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SCIENTIA PLENA VOL. 7, NUM

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Academic year: 2021

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095702-1

Variação na expressão do tempo passado na fala e escrita de

Itabaiana/SE: formas de pretérito mais-que-perfeito composto

e pretérito perfeito na expressão do passado anterior

1

A. M. Santos & R. M. Ko. Freitag

Grupo de Estudos em Linguagem, Interação e Sociedade, Departamento de Letras, Universidade Federal de Sergipe, 49500-000, Itabaiana-Se, Brasil

amanda.letras@yahoo.com.br

(Recebido em 02 de março de 2011; aceito em 13 de setembro de 2011)

Este estudo enfoca o fenômeno de variação referente à expressão do tempo verbal passado na fala e escrita da comunidade de fala de Itabaiana/SE, especificamente das formas de pretérito perfeito e mais-que-perfeito composto na expressão do passado anterior. Adotamos os princípios metodológicos da Sociolinguística Variacionista, coletando dados de duas amostras: Entrevistas Sociolinguísticas e Fala&Escrita. Os resultados mostram a correlação funcional existente entre as formas de pretérito perfeito e pretérito mais-que-perfeito para a expressão do passado anterior, bem como a importância das motivações linguísticas para a alternância das formas verbais.

Palavras-chave: variação linguística, pretérito mais-que-perfeito, pretérito perfeito, passado anterior

This paper focuses the past tense variation in Itabaiana’s spoken and written language, specify the variable use of preterito perfeito and preterito mais-que-perfeito compost to codify anterior past. The methodological principles from Variacionist Sociolinguistic are adopted, with data collected by two samples: Sociolinguistics Interviews and Spoken&Written. The results show that there is a functional correlation between the forms preterito perfeito and preterito mais-que-perfeito compost in expression of anterior past, and points the relevance of linguistic motivations for the variation in this domain.

Keywords: linguistic variation, preterito mais que perfeito, preterito perfeito, anterior past.

1.INTRODUÇÃO

Todas as línguas possuem em sua gramática elementos que situam o indivíduo em uma espécie de reta cronológica. Esses elementos são manifestados pela categoria linguística denominada tempus2. Segundo Castilho, “O tempo é uma propriedade da predicação cuja interpretação tem de ser remetida pela situação de fala. O tempo também depende da noção de anterioridade, simultaneidade e posterioridade.”[1]

É bem verdade, que a ordenação temporal pode ser evidenciada por advérbios, conjunções, numerais e adjetivos; no entanto, diversas línguas atribuem à concepção de palavra temporal ao verbo. É ele que, na maioria das vezes, melhor situa o indivíduo temporalmente. Não há dúvidas quanto à relação existente entre tempus e verbo, porém, é necessário diferenciá-los a fim de que não haja nenhum tipo de equívoco com relação as suas respectivas definições. O “verbo é a palavra que exprime um fato (ação, estado ou fenômeno) representado no tempo. E o tempus, por sua vez, é a variação que indica o momento em que se dá o fato expresso pelo verbo” [2].

No sistema linguístico do português, o tempus verbal é responsável por manifestar experiências que estão relacionadas a uma determinada referenciação temporal, capaz de indicar situações vinculadas à noção de estado, processo e ação. Notam-se três referenciações temporais

1

O presente estudo é resultado do desenvolvimento do plano de trabalho do projeto intitulado “Variação na expressão do tempo verbal passado na fala e escrita de Itabaiana/SE: formas e funções concorrentes” fomentado pela FAPITEC (Edital FAPITEC/FUNTEC-SE Universal 06/2009 Processo n. 019.203.00910/2009-0) e CNPq (Edital MCT/CNPq/MEC/CAPES 02/2010 - Ciências Humanas, Sociais e Sociais Aplicadas Processo n. 401564/2010-0), e coordenado pela Profa. Dra. Raquel Meister Ko. Freitag.

2

Neste estudo, adotamos a nomenclatura apresentada por Santos (1974 apud CORÔA, 2005), que utiliza a expressão

tempus (plural tempora) para referir-se à expressão gramatical que marca a posição dos acontecimentos em dado

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que podem ser situadas na linha do tempo em torno do momento da enunciação, são elas: presente, passado e futuro. Esses tempora verbais se desmembram para melhor descrever o momento em que se realiza um fato. Dentre os tempora, chamamos atenção para o pretérito mais-que-perfeito composto e o pretérito perfeito anterior.

O pretérito mais-que-perfeito refere-se a uma ação anterior a outra já passada, ou passado anterior. Normalmente, utiliza-se com mais frequência sua forma composta em detrimento da forma simples [3]; já o pretérito perfeito anterior expressa um fato passado que se ancora em uma situação também passada.

