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Morte súbita nas epilepsias: resultados inspiradores revelados

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Academic year: 2021

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REVENDO CIÊNCIAS BÁSICAS

RESUMO

A epilepsia é a doença neurológica crônica grave mais comum e o fenômeno da morte súbita nas epilepsias (SUDEP) é uma das causas de morte mais freqüentes nesta síndrome neurológica. Existem várias propostas com o intuito de esclarecer o fenômeno da SUDEP, e a maioria envolve o possível papel dos efeitos autonômicos, tais como distúrbios cardiorrespiratórios. Neste sentido, estudos clínicos e experimentais demonstraram que a atividade física pode diminuir a freqüência de crises epilépticas e melhorar a função cardiovascular e o estado psicológico dos pacientes com epilepsia. Este artigo de revisão aborda o fenômeno da SUDEP e a possível contribuição da atividade física na prevenção da SUDEP entre pacientes com epilepsia.

Descritores: Epilepsia; Morte súbita; Exercício ABSTRACT

Epilepsy is the most common serious chronic neurological condition and sudden unexpected death in epilepsy (SUDEP) is probably the most frequent epilepsy-related cause of death. Several suggestions have been made concerning the mechanisms behind SUDEP, most involving speculations on the possible role of autonomic effects such as cardiorespiratory disturbances. Clinical and experimental studies have shown that physical activity can decrease seizure frequency, as well as lead to improved cardiovascular and psychological health in patients with epilepsy. This article reviews the SUDEP phenomenon

and the possible contribution of exercise in the prevention of SUDEP among patients with epilepsy.

Keywords: Epilepsy; Death, sudden; Exercise MORTE SÚBITA INESPERADA NA EPILEPSIA

Epilepsia é a doença neurológica grave mais comum. Aproximadamente 50 milhões de pessoas em todo o mundo sofrem de epilepsia(1). Estudos epidemiológicos sugerem que 70% a 80% dos indivíduos que desenvolvem epilepsia terão remissão, enquanto os outros pacientes continuarão com suas crises convulsivas e são refratários aos tratamentos disponíveis atualmente(2). Os fatores de risco mais comuns para a epilepsia são as doenças vasculares cerebrais, tumores cerebrais, uso de álcool, lesões traumáticas da cabeça, malformações do desenvolvimento cortical, herança genética e infecções do sistema nervoso central(3). Em países com poucos recursos, infecções endêmicas como malária e neurocisticercose parecem ser importantes fatores de risco(4).

A morte súbita inesperada na epilepsia (SUDEP – Sudden Unexpected Death in Epilepsy) é definida como a morte súbita, não esperada, testemunhada ou não, não traumática e não por afogamento em

Morte súbita nas epilepsias: resultados inspiradores revelados

pela atividade física

Sudden unexpected death in epilepsy: expiration date revealed by physical activity

Ricardo Mario Arida1, Esper Abrão Cavalheiro2, Antonio Carlos da Silva3, Diego Basile Colugnati4, Aline Priscila

Pansani5, Marly de Albuquerque6, Fulvio Alexandre Scorza7

1 Professor Assistente do Departamento de Fisiologia, Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina – UNIFESP, São Paulo (SP), Brasil.

2 Professor Titular do Departamento de Neurologia/Neurocirurgia – Laboratório de Neurologia Experimental, Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina – UNIFESP, São Paulo (SP), Brasil.

3 Professor Assistente do Departamento de Fisiologia, Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina (UNIFESP/EPM), São Paulo (SP), Brasil.

4 Pós-graduando do Departamento de Neurologia/ Neurocirurgia – Laboratório de Neurologia Experimental, Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina – UNIFESP, São Paulo (SP), Brasil.

5 Pós-graduando do Departamento de Neurologia/ Neurocirurgia – Laboratório de Neurologia Experimental, Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina – UNIFESP, São Paulo (SP), Brasil.

6 Professor Assistente do Núcleo de Pesquisas Tecnológicas, Universidade de Mogi das Cruzes, Mogi das Cruzes (SP), Brasil.

