• Nenhum resultado encontrado

Um olhar exploratório sobre a dinâmica imobiliária na RMPA nos anos 90 1 Tanya M. de Barcellos *

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Um olhar exploratório sobre a dinâmica imobiliária na RMPA nos anos 90 1 Tanya M. de Barcellos *"

Copied!
15
0
0

Texto

(1)

Um olhar exploratório sobre a dinâmica imobiliária na RMPA nos anos 901

Tanya M. de Barcellos*

Introdução

Este texto é o resultado de um primeiro contato com a complexa problemática do mercado imobiliário, em cuja compreensão jogam inúmeros fatores como aqueles que determinam a renda da terra urbana, e que merecem uma discussão que não cabe no escopo dessa tentativa. Também o papel fundamental desempenhado pelas políticas urbanas não foi sistematicamente considerado na abordagem, o que impõe limites na capacidade explicativa da análise. Centramos nosso foco nas características da estruturação do espaço urbano na Região Metropolitana de Porto Alegre (RMPA) na última década, procurando detectar as tendências de atuação do segmento empresarial de produção imobiliária, num esforço que busca fundamentalmente organizar os dados que conseguimos reunir. Tal tarefa já é bastante difícil, pois nesse material encontramos informações de caráter heterogêneo e com níveis bastante diferenciados de abrangência e de qualidade. Os dados reunidos provêm do Censo Demográfico, das Prefeituras dos municípios maiores da região (Porto Alegre, Canoas, Novo Hamburgo, São Leopoldo e Gravataí) e do Sindicato da Indústria da Construção Civil (SINDUSCON), que publica um levantamento anual sobre o setor, feito exclusivamente junto a empresas que atuam na cidade de Porto Alegre. O comportamento do setor construtivo é crucial no processo de provimento da habitação e na conformação do espaço urbano. Sabemos que a elitização da produção imobiliária de cunho empresarial tem como contraponto o crescimento das áreas irregulares de moradia, tornando essa questão fundamental para avançarmos na compreensão das diferenciações sociais existentes entre os espaços da metrópole2.

As desigualdades sociais que caracterizam as áreas metropolitanas fazem parte de processos complexos. A crise econômica dos anos 80, que se estende pelos 90, e as mudanças que decorrem dos processos de reestruturação econômica e globalização são fenômenos que vêm imprimindo suas marcas nas metrópoles. Assistimos a uma rápida transformação urbana como reflexo da integração das cidades à nova divisão internacional do trabalho, sendo reservado para as grandes cidades um papel privilegiado no processo de organização de mercados a nível mundial.

A referência para nossa aventura analítica se encontra nas leituras sobre as mudanças sociais, econômicas e culturais que acompanham a reestruturação econômica desde o plano mundial até as várias dimensões do local3.

1

A análise que empreendemos se vincula ao projeto de pesquisa Desigualdades Sócio-espaciais na RMPA, em curso no Núcleo de Estudos Regionais e Urbanos da FEE. Este projeto vem sendo desenvolvido com recursos aportados pelo Programa Pró-Guaíba e pela Fapergs e, em termos institucionais, está integrado ao Projeto “Metrópole, Desigualdades Sócioespaciais e Governança Urbana: Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte e Porto Alegre” encaminhado ao Programa Nacional de Cooperação Acadêmica – PROCAD e inserido no Programa de Apoio à Núcleos de Excelência – PRONEX/MCT.

*

Socióloga, Técnica da Fundação de Economia e Estatística.

2

No contexto do projeto mais amplo foi publicada uma abordagem das desigualdades sócio-espaciais em Porto Alegre que contempla alguns aspectos do mercado imobiliário. (Mammarella, Barcellos Koch, 2002).

3

(2)

No Brasil, as análises que procuram dar conta da estruturação dos espaços metropolitanos, durante um largo período se desenvolveram em torno da problemática centro-periferia (Lago, 2000). Mais recentemente, alguns estudos têm evidenciado novas articulações no processo de crescimento das áreas metropolitanas. Os anos 90, especialmente, revelaram muito claramente uma fragmentação social na configuração desses espaços. Em todo o território metropolitano podemos verificar o aumento das formas precárias de moradia, o crescimento da população vivendo em favelas, provocando uma aproximação da residência de pobres e ricos. A segregação social, nesse contexto, se exprime de uma nova forma, através de enclaves de áreas ricas e pobres, ou seja, de espaços delimitados no território – condomínios fechados ou ocupações ilegais, nos quais ocorre, por motivos diferentes, uma privatização de espaços públicos e a livre circulação é obstaculizada. (Ribeiro, 2000; Taschner, Bógus, 2000). O processo de ajuste estrutural iniciado nos anos 90, e que foi precedido de uma grave crise econômica, foi acompanhado de um aprofundamento dos problemas decorrente da crise, como o desemprego e a pobreza. No que diz respeito à problemática urbana, um dos aspectos que se alterou grandemente foi a dinâmica da produção habitacional, já que a crise trouxe junto a extinção do BNH, em 1986, que desempenhava importante papel no financiamento da moradia para as camadas médias e para a população de baixa renda. O setor imobiliário entra com sistemas próprios de financiamento que se voltam mais para a clientela de alta renda, alterando substancialmente a oferta de imóveis não só em termos quantitativos, mas também qualitativamente. Com isso, as faixas mais pobres da população ficam à margem do mercado formal, tendo como recurso a moradia precária, obtida pela via da autoconstrução (Souza, 2001).

Nossa reflexão se estruturou em torno de alguns tópicos: breve síntese das características da ocupação da RMPA; abordagem aproximada da problemática da estruturação urbana na RMPA a partir dos dados do Censo (principais municípios X região), enfocando o crescimento populacional e dos domicílios, a regularidade e irregularidade da ocupação, e as mudanças no padrão de moradia das diferentes camadas da população; e, finalmente, as tendências do mercado imobiliário nos principais municípios da RMPA, detectadas com base nas informações dos cadastros municipais.

Expansão urbana da RMPA

O texto de Carrion (1989) sobre mercado imobiliário e moradia periférica na RMPA reconstitui sinteticamente a história da expansão urbana da região e, junto com o trabalho de Vilaça (2001) nos dá pré-condições para refletirmos sobre o caráter das mudanças que estamos observando recentemente.

Para compreender a atual configuração metropolitana é necessário recuar pelo menos até o final do século XVIII e início do XIX, quando já ressalta o papel de Porto Alegre enquanto porto para a saída dos excedentes produzidos pela agricultura de subsistência dos colonos açorianos localizados em Viamão, Gravataí e Santo Antônio da Patrulha e ao longo dos vales dos rios Taquari e Jacuí (Cachoeira, Rio Pardo, Triunfo, Santo Amaro e Taquari).

