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FUNDAMENTAÇÃO BÍBLICA DO DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO Prof. Ms. Lucho Torres Bedoya

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Academic year: 2023

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FUNDAMENTAÇÃO BÍBLICA DO DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO

Prof. Ms. Lucho Torres Bedoya* Resumo: Que possibilidades oferecem as Escrituras para a fundamentação do diálogo inter-religioso? Em que medida a abertura a outras experiências religiosas (aceitação de valor, e de verdade), é conteúdo da Revelação de Deus? O diálogo inter-religioso pode oferecer novos horizontes de sentido para a melhor compreensão da fé? Em referência a estas questões, relevantes para a teologia das religiões, este artigo pretende mostrar, com base em análise de textos e definições metodológicas, evidências claras da fundamentação bíblica do diálogo inter-religioso.

Palavras-chave: diálogo inter-religioso, pluralismo religioso, Bíblia.

Abstract: Which possibilities do offer the Holy Writ for the foundation of the interreligious dialog? In which dimension the opening to other religious experiences (value and truth acceptance) is contents of God’s Revelation? The interreligious dialog can offer new horizons of sense for a better comprehension of the faith? In reference to these questions, momentous for theology of religions, this article intends to show, with basis in analysis of texts and methodologies definitions, clear evidences of the biblical foundation of the interreligious dialog.

Key-words: interreligious dialog; religious pluralism; Bible.

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Introdução

O diálogo inter-religioso é, sem dúvida, um sério desafio para a teologia contemporânea. O pluralismo religioso é uma realidade incontestável apesar da intolerância de certos fundamentalismos que pretendem ocultá-la.

Lamentavelmente, grupos e movimentos cristãos de tendência sectária usam a Bíblia como arma de defesa e ataque contra outras religiões e denominações confessionais, a fim de preservar a prerrogativa da religião cristã, a participar de uma determinada tradição. No entanto, existe hoje a consciência mundial, cada vez mais clara, da necessidade do diálogo inter- religioso como postura ética. Na realidade atual, o pluralismo religioso não só desafia essas posturas religiosas fundamentalistas, mas é atitude de resistência a qualquer pretensão do tipo fundamentalista, que coloque em risco a paz e a segurança da vida humana e da natureza, já debilitadas pelas políticas econômicas e militares dos governos poderosos do mundo.

Cabe à teologia a responsabilidade de aprofundar a pertinência do conhecimento teológico sobre o diálogo inter- religioso e de apresentar à comunidade de fé e à sociedade o horizonte de sentido que tem para a salvação da vida humana. Eis a importância da teologia das religiões, como posicionamento crítico da fé cristã perante o pluralismo religioso. Neste contexto é de vital importância afirmar o sentido libertador das Escrituras, como fonte de inspiração para o diálogo e comunhão inter-religiosa e construção de uma humanidade com sentido.

Neste artigo pretendemos contribuir com esta reflexão mostrando os fundamentos que a Bíblia oferece para o aprofundamento do diálogo inter-religioso na comunidade de fé, e em referência à atuação da Igreja perante outras religiões.

1. Pressupostos conceituais e metodológicos

1.1. Para nós cristãos, a Sagrada Escritura é fonte da Revelação de Deus por excelência, porque acreditamos estar nela contida a plenitude da mesma. Os critérios decisivos para a

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compreensão da Revelação de Deus no decorrer da história humana estão na Bíblia.

As Escrituras, por causa de seu caráter inspirado, não têm um sentido evidente em si mesmas, nem absoluto. O sentido da Palavra de Deus é relativo à comunidade de fé que a escuta e acolhe na história, enquanto lhe oferece um sentido salvífico de vida. Isto implica compreender que, embora a Bíblia não aborde problemas contemporâneos, nem tinha como o fazer, pode oferecer horizontes de sentido para solução dos mesmos.

1.2. O diálogo inter-religioso não é, propriamente, um conteúdo específico desenvolvido nas Escrituras. Tampouco é uma preocupação bíblica fundamental. No entanto apresenta-se como um dos referencias da construção teológica do Antigo e do Novo Testamento que merece especial atenção e que mais adiante abordaremos.

Na Bíblia encontramos claras evidências do diálogo inter- religioso, e particularmente horizontes de sentido sobre as suas implicações na compreensão e na vivência da fé israelita e cristã.

Inúmeros textos de significado abrangente e, particularmente, vivências e fatos consignados nas Escrituras, apontam à aceitação e apropriação canônica do judaísmo e do cristianismo de experiências religiosas distintas.

1.3. Estas constatações nos levam a precisar dois tipos de fundamentação bíblica, complementares entre si. Um, de conteúdo da inspiração, no âmbito da hermenêutica. O outro, do conteúdo da fenomenologia, no âmbito da exegese. No primeiro caso trata-se de avaliar as possibilidades de sentido atual que os textos bíblicos trazem para a compreensão do diálogo inter-religioso. No segundo caso, procura-se explicar o significado contextual de determinados fatos e experiências históricas a que fazem referência os textos bíblicos, em relação ao assunto em questão.