7 Professor Assistente of Departamento de Neurologia/ Neurocirurgia - Laboratório de Neurologia Experimental, Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina – UNIFESP, São Paulo (SP), Brasil.

Autor correspondente: Fulvio Alexandre Scorza – Rua Botucatu, 862 – Edifício Leal Prado – CEP 04023-900 – São Paulo (SP), Brasil – Tel.: 11 5576-4508 – e-mail: scorza.nexp@epm.br Data de submissão: 2/8/2007 – Data de aceite: 14/8/2007

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pacientes com epilepsia, com ou sem evidências de uma crise convulsiva e com a exclusão de status epilepticus documentado, em que a autópsia não revela uma causa toxicológica ou anatômica da morte(5). As comparações entre as estimativas de incidência para SUDEP são difíceis já que têm sido usadas diferentes definições para esta condição, nem todos os pacientes possuem exames de autópsia, e os métodos de verificação de caso e as populações estudadas têm variado(6). A incidência estimada de SUDEP é de 3,5/1.000 indivíduos por ano em um estudo clínico com lamotrigina(7), 0,5-1,4/1.000 indivíduos por ano em pacientes com epilepsia tratada(8), 5,9/1.000 indivíduos por ano em pacientes ambulatoriais com epilepsia em um centro de referênciaterciário(9), 9/1.000 indivíduos por ano em candidatos à cirurgia para epilepsia e 0,35/1.000 indivíduos por ano em um estudo populacional(10). O estudo National General Practice Study of Epilepsy (NGPSE), um estudo populacional realizado no Reino Unido, constatou o primeiro caso de SUDEP após 11.000 indivíduos por ano de seguimento(11), e os resultados do Medical Research Council Antiepileptic Drug Withdrawal Study mostraram que a presença de SUDEP entre pacientes com epilepsia em remissão é um evento raro(12). As informações quanto aos fatores de risco para SUDEP são conflitantes, mas os potenciais fatores de risco incluem idade(7), início precoce da epilepsia(13), duração da epilepsia(14), crises epilépticas não controladas, especialmente na epilepsia do lobo temporal (ELT)(14-15), freqüência de crises (14-15), tipo de crise(15), número de drogas antiepilépticas (DAEs)(16) e temperaturas no inverno(17). Ademais, os potenciais mecanismos patológicos para SUDEP não são conhecidos, mas é muito provável que arritmias cardíacas durante e entre as crises convulsivas, distúrbios eletrolíticos, drogas antiarrítmicas ou transmissão de atividade epiléptica ao coração via sistema nervoso autônomo desempenhem um papel importante(18).

EPILEPSIA E O EXERCÍCIO: ESTUDOS EM HUMANOS

Embora o efeito favorável do condicionamento físico sobre a saúde geral seja inquestionável, os pacientes com epilepsia freqüentemente são excluídos de participação em atividades físicas. Isso é surpreendente, porque para muitos pacientes de alto risco, como os que possuem doença coronariana e diabetes, o exercício físico já se mostrou muito benéfico. Essa relutância tanto de pacientes quanto de médicos se deve, em parte, ao temor de lesões e, em parte, ao temor de que os exercícios desencadeiem crises epilépticas(19). Embora a questão de um impacto positivo ou negativo do exercício físico sobre a freqüência das crises continue sem solução, os pacientes com epilepsia devem usufruir os mesmos benefícios que outros no que diz respeito aos efeitos positivos sobre a capacidade máxima aeróbica e para o trabalho, peso corpóreo e auto-estima(20).

Todavia, essa atitude de restrição e proteção do paciente com epilepsia mudou dramaticamente ao longo