(3)

São Leopoldo, que, em 1876 alcança Novo Hamburgo, em 1903 Taquara, e, em 1924, Canela4.

O eixo norte, seguindo a via férrea e a BR-116, concluída no final dos anos 40, ligando São Leopoldo e Novo Hamburgo a Porto Alegre, concentrou desde meados do século XX até o início dos 70, a ocupação urbana e industrial da atual RMPA. Além desse vetor, são importantes também na conformação da região os núcleos urbanos antigos em Viamão e Gravataí, situados respectivamente à leste e nordeste de Porto Alegre, cujas origens datam da época da imigração açoriana e onde a concentração urbana até recentemente se verificava somente na sede.

Até 1940, apenas os municípios de Porto Alegre, Viamão, Gravataí, Guaíba, São Leopoldo e Novo Hamburgo conformavam o que depois viria a constituir a RMPA. A partir de então, desmembramentos sucessivos ocorreram ao longo da ferrovia e da BR-116, que resultaram na criação de Canoas (1940), Esteio (1954), Sapiranga (1954), Estância velha (1959), Campo Bom (1959), e Sapucaia do sul (1961), e, em 1965, Alvorada e Cachoeirinha. Na época em que foi legalmente instituída, em 1973, a RMPA foi constituída pelos municípios de Alvorada, Cachoeirinha, Campo Bom, Canoas, Estância Velha, Esteio, Gravataí, Guaíba, Novo Hamburgo, Porto Alegre, São Leopoldo, Sapiranga, Sapucaia do Sul e Viamão.

Somente nos anos 60 começam a se destacar em termos econômicos outros municípios além de Porto Alegre, Novo Hamburgo e São Leopoldo, que eram os principais centros industriais até então. O município de Canoas passou a ter maior importância nessa época, disputando posição com Novo Hamburgo, que junto com São Leopoldo impulsionaram na região do Vale dos Sinos a produção coureiro-calçadista de forma quase que exclusiva. Foi nessa época que começou a funcionar no município de Canoas a Refinaria Alberto Pasqualini, muito importante nesse crescimento da produção industria, levando a um desenvolvimento diversificado, com a presença de vários ramos dinâmicos como química, material elétrico e de comunicações, metalurgia e mecânica, já em 1970. Também aparecem, com menor peso, Sapucaia e Esteio, no eixo norte.

Na década de 70, a construção da BR-290, ligando Porto Alegre à BR-101 (litorânea) favoreceu a implantação de indústrias no eixo leste-nordeste (Gravataí, Cachoeirinha e Alvorada).

A concentração populacional crescente na região é um dos efeitos dessa dinâmica: em 1940 nela estariam 12% da população do Estado, proporção que alcança os 23% em 1970, 29% em 1980, alcançando 33% em 1991. Na última década o incremento já não foi tão significativo, estabilizando a participação da região na população do RS em 34%.

Entre 1940 e1980 as áreas que apresentaram maior crescimento populacional foram as que correspondem aos municípios de Alvorada e Cachoeirinha. Também tiveram taxas elevadas em alguns momentos os municípios de Canoas (1940-60), Esteio (1940-60), Sapucaia do Sul (1950–70), Viamão (década de 50); Gravataí (década de 70), Campo Bom (décadas de 50 e 70) e Sapiranga (década de 70). Os municípios do entorno de Porto Alegre e algumas localidades da região coureiro-calçadista seguiram sendo os de maior crescimento demográfico nas décadas seguintes.

4

(4)

Considerando o núcleo metropolitano, a expansão urbana ocorreu de certo modo condicionada pela conformação peninsular que promoveu um crescimento em “leque semi-aberto”, tendo a parte mais central formado o conjunto cívico e religioso da cidade, e concentrado a moradia elites, que se expandiu para a parte mais alta do centro, na rua Duque de Caxias. No final do século XIX, podia-se identificar, partindo desse ponto, dois eixos de expansão da residência burguesa: um, em direção aos morros urbanizáveis – por onde se desenvolveu o bairro Independência e outro no caminho da orla do rio, que formou o Menino Deus. O centro de Porto Alegre manteve grande vitalidade ainda durante a década de 50, quando já apareciam outros pólos comerciais que tinham caráter mais popular como os bairros Azenha e Navegantes (Villaça, 2001).

Na primeira metade do século XX em linhas gerais o crescimento da cidade foi em direção ao norte partindo do centro histórico, em função do acesso mais direto às vias de comunicação com o resto da região e com o centro do país. O desenvolvimento industrial em grande parte influenciou esse sentido. Na década de 40 o incremento se intensificou em função do surgimento de muitas indústrias novas. Até então as imediações do porto (zona norte – Navegantes, São João, Floresta) concentravam as indústrias. Também nesses bairros residia grande parte da população operária. Nesse período instalaram-se indústrias ao longo da estrada do Passo da Areia (atual Avenida Assis Brasil), tendo contribuído para isso a enchente de 1941 que alagou a zona portuária e proximidades. A nova área era continuidade da zona industrial mais antiga e a zona sul da cidade tinha uso agrícola, a apresentava baixa densidade populacional. Após 1940 a área que converge com a atual Avenida Assis Brasil (em direção aos limites com Gravataí (Cachoeirinha) e Viamão (Alvorada)) foi sendo ocupada por indústrias e pela população mais pobre composta de operários e comerciários, entre outros. É dessa época (1946-50) a construção do conjunto habitacional do IAPI, construído para moradia de industriários.

Em Porto Alegre, o processo de loteamentos iniciou-se por volta de 1920, mas foi na década de 40 que começaram a surgir importantes loteamentos nos municípios da RMPA, em especial em Canoas, Novo Hamburgo e São Leopoldo, impulsionados pelo crescimento da indústria e da população e facilitados pelas melhorias na acessibilidade (pavimentação e ampliação da BR-116, aberta e duplicada e revestida entre 1940-48). Aliás, o desenvolvimento industrial fora e para além de Porto Alegre seguindo a direção das antigas colônias deu à expansão urbana da região uma forma distinta do clássico centro – periferia de grande parte das metrópoles brasileiras (Villaça, 2001).