A partir de estudos que focam os fenômenos de variação referente aos tempora verbais do português [4] – percebe-se que, no processo de interação, as formas verbais apresentadas acima se equivalem em contextos específicos. Trata-se de um processo de variação linguística no qual a função concernente à expressão do passado anterior pode ser manifestada por duas formas distintas: o mais-que-perfeito composto e o pretérito perfeito anterior, como podemos observar nos exemplos (1), (2), (3) e (4), respectivamente:

(1) [...] tava a:: vó do menino... do outro menino... TINHA MORRIDO antes dele ter nascido... tava se balançando na cadeira Fala - se ita mbh 083

(2) CHEGOU um menino colega dele “me dê aí um geladinho” ele ... “vá lá pegar por favor”... ele FOI pegar quando ele ABRIU a geladeira que PEGOU o geladinho... Fala - se ita mbh 08 (3) Uma vez meu colega me CONTOU que tava assistindo a mãe dele TINHA IDO para a rua. Escrita - se ita mbh 08

(4) [...] quando ele FOI pegar que ele ABRIU a geladeira e TIROU o galadinho que ele OLHOU no quintal a vó do outro menino [...] Fala - se ita mbh 08

Observando os exemplos (1) e (3), notamos que o falante utiliza a forma de pretérito mais-que-perfeito composto para enunciar fatos – TINHA MORRIDO e TINHA IDO. Esses fatos também podem ser expressos pela forma simples correspondente – MORREU e FOI, respectivamente. Em (2) e (4) ocorre o contrário. O fato é codificado por meio do pretérito perfeito. Peguemos algumas dentre as formas destacadas: CHEGOU, FOI, ABRIU, TIROU. As relações semânticas manifestadas se equivalem a TINHA CHEGADO, TINHA IDO, TINHA ABERTO, TINHA TIRADO, respectivamente.

Essas formas possuem um traço de anterioridade temporal. Todos os eventos demarcados estão situados cronologicamente antes do momento enunciativo. Para melhor entendermos como se realiza o processo de anterioridade temporal, peguemos os planos discursivos apresentados no exemplo (3). Observe-se a representação do diagrama da figura 1.

---S---R---F TINHA IDO CONTOU

Figura 1: Diagrama temporal para o mais que perfeito

As formas verbais apresentadas encontram-se à esquerda do ponto de fala (presente). São, portanto, formas que evidenciam uma anterioridade temporal. Trata-se de situações que possuem uma referenciação temporal passada. Temos um evento passado (TINHA IDO), que possui um traço de anterioridade mais forte por ser o evento mais anterior, que, por sua vez, ancora-se em outra situação também passada (CONTOU). Assim, entendemos, no exemplo (3),

3 Neste trabalho utilizamos códigos numéricos e gráficos que nos ajudam na identificação e organização dos informantes que compõem o nosso corpus. Entendamos a que estes se referem. Os primeiros são constantes, pois dizem respeito ao estado e à cidade em se realiza o presente estudo: Sergipe (se), Itabaiana (ita). Os próximos códigos controlam os seguintes fatores: sexo – feminino (f) e masculino (m); faixa etária: 6 – 8 (p), 10 – 13 (b), 14 – 16 (c), 17 – 21 (d); escolaridade: 1º ano do ensino fundamental/alfabetização (g), 6º ano (h), 9º ano (j), 1º ano do ensino médio (k), 3º ano do ensino médio (l).

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que antes de contar um dado evento, outro fato o antecedeu: o de a mãe ter ido a algum lugar. São duas situações que, embora possuam o mesmo traço temporal, obedecem a uma regularidade cronológica que estabelece o nível de anterioridade entre as formas e os seus respectivos eventos. Trata-se de variantes linguísticas que, inseridas em um determinado contexto interacional, possuem a mesma função comunicativa, ou seja, o mesmo valor de verdade dentro de uma dada comunidade linguística [5]. Essas variantes da língua configuram-se como adversárias que configuram-se enfrentam no “campo de batalha da variação” [6].

Este trabalho tem como objetivo geral observar como se realiza o processo de variação referente à expressão do tempus passado na fala e escrita de Itabaiana/SE, conduzida pelos princípios teóricos da Sociolinguística Laboviana [5], a qual nos permite identificar as características do fenômeno em análise; e pelos pressupostos do Funcionalismo Linguístico norte-americano [15]. Ambas as vertentes teóricas se fundem, para assim, compor o quadro teórico no qual se inscreve a referida pesquisa.

2.AS CATEGORIAS DE TEMPUS, ASPECTO E REFERÊNCIA VERBAL

Dada a natureza do fenômeno em análise, é importante apresentarmos e discurtimos as concepções referentes à categoria gramatical linguística tempus, diferenciando-a do tempo físico. Fazemos as devidas considerações a respeito do ponto de referência verbal, uma vez que, entendemos a sua importância para o entendimento da categoria tempus. Por fim, discutimos acerca da categoria linguística aspecto, a fim de diferenciá-la do tempus, bem como, os elementos que compõem a perfectividade.

O tratamento das relações temporais aplicadas ao sistema linguístico do português pode ser constatado em pesquisas [7, 3, 8, 9, 10], as quais nos ajudam a entender melhor como as relações temporais são estabelecidas dentro de domínios funcionais específicos, o que, muitas vezes, não é evidenciado pelas gramáticas normativas.

Antes de analisar o valor temporal de uma forma verbal, é necessário que verifiquemos o contexto discursivo em que ela se insere, visto que, é ele que determina sua temporalidade. Por exemplo, se dizemos “TOMARA que você passe no concurso”, sabemos que, canonicamente, a forma verbal em destaque está conjugada no pretérito mais-que-perfeito simples; contudo, se observarmos por um viés semântico-pragmático, concluímos que TOMARA está sendo utilizado como uma referência temporal futura. Tal fato nos leva a crer que, o valor temporal que atribuímos aos tempora verbais deve levar em conta as condições de produção linguística e não apenas a memorização desinencial.