das últimas décadas, e as recomendações gerais foram revistas recentemente. Em 1968, o Comitê sobre Aspectos Médicos do Esporte da Associação Médica Americana recomendou que as pessoas com epilepsia não controlada por medicação evitassem não apenas esportes de colisão, mas também os esportes sem contato(21-22). Em 1974, o Comitê reviu sua instância e descreveu que pessoas com epilepsia com um controle adequado deveriam participar de qualquer esporte, exceto atividades em que pudesse ocorrer traumatismo encefálico crônico(23). Em 1983, a Academia Americana de Pediatria abriu ainda mais a consideração do indivíduo e declarou: “Epilepsia, por si só, não deve excluir uma criança da participação de hóquei, futebol, basquete e luta livre”(22). Em 1997, a Liga Internacional contra Epilepsia recomendou que os únicos esportes proibidos para atletas com epilepsia fossem pára-quedismo e mergulho(24). Para poder fornecer orientações satisfatórias sobre esportes a pacientes epilépticos, é essencial entender o fator que poderia afetar o transtorno epiléptico nos esportes. Muitas circunstâncias durante as atividades físicas ou esportivas são fatores presumidos que ainda não foram investigados. Do mesmo modo, é difícil apontar os efeitos específicos que a epilepsia terá sobre a participação nos esportes e tirar conclusões generalizadas.

Alguns estudos foram projetados para analisar a relação entre a epilepsia e exercícios comparando atividades físicas e sociais entre pacientes com epilepsia, com base em questionários e/ou estudos clínicos(25). Avaliam também o condicionamento físico por meio de testes padronizados de resistência física(25) e programas de treinamento físico(20). Com poucas exceções, o exercício físico regular é benéfico ao indivíduo com epilepsia. Por exemplo, um estudo conduzido por Nakken et al.(20) relatou que quatro semanas de um programa de treinamento físico na intensidade de 60% do VO2max, por 45 minutos por dia, não alterou a freqüência média de crises epilépticas(20). Outro estudo de avaliação do exercício físico em mulheres com epilepsia intratável demonstrou que o treinamento físico aeróbico diminuiu o número de crises durante o período de exercícios(26).

O grau de participação em atividades físicas entre pacientes com epilepsia parece ser baixo(27). Em um estudo de pacientes epilépticos na Noruega, apenas 23% participavam de atividades físicas organizadas(19). Apesar do fato de vários estudos epidemiológicos terem sido conduzidos sobre esse tópico, as amostras de pacientes podem não ter aplicação direta em países em desenvolvimento. Um estudo conduzido por Arida et al.(28) analisou o grau de participação de atividades físicas entre pacientes brasileiros com epilepsia. Embora apenas 15% dos pacientes tenham sido classificados como sendo ativos, ou seja, que praticavam exercícios regularmente, mais da metade dos pacientes participava de atividades físicas uma ou duas vezes por semana e nos finais de semana.

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A principal preocupação relativa ao exercício físico realizado por pessoas com epilepsia são as crises convulsivas induzidas pelo exercício, mas há outros importantes fatores envolvidos, como falta de centros de treinamento, problemas com transporte, baixa motivação, nível energético diminuído pela medicação e falta de instrutores qualificados para lidar com tais problemas(19).

EPILEPSIA E FISIOLOGIA DO EXERCÍCIO

A maioria dos experimentos sobre a atividade elétrica do cérebro demonstrou que as descargas anormais desaparecem na maioria dos pacientes durante a atividade física, mas retornam em repouso(29). Foi também observado que um número menor de crises ocorre durante a atividade física e mental em comparação aos períodos de repouso(30). A vigilância e atenção aumentadas envolvidas no exercício poderiam explicar a redução no número de crises(29). Outra hipótese relaciona a liberação das beta-endorfinas durante o exercício com a inibição de descargas epilépticas(31).