Muitos loteamentos da década de 40, sobretudo em Canoas, foram feitos em áreas inadequadas (terras inundáveis, de acesso precário e sem serviços básicos de infraestrutura). Os loteamentos mais antigos de Canoas, de moradia da população mais pobre, situados nos bairros Niterói e Vila Rio Branco, junto à divisa com Porto Alegre, corresponderam à expansão da capital. Datam também dessa época (anos 40) os loteamentos feitos nas áreas que hoje são as sedes dos municípios de Cachoeirinha (Vila Cachoeirinha) e Alvorada (Vila Passo do Feijó), também contíguos a Porto Alegre e que, durante as décadas seguintes passariam a desempenhar o papel de cidades - dormitório.

(5)

expressas quanto à infraestrutura e áreas de uso público só foram estabelecidas em Porto Alegre e Canoas, tornando ainda mais elevados os preços dos terrenos no núcleo metropolitano.

No final da década de 50 e início dos anos 60 os municípios de Campo Bom, Guaíba e Gravataí estabeleceram legislação específica para loteamentos, sem, porém, muito rigor com relação à implantação de infraestrutura urbana. Essa ausência de regulamentação gerou a ocupação de áreas impróprias para moradia, um crescimento extensivo, com baixa densidade de ocupação e vazios urbanos e áreas com sérias deficiências de infraestrutura.

Na década de 50 alguns outros fatores interferiram no direcionamento da expansão urbana, particularmente o crescimento do mercado de trabalho em Porto Alegre em direção à zona norte, que provocou o incremento do núcleo mais próximo, Canoas e a polarização exercida pela capital, acarretando um grande crescimento em Gravataí.

A população de baixa renda que trabalhava em Porto Alegre deslocou-se para núcleos próximos que tinham profundas carências em serviços e equipamentos básicos, orientando um vetor de expansão na direção leste-nordeste, seguindo os caminhos que ligam a cidade a Viamão e Gravataí, com crescimento maior em Alvorada (Vila Passo do Feijó) e Cachoeirinha, então distritos desses municípios.

Tendo em vista as condições de funcionamento do mercado de imóveis (oferta reduzida de imóveis para locação, encarecimento da terra, baixo salário), o aluguel, que era a forma predominante de moradia operária, foi sendo substituído pela casa própria em bairros periféricos da capital e nas áreas de expansão urbana. Antes da criação do BNH (1964), era limitada a possibilidade de financiamento da moradia, o que levou à autoconstrução nos loteamentos periféricos5.

A disseminação do transporte coletivo por ônibus, serviço que surge em 1926 em Porto Alegre, também foi fator fundamental para essa ocupação periférica. O mercado de terra metropolitano teve grande dinamismo entre 1950 e 1964. Em Porto Alegre o maior número de loteamentos se verificou na zona norte (entre Protásio Alves e Assis Brasil), sendo destinados em grande parte à população de baixa renda, pois não dispunham de boa infraestrutura e serviços urbanos. Nos anos 50 também se proliferaram loteamentos em Canoas e nos atuais municípios de Gravataí, Cachoeirinha, Alvorada, Sapucaia do sul e Guaíba.

Depois de 1964 se retrai, em toda a RMPA, a implantação de loteamentos, o que resultou do tamanho excessivo das áreas que acabou deixando em reserva uma grande parte da terra loteada no período anterior. A desaceleração da economia no início dos 60 incidiu sobre o setor imobiliário, que só teve recuperação mais significativa no final da década.

A partir de 1976, quando o financiamento do BNH se voltou para a faixa de 3 a 5 Salários Mínimos, se verificou uma retomada do processo de loteamentos, desta vez não para venda de lotes individualizados, mas para a construção e venda de conjuntos habitacionais. Entre 1976 e 1982 foram construídos vários conjuntos na RMPA, destacando-se Porto Alegre, Gravataí, Guaíba e Alvorada, que concentraram quase todas as cerca de 37.000 unidades construídas.

5

(6)

No começo da década de 80, a recessão econômica provocou retração desses empreendimentos e dificultou a venda das unidades já construídas. Até 1987, vários conjuntos estavam apenas parcialmente ocupados, tornando-se objeto de constantes invasões por parte da população de renda muito baixa (Azevedo, 1998).6

Nessa nova fase, atuam no mercado não apenas agentes isolados, mas, sobretudo, as incorporadoras, que controlam o processo de produção da habitação. O setor imobiliário atua, a partir da década de 70, em articulação com o setor financeiro, sobretudo através do SFH. Embora com maior dinamismo, o mercado imobiliário não consegue incorporar famílias com renda muito baixa, mesmo no caso dos conjuntos habitacionais populares.

A venda de lotes individuais, voltada para moradia de população de renda mais baixa, passou a ocorrer em áreas cada vez mais afastadas, devido ao processo de valorização da terra. A zona da Avenida Assis Brasil, por exemplo, cuja ocupação inicial se deu a partir da década de 40, e que em termos residenciais foi feita por população de baixa renda, passou por várias remodelações que provocaram valorização e mudança de uso. Hoje, lá convivem, camadas de renda baixa, com segmentos médios e até médios altos, com no caso do bairro Jardim Lindóia. Foi por essa avenida que se deu o acesso à RS–20 e à RS-30, em direção à Gravataí e Cachoeirinha, que na década de 50 constituíram espaços de expansão urbana da capital. A construção da BR-290 (auto-estrada), na década de 70, unindo Porto Alegre com a BR-101, passando por esses dois municípios, bem como a criação dos distritos industriais de Cachoeirinha e Gravataí, produziram certa valorização dos terrenos na área. As alternativas mais acessíveis para moradia se concentraram em Alvorada, Sapucaia do Sul e Viamão.

Em 1972, os preços da terra eram mais altos em Porto Alegre, Novo Hamburgo, Gravataí, São Leopoldo, Cachoeirinha e Canoas. Com preços mais baixos apareciam Sapucaia do Sul, Alvorada, Guaíba, Esteio e Viamão. Esse quadro não se modificou muito, mas vem aumentando a distância entre preços máximos, nas áreas centrais e mínimos, nas periferias, onde à medida que chega a infraestrutura tornam-se menos acessíveis à população, colocando a invasão como solução para os mais pobres.

Expansão urbana e padrão de moradia no período mais recente

Os dados dos Censos Demográficos de 1991 e 2000 nos permitem uma visão aproximada das tendências gerais da expansão urbana na RMPA, em especial, do padrão habitacional dominante na região, o que será feito a partir da análise de alguns indicadores indiretos. O crescimento populacional e as mudanças na distribuição da renda fornecem indícios sobre a direção e o conteúdo que vem assumindo o crescimento urbano. A estratificação do tipo de moradia – proporção de casas e de apartamento – nos diferentes municípios da RMPA é um indicador do nível de empresariamento na oferta de habitações, especialmente se correlacionado com o rendimento da população; o número de dormitórios nos domicílios e a condição de ocupação dos domicílios, identificando o peso do aluguel e da casa própria, visto que são informações que nos permitem inferir a respeito dos reflexos da crise na problemática habitacional. Esse conjunto de indicadores, complementado pelos dados relativos aos aglomerados subnormais, nos informam sobre o padrão recente de moradia na RMPA.

