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A penal das pessoas jurídicas por crimes ambientais

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Academic year: 2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO

DEPARTAMENTO DE DIREITO PÚBLICO PROGRAMA DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

GISELLE DA SILVA CARNEIRO

A RESPONSABILIDADE PENAL DAS PESSOAS JURÍDICAS POR CRIMES AMBIENTAIS

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GISELLE DA SILVA CARNEIRO

A RESPONSABILIDADE PENAL DAS PESSOAS JURÍDICAS POR CRIMES AMBIENTAIS

Monografia submetida à Coordenação do Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito. Área de concentração: Penal. Orientador: Prof. Raul Carneiro Nepomuceno.

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará

Biblioteca Setorial da Faculdade de Direito

C289r Carneiro, Giselle da Silva.

A responsabilidade penal das pessoas jurídicas por crimes ambientais / Giselle da Silva Carneiro. – 2015.

55 f. ; 30 cm.

Monografia (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Direito, Curso de Direito, Fortaleza, 2015.

Área de Concentração: Direito Penal.

Orientação: Prof. Me. Raul Carneiro Nepomuceno.

1. Responsabilidade penal - Brasil. 2. Crime contra o meio ambiente - Brasil. 3. Responsabilidade penal das pessoas jurídicas - Brasil. I. Nepomuceno, Raul Carneiro (orient.). II. Universidade Federal do Ceará – Graduação em Direito. III. Título.

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GISELLE DA SILVA CARNEIRO

A RESPONSABILIDADE PENAL DAS PESSOAS JURÍDICAS POR CRIMES AMBIENTAIS

Monografia submetida à Coordenação do Curso de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito. Área de concentração: Penal.

Aprovada em: 04/11/2015.

BANCA EXAMINADORA

________________________________________ Prof. Me. Raul Carneiro Nepomuceno (Orientador)

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_________________________________________ Prof. Me. Lino Edmar de Menezes

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_________________________________________ Mestranda Letícia Torquato de Menezes

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AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, Raimundo Vieira Carneiro e F. Francimar da Silva Carneiro, por todo apoio, amor e dedicação.

Ao meu namorado, F. Audísio Alves Júnior, pelo incentivo e compreensão desde a época anterior ao vestibular.

À minha amiga e colega de faculdade, Carolina Sofia F. G. Monteiro, pela ajuda na escolha do tema desta monografia.

Aos amigos e familiares que, de alguma forma, me ajudaram nesta caminhada.

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“as sanções a pessoas jurídicas desempenharão um grande papel no futuro. Afinal, as formas mais socialmente lesivas da criminalidade econômica e ambiental têm sua origem nas grandes e poderosas empresas”

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RESUMO

O presente estudo analisa a possibilidade de responsabilizar penalmente as pessoas jurídicas no âmbito dos crimes ambientais. Inicia-se fazendo um apanhado sobre a importância da proteção aos bens ambientais, por serem fundamentais à manutenção da vida. Em seguida, discorre-se sobre o instituto da pessoa jurídica a fim de melhor compreender o papel de destaque que estes entes desempenham na sociedade moderna, inclusive no cometimento de infrações ambientais, surgindo a necessidade de punir também o risco à integridade de bens socialmente relevantes (não apenas os danos). Finalmente, chega-se à pedra angular deste estudo, analisando a previsão constitucional e infraconstitucional do tema (discorrendo sobre as correntes de interpretação desses dispositivos), os institutos penais e a necessidade de adaptá-los à vontade do constituinte e a evolução do entendimento dos tribunais superiores sobre o assunto. Conclui-se pela vontade do constituinte brasileiro em responsabilizar penalmente as pessoas jurídicas pelo cometimento de crimes ambientais, no entanto a regulamentação da matéria ainda é deficitária, sendo imprescindível uma adaptação dos institutos penais à realidade da pessoa coletiva, bem como a criação de dispositivos processuais que possibilitem sua aplicação prática.