Embora tenha sido mostrado que o exercício reduz o número de crises e a atividade epiléptica no EEG, existem numerosos fatores que poderiam causar crises durante a prática de esportes e exercícios; no momento, quaisquer associações são especulativas. Parece que estes fatores ocorrem como resultado de um distúrbio de equilíbrio dos parâmetros fisiológicos, e a fadiga seria um desses fatores. Nos esportes, a fadiga geral e a fadiga muscular local têm de ser diferenciadas. O estresse da competição já foi discutido. O estresse físico e, especialmente, o psíquico são geralmente aceitos como fatores precipitantes de crises(32). Nos esportes competitivos, esse estresse pode induzir crises em pacientes sensíveis ao estresse(30,33). A hipóxia, hiper-hidratação e hipoglicemia são outras possíveis considerações. A hipóxia não ocorre durante atividades esportivas normais, embora possa ocorrer em altitudes elevadas (> 2.000 m), em atividades de montanhismo ou esqui alpino(33). A hiper-hidratação pode resultar de uma grande ingestão de água ou de uma perda extrema de sódio e representa um fator desencadeante de crises convulsivas bem conhecido. A hiper-hidratação pode ocorrer durante a natação ou exercício físico prolongado, como em corridas de maratonas e triatlo. A superingestão de líquidos isotônicos ou hipotônicos pode levar à hiponatremia(34). A hipoglicemia pode ocorrer em corridas de longa distância, ciclismo ou natação, especialmente quando há redução da ingestão regular de líquidos e alimentos(35). A hipertermia também sabidamente desencadeia crises convulsivas. O exercício prolongado (maratona, triatlo) em altas temperaturas e sob condições de alta umidade coloca os indivíduos em risco(36). Outro fator muitas vezes mencionado, mas de forma inapropriada, é a hiperventilação. Já que a hiperventilação no laboratório pode provocar descargas

epileptiformes ao eletroencefalograma (ECG) e mesmo crises convulsivas, especialmente crises de ausência, alguns autores concluíram, erroneamente, que o aumento da ventilação durante o exercício pode causar crises convulsivas(37). Todavia, a ventilação aumentada durante o treinamento físico é um mecanismo homeostático compensatório; e não ocorre alcalose respiratória da hiperventilação induzida(38). Do mesmo modo, as crises durante o exercício podem estar relacionadas a alterações metabólicas e respiratórias agudas. O grau de eficiência dos sistemas de controle respiratório em indivíduos não treinados não é conhecido, mas pessoas não treinadas perdem seu equilíbrio homeostático mais facilmente do que as treinadas.

EFEITO DO EXERCÍCIO FÍSICO SOBRE MODELOS EXPERIMENTAIS DE EPILEPSIA

Estudos experimentais também mostraram um efeito positivo do exercício físico em animais com epilepsia (39-42). O primeiro estudo com relatos do efeito do exercício físico sobre a epilepsia usou o modelo de abrasamento

(kindling) e verificou o efeito do exercício agudo e crônico

sobre o desenvolvimento de abrasamento da amígdala(39). Para avaliar o efeito agudo do exercício sobre a evolução do abrasamento, os animais foram submetidos a um período diário de exercícios físicos que consistiu de 40 minutos de corrida na esteira rolante, à velocidade de 20 metros por minuto. Um minuto após o exercício, os animais foram estimulados (abrasamento). Para o efeito crônico do exercício, os animais foram submetidos a um programa de exercícios aeróbicos (45 sessões de 40 minutos de corrida em uma esteira rolante, a 20 metros por minuto, sete dias por semana). Após este período de treinamento, os animais foram submetidos a 40 minutos de corrida na mesma velocidade e foram estimulados um minuto após o exercício. O número de estímulos necessários para atingir o estágio 5 foi estatisticamente mais elevado para o grupo de exercício crônico em relação ao grupo de exercício agudo e o grupo-controle. O número de estímulos necessários para atingir o estágio 5 no grupo de exercício agudo foi maior, mas não estatisticamente diferente do grupo-controle. Assim, os grupos de exercício agudo e crônico gastaram mais tempo e tiveram durações mais curtas de pós-descarga (PD) durante o estágio 1 do que o grupo-controle.

Alguns fatores provavelmente contribuíram para este efeito. Várias linhas de evidência mostram que a neurotransmissão cerebral é influenciada pelo exercício. Por exemplo, o aumento dos níveis de noradrenalina no cérebro inteiro já foi relatado(43). É fato bem conhecido que, entre as catecolaminas, a noradrenalina demonstra um efeito inibitório tônico sobre o desenvolvimento do abrasamento, mas não sobre o estado de abrasamento(44). Bortolotto e Cavalheiro(45) observaram que a depleção da noradrenalina induzida por DSP4 facilitou a propagação