No paradigma linguístico do português, o tempus verbal atua como um instrumento fundamental na codificação de experiências que estão vinculadas a um determinado tempo/referenciação temporal4, capaz de manifestar fatos que estão elencados à noção de estado, processo e ações, que por sua vez, liga-se ao momento da enunciação. A partir das teorias apresentadas por Reichenbach [11], os estudos referentes aos tempora verbais, centram-se nos centram-seguintes eixos: precentram-sente, passado e futuro [2]

Tomando o tempo presente (ponto de referência universal), é possível verificarmos situações que se correlacionam ao ponto de referência5 [12]. A partir deste, é possível localizarmos eventos que são anteriores, simultâneos ou posteriores ao momento de fala. O ponto de referência pode estar na mesma referência temporal da situação ou não. Se os fatos ou ações ocorrem à esquerda do momento enunciativo, significa que estão localizados na referenciação temporal passada; quando localizados à direita, situam-se na referenciação temporal futura, como podemos observar abaixo, na figura 2.

São situações (estados, processos e ações) que são codificados a partir da nossa experiência de tempo. As referenciações temporais básicas são: passado, presente e futuro [4].

5

Entende-se como sendo “uma coordenada temporal em função da qual se definem os valores temporal e aspectual de um enunciado”[8].

(4)

passado presente futuro _____________________ __ _____________________ ---0---

Ponto de referência universal

Figura 2: Tipos verbais [4]

De acordo com a classificação de Comrie [8], os tempora verbais podem ser definidos como: absoluto, relativo e relativo-absoluto.

O tempus absoluto toma o presente como eixo dêitico na orientação do paradigma temporal e se relaciona ao momento de fala (F). O tempus verbal relativo tem como ponto de referência (R) o próprio contexto, a situação (S) pode ocorrer, antes, simultânea ou depois dele (contexto). Os tempora relativos podem ser expressos por formas verbais não finitas que indicam um tempus relativo puro; e finitas, que indicam um tempus relativo-absoluto. O primeiro possui como ponto de referência a forma finita que mais se aproxima e podem receber a referenciação temporal a partir desse ponto. Os do segundo tipo “tomam um momento de referência estabelecido em relação ao momento presente, e a situação é localizada em relação a esse ponto de referência” [8].

Já a categorial aspectual refere-se à forma como o falante percebe a constituição temporal interna de uma situação, não tendo nenhuma relação com o ponto dêitico (ponto de fala). “Dizemos que o verbo do português exprime aspecto porque ele nos dá a possibilidade de representar o mesmo fato, ora como um todo indivisível, ora como composto por diferentes ‘fases’, uma das quais é posta em foco” [10]. Já a categoria tempus é responsável pela decodificação temporal externa, mantendo uma estreita relação com o momento enunciativo. “Assim, enquanto o Tempo trata o fato enquanto ponto de distribuição na linha de tempo, a categoria aspecto trata o fato como passível de conter frações de tempo que decorrem dentro dos seus limites” [13].

No sistema linguístico do português o aspecto se concentra no binômio pretérito perfeito e pretérito imperfeito, dando-nos a noção de aspecto perfectivo e imperfectivo. O aspecto perfectivo emite a perspectiva global da situação sem especificar a sua constituição temporal interna. O evento exposto é tido como um todo, fechado; enquanto que o imperfectivo não menciona os pontos iniciais e finais da situação, mas o seu desenvolvimento, a sua estrutura temporal interna [8]. Mostra um fragmento do tempo que se mantém em andamento, como podemos notar respectivamente nos exemplos (5)-(6) a seguir:

(5) [...] eu ainda era muito peque:: na ... minha mãe ENTROU em desespero meu pai PAROU de trabalhar Fala - Se ita cfg 22

(6) [...] um acidente com:: ... com ela e com a mãe ... ela VINHA da/ de uma cidade ... aí ... VINHA ela de moto e um caminhão onde ela bateu ...bateu com o caminhão ... a moto e o caminhão Fala - Se ita cfg 22

Em (5), as situações codificadas por ENTROU e PAROU são colocadas como um todo, não há nenhum tipo de especificação com relação às suas fases temporais. No entanto, no exemplo (6), as fases temporais são percebidas e separadas a partir da sua complexidade interna. Neste caso, o falante codificou a duração da situação.

Feitas as devidas considerações a respeito da categoria aspectual, nos deteremos no aspecto perfectivo, uma vez que, são os traços da perfectividade que se manifestam nas formas verbais de pretérito mais-que-perfeito composto e pretérito perfeito anterior, objetos de estudo da presente investigação.

Quanto à caracterização do perfectivo, nota-se que muitas propostas se mostram insuficientes e não dão conta de definir esse fenômeno linguístico. Partir de pressupostos de que essa categoria gramatical é a manifestação de um fato acabado, que se relaciona a fatos de curta duração, que descreve fatos limitados, seria, entre outros termos, “procurar uma agulha num

(5)

palheiro”. Claro que, muitas vezes, a depender do contexto em que a forma verbal é utilizada, podemos encontrar tais características, porém, estas não devem ser encaradas como universais, de forma que podem ser aplicadas em quaisquer circunstâncias.

É sabido que muitas situações marcadas pelo aspecto perfectivo denotam certa extensão temporal. Sendo assim, percebe-se que o perfectivo pode mostrar as fases internas que constituem sua temporalidade, no entanto deve mantém a sua visão global. Recuperemos o exemplo (3): “Uma vez meu colega me contou que tava assistindo a mãe dele TINHA IDO para a rua”; percebe-se que, embora a forma verbal esteja marcada pelo aspecto perfectivo, podemos notar a sua estrutura temporal interna. A forma destacada apresenta duratividade, podemos imaginar como se deu esse deslocamento cronologicamente.