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ABSTRACT

This study examines the possibility of criminally liable legal entities under the environmental crimes. Starts doing an overview of the importance of the protection of environmental assets, as they are fundamental to sustaining life. Then it talks about the institution of legal entity in order to better understand the important role that these beings play in modern society, including in the commission of environmental offenses, resulting in the need to also punish the risk to the integrity of socially relevant goods (not just damage). Finally, one reaches the cornerstone of this study, analyzing constitutional and infra-weather theme (discussing current interpretation of these devices), penal institutions and the need to adapt them to the will of the constituent and the evolution of the understanding of higher courts on the matter. The results confirmed the will of the Brazilian constituent in criminally responsible legal entities for committing environmental crimes, however the regulation of the matter is still lacking, is indispensable adaptation of penal institutions to the reality of the legal person as well as the creation of procedural devices to enable its practical application.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CF Constituição Federal CC Código Civil

EDcl Embargos de Declaração HC Habeas Corpus

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 13

2 MEIO AMBIENTE ... 14

2.1 Conceito ... 14

2.2 Proteção jurídica ... 15

2.3 Conscientização em prol do desenvolvimento sustentável e solidariedade na proteção do meio ambiente ... 19

3 PESSOA JURÍDICA ... 22

3.1 Conceito ... 22

3.2 Natureza jurídica e capacidade de ação ... 23

3.3 Teoria da personalidade jurídica ... 27

3.4 Capacidade e representação ... 28

3.5 Classificação ... 29

3.6 As pessoas jurídicas na sociedade moderna ... 30

4 A RESPONSABILIDADE PENAL DAS PESSOAS JURÍDICAS POR CRIMES AMBIENTAIS ... 33

4.1 Histórico ... 33

4.2 A (in)compatibilidade da responsabilidade penal da pessoa jurídica com o Direito Penal brasileiro ... 36

4.2.1 Capacidade de ação ... 36

4.2.2 Culpabilidade ... 37

4.2.3 Princípio da legalidade ... 40

4.2.4 Princípio da pessoalidade da pena ou da intranscendência da sanção penal . 41 4.2.5 Princípio da intervenção mínima ... 42

4.2.6 Funções da pena ... 43

4.2.7 Efeito simbólico ... 44

4.2.8 Criminalidade moderna e direito administrativo sancionador ... 45

4.3 Correntes de interpretação do dispositivo constitucional ... 46

4.4 Evolução jurisprudencial dos tribunais superiores ... 49

4.4.1 STF ... 49

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5 CONCLUSÃO ... 53

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1 INTRODUÇÃO

O tema escolhido é controvertido, tendo dividido a opinião dos doutrinadores, e relevante para a sociedade, tendo em vista a importância da preservação ambiental no atual contexto mundial em que as pessoas sofrem cada vez mais com as mudanças climáticas e a escassez dos recursos naturais. Também possui relevância acadêmica, posto que a admissibilidade da responsabilidade penal das pessoas jurídicas deve gerar mudanças na seara penal.

O objetivo da vertente pesquisa é analisar a (im)possibilidade de responsabilizar penalmente as pessoas jurídicas quando da prática de crimes ambientais, frente à Constituição Federal de 1988, à lei 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais) e aos princípios que regem o ordenamento jurídico brasileiro. O aporte teórico que embasou o estudo vai desde obras clássicas, de referência obrigatória, até perquirição de teses, dissertações e revistas especializadas na temática em foco. Utiliza-se, ainda, o entendimento atual dos tribunais superiores.

O tema possui incursões na seara do Direito Constitucional, do Direito Civil, do Direito Penal e do Direito Ambiental. Por isso, serão analisados alguns conceitos e institutos, destas áreas, necessários para a compreensão da problemática apontada.

No primeiro capítulo, conceitua-se meio ambiente e discorre-se sobre a proteção jurídica dada ao bem ambiental, retratando o contexto histórico e a evolução da conscientização em prol do desenvolvimento sustentável.

Em seguida, apresenta-se o conceito e a evolução do instituto da Pessoa Jurídica, analisando a sua natureza jurídica (aspecto fundamental para saber se os entes coletivos possuem capacidade de ação e, por consequência, se podem ser responsabilizados penalmente), sua representação e classificação. Conclui-se o segundo capítulo com um tópico sobre o papel das pessoas jurídicas na sociedade moderna.

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2 MEIO AMBIENTE

O presente capítulo faz um apanhado sobre a importância da proteção aos bens ambientais, por serem fundamentais à manutenção da vida, conceituando meio ambiente e discorrendo sobre a proteção jurídica dada ao bem ambiental, retratando o contexto histórico e a evolução da conscientização em prol do desenvolvimento sustentável.