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da atividade epileptiforme e a taxa de abrasamento do hipocampo. Embora a maioria desses estudos associe o sistema noradrenérgico do cérebro com o desenvolvimento do abrasamento(46), Welsh e Gold mostraram que uma única injeção intraperitoneal de epinefrina administrada 30 minutos ou 24 horas antes do primeiro testes, retardou o desenvolvimento de crises epilépticas, sugerindo que as catecolaminas endógenas periféricas possam desempenhar um importante papel na regulação da epileptogênese. As evidências a favor de alterações de síntese e metabolismo das catecolaminas durante o exercício e o envolvimento inibitório deste sistema neurotransmissor no abrasamento da amígdala sustentam a hipótese de que o efeito do exercício crônico sobre as catecolaminas cerebrais pode contribuir para retardar o desenvolvimento do abrasamento.

Também foi observado que o tempo gasto no estágio 1 foi mais longo e a duração de PD neste estágio foi mais curta nos animais treinados com exercício. Como regra geral, a taxa de abrasamento parece estar relacionada ao comprimento do PD inicial, isto é, quanto mais longo o PD inicial, mais rapidamente aparece o abrasamento(47). Assim, a avaliação de diferentes estágios é importante, já que o efeito da catecolamina é observado principalmente durante o desenvolvimento do abrasamento e não após o estabelecimento das crises do estágio 5(44). Considerados em conjunto, esses achados sugerem que o exercício físico inibe o desenvolvimento do abrasamento da amígdala em ratos.

Um estudo subseqüente usando o modelo de epilepsia induzida pela pilocarpina avaliou o efeito de um programa de exercícios aeróbicos sobre a freqüência de crises(40). Após a primeira crise espontânea recorrente, os animais foram submetidos a um programa de exercícios aeróbicos de 45 sessões sobre uma esteira rolante, sete dias por semana, na intensidade de 60% VO2max. Foi observada uma menor freqüência de crises nos animais treinados portadores de epilepsia. A principal preocupação com respeito ao exercício físico realizado por pessoas com epilepsia tem sido a de crises induzidas pelo exercício. As crises ocorrem durante o exercício físico, mas aparentemente são infreqüentes(48). Neste estudo, apenas dois animais apresentaram três crises cada, durante 3.600 horas de exercício, e dois animais manifestaram uma crise cada, um minuto após o exercício.

Foram realizadas investigações adicionais a fim de esclarecer ainda mais os fatores que poderiam interferir neste processo. Um estudo usando taxas metabólicas cerebrais locais de glicose avaliou se o treinamento físico modifica a atividade funcional em ratos com epilepsia(41). A taxa metabólica cerebral local de glicose foi medida pelo método quantitativo de [14C]2-deoxiglicose (2DG). Para determinar as alterações na atividade funcional do cérebro em animais epilépticos treinados, foram estudados ratos com epilepsia durante a fase interictal do modelo de epilepsia induzida por pilocarpina. O propósito do estudo do metabolismo cerebral durante a fase interictal

foi que todos os animais apresentassem crises epilépticas em repouso e não durante o exercício(40). Entretanto, a hipótese de que animais com epilepsia submetidos a treinamento físico exibiriam alterações metabólicas acentuadas na fase interictal não foi confirmada. Foi observado um aumento das taxas metabólicas cerebrais locais de glicose interictal no colículo inferior e córtex auditivo nos ratos epilépticos treinados em comparação a ratos epilépticos não treinados. Embora nenhuma alteração substancial das taxas metabólicas cerebrais locais de glicose tenha sido observada após treinamento físico, o exercício reverteu as taxas metabólicas baixas em várias estruturas dos animais com epilepsia. Vissing et al.(49) descreveram uma maior utilização local de glicose no córtex auditivo e visual durante exercícios, sugerindo que estas alterações não estejam diretamente relacionadas ao exercício em si, mas ao estado de maior alerta mental nos ratos durante o exercício do que em repouso. Já que a atividade física necessita de um certo nível de alerta, o aumento de atenção e vigília observado durante a atividade física poderia reduzir o número de crises epilépticas(29). Embora essas alterações tenham sido observadas em repouso, a taxa metabólica aumentada nestas estruturas poderia explicar o número menor de crises convulsivas em ratos epilépticos treinados no presente trabalho e em investigações anteriores(40).

