas reportada só pode dever-se a lapso ou errada interpretação da nossa funcionária, uma vez que as instruções e directivas da Administração deste Hospital são de que não há (nem pode haver) “marcações fechadas” e de que a todo o tempo é possível efectuar marcações a utentes do SNS.

[…]”;

102. Pelo que concluiu o Hospital da Ordem Terceira que “[…] deve o presente

Processo de Inquérito ser arquivado, sem mais qualquer consequência para este Hospital” – cfr. pronúncia do Hospital da Ordem Terceira sobre o projecto de

deliberação da ERS e junta aos autos.

V.II Apreciação

103. Refira-se, ab initio, que os argumentos apresentados pelo Hospital da Ordem

Terceira foram devidamente considerados e ponderados;

104. Verificando-se, no entanto, que os mesmos não são de molde a infirmar os factos e sua apreciação tal como constantes do projecto de deliberação da ERS;

(23)

105. Seja porque tais argumentos aduzidos se encontram assentes em pressupostos que não encontram respaldo no quadro normativo aplicável às entidades prestadoras de cuidados de saúde aos utentes do SNS;

106. Ou no quadro factual de funcionamento da entidade e verificado pela ERS;

107. Ou seja ainda porque, não raras ocasiões, os argumentos aduzidos encontram-se em directa contradição com os elementos de prova constantes dos autos.

108. Aliás, a este propósito deve sublinhar-se que a pronúncia do Hospital da Ordem Terceira é silente naquilo que constitui a substância do quadro factual apresentado pela ERS no seu projecto de deliberação;

109. Tal como é silente quanto aos resultados das diligências probatórias efectuadas nos presentes autos;

110. O que, consequentemente, e em regra, acaba por aproximar os seus argumentos a considerações de teor genérico.

111. Dito isto, analisem-se de forma mais concreta os argumentos apresentados pelo Hospital da Ordem Terceira.

112. O Hospital veio, então e recorde-se, alegar que “[…] não tem Acordo de

exclusividade com a ARS/Lisboa.”;

113. E que “[…] não existe neste Hospital qualquer discriminação de doentes/entidades

financiadoras dos utentes.”.

114. Ora, a momento algum foi pela ERS referido que o Hospital possuiria um dever, legal ou contratual, de exclusividade face ao SNS;

115. Pelo que tal alegação apresenta-se, em si mesma, inócua para o esclarecimento da situação que aqui se cuida e analisa.

116. Já quanto à alegação de que não existiria “[…] neste Hospital qualquer

discriminação de doentes/entidades financiadoras dos utentes”, ela encontra-se em

directa, absoluta e insanável contradição com os factos e elementos probatórios existentes nos autos.

117. Efectivamente, qualquer uma das exposições dos utentes reclamantes contradita directamente a posição defendida pelo Hospital;

(24)

118. Recordando-se a exposição do utente J., que veio referir que

“Tendo um familiar meu necessidade de efectuar uma colonoscopia por

indicação do seu médico assistente, dirigi-me hoje ao Hospital da

Ordem Terceira para efectuar a respectiva marcação, foi com surpresa que fui informado que não aceitavam marcações para utentes do Serviço Nacional de Saúde e só a partir de Setembro me deveria dirigir novamente à instituição para então provavelmente marcar o exame. Face à minha insistência fui informado que se o exame fosse feito particularmente, isto é se fosse pago de imediato seria efectuada daqui a duas semanas.” – cfr.

exposição do utente de 24 de Abril de 2008, junta aos autos;

119. Posteriormente complementada com as seguintes explicações adicionais:

“Com base na lista […], contactei diversas entidades que supostamente

executariam o exame que o meu familiar necessita (colonoscopia).

Até ao momento o resultado desses contactos é o que consta na lista abaixo.

[…]

HOSPITAL DA ORDEM TERCEIRA

Resp.Téc DR. ALBERTO FILIPE PAES COSTA E CURTO Rua Serpa Pinto, 7 1200 LISBOA

213230300 - serviço nacional de saúde só a partir de Setembro, particular duas semanas.

[…] – cfr. exposição adicional do utente de 1 de Maio de 2008, junta aos autos.