2.1 Conceito

A expressão “meio ambiente” é redundante, pois a palavra ambiente significa o que cerca ou envolve os seres vivos ou as coisas.1 “Costuma-se criticar tal termo, porque pleonástico, redundante, em razão de ambiente já trazer em seu conteúdo a ideia de “âmbito que circunda”, sendo desnecessária a complementação pela palavra meio”. 2 Entretanto, no Brasil, essa expressão consagrou-se.

José Afonso da Silva tenta explicar a utilização do termo, afirmando que expressões compostas reforçam o sentido, sendo uma prática que deriva do fato do termo reforçado ter sofrido enfraquecimento no sentido a destacar ou porque sua expressividade é mais ampla ou mais difusa. A legislação brasileira, inclusive as normas constitucionais, utilizaria a expressão meio ambiente, pois o legislador teria a necessidade de empregar termos com a maior precisão significativa possível. Arremata dizendo que:

O meio ambiente integra-se, realmente, de um conjunto de elementos naturais e culturais, cuja interação constitui e condiciona o meio em que se vive. Daí por que a expressão “meio ambiente” se manifesta mais rica de sentido (como conexão de valores) do que a simples palavra “ambiente”. Esta exprime o conjunto de elementos; aquela expressa o resultado da interação desses elementos. O conceito de meio ambiente há de ser, pois, globalizante, abrangente de toda a Natureza original e artificial, bem como os bens culturais correlatos, compreendendo, portanto, o solo, a água, o ar, a flora, as belezas naturais, o patrimônio histórico, artístico, turístico, paisagístico e arqueológico.3

Segundo Édis Milaré4 o conceito jurídico de meio ambiente tem duas perspectivas principais: a visão estrita, na qual considera apenas o patrimônio natural e suas relações com e entre os seres vivos; e a concepção ampla, que abrange o meio ambiente artificial ou humano, além do meio ambiente natural.

O art. 3º, inciso I, da Lei n. 6.938/81 (Lei de Política Nacional do Meio Ambiente) conceitua meio ambiente como “o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem

1 FREITAS, Vladimir Passos de; FREITAS, Gilberto Passos de. Crimes Contra a Natureza. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 17.

2 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 60. 3 SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional. 9. ed., rev. e atual. São Paulo, SP: Malheiros, 2011, p. 19-20.

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15 física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”, tutelando tanto o meio ambiente natural (§1º, incisos I, III e VII, do art. 225), quanto o artificial (arts. 225, 182, 21, inciso XX, e 5º, inciso XXIII, todos da CF/88 e o Estatuto da Cidade – Lei n. 10.257/2001), o cultural (arts. 216 e 225, ambos da CF) e o do trabalho (arts. 7º, inciso XXIII, 200, inciso VIII e 225, caput). “Conclui-se que a definição de meio ambiente é ampla, devendo-se observar que o legislador optou por trazer um conceito jurídico indeterminado, a fim de criar um espaço positivo de incidência da norma”. 5

Utilizaremos, neste trabalho, o termo “meio ambiente”, tendo em vista a escolha da referida expressão pelo legislador, bem como o reforço de sentido que apresenta.

2.2 Proteção Jurídica

O meio ambiente é imprescindível para a sobrevivência do ser humano, sendo atualmente o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado considerado um bem de terceira geração, por ser de uso comum do povo (não é público nem privado), indispensável à sadia qualidade de vida, estando agrupado entre os direitos difusos (transindividualidade dos interesses, indivisibilidade do objeto, titulares indeterminados e interligados por circunstâncias de fato). A escassez dos recursos naturais e a evidente degradação da natureza deram notoriedade às questões ambientais e, conseqüentemente, despertaram a busca por soluções.

José Afonso da Silva alega que “o problema da tutela jurídica do meio ambiente manifesta-se a partir do momento em que sua degradação passa a ameaçar não só o bem-estar, mas a qualidade de vida humana, se não a própria sobrevivência do ser humano.” 6 Acrescenta dizendo que a intensidade crescente dos desastres ecológicos despertou a consciência ambientalista, surgindo a necessidade da proteção jurídica do meio ambiente e, por conseqüência, a legislação ambiental.7

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em sua Res. 217-A (III), de 1948, não faz referência expressa ao direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental: “Toda pessoa tem direito a um nível de vida próprio a garantir sua saúde, seu bem-estar e o de sua família”.