Um estudo recente foi realizado para analisar o efeito do exercício aeróbico sobre os parâmetros eletrofisiológicos do hipocampo in vitro, observados em ratos submetidos ao modelo da epilepsia induzida por pilocarpina(42). As alterações eletrofisiológicas foram monitoradas por potenciais de campo extracelulares registrados na área CA1. Ratos epilépticos treinados exibiram uma redução de espículas quando comparados a ratos não treinados. Esses resultados indicam que o treinamento físico reduz a hiper-responsividade em CA1 e pode modificar a plasticidade sináptica em ratos submetidos ao modelo da epilepsia límbica induzida por pilocarpina.

Nestes modelos animais de epilepsia do lobo temporal parece que a atividade física em geral não pode ser considerada um fator indutor de crises. Os mecanismos pelos quais o treinamento físico é capaz de induzir tais alterações não são completamente compreendidos e requerem maior investigação.

CONSIDERAÇÕES FINAIS E OBJETIVOS FUTUROS

Como já mencionado, os indivíduos epilépticos apresentam um aumento de duas a três vezes na probabilidade de morrer prematuramente do que os que não têm epilepsia, e a categoria mais comum de morte relacionada à epilepsia é a SUDEP. As causas fisiopatológicas exatas da morte súbita inesperada nas epilepsias não são conhecidas, mas é muito provável que as anormalidades cardíacas durante e entre as crises desempenhem um papel potencial(18). Segundo este

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raciocínio, e com base em evidências experimentais e clínicas da última década que sugerem que a atividade física por si só é capaz de reduzir arritmias cardíacas em estudos animais e em seres humanos(50), postulamos a questão: poderia existir uma relação entre a inatividade física e SUDEP?

Em primeiro lugar, considera-se que as doenças cardiovasculares estejam freqüentemente associadas à hiperatividade do sistema nervoso simpático(51) e que aumentos de atividade física produzem efeitos benéficos sobre o sistema cardiovascular em indivíduos normais e doentes, por alterações no controle neuronal da circulação(50). Esses efeitos incluem redução na pressão sangüínea e efluxo simpático em seres humanos(52) e também em modelos animais de treinamento com exercícios(53). Já que a morbidade e a mortalidade na doença cardiovascular muitas vezes estão associadas a elevações na atividade do sistema nervoso simpático(54), os efeitos benéficos da atividade física provavelmente estão relacionados, em parte, à menor atividade simpática. É interessante notar que um estudo recente desenvolvido pelo nosso grupo avaliou a freqüência cardíaca in vivo (ECG) e em preparações isoladas ex vivo (preparação de Langendorf) de ratos com epilepsia(55). Os resultados mostraram diferenças na freqüência cardíaca média in

vivo, mas surpreendentemente nenhuma diferença foi

notada na freqüência cardíaca na situação de isolados

ex vivo, sugerindo uma modulação pelo sistema nervoso

central sobre o coração que poderia explicar a SUDEP(55). Se considerarmos estes achados conjuntamente, é razoável propor que a atividade física regular é capaz de atenuar a atividade do sistema nervoso simpático, as anormalidades cardíacas e, conseqüentemente, a SUDEP.

Em segundo lugar, fica claro que a mortalidade prematura é maior em pacientes com epilepsia, especialmente aqueles com crises mais graves(6), e aceita-se, em geral, que as anormalidades cardíacas entre uma crise e outra sejam, muito provavelmente, a causa de SUDEP(6). Uma vez que a atividade física tem sido vista como tendo a ação de um anticonvulsivante(28,39-40,42,56), é coerente propor que a atividade física regular possa atenuar a freqüência de crises e anormalidades cardíacas que poderiam culminar em SUDEP.

Finalmente, o próximo passo é compreender os mecanismos pelos quais o treinamento com exercícios influencia o sistema cardiovascular de pacientes com epilepsia. É provável que esses mecanismos sejam importantes para o desenvolvimento de novas estratégias para prevenção da SUDEP.

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Referências

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