Feitas as devidas considerações a respeito da categoria aspectual e dos traços de perfectividade que se encaixam neste estudo, apresentamos, na seção seguinte, as características das variantes em foco.

3.FORMAS VERBAIS VARIÁVEIS: PRETÉRITO MAIS-QUE-PERFEITO

COMPOSTO E PRETÉRITO PERFEITO

O interesse desta investigação volta-se para o valor temporal prototípico do pretérito mais-que-perfeito composto e do presente perfeito anterior, para observarmos em quais contextos comunicativos essas formas atuam como variantes linguísticas. Desta forma, apresentamos as características das formas verbais de pretérito mais-que-perfeito composto e de pretérito perfeito anterior, os traços semântico-discursivos que as envolvem, para que possamos delimitar com clareza as variantes as quais nos propusemos a analisar.

O pretérito mais-que-perfeito codifica eventos que aconteceram antes de um ponto de referência anterior, ou seja, temos uma ação transcorrida que tem como referência outra ação também passada. “A ideia de que algo representa um passado do passado e, portanto, duas vezes anterior ao MF, está bem de acordo com o uso que fazemos do mais-que-perfeito, tanto simples (quando o usamos), como composto” [2], como podemos constatar no exemplo (7), diagramado temporalmente na figura 3.

(7) [...] eu CONSEGUI:: recuperar o tempo de estudo que eu TINHA PERDIDO Fala - Se ita cfg 22

---S---R---F TINHA PERDIDO CONSEGUI

Figura 3: Diagrama temporal de (7)

Trata-se de uma situação passada (o fato de ter perdido tempo de estudo) que se relaciona a outra também anterior (de ter conseguido recuperar o tempo perdido). São dois eventos passados que estão correlacionados. É válido salientar que o pretérito mais-que-perfeito simples não foi contemplado em nossas análises, pois, como já comprovado pelo projeto NURC (Norma Urbana Oral Culta), entre outros que trabalham no viés funcionalista, não foram encontrados no corpus falado, até o momento, nenhum dado referente a esse tempo verbal, o que inviabiliza o estudo variacionista da referida forma. A dificuldade que o pretérito mais-que-perfeito simples apresenta “não está na sua interpretação semântica, mas no seu uso: restringe-se ao uso literário ou a uma forma muito cuidada de expressão oral, como discurso e similares, ou ainda à linguagem jornalística, pela economia de espaço” [2].

Com relação ao pretérito perfeito, é necessário que estabeleçamos os nossos critérios avaliativos. O pretérito perfeito, no sistema linguístico do português, tem a função de codificar um tempo passado. Entretanto, essa referenciação temporal se mostra sensível a duas maneiras distintas de anterioridade temporal, marcadas pelo pretérito perfeito simples e pelo pretérito perfeito anterior. O primeiro é caracterizado como um tempus absoluto, pois expressa um tempo passado que está relacionado ao momento de fala, não se enquadrando, assim, nos nossos

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objetivos. Já o segundo (pretérito perfeito com valor de passado anterior), configura-se como um tempus relativo-absoluto que também é responsável por codificar eventos passados, no entanto, está correlacionado a outro momento passado, assumindo assim, as mesmas funções comunicativas da forma de pretérito mais-que-perfeito, conforme (8), diagramado na figura 4. (8) [...] a narrativa recontada que eu vou contar ... é sobre a história .... de uma colega de que me CONTOU ... que ACONTECEU um acidente com:: ... com ela e com a mãe Fala - Se ita cfg 22

---S---R---F ACONTECEU CONTOU

Figura 4: Diagrama temporal de (8)

Em (8), temos uma ação passada (ACONTECEU), que tem como ponto de referência um evento anterior em relação ao momento enunciativo (CONTOU). Essa equivalência também se estabelece no âmbito semântico, visto que, a forma de pretérito perfeito anterior está sendo utilizada em lugar do pretérito mais-que-perfeito composto, ou seja, as duas formas podem ser utilizadas em um mesmo contexto para veicular a mesma informação, reforçando assim, a ideia de que as formas em análise configuram-se como variantes que se encontram em competição na língua.

Feitas as devidas considerações a respeito das propriedades atribuídas às formas de pretérito mais-que-perfeito e pretérito perfeito, apresentamos, a seguir, os procedimentos metodológicos adotados para a delimitação da variável em foco e a análise variacionista.

4.METODOLOGIA

Para a demarcação do nosso escopo investigativo foi necessário um levantamento das formas verbais concorrentes que compõem o envelope variacional. Contudo, esse levantamento não se restringiu a codificação gramatical da alternância das formas de pretérito mais-que-perfeito composto e pretérito perfeito, isto é, não basta o reconhecimento das formas verbais, mas também a identificação da função discursiva. Nesses termos, a análise dos dados cotejados parte da função para a forma, visto que, em muitos casos, as formas verbais sob análise, desencadeiam outras funções temporais. Portanto, partimos da seguinte função: anterioridade verbal a um ponto de referência também passado e não especificamente das categorias verbais. É preciso considerar que essa decisão metodológica requer uma maior complexidade analítica, no entanto, se mostra pertinente no que concerne à operacionalização do fenômeno em estudo.