Esse novo direito humano, posteriormente reconhecido como direito fundamental no âmbito do direito brasileiro, foi reconhecido pela Declaração do Meio Ambiente, adotada pela Conferência das Nações Unidas, em Estocolmo, em junho de 1972. O Princípio 1 da Declaração de Estocolmo esclarece que “o homem tem um direito fundamental à liberdade, à igualdade e a

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16 condições de vida satisfatórias, num ambiente cuja qualidade lhe permita viver com dignidade e bem-estar. Ele tem o dever solene de proteger e melhorar o meio ambiente para as gerações presentes e futuras”. A mesma declaração firmou outros vinte e cinco princípios fundamentais de proteção ambiental, que influenciaram na elaboração do capítulo referente ao meio ambiente da Constituição Brasileira de 1988. 8

A constitucionalização do ambiente, no mundo, se intensificou a partir de 1970. As Constituições Brasileiras anteriores à de 1988 não se referiam especificamente à proteção do meio ambiente natural e as mais recentes, desde 1946, apenas traziam orientações protecionistas no que se refere à saúde. A Constituição Brasileira de 1988 foi a primeira a tratar de maneira direta da questão ambiental.9 Esta seguiu a tendência mundial ao erigir o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental. A proteção ambiental visa tutelar a qualidade do meio ambiente em função de um valor maior que é a qualidade de vida.

O art. 5º da CF/88 traz um rol expresso de direitos e garantias fundamentais que, apesar da proteção ao meio ambiente não está expressamente no referido artigo, permite o seu reconhecimento como tal devido à previsão do § 2º do mesmo dispositivo, que assim dispõe:

§ 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

Na lição de Solange Teles da Silva, “não há possibilidade da concretização dos demais direitos fundamentais sem o direito ao meio ambiente, que se traduz em última análise como o próprio direito à vida. [...] O direito ao meio ambiente configura-se, portanto, como a matriz de todos os demais

direitos fundamentais”. 10

Há vários dispositivos ao longo do texto constitucional que apresentam valores ambientais, no entanto a Constituição dedicou um capítulo, composto apenas pelo art. 225, ao meio ambiente, localizado na parte da “Ordem Social”, no capítulo VI do Título VIII:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações. (grifo nosso)

§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: (grifo nosso) I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;

II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;

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17 III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;

IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;

V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;

VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente;

VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.

§ 2º Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.

§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. (grifo nosso)

§ 4º A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.

§ 5º São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais.

§ 6º As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização definida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas.

A CF/88 deu tratamento diferenciado aos bens ambientais, conforme leciona Celso Antônio Pacheco Fiorillo:

A nossa Carta Magna estruturou uma composição para a tutela dos valores ambientais, reconhecendo-lhes características próprias, desvinculadas do instituto da posse e da propriedade, consagrando uma nova concepção ligada a direitos que muitas vezes transcendem a tradicional ideia dos direitos ortodoxos: os chamados direitos difusos.11 Vladimir Passos de Freitas e Gilberto Passos de Freitas, por sua vez, analisam que:

A Constituição Federal de 1988 trouxe significativo avanço à proteção do meio ambiente. A matéria, anteriormente, era objeto de normas infraconstitucionais [...] o art. 5º, inciso LXXIII, elevou a proteção ambiental à categoria de direito fundamental de todo cidadão. E mais. No § 1º do art. 225, a Lei Maior, objetivamente, traçou as regras a serem obedecidas pelo Poder Público para assegurar a efetividade de tais direitos. No § 3º deixou expresso que os infratores das normas de proteção ao meio ambiente, sejam pessoas físicas ou jurídicas, estarão sujeitos a sanções penais, civis e administrativas. No inciso IV do § 1º elevou o estudo prévio de impacto ambiental a exigência constitucional. No inciso VI do § 1º revelou a preocupação com o aspecto preventivo, quiçá o mais importante, determinando a promoção da educação ambiental. 12