Como contribuição para os estudos sobre o pluralismo religioso na Bíblia, julgamos de maior relevância pesquisas de perspectiva fenomenológica que permitam encontrar fundamentos

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sólidos sobre o que realmente podemos entender como diálogo inter-religioso nas Escrituras e suas implicações na compreensão da Revelação de Deus.

1.4. A maneira adequada de abordar o assunto na Bíblia é entender conceitualmente o diálogo como uma realidade dinâmica e não mecânica. Além dos elementos relacionais (eu-tu) e da mediação verbal que o compõe, o diálogo acontece historicamente como inter-ação existencial, vital, histórica entre pessoas, grupos ou povos, a partir de necessidades concretas propiciadas por um referencial existencial comum.

O diálogo inter-religioso, enquanto atitude e comportamento de interação, manifesta-se por uma necessidade intrínseca à compreensão histórica mais abrangente de determinada experiência religiosa de grupos e povos particulares. A disposição para este diálogo responde à necessidade particular da experiência religiosa de alguém. Esta necessidade é de ordem teleológica: da procura da melhor compreensão do sentido da experiência religiosa particular.

A dinâmica do diálogo inter-religioso não implica na negociação das partes, mas na abertura a novos e consistentes referenciais para a afirmação histórica da própria fé. O diálogo apresenta-se assim como instância crítica da fé que possibilita a re- significação da experiência religiosa atual em favor da consolidação dos fundamentos primeiros, num horizonte maior da compreensão da fé e da salvação que oferece.

É na interação dos sujeitos paradigmáticos da Revelação de Deus (Povo de Israel, Jesus de Nazaré, Comunidades cristãs das origens) com outras experiências religiosas, em seus correspondentes contextos histórico-sociais, que se revelam sua atitude e prática de diálogo, comunicação relacional, alteridade, afirmação de autonomia, de respeito e acolhida do outro.

1.5. Isto significa afirmar que o diálogo inter-religioso na Bíblia deve ser adequadamente entendido a partir dos resultados práticos desta interação, cujo horizonte maior é a procura de uma

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vida humana com sentido, a partir da afirmação histórica da fé judaica e cristã na significação libertadora de seus fundamentos.

Nas Escrituras podemos destacar alguns frutos desta interação, entre os quais: a atitude de co-existência com experiências religiosas não judaicas nem cristãs; a consciência da origem e destino comum dos seres humanos em Deus; a valorização teológica de pessoas com experiências religiosas distintas; a não-exclusão da salvação de Deus a estrangeiros e grupos sociais marginais; a incorporação canônica de diversas experiências religiosas; a construção teológica da fé a partir da acolhida da diversidade de tradições religiosas.

2. Possibilidades que a Bíblia oferece para o diálogo inter- religioso

2.1. Um dado prévio que perpassa a história bíblica é seu desenvolvimento em contextos de diversidade religiosa, naturalmente aceitos, na forma de co-existência com experiências religiosas de povos e culturas.

A constatação bíblica da co-existência com realidades de pluralismo religioso é diversa, verificável nos diversos períodos da história de Israel:

a) Do período da Formação do Povo de Israel S. XIII-XI AC citamos dois textos eloqüentes. No deserto, a caminho da terra de Canaã, após Moisés ter referido a seu sogro tudo o que Javé tinha feito contra Faraó e os egípcios por causa de Israel, Jetro conclui:

“... que Javé é maior que todos os deuses” (Ex 18,11). Na célebre renovação da Aliança das Tribos de Israel no santuário de Siquém, Josué lembra que Abraão, e outros ancestrais do povo, antes de ser guiado por Javé pelas terras de Canaã, habitava além do rio servindo outros deuses (Js 24,2). Na hora da renovação litúrgica da aliança Josué coloca o povo para decidir a quem servir “se aos deuses aos quais serviram vossos pais do outro lado do Rio, ou aos deuses dos amorreus em cuja terra agora habitais. Quanto a mim e à minha casa serviremos a Javé” (Js 24,15).

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b) Da época da monarquia lembramos as memórias de Isaías do tempo do rei Ezequias, S. VIII AC, quando Senaquerib rei da Assíria ameaçava destruir Judá: “Cuidado, não deixeis Ezequias seduzir-vos dizendo: ‘Javé nos livrará”. “Por acaso os deuses das demais nações livraram cada um a sua terra das mãos do rei da Assíria? Onde estão os deuses de Emat e de Arfad? Onde estão os deuses de Sefarvaim, onde estão os deuses da terra de Samaria?”(Is 36,18-19). Numa oração angustiada à espera de uma intervenção favorável de Javé, Ezequias alude a existência de outros deuses, porém mostrando sua fraqueza e nulidade, quando Javé sai em auxílio de seu povo: “É verdade Javé que os reis da Assíria destruíram todas as nações (e as suas terras) e lançaram os seus deuses ao fogo, porque não eram deuses, mas sim obras de mãos humanas, feitos de madeira e de pedra, que aqueles destruíram. Mas agora, Javé nosso Deus, salva-nos da sua mão, eu te suplico, a fim de que todos os reinos da terra saibam que só tu Javé, és Deus” (Is 37,18-20).