(9) [...] eu ESTUDEI os dez cursos me identifiquei com ciências contábeis... (se ita mb lq 01)

(10) [...] eu TENTEI o vestibular e não consegui... (se ita mp lq 03)

Após a coleta de dados relativos à variável descrita, procedemos à codificação dos dados, os quais foram correlacionados com fatores linguísticos forma da função, relação semântico-sintática, tipo de advérbio, traços aspectuais, tipo de sequência discursiva e forma de realização da referência. Após codificados, os dados foram analisados quantitativamente pelo programa computacional GoldVarb X [14]. A análise estatística permite o equilíbrio das frequências, suprindo assim, a discrepância referente ao número de ocorrências coletadas das formas verbais de pretérito perfeito e mais-que-perfeito, para que, assim, pudéssimos verificar a recorrência das referidas formas na comunidade da fala de Itabaiana/SE.

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5.ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Como apontamos na introdução, no transcorrer do processo comunicativo a função referente à expressão do passado anterior pode ser manifestada por duas formas verbais: o pretérito mais-que-perfeito composto e o pretérito perfeito anterior. Ambas as categorias possuem as propriedades necessárias que permitem uma competição discursiva em dados contextos. Entre essas propriedades insere-se o traço responsável pela codificação de anterioridade temporal, uma vez que, as situações encontram-se antes do ponto de fala [4]. Tendo em vista tal concepção, buscamos, nesta seção, analisar qual das formas verbais em processo de variação é mais recorrente na comunidade de fala da cidade de Itabaiana/SE. O gráfico da figura 5 resume os resultados obtidos.

Figura 5: Total de ocorrências das formas verbais de pretérito perfeito e mais-que-perfeito para a codificação da anterioridade verbal em relação ao ponto de referência passado

Os resultados estatísticos decorrentes da análise dos dados apontam que, a forma verbal de pretérito perfeito possui mais recorrência de uso em relação à forma composta do pretérito mais-que-perfeito, no tocante à expressão da função de anterioridade em relação a um ponto de referência passado. Dentre os 202 dados coletados, 187 correspondem à forma de pretérito perfeito e apenas 15 ao mais-que-perfeito, o que equivale a 93% e 7%, respectivamente.Os resultados apresentados nos autorizam falar em uma redução do paradigma verbal, pois constatamos que a forma de pretérito mais-que-perfeito está cedendo espaço para o pretérito perfeito, quando este atua na codificação da função de anterioridade em relação a um ponto de referência passado [4]. A opção pelo uso do pretérito perfeito pode ser justificada a partir do princípio da marcação [15].

O princípio da marcação envolve uma complexidade estrutural e cognitiva que pode determinar a frequência de uso de determinadas formas verbais. A forma marcada é aquele que envolve uma maior complexidade estrutural, isto é, possui uma estrutura discursiva maior e por isso demanda uma complexidade cognitiva maior no que concerne ao processamento dos dados. Já a forma não marcada é aquela que ocorre com mais frequência em determinada comunidade de fala, pelo fato de demandar menor complexidade cognitiva e estrutural. A par das considerações referidas, notamos que o pretérito mais-que-perfeito insere-se como a variante marcada, uma vez que, se trata de uma locução verbal, sendo, portanto, mais complexa em termos estruturais e cognitivos, se comparado a forma de pretérito perfeito, que possui uma estrutura discursiva mais simples que necessita de menos processamento mental. Esse fato justifica a escolha do pretérito perfeito em detrimento do mais-que-perfeito no que se refere à anterioridade temporal entre os falantes itabaianenses.

Para verificarmos os efeitos dos fatores internos ao sistema na variação das formas de pretérito perfeito e mais-que-perfeito quando codificam a função de anterioridade em relação a um ponto de referência passado, foram arranjadas motivações linguísticas de maneira que

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pudéssemos verificar se estas atuam no processo variacional das categorias verbais que nos propusemos analisar.

A relação semântico-sintática considera a relação existente entre a função discursiva codificada por um fenômeno variável e seu ponto de referência [4]. Com esse fator linguístico objetivamos observar quais os contextos, por meio das relações semântico-sintáticas, que mais favorecem a recorrência de uso do pretérito perfeito e do mais-que-perfeito. Os exemplos listados abaixo ilustram as relações que são abordadas no presente estudo:

Encadeamento

(10) [...] comecei a fazer pré-vestibular público... aí ganhei bolsa na escola particular... (se ita fl pq 04)

(11) [...] quando nós entramos em contato com o pessoal lá de São Cristovão... aí conseguimos o transporte... (se ita mp lq 03)

Causalidade

(12) [...] achei um pouco um pouco... assim estranho né? porque você via gente... muita gente que... de muitos lugares... muita gente que eu também nunca tinha visto... (se ita mp lq 03) (13) [...] eu comecei a ficar com raiva porque elas tinham escondido o meu caderno... se ita F9_2)

Contraste

(14) [...] eu passei em São Cristovão porém... desisti de lá e vim pra cá pra Itabaiana já que eu moro aqui né? (se ita fp lq 04)

(15) [...] eu com medo que a polícia desse um tiro me deitei no chão, mas minha mãe gritou pra que eu fosse pra casa da minha tia... (se ita M9_1)

Temporalidade

(16) [...] peguei experiência rápido até quando outras pessoas chegaram no mesmo setor que eu dava explicação sobre várias coisas dali... (se ita fp lq 04)

(17) [...] eu fui caminhando... quando eu cheguei perto do perto do Sítio Porto eu... eu vi uma sombra (se ita M9_2)

O entrelaçamento sintático decorrente da situação passada em relação a um ponto de referência também anterior pode ser demarcado via orações subordinativas, coordenativas e justapostas. As orações circunstanciais denotam uma relação semântica mais visível. As adjetivas funcionam como modificadoras do dado variável, enquanto as substantivas atuam como complementação. O fator linguístico relação semântico-sintático foi selecionado estatisticamente, sendo este um dos fatores mais significativos que compõem este estudo.