Luiz Regis Prado evidencia que com o novo texto ficou patenteado o reconhecimento do direito-dever ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, a obrigação dos poderes públicos e da

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18 coletividade de defendê-lo e de preservá-lo e a previsão de sanções para as condutas ou atividades a ele danosas. A preservação do ambiente teria se tornado a base em que se assenta a política econômica e social. 13

Para Celso Antônio Pacheco Fiorillo:

O art. 225 estabelece quatro concepções fundamentais no âmbito do direito ambiental: a) de que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado; b) de que o meio ambiente ecologicamente equilibrado diz respeito à existência de um bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, criando em nosso ordenamento o bem ambiental; c) de que a Carta Maior determina tanto ao Poder Público como à coletividade o dever de defender o bem ambiental, assim como o dever de preservá-lo; d) de que a defesa e a preservação do bem ambiental estão vinculadas não só às presentes como também às futuras gerações.14

Para tentar assegurar esse direito, o Constituinte adotou algumas medidas: previu a ação popular (art. 5º, inciso LXXIII), que permite uma participação mais efetiva dos cidadãos; reservou ao Ministério Público papel de destaque na promoção do inquérito civil e da ação civil pública nas questões ambientais (art. 129, inciso II); cominou sanções penais aos sujeitos que causem danos ambientais (§3º do art. 225), deixando clara a necessidade de proteção penal do ambiente; e etc.

Vladimir Passos de Freitas e Gilberto Passos de Freitas15 atentam para o fato do Direito Penal ser um importante instrumento na proteção do meio ambiente como bem jurídico socialmente relevante, posto que, na maioria das vezes, as sanções administrativas e civis não são eficazes na repreensão das agressões contra este. Explica que “o estigma de um processo penal gera efeitos que as demais formas de repressão não alcançam”.16 Conclui ser a sanção penal necessária em determinadas situações, tanto em função da relevância do bem protegido, quanto da sua maior eficácia dissuasória.

Celso Antonio Pacheco Fiorillo acrescenta que:

[...] a finalidade maior da Constituição Federal é trazer efetividade e utilidade para o direito criminal ambiental, bem como para o direito penal ambiental, estabelecendo sanções penais concretas para aqueles que, na ordem jurídica do capitalismo, lesam ou mesmo ameaçam a vida em todas as suas formas.17

13 PRADO, Luiz Regis. A Tutela Constitucional do Ambiente no Brasil. Doutrinas Essenciais de Direito Ambiental, Revista dos Tribunais, v. 4, 2011, p. 113-123. Disponível em: <www.professorregisprado.com/artigos>. Acesso em: 06 jul. 2015.

14 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 51-52.

15 FREITAS, Vladimir Passos de; FREITAS, Gilberto Passos de. Crimes Contra a Natureza. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 31-32.

16 FREITAS, Vladimir Passos de; FREITAS, Gilberto Passos de. Crimes Contra a Natureza. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 31.

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19 Segundo Luiz Regis Prado, a origem imediata do art. 225 da CF/88 se encontra no § 3º do art. 45 da Constituição espanhola, que teria sido a primeira a fazer constar explicitamente em seu texto a possibilidade do emprego de sanções penais. 18

2.3 Conscientização em prol do desenvolvimento sustentável e solidariedade na proteção do meio ambiente

A Conferência de Estocolmo, de 1972, teve o objetivo de conscientizar a população mundial sobre a importância da conservação do ambiente e do desenvolvimento sustentável, tornando-se uma das principais preocupações de ordem internacional. Passou-se a buscar um desenvolvimento econômico qualitativo, voltado a melhorar a qualidade de vida e o bem-estar social.19 “Põe-se, pois, a questão de compatibilizar crescimento econômico e qualidade de vida, ou seja: orientar o desenvolvimento de tal forma que não continue a destruir os elementos substanciais da Natureza e da Cultura [...]”. 20

O Princípio 13 da Declaração de Estocolmo afirma que:

A fim de lograr um ordenamento mais racional dos recursos e, assim, melhorar as condições ambientais, os Estados deveriam adotar um enfoque integrado e coordenado da planificação de seu desenvolvimento, de modo a que fique assegurada a compatibilidade do desenvolvimento, com a necessidade de proteger e melhorar o meio ambiente humano, em benefício de sua população.