c) Do período do Exílio, S. VI AC, mencionamos a profecia de Jeremias aos judeus no Egito na qual, logo de recapitular a discussão com eles a respeito de sua adesão ao culto dos deuses e deusas egípcios, Javé os desafia a reconhecer pelo discernimento qual a palavra dos deuses que se realiza: “a Minha ou a deles!” (Jr 44, 28).

d) Do período helenista mencionamos o salmo 86, provavelmente da época dos Macabeus, no S. II AC, que ainda conserva este sentido de pluralismo religioso, embora ao interior da vivência da fé num Deus único: “Entre os deuses não há outro como tu, nada que se iguale às tuas obras!. Todas as nações que fizeste virão adorar-te e dar glória a teu nome, Senhor, pois tu és grande e fazes maravilhas, tu és Deus, tu és o único” (Sl 86,8-10).

É importante lembrar ainda, que a concepção monoteísta desenvolvida desde o exílio babilônico com o Dêutero-Isaías, longe de fundamentar a negação da existência das crenças em outros deuses, responde a uma necessidade teológica crucial para a sobrevivência do Povo de Israel, isto é, mostrar que Javé orienta os

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desígnios de Israel conduzindo a história, que o exílio não foi algo acidental, nem obra de outros deuses mais poderosos, mas castigo do próprio Javé por causa da infidelidade à Aliança como apelo para a conversão de Israel (Cf. Is 40,1-2)

2.2. Estas constatações nos permitem afirmar que em Israel e nos povos da antiguidade, Deus não é princípio absoluto de negação de outros deuses, mas princípio da existência dos povos. O que garante e sustenta a vida humana em cada povo são seus deuses. Para os egípcios é Amon-Ra e o panteão de deuses que o circunda. Para os babilônios é Marduk, e os deuses estelares. Para os Assírios é Assur e seus outros deuses. Para os gregos e romanos é, respectivamente Zeus e Júpiter, junto a uma constelação de deuses. Para Israel, é Javé.

No entanto, na expressão da fé das grandes teologias do Antigo Testamento –profética, sacerdotal, messiânica, sapiencial, apocalíptica-, o povo de Israel nunca deixou de afirmar sua exclusividade para com Javé, o Deus Todo-poderoso, o Deus Único, o Deus três vezes Santo, fonte de toda Sabedoria, de quem entende a razão da sua existência e garante sua proteção e cuidado.

No entanto, em nenhuma delas existe o conteúdo proselitista de negação de outras experiências religiosas, a não ser quando atentam contra a vida humana1, e os princípios de cuidado da vida humana estabelecidos por Javé (Cf. Ex 20, 1-17; Dt 5,1-21).

2.3. Na Bíblia existe clara consciência de que todos os seres humanos têm origem e destino comum que remete a Deus.

a) No Antigo Testamento, os relatos de Gn 1-3 mostram o ser humano como criação de Deus, feito a sua imagem e semelhança.

Deus é o sentido maior da existência humana. É neste sentido que a Aliança cósmica de Deus com a humanidade (Gn 6-9), antecede a alianças particulares realizadas posteriormente com Abraão (Gn 12), as Tribos de Israel (Ex 19-24) e o rei Davi (2Sam).

1 É o problema da idolatria denunciado amplamente pelos profetas: cf. Os 4,12- 14; Is 31,1-3; Ez 14,1-11; etc.

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A consciência da eleição e sua vocação universalista fazem parte da identidade de Israel. Daqui sua convicção de existir uma única salvação e que esta é oferecida por Javé a todos os seres humanos:

“Javé disse a Abraão...: Eu farei de ti um grande povo e eu te abençoarei... Por ti serão benditos todos os clãs da terra” (Gn 12,2- 3);

“Naquele dia, haverá uma vereda do Egito até a Assíria: os assírios irão ao Egito e os egípcios à Assíria e os egípcios adorarão juntamente com a Assíria. Naquele dia...uma benção que pronunciará Javé dos Exércitos: “Benditos meu povo, o Egito e a Assíria, obra das minhas mãos, e Israel, minha herança”. (Is 19,23-25).

“Eu (Javé) te constituí como aliança do povo, como luz das nações...” (Is 42,6) “...a fim de que a minha salvação chegue até a extremidade da terra” (Is 49,6).

“Javé descobriu o braço santo aos olhos de todas as nações, e todas as extremidades da terra viram a salvação do nosso Deus”

(Is 52,10).

“...Todas as nações a Jerusalém afluirão. Povos numerosos por-se-ão em marcha e dirão: vinde, subamos à montanha de Javé...Ele será juiz entre as nações, o árbitro de povos numerosos...” (Is 2,3-4).