As frequências associadas ao encadeamento discursivo não corresponderam à hipótese elencada por Coan [4], bem como os resultados apresentados pela autora – a de que o encadeamento tende a favorecer o aparecimento do pretérito mais-que-perfeito. Os resultados demonstram que o encadeamento (0,78) favorece o uso de pretérito perfeito na comunidade linguística de Itabaiana/SE. Dos 56 dados cotejados, 55 dos contextos discursivos analisados relativos ao pretérito perfeito, contêm uma relação semântico-sintática marcada pelo encadeamento (e, aí), com percentual de 98%. Os resultados estão descritos na tabela 1.

(9)

Tabela 1: O efeito da relação semântico-sintática para o uso do pretérito perfeito na expressão da anterioridade temporal

RELAÇÃO SEMÂNTICO-SINTÁTICA APLIC/TOTAL % PR

Encadeamento 55/56 98% 0.78

Complementação 94/100 94% 0.45

Causalidade 16/19 84% 0.22

Contraste 8/10 80% 0.25

Modificação 2/5 40% 0.03

Em seguida, constatamos a incidência da complementação (0,45). Dentre os 100 dados coletados 94 estão inseridos em contextos compostos por orações subordinadas completivas com uma frequência de 94%. O segundo fator semântico-sintático mais recorrente para a expressão do passado anterior a um ponto de referência passado corresponde à hipótese alçada por Coan [4] – segundo a qual a complementação propicia a utilização do pretérito perfeito. “O complemento no passado, normalmente, ocorreu antes do seu ponto de referência. Tal fato deve favorecer o aparecimento do pretérito perfeito”[4]. Porém, no estudo que realizou na comunidade de fala de Florianópolis, a autora constatou que a complementação favorece o uso do mais-que-perfeito6, divergindo, assim, das suas hipóteses.

A relação expressa pela causalidade (0,22) – efeito/causa – é o terceiro fator semântico-sintático correlacionado ao pretérito perfeito. Os dados globais totalizam 19 ocorrências, dentre as quais, 16 referem-se à categoria verbal em análise, o que, em percentuais, corresponde a 84% dos dados cotejados. Esta perspectiva pauta-se no fato de que o efeito, por si só, já pressupõe uma causa, isto é, qual a causa que desencadeia o efeito em determinado contexto discursivo. Desta forma, não há a necessidade semântica da utilização do pretérito mais-que-perfeito composto para evidenciar de forma mais concreta a anterioridade da situação em relação ao ponto de referência que também se encontra a esquerda do momento de fala. Tal resultado converge com aqueles apresentados por Coan [4], em que a autora constata o uso da causalidade associado a contextos de uso do pretérito perfeito.

A relação semântico-sintática expressa pelo contraste (0,25) também tende a desfavorecer o uso do pretérito mais-que-perfeito divergindo da hipótese e resultados elencados por Coan [4]. Assim, dos 10 dados, 8 codificam a utilização do contraste correlacionado ao pretérito perfeito, ou seja, 80% das ocorrência coletadas.

Modificação (0,03), por sua vez, não favorece a utilização do pretérito perfeito. Do total de 5 dados, 2 vinculam-se a forma verbal menos marcada, o que equivale a 40% das amostras quantificadas.

Os resultados apontam que as situações de encadeamento, complementação, causalidade e contraste propiciam o uso do pretérito perfeito; porém, a modificação desfavorece o uso da forma menos marcada. É necessário salientar, que a temporalidade não foi inserida na análise dos dados por não contemplar a oscilação das formas de pretérito perfeito e mais-que-perfeito.

O controle da presença ou ausência de advérbio sob o escopo do passado anterior nos possibilitou verificar o efeito do advérbio para a codificação das formas verbais em estudo: pretérito perfeito e mais-que-perfeito. Selecionamos os advérbios de tempo e negação, pois, estes “influenciam mais imediatamente a situação do dado variável já que está em foco uma função temporal” [4]. Além destes advérbios, consideramos também a sua não ocorrência, para testarmos a pertinência da presença ou ausência para uso das categorias verbais.

Presença de advérbio

(18) [...] QUANDO nós entramos em contato com o pessoal lá de São Cristovão... aí conseguimos o transporte... (se ita mp lq 03)

6

Para justificar tal divergência a autora explica que “a relação de complementação, normalmente, ocorre na presença de um verbo discendi, ou verbo de estado, ambos favorecedores do mais-que-perfeito, que fazem parte de um grupo selecionado antes da relação semântico-sintática [4]

(10)

(19) [...] nós JÁ tínhamos combinado com o pessoal do... do... daqui de São Cristovão e eles entraram em contato com o pessoal de lá pra fazer o- a reserva... (se ita se ita fp lq 03)

(20) [...] eu achei um pouco estranho né? porque você via muita gente... de muitos lugares... muita gente também que eu NUNCA tinha visto (se ita mp lq 03)

Ausência do advérbio

(21) [...] aí eu fiquei bem nervosa... aí eu disse “mãe vai doer?”... (ita se F6_2) (22) Entrou entre as ferragens e conseguiu tirar três pessoas. (ita se F3_2)

Os resultados obtidos encontram-se na tabela 2.