A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento ocorrida no Rio de Janeiro, em 1992, reafirmou os princípios da Declaração de Estocolmo e acrescentou outros princípios sobre meio ambiente e desenvolvimento sustentável. O Princípio 3 afirma que o “direito ao desenvolvimento deve ser exercido de modo a permitir que sejam atendidas eqüitativamente as necessidades de desenvolvimento e de meio ambiente das gerações presentes e futuras". Enfim, a política do desenvolvimento sustentável tenta conciliar dois direitos fundamentais do Homem, quais sejam, o direito ao desenvolvimento e o direito a uma vida saudável. 21

Para Germana Parente Neiva Belchior e João Luis Nogueira Matias22, o desenvolvimento sustentável é composto por três elementos: desenvolvimento econômico, equidade social e equilíbrio ambiental. Acrescentam, ainda, que:

18 PRADO, Luiz Regis. A Tutela Constitucional do Ambiente no Brasil. Doutrinas Essenciais de Direito Ambiental, Revista dos Tribunais, v. 4, 2011, p. 4-5. Disponível em:< www.professorregisprado.com/artigos>. Acesso em 06 jul. 2015.

19 PRADO, Luiz Regis. Direito Penal do Ambiente. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 66.

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20 [...] o princípio da solidariedade está obrigatoriamente consubstanciado no conceito de desenvolvimento sustentável. Isto se deve pela titularidade difusa do meio ambiente, pois esta ultrapassa o plano dos interesses individuais das pessoas per si (transindividual) ou grupo, caracterizando-se por sua indivisibilidade. Seu objeto diz respeito a todos os membros da sociedade, ao mesmo tempo em que não é destinado a alguém exclusivamente por ser indivisível e possuir titulares indeterminados, cuja relação entre estes tem origem em uma situação de fato. 23

No direito brasileiro, o princípio em comento pode ser evidenciado no art. 4º, I, da Lei 6.938/81 (Política Nacional do Meio Ambiente) ao estabelecer como um dos seus objetivos a “compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico”.

A análise do caput do art. 170 combinado com o inciso VI do mesmo artigo, ambos da CF/88, deixa evidente a intenção do legislador em conciliar desenvolvimento econômico com equilíbrio ambiental, buscando-se o desenvolvimento sustentável.

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

[...]

VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; Lívia Gaigher Bósio Campello24, no artigo intitulado “Solidariedade e Cooperação Internacional na Proteção do Meio Ambiente”, classifica o direito ao meio ambiente e outros direitos difusos (direitos de paz, direito ao desenvolvimento, luta contra o terrorismo e desarme nuclear) como Direito Humano de terceira fase, geração ou dimensão. Esses direitos teriam como valor de referência a solidariedade que, segundo ela, aponta para a racionalização da utilização dos recursos naturais e para um desenvolvimento sustentável. Afirma que a solidariedade, na qualidade de princípio fundamental do Direito Internacional, foi anunciada por Emer de Vattel, em meados do século XVIII, e que este autor defende que os Estados têm o dever de assistência mútua e demais obrigações que objetivam a segurança e o bem-estar comum.

A solidariedade se aplica ao Direito Ambiental se consubstanciando em direitos-obrigações para as gerações presentes e futuras, posto que um eventual dano ambiental afeta todo o planeta, incluindo a vida humana, e não apenas as pessoas presentes no território em que ocorreu a degradação diretamente (não se circunscreve em limites territoriais).

em Direito da Universidade Federal do Ceará e o Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina, financiado pelo CNPQ.

23 BELCHIOR, Germana Parente Neiva; MATIAS, João Luis Nogueira. Fundamentos Teóricos do Estado de Direito Ambiental. p. 2294.