6

(7)

O crescimento demográfico metropolitano já vem há pelo menos duas décadas se concentrando no entorno imediato de Porto Alegre e, de um modo muito menos intenso, em algumas localidades pequenas situadas no Vale dos Sinos, na região da produção coureiro-calçadista do Estado. Entre 1991 e 2000, a população da região aumentou em média 16%, enquanto na periferia da capital, em Eldorado do Sul ele superou 50%, e em Viamão e Alvorada, ficou em torno de 30%. Na região do Vale dos Sinos as cifras são igualmente impressionantes em alguns casos, muito embora se trate de municípios de pequeno porte, como Nova Hartz onde o incremento também ultrapassou os 50% e em e Dois Irmãos e Parobé, onde esteve por volta dos 40%. A sede metropolitana, embora com menor crescimento e perdendo peso demográfico, continua ainda a concentrar a população da região numa proporção que foi de quase 40% em 2000. Os municípios da sua periferia (Alvorada, Cachoeirinha, Eldorado do Sul e Viamão), em contraposição, aumentam sua fatia na composição da população da metrópole (de 13% para 15%).

O aumento do número de domicílios foi sempre maior que o da população, indicando que estão em curso mudanças no padrão de ocupação dos domicílios e rearranjos na composição das famílias7.

O padrão mais freqüente de residência na RMPA é o de dois dormitórios, onde se concentravam mais de 46% das pessoas nos dois anos examinados. Também nos municípios que a integram, à exceção de Ivoti, onde as residências de três dormitórios têm maior peso, predomina a moradia em dois dormitórios. Houve uma pequena redução na moradia com 1 dormitório e um incremento na de três e mais dormitórios, que reúne uma parcela muito pequena da população da região.

A distribuição da população pelo tipo de moradia mostra um predomínio da casa sobre o apartamento nos dois anos analisados. No conjunto metropolitano, a população concentrava sua residência em casas numa proporção em torno de 80% em 1991, que cresceu para 82% em 2000, significando uma queda na importância do apartamento. Levando em consideração a tese de que o apartamento é indicador do empresariamento na produção imobiliária (Lago, 2000) esse fato permite supor que a irregularidade possa ter se expandido na RMPA. A perda, no entanto, não ocorre de forma generalizada nos municípios da região e nas suas diferentes áreas. Ao contrário, em certos casos verificou-se até um aumento considerável da residência em apartamentos, como, por exemplo, em Guaíba e Dois Irmãos (de 1,16% para 8% no primeiro e de 2,24% para 7,33% no segundo). Na verdade, na maioria dos municípios houve um pequeno acréscimo no peso da moradia em apartamentos, o que pode estar apontando uma tendência de diversificação social da região, com aumento da presença de camadas de renda um pouco mais alta, com acesso ao mercado regular da moradia, em municípios que concentram população de renda mais baixa. Por outro lado, entre os que experimentaram um aumento dos residentes em casas, deve ser ressaltada a situação de Porto Alegre, pois foi realmente o único aumento importante, não só em termos relativos, mas, sobretudo, em volume absoluto (quase 100.000 pessoas). Em Alvorada, Canoas, Estância Velha, e Sapucaia do Sul também aumentou a proporção da moradia em casas, somente que numa escala muito menor.

Devemos ressaltar, contudo, que somente em Porto Alegre encontramos um peso realmente significativo da moradia em apartamento, que representava 39% das alternativas em 1991, caindo para 36% em 2000. Nos demais municípios essa proporção alcançou no máximo 10,5% (Novo Hamburgo em 2000).

7

(8)

A abordagem que integra o cruzamento do tipo de moradia com a distribuição dos rendimentos por faixas de salário mínimo pode nos iluminar um pouco na compreensão desses achados.

Em Porto Alegre, o aumento na moradia em casas foi significativo nas faixas de renda baixa e média8, envolvendo desde os que ganhavam entre ½ e 1 salário mínimo até os que estavam no intervalo de renda entre cinco e dez salários mínimos. Com isso podemos levantar a hipótese de que influenciaram nesses números não somente a expansão da moradia irregular, mas também, a crescente escolha por condomínios fechados pelas camadas médias. Já na faixa de renda mais alta cresceu a proporção da moradia em apartamento, acompanhando o processo de verticalização em curso em bairros ricos da cidade, como Moinhos de Vento e Bela Vista, e em outros emergentes para camadas mais abastadas como Três Figueiras e Chácara das Pedras, onde se concentram os investimentos do setor imobiliário como veremos mais adiante. Na capital, como concentração urbana de maior porte da região, conseguem se expressar com maior nitidez as contradições implícitas nos processos de estruturação urbana da metrópole.

Em Sapucaia do Sul constatamos que o maior aumento na proporção da moradia em casas foi exatamente na faixa mais alta de renda, sendo seguido do que se verificou na faixa de rendimento entre 5 e 10 salários mínimos. Em Alvorada, município dormitório para grande parte da população mais pobre que trabalha em serviços mal remunerados na capital, registrou-se uma situação distinta: aumento da residência em casas entre a população de baixa renda, especificamente entre os que se enquadravam na faixa de ½ a 1 salário mínimo e na faixa imediatamente mais alta de rendimento (de 1 a 2 salários mínimos), do que se deduz um crescimento da moradia irregular.

Estes exemplos estão mostrando que a questão é bastante complexa. Se olharmos para as informações que contabilizam a moradia irregular, constatamos que embora ponderando o subdimensionamento que marca o levantamento censitário de aglomerados subnormais9 houve crescimento significativo da população nessas áreas, que superou em muito o incremento percentual da população da região como um todo: enquanto nos aglomerados subnormais o crescimento foi de 56%, na média metropolitana ele não chegou a 17%. Também a população vivendo em domicílio próprio, mas em terreno não próprio, outro indicador do padrão de moradia, aumentou em vários municípios da região, não obstante tenha apresentado leve queda no conjunto da metrópole. Foi muito grande o crescimento dessa condição em Cachoeirinha, Eldorado do Sul e Gravataí. Já em Viamão, Sapucaia do Sul, Sapiranga, São Leopoldo, Portão, Novo Hamburgo e, em menor dimensão Porto Alegre, verificou-se decréscimo de pessoas em domicílios próprios.