Tabela 2: Atuação do advérbio da situação para a recorrência do pretérito perfeito na expressão do passado anterior

ADVÉRBIO DA SITUAÇÃO APLIC/TOTAL % PR Ausência do advérbio 162/172 94% 0.55

Nunca 25/30 83% 0.24

Contextos discursivos em que aparece a forma de pretérito perfeito tendem a não ser precedidos pelos advérbios controlados (0,55); das 172 amostras em162 constatamos a não recorrência ao uso dos advérbios para a codificação da função de anterioridade em relação ao ponto de referência anterior, o que corresponde a 94%. Constatamos a recorrência do advérbio nunca (0,24), associado ao pretérito mais-que-perfeito, com três ocorrências. Tal resultado converge com o estudo realizado por Coan [4], no qual a autora constata que o advérbio nunca estaria associado à forma de pretérito mais-que-perfeito. Os demais advérbios controlados – já, não e o advérbio de tempo – foram amalgamados para que pudéssemos observar a influência do uso destes para a alternância das formas variáveis. Constatamos, contudo, que a presença do advérbio propicia o aparecimento do pretérito mais-que-perfeito no que concerne à codificação da função de anterioridade temporal.

As sequências discursivas são estruturas linguísticas que o falante dispõe para expressar-se nas situações comunicativas, as quais possuem peculiaridades que podem determinar o uso de determinadas formas variantes [8].

Perspectivas do enunciador Objetivo da enunciação

Narração Tempo e lugar Contar, dizer os fatos fictícios ou não Injunção O fazer póstumo ao tempo da

enunciação

Estimular à realização de uma ação, dizer como realiza a ação

Descrição Espaço conhecido Caracterizar, descrever, dizer como é

Opinião Comentário crítico Discorre criticamente acerca de determinado assunto

Figura 6: Tipologia textual-discursiva das sequências discursivas [8]

No decorrer da codificação dos dados, controlamos as seguintes sequências discursivas: narrativa, injuntiva, descritiva e opinativa, conforme a figura 6. Porém, dentre os tipos discursivos controlados, dois foram estatisticamente significativos para este estudo: a narrativa e a descrição. Os resultados obtidos a partir do cotejamento dos dados estão distribuídos no gráfico da figura 7.

(11)

Figura 7: Distribuição das formas de pretérito perfeito e pretérito mais-que-perfeito para a expressão do passado anterior em função da sequência discursiva

As sequências narrativas favorecem o uso da forma de pretérito perfeito com percentuais de 93% e apenas 7% para as sequências descritivas. Com relação ao mais-que-perfeito, percebe-se que, ao comparar as ocorrências das formas com as duas sequências discursivas em análise, nota-se que esta também está mais associada aos contextos em que ocorrem narrativas, com 67% dos dados e 33% para as sequências dscritivas. Contudo, ao analisarmos isoladamente apenas as frequências descritivas, percebemos o favorecimento do uso da forma de pretérito mais-que-perfeito, com 33% dos resultados, e consequentemente o desfavorecimento da categoria verbal de pretérito perfeito, a qual possue um percentual de apenas 7% dos dados coletados. A par do que esboçamos, nota-se que a sequência narrativa favorece tanto o uso do pretérito perfeito quanto do pretérito mais-que-perfeito. Já as sequenciações descritivas propiciam o aparecimento da forma verbal marcada, ou seja, do mais-que-perfeito.

Controlamos, ainda, os traços aspectuais, duratividade, dinamicidade e homogeneidade [8] relacionados à expressão do passado anterior.

Os traços semânticos estão vinculados à codificação do aspecto verbal. Berttineto [8] propõe os seguintes traços aspectuais: duratividade – procura delimitar a extensão da situação, se ela é [+durativa] ou [-durativa]; dinamicidade – procura demarcar se uma situação é [+dinâmica] ou [-dinâmica] – por exemplo, as situações que denotam estado são consideradas menos dinâmicas pois, , são mais densas; homogeneidade - situações são [+homogêneas] quando conseguimos fragmentar um momento temporal e mesmo assim, a situação se completa, em contrapartida temos o traço [-homogêneo] o qual não permite a finalização do evento a partir de um recorte temporal [8]. A partir do exemplo (23), podemos entender de forma mais precisa os traços semânticos que se inscrevem neste estudo.

(23) Meu pai trabalha em uma pedreira aí no decorrer do tempo ele ficou doente aí ele teve que fazer uns exames. (se ita M1_2)

O evento apresenta os seguintes traços aspectuais: [+durativo] pois os verbo ficou denota uma situação de estado que se estende por algum tempo; [-dinâmico], uma vez que a situação não apresenta nenhum desenvolvimento, é uma situação estática; [-homogêneo], já que podemos fatiar um momento temporal do evento e mesmo assim teremos a sua conclusão.

O controle destes traços possibilita a identificação dos contextos preferíveis para a atuação de formas verbais variáveis [8]. No entanto, neste estudo não foi verificada a relevância estatística destes traços para a expressão do passado anterior. As estatísticas obtidas a partir do controle do feixe aspectual não nos possibilitou traçar de forma precisa quais traços se associam as formas variantes em análise. Tal constatação pode ser comprovada nos gráficos das figuras 8, 9 e 10.