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21 A responsabilidade solidária seria um instrumento em favor da preservação ambiental, pois quanto maior o número de responsabilizados por trazer riscos ambientais, mais provável prevenir ou reparar eventuais danos. O credor de uma obrigação ambiental é a coletividade, enquanto os sujeitos passivos podem ser vários, pessoas físicas ou jurídicas que causaram ou se beneficiaram, direta ou indiretamente, do dano ambiental. “A obrigação é solidária (passiva) porque cada um dos poluidores pode ser compelido a sanar toda a poluição produzida ou a pagar a totalidade dos prejuízos, ainda que não tenha sido o único causador dos danos ambientais”. 25

A responsabilidade solidária constitui-se em importante mecanismo para as políticas públicas em matéria ambiental, pois visam a proteção do meio ambiente e a reparação de danos ambientais, além de se adaptar a um novo modelo de desenvolvimento baseado na sustentabilidade. Nessa linha de pensamento, Stival, Castor e Fernandes afirmam:

A legislação ambiental imputa aos agentes e atividades que tenham contribuído, direta ou indiretamente, à produção do dano ambiental, a responsabilidade solidária pela reparação do mesmo. Cada um responde pela totalidade do dano, independentemente de ter agido ou não com culpa ou do grau desta. Enfim, deve-se pensar na mudança de paradigma, do atual desenvolvimentista para outro da sustentabilidade. O modelo atual de desenvolvimento, impulsionado pelo capitalismo, não será capaz de preservar a qualidade de vida das futuras gerações.26

Portanto, a busca pelo desenvolvimento sustentável e pela solidariedade entre os povos é fundamental para tentar reverter a atual situação de degradação ambiental. O primeiro preza pelo alinhamento entre o desenvolvimento econômico e a preservação dos recursos naturais, enquanto o segundo prega uma política de cooperação entre os povos (financeira, tecnológica, etc.), no entanto ambos convergem para assegurar a qualidade de vida no planeta e, até mesmo, a sua preservação.

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3 PESSOA JURÍDICA

O presente capítulo discorre sobre o instituto da pessoa jurídica a fim de melhor compreender o papel de destaque que estes entes desempenham na sociedade moderna, inclusive no cometimento de infrações ambientais. Apresenta o conceito e a evolução do instituto da Pessoa Jurídica, analisando a sua natureza jurídica (aspecto fundamental para saber se os entes coletivos possuem capacidade de ação e, por consequência, se podem ser responsabilizados penalmente), sua representação e classificação. Conclui a explanação com um tópico sobre o papel das pessoas jurídicas na sociedade moderna.

3.1 Conceito

Carlos Roberto Gonçalves afirma que essas unidades coletivas foram criadas através da evolução histórica ou pela vontade humana, posto que o homem seria um ser eminentemente social. Acrescenta que o direito passou a discipliná-las a fim de que participassem da vida jurídica como sujeito de direitos, atribuindo-lhes personalidade própria. 27 Nesse sentido, afirma:

A pessoa jurídica é, portanto, proveniente desse fenômeno histórico e social. Consiste num conjunto de pessoas ou bens, dotado de personalidade jurídica própria e constituído na forma da lei, para a consecução de fins comuns. Pode-se afirmar, pois, que pessoas jurídicas são entidades a que a lei confere personalidade, capacitando-as a serem sujeitos de direitos e obrigações. A sua principal característica é a de que atuam na vida jurídica com personalidade diversa da dos indivíduos que as compõem (CC, art. 50, a contrario sensu, e art. 1.024). 28

Sílvio Rodrigues, por sua vez, define as pessoas jurídicas como grupos humanos, com personalidade distinta dos seus componentes, aos quais a lei atribui capacidade de ter direitos e contrair obrigações e que têm por fim a realização de um fim comum. São compostas por um conjunto de pessoas ou por uma destinação patrimonial. “Pessoas jurídicas, portanto, são entidades a que a lei empresta personalidade, isto é, são seres que atuam na vida jurídica, com personalidade diversa da dos indivíduos que os compõem, capazes de serem sujeitos de direitos e obrigações na ordem civil”. 29

Pessoa jurídica é a denominação utilizada pelo nosso Código Civil, porém não é a única existente. Caio Mário discorre sobre as várias denominações:

Pessoa jurídica é o seu nome no Código Civil alemão (§§ 21 a 89 do BGB). O Código Civil suíço (art. 53) as denomina pessoas morais, designação que é frequentemente usada pela doutrina francesa, muito embora ali se encontre igualmente referência a pessoas jurídicas. Adotou o Código italiano (arts. 11 e ss.), como o Código espanhol (art. 35), o apelido pessoas jurídicas. A denominação, sem ser perfeita, dá a idéia de como vivem e operam estas entidades, acentuando o ambiente jurídico que possibilita sua existência, enquanto