Na tradição sapiencial a sabedoria é patrimônio da humanidade oferecida por Deus. “Deus criou todos os seres para que subsistam e, no mundo, as gerações reproduzam a vida...” (Sb 1,14) “Quem encontra a sabedoria encontrou a vida e alcançou o favor do Senhor” (Pr 8,35).

b) No Novo Testamento permanece esta ótica universalista da salvação cujo conteúdo maior é agora Jesus de Nazaré. O velho Simeão ao ver Jesus criança no templo testemunha publicamente:

“... meus olhos viram tua salvação que preparaste em face de todos os povos, luz para iluminar as nações, e glória de teu povo, Israel”

(Lc 2,30-32).

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Nos Evangelhos Jesus não exclui ninguém da salvação, tampouco os estrangeiros nem grupos marginais como os samaritanos:

Em Marcos, no segundo relato da multiplicação dos pães, os beneficiários foram os habitantes não-judeus da região helenista da Sidônia e da Decápole (Mc 7,31; 8,1-9). - Em Mateus, são os magos vindos do oriente que procuram o “Messias” dos judeus para homenageá-lo e logo de encontrá-lo prostrar-se (Mt 2,1.11). – Na Parábola do juízo: “Diante do Filho do Homem serão reunidas todas as nações e ele separará os homens uns dos outros...” (Mt 25,31-46) - Em Lucas, de dez leprosos curados por Jesus somente um, o samaritano, fez a experiência da salvação: Jesus lhe disse:

“Onde estão os outros nove? Não houve, acaso, quem voltasse para dar glória a Deus senão este estrangeiro?” Em seguida disse-lhe:

Levanta-te e vai; a tua fé te salvou” (Lc 17,17-19). - Uma das últimas instruções de Jesus ressuscitado, antes da sua ascensão, relativa ao entendimento das Escrituras diz: “Assim está escrito que o Cristo devia sofrer e ressuscitar dos mortos no terceiro dia, e que em seu Nome, fosse proclamado o arrependimento para a remissão dos pecados a todas as nações, a começar por Jerusalém” (Lc 24,45-47) - Em João, o prólogo do evangelho afirma que: “No princípio era o Verbo... ele estava com Deus. Tudo foi feito por meio dele... O que foi feito nele, era a vida, e a vida era a luz dos homens” (Jo 1,1-4).

Em Atos dos Apóstolos a prática evangelizadora das comunidades está marcada por sua projeção universal: “Vocês sereis minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judéia e Samaria, até os confins da terra”. (At 1,8) - Após o testemunho de Pedro perante cristãos judaizantes sobre a conversão do romano Cornélio e dos membros da sua casa, ele justifica sua conduta afirmando: “Se Deus lhes concedeu o mesmo dom que a nós, que cremos no Senhor Jesus Cristo, quem seria eu para poder impedir a Deus de agir?” Ao que os ouvintes, tranqüilizando-se, glorificaram a Deus dizendo: “Logo, também aos gentios Deus concedeu o arrependimento que conduz à vida!” (At 11,17-18).

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Na Carta aos Romanos, Paulo argumenta em favor da teologia da justificação pela fé afirmando: “De fato, nós estimamos que o homem é justificado pela fé, independentemente das obras da lei. Ou então Deus seria somente o Deus dos judeus? Por ventura não é ele também o Deus dos pagãos?, visto ser um só o Deus que justificará os circuncisos pela fé, e os incircuncisos pela fé. (Rm 3,28-30) - “Assim, não há diferença entre judeu e grego: todos têm o mesmo Senhor, rico para com todos os que o invocam (Rm 9,12).

A carta dêutero-paulina aos Colossenses continua esta perspectiva: “Vós despojastes o homem velho, com suas práticas, e revestistes o homem novo, aquele que para ter acesso ao conhecimento, não cessa de ser renovado à imagem de seu Criador;

não há mais grego, nem judeu, circunciso e incircunciso, bárbaro, cita, escravo, homem livre, mas Cristo: ele é tudo e está em todos” (Cl 3,11).

3. Valorização teológica da fé a partir de experiências religiosas distintas

Uma segunda questão teológica relevante para a fundamentação do diálogo inter-religioso é refletir em que medida a abertura a outras experiências religiosas na Bíblia -na afirmação de aceitação de valor, e de verdade-, é conteúdo legítimo da Revelação de Deus, e portanto, portadora de significado normativo para a vivência da fé do Povo de Israel e das Comunidades Cristãs.

3.1 No Antigo Testamento é significativa a valorização de experiências religiosas não judaicas, entre as quais citamos:

a) A história de Balaão de Moab, no Livro dos Números (Nm 22-23). O profeta arameu nega-se amaldiçoar Israel por ordem do rei de Moab, justificando sua postura religiosa: “Como amaldiçoarei aquele que Deus não amaldiçoou? Como votaria a reprovação daquele que o Senhor não reprovou? (Nm 23,8) ...Javé, seu Deus, está com ele...” (Nm 23,21). Afinal, será a burra do profeta estrangeiro quem decidirá a questão em favor da tolerância com os hebreus em seu caminho às terras de Canaã.