Com relação a Porto Alegre podemos avançar um pouco mais na compreensão da dinâmica da estruturação urbana. Isto porque tivemos condições de trabalhar as informações de forma mais desagregada, contemplando a divisão da cidade em bairros, divisão que foi utilizada pelo IBGE na divulgação dos dados da amostra do Censo de 2000.

O crescimento populacional diferenciado dos bairros nos fornece uma visão das mudanças que podem estar ocorrendo na cidade. Vejamos primeiramente que áreas estão perdendo moradores e, portanto, sofrendo algum tipo de reestruturação que implica em expulsão. Os percentuais mais elevados de incremento negativo da população estão, por

8

Cabe esclarecer que o indicador de renda foi construído com base na variável renda nominal dos maiores de 10 anos.

9

(9)

ordem, em Navegantes/São Geraldo, São João, Centro, Cidade Baixa e Floresta. No Centro e Cidade Baixa, que é seu prolongamento imediato, temos a situação de crescente deterioração que pode ser deduzida dos projetos e planos que o poder público municipal vem desenvolvendo visando sua recuperação (Borba, 1993). Mais recentemente nessa área o comércio tem crescido bastante assim como a moradia de camadas médias. No bairro Floresta houve um incremento da atividade comercial mudando o perfil do bairro. Os outros são bairros limítrofes em uma região que era industrial, tendo sido também local de moradia operária.

Os bairros que tiveram forte crescimento populacional também expressam também situações distintas. O que apresentou maior crescimento foi o bairro Mário Quintana, localizado no norte de Porto Alegre, no limite com Alvorada. É uma área de moradia popular. O segundo maior se verificou em um grupo de bairros situados no extremo sul (Ponta Grossa, Chapéu do Sol, Belem Novo Lageado e Lami), quase todos na orla do Guaíba, numa área que se constitui em expansão natural da cidade. Também na zona sul da cidade, em bairros que na sua maior parte eram balneários, verificamos um incremento menor, mas ainda muito superior à média, no conjunto Espírito Santo/Guarujá/Serraria/Hípica/Pedra Redonda/Ipanema. No sul de Porto Alegre têm surgido inúmeros condomínios residenciais construídos para camadas médias, sendo mais recentemente alguns voltados para faixas de renda mais alta, o que nos indica que já estão sofrendo grandes transformações na infra-estrutura e na oferta de comércio e serviços. Ainda com crescimento percentual significativamente acima da média metropolitana temos os bairros Restinga e Passo das Pedras; um grupo formado por Vila João Pessoa e Coronel Aparício Borges; um que reúne Bom Jesus, Jardim Carvalho e Jardim do Salso; outro juntando Anchieta, Arquipélago, Farrapos e Humaitá (zona industrial e moradia popular); um reunindo Vila Nova e Campo Novo (área antes rural); e, finalmente, o conjunto de Lomba do Pinheiro, Agronomia e Jari no limite com Viamão. Nesses bairros podemos identificar em grande parte o crescimento da moradia popular. São regiões da cidade que dispõem de infra-estrutura precária ou inexistente.

Observando a proporção de apartamentos e casas nos bairros de Porto Alegre em 2000 ressalta uma clara correlação entre os bairros mais elitizados e elevada participação de residência em apartamento, que chega em alguns casos a mais de 80%. É o caso dos grupos onde estão somados Auxiliadora, Mont’Serrat, Moinhos de Vento e Bela Vista e Bom Fim, Farroupilha e Independência; de Petrópolis; e, ainda do bairro Floresta, esse de residência para camadas médias e mais caracterizado pela função comercial. Na outra ponta, também é quase que exclusiva a moradia em casas, nos bairros mais populares: mais de 90% em Mário Quintana, Restinga, Vila Nova/Campo Novo, Bom Jesus/Jardim do Salso/Jardim Carvalho, Agronomia/Lomba do Pinheiro/Jari e finalmente, Medianeira/Santa Teresa, sendo esse último local onde encontramos uma das maiores vilas da cidade, a Vila Cruzeiro do Sul, que se mistura com a residência de camadas médias e até mais abastadas.

(10)

em bairros de moradia da população de renda mais alta e a expansão de áreas mais na periferia, sendo ocupadas principalmente por população mais pobre. Na zona sul da cidade o crescimento populacional aponta para uma perspectiva de reestruturação urbana.

O mercado imobiliário nos principais municípios da RMPA

Os dados disponíveis sobre o mercado imobiliário na região são em geral bastante precários, quando disponíveis. Em poucos casos, como, sobretudo, Porto Alegre e em menor escala Novo Hamburgo, as informações, além de mais abrangentes em relação à temática, são organizadas em sistemas informatizados, permitindo um acesso mais fácil e seguro. Não obstante, sabemos que os registros nem sempre conseguem dar conta de toda a atividade do setor imobiliário, que se compõe de um universo muito diversificado de empreendedores. Sob esse aspecto, o SINDUSCON – RS nos fornece algumas informações importantes. A proporção de pequenas empresas, com até dois empreendimentos, atuando no mercado é muito significativa e aumentou entre 2000 e 2002 de 77,56% para 80,52. No outro extremo, vemos que apenas 8,2% das empresas tinha 5 ou mais empreendimentos, sendo que uma delas teve 13 empreendimentos em 2002. Não podemos esquecer que esse é o universo com registro, e que ainda assim, apresenta omissões como o da faixa de valor dos imóveis em oferta: em 2002 mais de 6% das empresas não informaram esse item que, inclusive é de preenchimento opcional no Censo do SINDUSCON (SINDUSCON, 2000, 2001, 2002).

Dentre os municípios da RMPA, escolhemos os de maior porte e importância econômica, como Porto Alegre, Canoas, Gravataí, Novo Hamburgo e São Leopoldo, onde já é mais intenso o dinamismo do mercado de imóveis e onde, em tese, poderíamos encontrar mais facilmente informações organizadas10.

O único dado com potencial comparativo que conseguimos levantar foi o registro da área construída discriminados por bairro e área (em m2) do empreendimento, e ainda assim incompleto, pois obtivemos para quatro dos cinco municípios, e, nem sempre cobrindo todos anos definidos para a abordagem, ou seja, o período entre os dois censos demográficos11.

Assim, ficamos bastante restritos nas nossas possibilidades de análise e compreensão da temática em questão. No entanto, essas informações podem nos situar na dinâmica de municípios sobre os quais não existem muitos estudos disponíveis, já que as poucas análises realizadas sobre o assunto se concentram na cidade de Porto Alegre ou tratam de períodos anteriores.