(12)

Figura 8: Distribuição do traço aspectual duratividade para a expressão do passado anterior entre as formas de pretérito perfeito e mais-que-perfeito

O gráfico da figura 8 apresenta a distribuição das formas de pretérito perfeito e mais-que-perfeito em função do traço duratividade: [+durativo] e [-durativo]. Desta forma, percebe-se que tanto o pretérito perfeito quanto o mais-que-perfeito estão vinculados ao traço [+durativo], com percentuais de 92% e 93%, respectivamente. O traço [-durativo] teve frequência de 8% para o pretérito perfeito e 7% para o mais-que-perfeito.

Figura 9: Distribuição do traço aspectual dinamicidade para a expressão do passado anterior entre as formas de pretérito perfeito e mais-que-perfeito

No gráfico da figura 9, é possível observarmos a distribuição das formas em variação em função do traço dinamismo: [+dinâmico] e [-dinâmico]. O cotejamento dos dados evidencia que as duas formas analisadas nesta investigação pretérito perfeito e mais-que-perfeito – possivelmente atuam em contextos [+dinâmicos], com percentuais de 97% e 90%, e 3% e 10% para aqueles [-dinâmicos].

Figura 10: Distribuição do traço aspectual homogeneidade para a expressão do passado anterior entre as formas de pretérito perfeito e mais-que-perfeito

(13)

O gráfico da figura 10 apresenta os resultados para o traço homogeneidade na a expressão do passado anterior. Assim, verifica-se que o pretérito perfeito liga-se tanto a contextos [+homogêneos] quanto [-homogêneos], com percentuais de 91% e 94% respectivamente.

Pelo que delineamos, notamos que não é possível precisar os traços aspectuais ligados às formas verbais que estamos analisando neste estudo. Percebe-se, portanto, a necessidade de pesquisas que abarquem de forma detalhada tais categorias linguísticas, na tentativa de traçar a influência dos traços aspectuais para a oscilação da forma de pretérito perfeito e mais-que-perfeito.

6.CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesta investigação, analisamos a equivalência semântica das formas verbais de pretérito perfeito e mais-que-perfeito no que concerne à expressão da anterioridade temporal, assim como os fatores linguísticos que motivam a alternância do uso das referidas formas verbais entre os falantes pertencentes à comunidade de fala de Itabaiana/SE. A seguir, elencamos nossas constatações: i) recorrência de uso do pretérito perfeito em detrimento da forma composta de pretérito mais-que-perfeito; ii) a forma de pretérito perfeito está associada a contextos de encadeamento discursivo e complementação; iii) o pretérito mais-que-perfeito associa-se à função sintático-semântica de modificação; iv) pretérito perfeito é favorecido pela ausência do advérbio da situação; v) a forma composta de mais-que-perfeito ocorre com mais frequência quando acompanhado por advérbios; vi) no que se refere ao tipo semântico-cognitivo do verbo e aos traços aspectuais abordados ao longo deste estudo, estes não se mostraram estatisticamente significativos para esta investigação.

1. CASTILHO, A. T.. Aspecto verbal no português falado. In: ABAURRE, M. B.; RODRIGUES, A. C. S. (orgs). Gramática do Português Falado: novos estudos descritivos, p. 83-121, 2002.

2. CORÔA, M. L. M.S.. O tempo nos verbos do português. São Paulo: Parábola Editorial, 2005. 3. BECHARA, E. Gramática da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Lucerna, 2006.

4. COAN, M. Anterioridade a um ponto de referência passado: Pretérito (mais-que-) perfeito. Dissertação de mestrado em Linguística do Programa de Pós-graduação em Linguística da Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 1997, 177 p.

5. LABOV, W. Padrões sociolinguísticos. São Paulo: Parábola Editorial, 2008. 6. TARALLO, F. A pesquisa sociolinguística. São Paulo: Ática, 2007.

7. CAMPOS, O. G. L.;RODRIGUES, A. C. S.; GALEMBECK, P.. A flexão modo-temporal no português culto do Brasil: formas de pretérito perfeito e pretérito imperfeito do indicativo. In: ABAURRE, M. B.; RODRIGUES, A. C. S. (orgs). Gramática do Português Falado: novos estudos descritivos, p. 35-58, 2002.

8. FREITAG, R. M. Ko. A expressão do passado imperfectivo no português: variação/gramaticalização e mudança. Tese de doutorado em Linguística do Programa de

Pós-graduação em Lingüística da Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2007, 238 p. 9. RODRIGUES, A. C.S; CAMPOS, O. G.L.A; GALEMBECK, P.; TRAVAGLIA, L. C.. Formas de

pretérito perfeito e imperfeito do indicativo no plano textual-discursivo. In: ABAURRE, M. B.; RODRIGUES, A. C. S. (orgs). Gramática do Português Falado: novos estudos descritivos, p. 415-461, 2002.

10. ILARI, R. Introdução à semântica: brincando com a gramática. São Paulo: Contexto, 2001. 11. REICHEMBACH, Hans. Elements of symbolic logic. New York: The MacMillan Company, 1947. 12. COAN, M.; BACK, A.; REIS, M.; FREITAG, R. M. Ko. As categorias verbais tempo, aspecto,

modalidade e referência: pressupostos teóricos para uma análise semântico-discursiva. Estudos

Lingüísticos, v. XXXV, p. 1463-1472(2006).

13. COSTA, S. B. B. O aspecto em português. São Paulo: Contexto, 1990.

14. SANKOFF, D.; TAGLIAMONTE, S.; SMITH, E.. Goldvarb X: A variable rule application for

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Mathematics - University of Ottawa, 2005.

15. GIVÓN, T. Functionalism and grammar. Amsterdam/ Philadelphia: John Benjamins Publishing, 1995.

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