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b) A incorporação canônica no livro dos Provérbios de parte da sabedoria egípcia de Amenemopê (Pr 22,27-23,14)2 contemporânea de Salomão, e das sentenças dos sábios não- israelitas Agur e Lemuel (Pr 30-31), mostra o grau de aceitação e abertura da comunidade judaica a outras experiências de sabedoria ligadas a outros universos religiosos. Fato significativo por quanto a sabedoria antiga sempre esteve ligada em sua inspiração aos deuses e a uma ordem religiosa da qual è decorrente3.

c) A história da moabita Rute é eloqüente. Esta estrangeira é apresentada com sua experiência religiosa de origem, como pano de fundo de seu relacionamento solidário com a sogra Noemi na decisão de ficar com ela: “Não insistas comigo para que te deixe, pois para onde fores irei também... Teu povo será meu povo, teu Deus será o meu Deus. Onde morreres quero morrer e ser sepultada...” (Rt 1,16-17). A estrangeira Rute é a protagonista de uma autêntica história de salvação cuja beneficiária é a sogra Noêmi de confissão religiosa javista. Sua atitude de fé é modelo para a sogra. Segundo o conto, ela foi mãe do avô do rei Davi, o rei justo com o qual Javé fez uma “aliança permanente” (2Sm 7,12) e de cuja descendência, segundo Mateus, procede Jesus de Nazaré (Mt 1,5), o Messias, Filho de Davi (Mt 1,1).

d) No livro de Jonas destaca-se o contraste entre a atitude religiosa solidária dos marinheiros que embarcaram com o “herói”

rumo a Társis, quando o mar agitado ameaçava os afundar, e a atitude arrogante e auto-suficiente do judeu Jonas (Jn 1,5-6) que o isolava do resto. Sabemos que o pano de fundo da história de Jonas é a crítica ao fechamento religioso e social da comunidade judaica promovida pela teocracia sacerdotal do segundo templo no século V a.C.

3.2. No Novo Testamento também colocam se em destaque experiências religiosas e de fé não judaicas, nem procedentes das comunidades cristãs:

2 J. VILCHEZ LÍNDEZ, Sabedoria e sábios em Israel, São Paulo: Loyola, 1999, p. 21.

3 Ibid p. 59-63

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a) A possível valorização da experiência religiosa grega e romana para a formulação da profissão de fé em Jesus, no Evangelho de Marcos: “Início da Boa Nova de Jesus: Cristo, Filho de Deus” (1,1). Em atenção à composição mista da sua comunidade4 o autor parece utilizar-se de duas tradições religiosas distintas, uma judaica e outra greco-romana, para expressar a identidade profunda de Jesus de Nazaré. Enquanto para os cristãos de origem judaico seria aceitável o título messiânico de Jesus, não é claro o mesmo para os cristãos de procedência greco-romana, para quem melhor se compreende a filiação divina de Jesus5. Curiosamente, na narrativa evangélica é o judeu Pedro quem professa Jesus como o Messias anunciado pelos profetas: “Tu és o Cristo” (Mc 1,28). Distintamente, é o soldado romano quem confessa de Jesus: “Verdadeiramente, este homem era filho de Deus” (Mc 15,39).

b) A força da fé de uma mulher siro-fenícia, para enfrentar um certo fundamentalismo religioso judaico, a ponto de questionar Jesus de Nazaré e levá-lo a assumir uma nova postura em sua atuação evangelizadora, é única nos evangelhos: “Por causa desta palavra, vai, o demônio saiu de tua filha” (Mc 7,24-30).

c) Em Mateus a atitude de fé do centurião romano na cura do seu servo por Jesus, torna-se exemplar: “Jesus ficou admirado e disse aos que o seguiam: “Em verdade vos digo que, em Israel, não achei ninguém que tivesse tal fé. Mas eu vos digo que virão muitos do oriente e do ocidente e se assentarão à mesa no Reino dos Céus, com Abraão, Isaac e Jacó enquanto os filhos do Reino serão postos para fora, nas trevas...” (Mt 8,10-12).

d) Lucas apresenta a conhecida parábola do samaritano que se fez próximo como instância crítica da fé do legista (Lc 10,25-

4 Cf. J. AUNEAU, O Evangelho de Marcos in: AUNEAU, J. e outros.

Evangelhos Sinóticos e Atos dos Apóstolos. São Paulo: Paulinas, 1986, p. 91

5 A pesquisa de Van Den Born sobre a expressão Filho de Deus no AT e no NT, torna possível esta hipótese para o Evangelho de Marcos. Cf. A. BORN, Van Den e colaboradores, Dicionário Enciclopédico da Bíblia Petrópolis: Vozes, 1987, pp. 578-582.