Numa perspectiva geral, olhando para os totais dos quatro municípios, verificamos que, entre os dois anos limites disponíveis, houve crescimento de área construída, muito embora tenhamos observado oscilações nos anos intermediários do período analisado.

Antes de qualquer comentário especificando esse fenômeno devemos registrar que há uma distância considerável entre a dimensão da área construída em Porto Alegre em relação aos demais municípios. Entre 1991 e 2001, na capital, cuja população estava próxima de 1.400 mil (em 2000), foram vistoriados 8.985.228,38 m2, segundo dados publicados pela Prefeitura da cidade. Em Novo Hamburgo, no período 1992 – 2002, essa cifra cai para 2.036.005 m2, o que não é pouco considerando que a população do município

10

Em São Leopoldo obtivemos apenas os cadastros informatizados de 1998 e 1999. Os registros dos demais anos estão sendo organizados. De Canoas ainda não nos foram repassadas as informações solicitadas.

11

(11)

não atinge 240.000 habitantes, segundo o último Censo. Em Gravataí, onde os registros só estavam completos a partir de 1995, computamos 477.407,67 m2 de área de habite-se, o que representa uma pouco mais do que a metade da área dos habite-se registrados em Novo Hamburgo entre 1995 e 2000. Em se tratando de municípios de porte semelhante, como os dois últimos, essa diferença significativa tanto pode estar relacionada com problemas nos registros municipais (o que foi constatado no ano de 1996 em Gravataí)12, como com a existência de um mercado mais dinâmico na cidade de Novo Hamburgo.

Examinando as informações obtidas por bairros podemos identificar algumas tendências na estruturação urbana dessas localidades.

Começando por Novo Hamburgo, salientamos cinco bairros onde foram vistoriados mais de 100.000 m2 de área construída, ou seja, entre 16 % e 6 % do total vistoriado: Centro, Canudos, Rio Branco, Ideal, e Rondônia. O Centro da cidade é o bairro que apresenta o maior valor médio da face de quadra (R$241,14) e experimentou crescimento populacional significativo na última década. Canudos teve crescimento percentual menor do que a média do município e apresenta um valor médio da face da quadra bastante reduzindo, só ficando acima do valor calculados para o bairro de Rondônia. Os outros ficam com valores distantes daquele observado no Centro, mas bem acima do que foi registrado para Canudos e Rondônia. Em termos de crescimento populacional, todos esses bairros ficaram com um percentual abaixo da média do município, com indicativos de que estejam experimentando processos de reestruturação. Rio Branco, que ocupa a terceira posição em valor da face de quadra, é continuidade do Centro. Ideal, que limita com o sul do bairro Rio Branco, abriga os pavilhões da Feira Nacional do Calçado (FENAC). Canudos se situa na divisa com o município de Campo Bom à leste e com o bairro Santo Afonso ao sul, sendo esse um bairro com baixíssima ocupação. Rondônia, também limítrofe com Santo Afonso, se localiza, do mesmo modo que Canudos, próximo às vias que dão acesso à Campo Bom e Taquara. Ambos aparecem na listagem de processos para implantação de loteamentos e condomínios fornecida pela Secretaria de Planejamento do município13. Para Canudos, no período 1993 – 2003, constam os registros de quatorze loteamentos e de um condomínio, grande parte já das obras já concluída ou em execução, sendo que cinco, de propriedade da Prefeitura Municipal, envolvem uma área de 1.040.297,15 m2. O baixo valor do terreno, o número significativo de loteamentos e o tamanho da área projetada indicam tratar-se, nesse caso, de uma área de expansão urbana do município. Em Rondônia, no mesmo período, os registros apontam a existência de três loteamentos abrangendo uma área de 141.785,97 m2, todos na Rua Guia Lopes – importante eixo viário do município, sendo que dois deles já estão concluídos e um está ainda em execução.

É importante mencionar que uma parte considerável da área vistoriada em Novo Hamburgo é residencial, concentrando 69% em média no período 1992 – 2002, sendo, sobretudo, relativa à construção de edifícios. A proporção de edifícios na totalidade da área

12

No ano de 1996 havia muitos campos relativos à área das unidades de um conjunto residencial não preenchidos. Também no bairro Centro havia registros incompletos. Para correção é necessário voltar aos registros originais (Processos), o que não foi possível tendo em vista as dificuldades de tempo e de pessoal auxiliar para a realização desse tipo de levantamento. Como forma de minimizar o subdimensionamento da área construída nesses bairros, aplicamos um valor próximo à área de habite-se média do bairro nos campos que estavam sem registro.

13

(12)

dos projetos vistoriados é quase sempre superior a 30%, tendo atingido 65% em 1993. Também na média daqueles anos os projetos comerciais representaram 29% da área vistoriada, e os industriais ocuparam apenas uma fatia de 1%.

Na análise dos habite-se concedidos no período 1995 – 2000 em Gravataí,14 verificamos, em primeiro lugar que, a instalação do Complexo Automotivo da GM, mais que duplicou a quantidade média de habite-se dos anos anteriores. Embora com registro somente a partir de 1999, desponta em primeira posição com relação à dimensão de toda a área construída em seis anos (139.028,74 m2), representando mais de 29% de toda a área de habite-se no período. Em segundo lugar, mas com um tamanho consideravelmente menor (9,46%), aparece o Distrito Industrial. Pode-se facilmente imaginar os desdobramentos desses investimentos industriais e suas implicações na estrutura urbana do município. Também registram valores significativos de área construída os bairros Centro e, com uma dimensão bem menor o Parque dos Anjos, Novo Mundo, Paragem dos Verdes Campos e São Geraldo. O Parque dos Anjos se localiza na margem da Free-Way, fazendo fronteira com o Parque Industrial Gravataiense, loteamento residencial. A Paragem Residencial dos Verdes Campos se situa também na margem da Free-Way, em frente ao Complexo da GM. O bairro Novo Mundo limita com Cachoeirinha, igualmente margeando a Free-Way. Por fim, São Geraldo ocupa uma grande extensão de área ladeando a Av. Dorival Cândido Luz de Oliveira que liga a cidade de Cachoeirinha à Gravataí, em direção ao Centro.