120. Por seu turno, o utente C. trouxe aos autos o conhecimento de que tentou recorrer, em Julho de 2008, ao Hospital da Ordem Terceira para efectuar uma marcação de colonoscopia para a sua cônjuge, M., utente do SNS, tendo-lhe então sido referido que “só podiam aceitar marcações, nos dias 2 e 3 de Outubro…entre as 9 horas e as

17 horas.”;

121. Sendo que, posteriormente, no dia 2 de Outubro pelas 9horas e 30 minutos, o reclamante dirigiu-se ao Hospital da Ordem Terceira para uma tentativa de marcação do referido exame, tendo-lhe sido comunicado que não podiam realizar o mesmo, “por

(25)

não terem espaço temporal, além de que as instalações onde se realizavam os mesmos, iam ser fechadas para obras de remodelação”.

122. De novo, no dia 6 de Outubro de 2008, o mesmo reclamante procedeu à tentativa de marcação do exame de colonoscopia, desta feita como utente particular, já lhe tendo sido comunicado pelo Hospital da Ordem Terceira que o exame poderia ser realizado passados 8 dias.

123. E parece o Hospital da Ordem Terceira pretender omitir – uma vez que nem tampouco sobre tanto teceu qualquer consideração – que a própria ERS efectuou as suas diligências com vista à marcação de uma colonoscopia na qualidade de utente do SNS.

124. Assim, em diligência efectuada pela ERS no dia 2 de Maio de 2008, foi pelo referido Hospital comunicado que as marcações de colonoscopias para utentes do SNS apenas seriam realizadas a partir de Agosto, tendo as marcações que ser realizadas presencialmente – cfr. memorando da diligência junto aos autos.

125. Porém, em igual diligência efectuada pela ERS, no dia 5 de Maio de 2008, quando solicitada a marcação de tal acto mas na qualidade de particular, já foi referido pelo Hospital da Ordem Terceira que a marcação poderia ser efectuada para final do mês de Maio de 2008 – cfr. memorando da diligência junto aos autos.

126. E também no âmbito da acção de fiscalização realizada pela ERS a 17 de Julho de 2008 nas instalações do Hospital da Ordem Terceira, sitas na Rua Serpa Pinto, n.º 7, em Lisboa, foi solicitada, por técnico da ERS, a marcação de uma colonoscopia como utente do SNS;

127. Tendo sido informado pela funcionária presente que não estavam a fazer marcações de colonoscopias para o SNS, sendo que as mesmas apenas abririam em Setembro.

128. Porém, quando questionada a funcionária sobre a possibilidade de realização de tal exame já enquanto utente particular, a mesma informou que era possível marcar de imediato para o início do mês de Setembro – cfr. autos de ocorrência juntos aos autos.

129. Ou seja, carrearam-se para os autos provas claras, precisas e concordantes da situação de discriminação a que os utentes do SNS que se dirigem ao Hospital da Ordem Terceira são sujeitos;

(26)

130. E que igualmente afastam in totum a sua alegação de que “[…] relativamente aos

pontos 28 e 29 do projecto de deliberação, a situação concreta nelas reportada só pode dever-se a lapso ou errada interpretação da nossa funcionária, uma vez que as instruções e directivas da Administração deste Hospital são de que não há (nem pode haver) “marcações fechadas” e de que a todo o tempo é possível efectuar marcações a utentes do SNS.”5.

131. Na realidade, quer para os utentes reclamantes, quer para a ERS, nas diversas ocasiões em que tentou verificar da marcação de exames de colonoscopia a utentes do SNS, as marcações estavam de facto encerradas;

132. O que, seguramente, não se deverá a constantes e sucessivos, mas idênticos,

lapsos ou erradas interpretações de funcionários.

133. Mas é igualmente oportuno recordar a resposta do Hospital da Ordem Terceira ao pedido de elementos da ERS de 21.05.2008, e na qual referiu que “[…] os utentes da

ARS […] atendidos na proporção de 3 para 1, relativamente à totalidade de todos os outros sub-sistemas”;

134. O que é consentâneo, aliás, com a resposta que o Hospital da Ordem Terceira apresentou à ERS na diligência complementar por si efectuada:

“A possibilidade de realizar o exame um pouco mais cedo, por outra

entidade/particular que não ARS, insere-se na questão deste Serviço estar também aberto e convencionado a outras entidades/particulares que dispõem de outros dias e de outros tempos que, havendo muito menos procura, permite que o exame se realize mais breve, como é óbvio, relativamente à data da marcação.” – cfr. resposta do Hospital da Ordem

Terceira de 02.02.2009, junta aos autos, sublinhado nosso.