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36). É o proceder do samaritano, com sua experiência religiosa marginal ao judaísmo que faz possível a compreensão adequada do sentido da Lei Judaica do qual o doutor da lei é perito em interpretação (cfr Dt 6,5; Lv 19,18).

e) O episódio do encontro de Jesus com a Samaritana (Jo 4) coloca em relevo duas realidades: a valorização da experiência religiosa dela como estágio de um encontro pleno com Deus (Jo 4,20: “Os nossos pais adoraram sobre esta montanha, e vós afirmais que é em Jerusalém que se encontra o lugar onde se deve adorar”); e a relativização histórica de qualquer culto, face o desígnio salvífico de Deus (Jo 4,21-23: “Jesus lhe disse: “Crê, mulher, vem a hora em que nem nesta montanha, nem em Jerusalém adorareis o Pai. Vós adorais o que não conheceis; nós adoramos o que conhecemos, porque a salvação vem dos judeus.

Mas vem a hora -e é agora- em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e verdade, pois tais são os adoradores que o Pai procura”.

f) A glossolalia -o fenômeno de falar em línguas estranhas- discernida amplamente na Primeira Carta aos Corintios (1Cor 12- 14), é provavelmente experiência religiosa vinda das religiões de mistérios conhecidas da sociedade helenista6. Posteriormente foi assimilada pela comunidade de Corinto e acolhida por Paulo como dom do Espírito Santo (1Cor 12,10; 14,39). Em Atos dos Apóstolos, este fenômeno, é apresentado como sinal da efusão do Espírito Santo na Comunidade Cristã (At 2,4; 10,46).

A prática evangelizadora da igreja nascente parte deste horizonte fundamental da abertura universal da salvação em Cristo.

O episódio do encontro de Pedro em casa do centurião Cornélio, no Livro dos Atos dos Apóstolos, é paradigmático (At 10). Pedro, um judeu fiel e praticante, é desafiado a testemunhar a salvação de não judeus partilhando da mesa da casa de Cornélio e batizando toda sua família. Afinal do qual Pedro proclama: “Dou-me conta, em verdade, que Deus não faz acepção de pessoas, mas que em

6Cf. M. CARREZ, As Epístolas aos Coríntios in: M. CARREZ, e outros, As Cartas de Paulo, Tiago, Pedro e Judas, São Paulo: Paulinas, 1987, p. 105.

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qualquer nação, quem o teme e pratique a justiça, lhe é agradável.

Tal é palavra que ele enviou aos israelitas, dando-lhes a boa nova da paz por Jesus Cristo que é o Senhor de todos” (At 10,34-36). E quando questionado por cristãos “circuncisos” de Jerusalém ele contesta: “Se Deus lhes concedeu o mesmo dom que a nós, que cremos no Senhor Jesus Cristo, quem seria eu para poder impedir a Deus de agir?” (At 11,17); e os ouvintes acenam glorificando a Deus dizendo: “Logo, também aos gentios Deus concedeu o arrependimento que conduz à vida (em Jesus Cristo)” (At 11,18).

É, pois, um fato incontestável na Bíblia, a valorização explícita de experiências religiosas distintas do judaísmo e do cristianismo, e de experiências de fé exemplares de pessoas não pertencentes ao Povo de Deus. Esta constatação nos leva a perguntar se tudo isto não é na verdade resultado da experiência que denominamos acima diálogo inter-religioso e, sendo assim, se este é nas Escrituras conteúdo próprio da Revelação de Deus.

4. O diálogo inter-religioso, como conteúdo da Revelação salvífica de Deus.

As evidências da perspectiva do dialogo inter-religioso na Bíblia acima indicadas tornam-se explicitas na pesquisa exegética.

A exegese, na medida que abre possibilidades para uma abordagem fenomenológica dos conteúdos dos textos bíblicos nos permite entender como e em que sentido o dialogo inter-religioso é conteúdo da Revelação de Deus, e quais suas implicações na construção teológica da fé de Israel e das Comunidades Cristãs.

A título de exemplo, apresentamos um breve estudo sobre a Formação do Povo de Israel, no qual encontramos fundamentos sólidos sobre o sentido do dialogo inter-religioso e sua função na dinâmica da revelação de Deus. A pertinência do assunto vem do contexto histórico de pluralismo religioso em que se inscreve e da dinâmica de afirmação histórica da experiência religiosa fundamental que sustentou, na origem de Israel, a fé em Javé.

Dinâmica esta de interação entre grupos sociais com experiências religiosas diversas, na qual encontraram uma instância crítica da fé

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que permitiu na história a re-significação de suas experiências religiosas em seus fundamentos maiores.

Na origem de Israel, a experiência religiosa foi, sem dúvida, um elemento relevante para a construção da sua identidade7. Junto às condições sócio-econômicas que tornaram favorável a progressiva ocupação dos hebreus das montanhas de Canaã, o fator religioso impulsionou a sua aglutinação de modo a vir a constituir uma nova formação social com características próprias: uma Confederação de Tribos (em aliança com o Deus-Javé) (Ex 22-24;

Js 24).