Como já mencionamos antes, no que se refere ao município de São Leopoldo somente estavam organizados em arquivos informatizados os dados relativos aos anos de 1998 e 1999. Não obstante, algumas observações podem ser realizadas, de modo a situar ao menos a importância relativa dos empreendimentos imobiliários naquela localidade. Nesse sentido, se considerarmos que dois anos podem representar uma amostra dessa dinâmica, devemos registrar que o município não está muito distante daquilo que verificamos em termos de totalização de habite-se em Gravataí. Nos dois anos, a área construída em São Leopoldo foi menor em cerca de 10.000 m2. Observamos também uma distribuição menos pulverizada nesse município, uma vez que tem um número significativamente menor de bairros. O bairro Feitoria, situado no limite com Novo Hamburgo, apresentou a maior proporção de área de habite-se (quase 19% em 1998 e mais de 15% em 1999). O Centro e o bairro Scharlau, esse na margem da BR-116, limitando com Novo Hamburgo apresentaram também dimensão significativa de área construída. Examinando o registro que aponta os proprietários das construções que receberam habite-se em São Leopoldo e Gravataí, apenas nesse último município encontramos atuando uma empresa de abrangência estadual com um empreendimento residencial em uma área no limite com Cachoeirinha, na margem da RS-20.

A análise da dinâmica recente do mercado imobiliário de Porto Alegre pode ser feita de maneira mais abrangente, uma vez que o SINDUSCON disponibiliza seu Censo Imobiliário desde 1998. Para o período anterior contamos com os dados sobre áreas vistoriadas publicados pela Prefeitura de Porto Alegre (Prefeitura Municipal de Porto Alegre, 1999, 2001).

14

O Departamento de Obras da Secretaria Municipal de Obras Públicas disponibilizou os dados sobre projetos vistoriados e aprovados. Utilizamos, no que se refere às áreas vistoriadas, as informações organizadas em planilhas EXCEL, pelo engenheiro Paulo Bassi, do Setor de controle e aprovação de Projetos da Diretoria de Planejo Urbano.

(13)

Começando com o quadro das áreas vistoriadas no período 1991 – 2001, discriminadas por bairros, identificamos, inicialmente, a proeminência de bairros de moradia da população de renda média e alta, o que é perfeitamente compreensível uma vez que estamos lidando com informações que refletem o movimento do mercado imobiliário formal. Destacaram-se, nesse período, com as maiores proporções de área vistoriada, os bairros Petrópolis, Bela Vista, Menino Deus, Passo da Areia, Sarandi, Rio Branco, São João, Mont’Serrat, Boa Vista e Moinhos de Vento, considerando as 10 maiores participações. Dentre esses, Bela Vista e Petrópolis, concentravam, juntamente com Belém Novo, os imóveis em oferta na faixa de valor mais alta (acima de R$ 250 mil) nos últimos anos (SINDUSCON, 2000, 2001, 2002). Os bairros Bela Vista e Petrópolis, junto com Menino Deus, Auxiliadora, Cristal, e Higienópolis, concentravam, igualmente a oferta de apartamentos de três dormitórios na faixa de R$125 mil a R$250 mil; Mont’Serrat, só para termos uma idéia do perfil que vem assumindo no período recente, oferecia 23 unidades, das quais 20 se encontravam na faixa de valor entre R$ 125 mil e R$ 250 mil, ou seja são imóveis acessíveis somente para camadas de renda mais alta. Também o bairro Rio Branco tem crescido com essa configuração.

Os bairros Bela Vista, Petrópolis e Mont’Serrat são áreas de moradia de camadas de renda alta e estão experimentando um processo de verticalização bastante intenso que já se delineava no início dos 90 em função de mudanças na legislação urbanística definida pelo I Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano de Porto Alegre (Barcellos, Mammarella, Koch, 2002). Esse processo se acelera após a aprovação do novo Plano Diretor, em 1999, que abriu a possibilidade de utilização de mecanismos que permitem aumento da densidade em áreas bem equipadas e com boa infra-estrutura.

O Passo da Areia, com origem operária, atualmente se caracteriza por um tipo de ocupação mais elitizada. Também em 2002 esse bairro tinha ofertas de imóveis concentradas em apartamentos de três dormitórios, na faixa de R$ 125 mil a R$ 250 mil. O mercado imobiliário tem explorado sua atratividade em função da proximidade com o Shopping Iguatemi, que alterou profundamente os bairros do seu entorno.

Sarandi, bairro mais popular, na zona norte da cidade, aparece em 2001 com destaque na oferta de apartamentos de dois dormitórios na faixa de R$ 50 mil a R$ 75 mil, indicando mudanças na sua composição social. Em 2002 tinha 10 apartamentos de três dormitórios (com garagem, sacada e churrasqueira) em oferta na faixa de R$ 75 mil a R$ 125 mil.

Em termos gerais o apartamento predomina, e vem crescendo em participação no conjunto das unidades disponíveis (em torno de 70%). Entre 1998 e 2001 aumentou sempre a proporção de unidades com três dormitórios, indicando que realmente o mercado se volta para famílias com faixa mais elevada de renda.

Embora considerando a diversidade na qualidade e abrangência das informações que utilizamos nessa abordagem, o que torna muito limitada a nossa possibilidade de captar com clareza essa complexa dinâmica, devemos arriscar alguns comentários mais analíticos sobre a dinâmica imobiliária da região.

(14)

da Free-Way e no vetor de ligação do Centro da cidade com o município de Cacheirinha. A diversidade de empresas incorporadoras e construtoras atuando no município é igualmente representativa dessa dinâmica.

Porto Alegre mostra uma dinâmica que se volta fundamentalmente para as camadas de renda mais alta da população. Junto com essa concentração de elites em alguns bairros como Moinhos de Vento, Bela Vista, Petrópolis e Mont´Serrat, observamos um avanço de projetos na zona sul da cidade, em grande parte também dirigidos para a população de renda mais elevada. e uma ampliação de investimentos em bairros do entorno orientados para camadas médias. De tal modo se estratifica a cidade que nos deparamos com algo que faz lembrar a “quartered city” definida por Marcuse para expressar a divisão social das metrópoles globalizadas (apud Barcellos, Mammarella, 2001): as camadas médias procuram se aproximar das elites e se afastar da moradia das camadas populares.

BIBLIOGRAFIA

AZEVEDO Paulo Roberto (1998). Passageiros da ilegalidade: um estudo da ocupação do Conjunto Residencial “Onze de abril”. Porto Alegre. Dissertação de Mestrado – PPG Sociologia UFRGS.

BARCELLOS, Tanya M. de, MAMMARELLA, Rosetta, KOCH, Mirian Regina. Tipologia sócio-espacial de Porto Alegre – 1980-91: diferenciações sócio-ocupacionais e desigualdades sociais entre os espaços da cidade. Indicadores Econômicos FEE, v. 29 n. 4. 2002. Porto Alegre, FEE, p. 307 – 341.