135. Como parecerá evidente, tanto significa que o próprio Hospital da Ordem Terceira admite a existência de tempos de espera diferentes consoante a entidade financiadora dos utentes;

136. E que, consequentemente, admite a prática de discriminação dos utentes do SNS.

5

Os pontos 28 e 29 do projecto de deliberação correspondem aos actuais § 33 e 34 da presente deliberação.

(27)

137. Mas recorde-se que o Hospital da Ordem Terceira veio ainda alegar que

“[…] cumpre o Acordo que tem estabelecido com a ARS de Lisboa, nos

seus exactos termos e nos períodos de tempo acordados, que neste caso concreto é 5ª feira das 15H45 às 18H45 […]

4. Apesar do Acordo firmado com a ARS/Lisboa ser só para este período de tempo, e mediante a procura dos utentes, este Hospital alargou os períodos de tempo contratados de modo a poder atender mais utentes, sem qualquer contrapartida adicional.

5. Significa isto que este Hospital passou a atender utentes do SNS para além do período de tempo contratado, com o único e exclusivo objectivo de servir os doentes e encurtar o período de espera desses mesmos doentes.”

– cfr. pronúncia do Hospital da Ordem Terceira.

138. Porém, tanto não obsta, nem pode obstar à realidade discriminatória verificada no Hospital da Ordem Terceira.

139. Efectivamente, o prestador alega, como referido, que contratou com a ARS LVT a realização de exames de colonoscopia a utentes do SNS num determinado horário, a saber, quintas-feiras das 15h45 às 18h45.

140. Mas tanto não significa, desde logo, que o Hospital da Ordem Terceira tenha contratado uma qualquer capacidade com o SNS.

141. Aliás, e como a ARS LVT teve oportunidade de esclarecer sobre o Hospital da Ordem Terceira, o mesmo é convencionado para Exames vídeo-endoscopia e para os quais não indicou capacidade de atendimento – cfr. resposta da ARS LVT de 10.02.2009, junta aos autos, destaque nosso;

142. E que facturou colonoscopia total e esquerda em 2008.

143. Por outro lado, deve sublinhar-se que ao declarar determinado horário, o prestador reconhece somente que, aquando do aceitação, a capacidade que detinha à luz dos seus recursos disponíveis para fazer face à procura é a alegada àquela data (in casu no ano de 2003).

(28)

144. Ou seja, que no momento da emissão de tal declaração, o Hospital da Ordem Terceira declarava que possuía capacidade para realização de exames de colonoscopias às quintas-feiras das 15h45 às 18h45.

145. Caso contrário, e se se entendesse que o Hospital da Ordem Terceira apenas teria contratado com a ARS LVT o atendimento, dentro de certo horário, sempre se teria de questionar qual a fundamentação para que esta procedesse ao pagamento de exames de colonoscopia realizados em horários diferentes do declarado;

146. E que, por isso e relativamente a tais actos realizados extra-horário declarado, se deveriam considerar como fora do âmbito da convenção;

147. O que, claro está, deveria conduzir ao reembolso das quantias assim pagas pelo SNS em excesso.

148. Ora, se é verdade que a ARS LVT sempre procedeu ao pagamento ao Hospital da Ordem Terceira dos montantes correspondentes aos exames de colonoscopia realizados fora do horário declarado, deve então daí inferir-se o reconhecimento assim expresso de que não existem horários contratados.

149. Sendo que tanto representa, aliás, a “contrapartida adicional” que o Hospital da Ordem Terceira alegou não receber pelo facto de efectuar “mais exames” do que lhe seria exigível: o Hospital é pago por todos e cada um dos exames de colonoscopia que efectua aos utentes do SNS.

150. E note-se que é o próprio prestador que aceita realizar exames de colonoscopia em horário diferenciado do declarado e que ele próprio determina;

151. O que admite concluir que a capacidade de atendimento indicada evoluiu.

152. Caso assim não se admitisse, a facturação apresentada dos exames realizados em horário diferenciado do declarado era irregular.

153. E acresce que igualmente tanto conduziria a in extemis admitir a liberdade do prestador para decidir realizar, ou não, exames de colonoscopias consoante a natureza da entidade financiadora e em função da [sua] conveniência financeira da altura.

(29)

154. O Hospital da Ordem Terceira detém acordos com outras entidades financiadoras (subsistemas e seguradoras).

155. Ora, poderia então o prestador, alegando o horário de atendimento (formal) declarado na ficha técnica da convenção, limitar a realização de exames de colonoscopias a utentes do SNS em função dos seus meros interesses financeiros;

156. E, igualmente, não fazer uso desse mesmo horário (formal) para realização de exames a utentes do SNS, aumentando a realização de exames de colonoscopias a utentes do SNS, também em função dos seus meros interesses financeiros.