Nos livros da Bíblia que informam sobre este período é de suma importância a ligação que estabelecem entre a experiência de Deus-Javé e os processos sociais que desencadearam a formação do Povo de Israel. A pesquisa histórica é clara em explicar este fato como um amplo e longo processo de construção8, cujo marco referencial foi a fuga de hebreus da corvéia de Faraó no Egito por volta dos anos de 1250 AC. Junto a estes, outros grupos sociais também descontentes com o sistema de opressão e exploração das cidades-estado que controlavam as terras de Canaã, tornaram-se protagonistas do grande movimento social dos chamados hapiru, também conhecidos como hebreus. Na conjuntura social, econômica e política da época isto implicou num fluxo migratório contínuo de camponeses sem terra às montanhas de Canaã e do progressivo assentamento de um número cada vez maior de camponeses à procura de melhores condições de vida. Resultado deste longo processo foi a emergência da sociedade tribal como organização alternativa às cidades-estado das planícies.

7 Cf. as pesquisas de N. GOTTWALD, Introdução sócio-literária da Bíblia Hebraica, São Paulo: Paulinas, 1988, p. 272-276 e de J. PIXLEY, A história de Israel a partir dos pobres, Petrópolis: Vozes, 1989, pp. 17-21.

8 Cfr. os trabalhos de N. GOTTWALD, op cit; J. PIXLEY, op cit; J. BRIHT, La historia de Israel, Bilbao: Desclée de Brower, 1970; M. SCHWANTES, História de Israel. Local e origens, São Leopoldo: Mimeografado, 1984. G. von RAD, Teologia do Antigo Testamento, Vol. 1, São Paulo: Aste, 1973.

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Neste processo histórico, o fator religioso foi significativo na definição da identidade desta nova organização social que se caracterizou como Confederação de tribos (em aliança com o Deus- Javé). Daqui a compreensão bíblica da fundação de Israel como Povo de Deus, isto é povo do Deus-Javé.

Os estudos bíblicos do período da formação do Povo de Israel, acontecida entre os séculos XIII-XI AC, mostram que as tribos não tinham uma idéia prévia e acabada de Javé. Na verdade foi no processo de intercambio cultural, social e religioso entre os clãs e tribos assentadas gradualmente nas montanhas de Canaã que se chegou à compreensão do Deus-Javé como Deus libertador da opressão. Deste modo, podemos explicar que os clãs e tribos que se formaram na montanha contribuíram com suas experiências religiosas e de vida na compreensão de Deus e, conseqüentemente, reconheceram suas particulares experiências religiosas na experiência paradigmática do Deus –Javé que libertou hebreus da opressão no Egito9.

O capítulo 24 do livro de Josué conserva a memória de tradições autônomas veiculadas por diferentes grupos sociais que contribuíram na formação de Israel10. Foram estes grupos: os semi- nômades da montanha, os pais e mães de Israel (v.2-4); os hebreus foragidos do Egito, liderados por Moisés (v.5-7a); os semi- nômades do deserto, provavelmente de Cades (v.7b); os camponeses descontentes das cidades-estado cananeias (v.8-13).

Este texto de Josué, da liturgia tribal da renovação anual da aliança com Javé, representa o momento da fusão de todas essas tradições em torno da grande tradição da confederação das tribos.

Neste horizonte de sentido entende-se que a compreensão do Deus-Javé foi resultado de uma construção teológica, elaborada experiencialmente a partir de tradições religiosas próprias de cada

9 Cf. N. GOTTWALD, op. cit. p. 276.

10 Segundo Milton Schwantes foram quatro os grupos sociais que gravitaram de forma determinante na formação do povo de Israel: os grupos abrâmicos, o grupo mosaico, o grupo sinaítico e o movimento dos hapirú da planície de Canaã. M.

SCHWANTES, op cit., pp. 63-162.

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um dos diversos grupos sociais que protagonizaram a formação do Povo de Israel.

O capítulo 3 do livro do Êxodo concentra diversidade de evocações sobre Deus, todas com autonomia de significado e correspondentes a diversos universos sócio-culturais. “Deus dos pais” (v. 15) remete ao deus dos ancestrais; “Deus de Abraão”,

“Deus de Isaac”, “Deus de Jacó” (v.15) faz referência a experiências familiares de Deus distintas entre si11; “Deus de Abraão, Isaac e Jacó” (v.16) aponta a experiência religiosa de aglutinação cultural entre clãs ou tribos; “Deus dos hebreus” (v.18), faz alusão à experiência religiosa dos setores sociais marginalizados nas terras de Canaã, os hebreus. Trata-se por tanto de tradições religiosas diferentes posteriormente aglutinadas na experiência do Deus-Javé: “Aquele que é, agindo, libertando da opressão” (v. 14).

A pesquisa bíblica recente mostrou que a experiência do Deus Javé remonta a uma tradição religiosa pré-israelita, extra- israelita e extra-cananéia: a tradição do Sinai12. No livro do Êxodo afirma-se que foi Enos filho de Set, quem começa a invocar o nome de Javé (Gn 4,26). Em Gn 4,15 mostra-se a ligação especial entre Caím e Javé, antes da formação de Israel. O culto a Javé provém de uma região ao sul do Mar Morto, primeiro habitada pelos madianitas e, posteriormente pelos edomitas a partir dos S. 13-12 AC. Nela localiza-se o monte Sinai, também chamado de Seir. No livro do Êxodo, a manifestação de Javé a Moisés acontece em terra de Madiã (Ex 3,1ss). Documento egípcio do S. XV AC menciona uma “terra dos ‘shashu’ (=beduínos) de Javé”. Também fala-se de

“beduínos do Seir.