BARCELLOS, Tanya M. de, MAMMARELLA, Rosetta. Questões teóricas e metodológicas na pesquisa recente sobre as grandes cidades: notas para reflexão. Revista Ensaios (FEE), Porto Alegre, Vol. 22, n. 2, p. 248-269, 2001.

BORBA, Sheila (1993). Transformações recentes na área central de Porto Alegre. Apontamentos para uma discussão. In: PANIZZI, Wrana., ROVATTI, João F., orgs. Estudos Urbanos: Porto Alegre e seu planejamento. Porto Alegre: Ed. Universidade/UFRGS; Prefeitura Municipal de Porto Alegre, p. 19-32.

CARDOSO, Adauto Lucio. Mercado Imobiliário e segregação: a cidade do Rio de Janeiro. In: RIBEIRO, Luiz Cesar de Queiroz (org) O Futuro das Metrópoles: Desigualdades e Governabilidade. RJ: Revan: FASE, 2000; p. 319 - 350.

CASTELS, Manuel (1989). The informacional city. Information, technology economic, restructuring and urban-regional process. Oxford, Basil Blawell.

CECCONI, Alessandra de Souza (2002). Os arranjos familiares na Região Metropolitana de Porto Alegre – RMPA - em 1980 e 1991. Trabalho apresentado no Seminário Nacional “Metrópoles: entre a coesão e a fragmentação, a cooperação e o conflito”, Rio de Janeiro, de 5 a 9 de agosto de 2002. (mimeo).

FIGUEIREDO, M. P. (Coord). Região Metropolitana de Porto Alegre: informações e análise. Porto Alegre: Metroplan/FEE, 1988.

LAGO, Luciana Corrêa do (2000). O que há de novo na clássica núcleo-periferia: a metrópole do Rio de Janeiro. In: RIBEIRO, Luiz Cesar de Q (org.). O futuro das metrópoles: desigualdades e governabilidade, Rio de Janeiro, Revan, p.207-228 LAGO, Luciana Corrêa do. Desigualdades e Segregação na Metrópole: O Rio de Janeiro

(15)

LEAL, Jesús (1999) Fragmentação do espaço urbano e diversificação do mercado imobiliário: o caso de Madri. Seminário “O futuro das metrópoles: impactos da globalização”. Teresópolis, 17 a 21 de maio.

MAMMARELLA, Rosetta, KOCH, Mirian Regina, BARCELLOS, Tanya M. de. Tipologia socioespacial da Região Metropolitana de Porto Alegre: perfil da década de 80. Trabalho apresentado no Seminário Nacional: Metrópoles: entre a coesão e a fragmentação, a cooperação e o conflito. Rio de Janeiro, 5 a 9 de agosto de 2002 (versão preliminar), Mimeo.

Mammarella, Rosetta; Barcellos, Tanya; Koch, Mirian Regina (2000). Mudanças sócio-espaciais e estrutura social da RMPA nos anos 80. Indicadores Econômicos FEE, Porto Alegre, v.28, nº 3, p.94-112.

PREFEITURA MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE (1999). Anuário Estatístico de Porto Alegre.

PREFEITURA MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE (2001). Anuário Estatístico de Porto Alegre.

PRETECEILLE, Edmond (1994). “Cidades globais e segmentação social”, In: RIBEIRO, L.C.Q. e SANTOS JUNIOR, O. A Globalização, fragmentação e reforma urbana: o futuro das cidades brasileiras na crise. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.

RIBEIRO, Luiz Cesar de Q. (2000). Cidade desigual ou cidade partida? Tendências da metrópole do Rio de Janeiro. In: RIBEIRO, Luiz Cesar de Q (org.). O futuro das metrópoles: desigualdades e governabilidade, Rio de Janeiro, Revan, p.63-98.

RIBEIRO, Luiz Cesar de Queiroz. Cidade desigual ou cidade partida? Tendências da metrópole do Rio de Janeiro. In: RIBEIRO, Luiz Cesar de Queiroz (org) O Futuro das Metrópoles: Desigualdades e Governabilidade. RJ: Revan: FASE, 2000; p. 62-98. SASSEN, Saskia (1998). As cidades na economia mundial. São Paulo. Studio Nobel. SINDUSCON – RS, III Censo Imobiliário de Porto Alegre. Porto Alegre: SINDUSCON –

RS, julho de 2000.

SINDUSCON – RS, IV Censo Imobiliário de Porto Alegre. Porto Alegre: SINDUSCON – RS, agosto de 2001.

SINDUSCON – RS, V Censo Imobiliário de Porto Alegre. Porto Alegre: SINDUSCON – RS, julho de 2002.

SOUZA, Ângela Gordilho. Favelas, invasões e ocupações coletivas nas grandes cidades brasileiras – (Re) Qualificando a questão para Salvador-BA. In: BÓGUS, Lucia M., RIBEIRO, Luiz César de Q. (Orgs). Cadernos de Metrópole: desigualdade e governança. São Paulo, 2001, n. 5, p. 81 – 116.

TASCHNER, Suzana Pasternak, BÓGUS, Lucia M. M. A cidade dos anéis: São Paulo. In: RIBEIRO, Luiz Cesar de Queiroz (org) O Futuro das Metrópoles: Desigualdades e Governabilidade. RJ: Revan: FASE, 2000; p. 247 – 284.

Referências

Documentos relacionados

EBITDA Ajustado é um indicador mais adequado para análise do desempenho econômico operacional da Companhia, já que exclui as alterações contábeis sem efeito caixa que podem

9 é avaliar a resistência de união por meio de um teste de cisalhamento por extrusão (push-out) entre dentina intra-radicular e pinos pré-fabricados de aço inoxidável,

No caso particular da instituição militar, quando uma nação se encontra mergulhada numa situação de crise económica e social profunda, como é o caso de Portugal, em

Neste trabalho propomos otimizar no procedimento numérico descrito em (CIRILO; ROMEIRO; NATTI, 2007) o tempo de processamento numérico, com relação ao parâmetro de relaxação, para

a) a cidade pólo – Porto Alegre - tem um papel importante como atrator de pessoas que realizam viagens intermunicipais por motivo de trabalho ou estudo na RMPA,.. pois 55,5%

estratégias diferenciadas: de um lado, levantou-se dados sobre área vistoriada e habite- se nos cadastros das prefeituras dos municípios de maior porte e importância econômica

MÉTODO: Trata-se de um estudo de campo, exploratório e participante, realizado na Unidade Básica de Saúde Bela Vista, levantando junto a ESF as principais dificuldades em assistir

Em referência às políticas públicas que prestam atendimento especializado às pessoas em situação de rua, em Novo Hamburgo, São Leopoldo e Porto Alegre, os serviços mais acessados