157. Ou seja, poderia o prestador limitar a realização de exames a utentes do SNS àquele horário formalmente constante da ficha técnica enviada para efeitos da convenção quando, por exemplo, tivesse procura de utentes de subsistemas, seguradoras ou “particulares” que lhe tomassem o remanescente da sua capacidade instalada;

158. Mas já não proceder a uma tal limitação – ultrapassando o referido horário formalmente constante da ficha técnica da convenção e sendo pago pela totalidade dos exames efectivamente realizados em qualquer horário por si livremente determinado – quando verificasse que a procura de utentes de subsistemas, seguradoras ou “particulares” não lhe tomassem o remanescente da sua capacidade instalada.

159. Ou seja, poderia o Hospital da Ordem Terceira decidir respeitar ou não as alegadas “limitações contratadas” consoante a eficácia financeira da estratégia a adoptar - atender uma maior percentagem de utentes do SNS numa determinada fase ou atender uma maior percentagem de utentes de outros subsistemas noutra fase, dependendo tal decisão apenas e tão só da viabilidade financeira da mesma.

160. E um tal comportamento redundaria numa utilização do acordo com o SNS a bel

prazer do prestador conforme as situações economicamente mais convenientes e

assim fundamentar a discriminação praticada.

161. E será também por isso que a ARS LVT, com propriedade e na sua resposta de 10.02.2009, junta aos autos, sublinhou o facto de “no caso de haver alterações à

matriz inicial do contrato, as mesmas [têm que ser] aceites pelo 1º outorgante”, ou

(30)

162. Porém, e aparte de se analisar se é mais vantajoso economicamente para o operador prestar preferencialmente cuidados a utentes privados quando comparado com o SNS, sempre se dirá que o acordo celebrado não terá seguramente menor valor no que respeita à obrigatoriedade do estrito e rigoroso cumprimento dos deveres que do mesmo decorrem, aos quais aquele pretendeu e desejou aderir, pelo que nunca semelhante argumento poderia colher para justificar a diferença de tratamento.

163. A verdade é que na medida em que a ARS LVT sempre procedeu ao pagamento dos exames de colonoscopia realizados, independentemente dos horários da sua efectiva realização, deve então inferir-se a irrelevância da alegação, pelo Hospital da Ordem Terceira, de haver contratado, com a ARS LVT, a realização de exames de colonoscopia a utentes do SNS num determinado horário, a saber, quintas-feiras das 15h45 às 18h45;

164. E remanesce o atendimento discriminatório entre utentes do SNS e utentes particulares praticado pelo Hospital da Ordem Terceira e verificado pela ERS.

165. Consequentemente, os interesses organizacionais do prestador, Hospital da Ordem Terceira, estão orientados em função da entidade financiadora – e não da ordem de chegada dos utentes ou do carácter prioritário da concreta situação clínica - resultando, por isso, na violação do seu dever, nos termos do n.º 2 do artigo 37.º do Estatuto do SNS, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 11/93, de 15 de Janeiro, de “cuidar dos doentes com oportunidade e de forma adequada à situação”, isto é, de forma pronta e não discriminatória.

VI. DECISÃO

166. O Conselho Directivo da ERS delibera, assim, nos termos e para os efeitos do preceituado nos art. 27.º e 36.º do Decreto-Lei n.º 309/2003, de 10 de Dezembro emitir uma instrução ao Hospital da Ordem Terceira de S. Francisco da Cidade nos seguintes termos:

a) Todos os utentes do SNS, portadores de credenciais, que se dirijam às suas instalações devem ser atendidos na qualidade de utentes do SNS;

b) O Hospital da Ordem Terceira de S. Francisco da Cidade deverá atender todos os seus utentes em função da estrita ordem de chegada ou do

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carácter prioritário da concreta situação clínica, não podendo estabelecer diferentes tempos de espera de acordo com a entidade financiadora;

c) O Hospital da Ordem Terceira de S. Francisco da Cidade deve dar cumprimento imediato à presente instrução, dando conhecimento à ERS, no prazo máximo de 30 (trinta) dias contados da notificação da mesma, dos procedimentos adoptados com um tal objectivo.

167. Será dado conhecimento da presente decisão à Administração Regional de Lisboa e Vale do Tejo, I.P..

168. A presente decisão será publicitada no sítio oficial da Entidade Reguladora da Saúde, na Internet.

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