Tudo isto nos permite concluir que o nome de deus-Javé não expressa uma compreensão absoluta de Deus, mas uma aproximação relativa a uma experiência religiosa fundamental que,

11 Cf. J.L. SKA, Introdução à leitura do Pentateuco, São Paulo: Loyola, 2003, pp.131 e 144.

12 Cf. C. DREHER, As tradições do Êxodo e do Sinai, In: Estudos Bíblicos, 16. A memória popular do Êxodo, Petrópolis: Vozes / São Leopoldo: CEBI, 1988.

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em sua origem foi plural e por isso irredutível. O comum a todas essas tradições religiosas é seu horizonte libertador: Deus protetor dos clãs, das tribos, dos hebreus em sua luta contra a opressão e exploração das cidades-estado e do Egito.

Expressão desta memória, que poderíamos chamar de pluralismo religioso, encontramos nos salmos, nas diversas evocações sobre Deus: “Os príncipes dos povos reuniram-se: é o povo do Deus de Abraão” (Sl 47,10); “O Senhor te responda no dia da aflição; o nome do Deus de Jacó te proteja!” (Sl 20,2); “Esta é a geração daqueles que o procuram, que procuram a tua face: é (o Deus de) Jacó” (Sl 24,6); “O Senhor de Todo poder está conosco.

Temos por cidadela o Deus de Jacó” (Sl 46,8); “Ó Deus quando saíste à frente do teu povo, avançando pelo deserto, a terra tremeu, e até o céu dissolveu-se, o próprio céu se fundiu diante de Deus, o do Sinai, o Deus de Israel” (Sl 68,8 Cf. Jz 5,5).

Considerações finais

As análises precedentes mostram que o diálogo inter- religioso é parte da Revelação de Deus. Não é um assunto periférico. Longe de constituir um simples conteúdo interpretativo das Escrituras, ele é também, uma realidade fenomenológica que teve implicações na compreensão da fé no Antigo e Novo Testamento.

O diálogo inter-religioso evidencia-se na Bíblia como expressão do dinamismo da práxis da fé. Ele é resultado de uma relação de interação com experiências religiosas de fora do judaísmo e do cristianismo, a partir de necessidades intrínsecas à compreensão da própria fé do Povo de Israel e das Comunidades Cristãs. Resultado desta interação é, de um lado, a incorporação canônica de experiências religiosas alheias ao universo religioso javista e cristão das origens, e de outro lado, o destaque contínuo ao testemunho da fé de estrangeiros, que não confessam a Javé no Antigo Testamento, nem a Jesus Cristo, no Novo Testamento.

O diálogo inter-religioso é uma instância crítica da fé que possibilita novos horizontes de sentido à compreensão das suas

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verdades fundamentais e à vivência autêntica das mesmas. A revelação de Deus na Bíblia é dinâmica, processual. Não é estática, nem acabada, embora aponte sempre a sua plenitude de significado para a vida humana.

Nesta perspectiva, o diálogo inter-religioso possibilita a superação e relativização de compreensões da fé limitantes e estreitas, e contribui para a re-significação da mesma em seus fundamentos maiores. É o que constatamos: na construção teológica de Javé, o Deus que liberta seu povo da opressão (Ex 3;

Js 24); na afirmação de experiências religiosas com sentido, fraternas, solidárias (Rute); na atuação inclusiva de Jesus:

beneficiando estrangeiros (Mc 7,24-8,13) e setores marginalizados da sociedade, destacando ora sua atitude exemplar da fé (Mt 8,10- 12), ora o testemunho prático da fé (Lc 10, 29-37); na compreensão da perspectiva universalista da salvação em Jesus Cristo nas primeiras Comunidades Cristãs (At 10-11; Rm 3, 28-30).

O diálogo inter-religioso na Bíblia não implica no relativismo da vivência religiosa, mas na afirmação genuína da própria fé - em Javé, para o Antigo Testamento; em Jesus Cristo, para o Novo Testamento - no horizonte de um único desígnio salvífico de Deus para a vida humana. Para o Povo de Israel Javé sempre foi, o único.

Como reza o salmista “Entre todos os deuses não há outro como Tu, nada que se iguale às tuas obras! Todas as nações que fizeste virão adorar-te e dar glória a teu nome, Senhor, pois tu és grande e fazes maravilhas, tu és Deus, tu és o Único” (Sl 86,8-10). As Comunidades Cristãs não anunciaram outra coisa que “há um só Senhor, uma só fé, um só batismo; há um só Deus e Pai de todos, que está acima de todos, por meio de todos e em todos” (Ef 4,4-5).

*Prof. Ms. Lucho Torres Bedoya Mestre em Ciências da Religião pela UMESP, na área bíblica,

Prof. do ITEP e do ICRE.

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