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23 aquela outra denominação (pessoa moral) tem menor força de expressão, por não encontrar sua razão de ordem no conteúdo de moralidade que as anima. Pessoa coletiva é outro nome usado, inaceitável, entretanto, por se impressionar apenas com a sua aparência externa, incidente no fato de frequentemente se originarem de um grupo ou uma coletividade de pessoas, mas inaceitável por excluir de sua abrangência todas as personalidades constituídas de maneira diversa de uma coletividade de indivíduos, o que se dá com as fundações [...]. 30 A expressão pessoa jurídica, segundo Orlando Gomes, é ambígua, posto que todas as pessoas são jurídicas, propriamente falando, no sentido de que a personalidade é conceito jurídico e seus atributos se regulam pelo Direito. Apesar da imprecisão, o termo se incorporou ao vocabulário jurídico. 31

Para Caio Mário o termo pessoa jurídica é o menos imperfeito e o mais expressivo, já que é o mais frequentemente usado pela doutrina. 32

Neste trabalho utilizaremos o termo pessoa jurídica, por ser a expressão empregada pelo legislador e a mais difundida entre os doutrinadores, bem como outros termos com mesmo significado, tendo em vista as inúmeras remissões a este instituto.

3.2 Natureza jurídica e capacidade de ação

Diante do reconhecimento da pessoa jurídica pelo direito brasileiro, originaram-se as teorias negativistas e as teorias afirmativistas sobre a natureza jurídica desses entes. Os seguidores das primeiras não reconhecem que a pessoa jurídica tem personalidade própria, ao revés dos seguidores da segunda, que procuram explicar como um grupo de pessoas passa a constituir uma unidade orgânica com personalidade própria, sendo esta última posição mais aceita nos dias atuais.

Segundo Washington de Barros Monteiro e Ana Cristina de Barros Monteiro França Pinto33, existem quatro teorias sobre o assunto: a teoria da ficção teria surgido com o direito canônico, sendo sustentada por Savigny. Parte do princípio de que só o homem é capaz de ser sujeito de direitos. As pessoas jurídicas seriam fictícias, incapazes de exprimir vontade e que só por meio de abstrações se obteria personalidade. Essa teoria não poderia ser aceita, posto que não explica a existência do Estado como pessoa jurídica; a teoria da equiparação também nega qualquer personalidade jurídica como substância, admitindo, apenas, que determinados bens ou patrimônios tenham tratamento jurídico equiparado ao das pessoas naturais. As pessoas jurídicas seriam patrimônios personificados pelo direito para um fim específico; a teoria da realidade objetiva ou orgânica se opõe à da ficção e seu principal representante foi Otto Gierke. Defende que as pessoas

30 MÁRIO, Caio. Instituições de Direito Civil. 25. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012, v. 1, p. 249. 31 GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. 19. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 168. 32 MÁRIO, Caio. Instituições de Direito Civil. 25. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012, v. 1, p. 250.

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24 jurídicas têm vontade própria e que sua finalidade seria realizar o fim social; e a teoria da realidade técnica ou jurídica, que estaria entre a teoria da ficção e a teoria da realidade. A pessoa jurídica teria a realidade das instituições jurídicas e não a realidade física inerente às pessoas naturais.

Caio Mário, por sua vez, reconhece que existe uma enorme variedade de teorias sobre o assunto, que, segundo ele, no entanto, podem ser agrupadas em quatro categorias: as teorias da ficção, a da propriedade coletiva, a da realidade e a institucional34: as teorias da ficção negariam a existência real da pessoa jurídica, que seria um ente fictício. A mais típica dentre as teorias da ficção seria a que considera a pessoa jurídica mera criação legal, consistindo numa ficção da lei ou da doutrina. O autor critica essa teoria por não se adequar a mais importante dessas pessoas que é o Estado. Alega ser tal teoria contraditória, pois “a lei cria a pessoa jurídica como ente fictício; mas a lei emana do Estado, que é uma ficção; e, se à criação da pessoa jurídica deve preceder a vontade da lei, fica sem explicação a personalidade do Estado, que sendo fictício dependeria da preexistência de algo que a reconhecesse”.35 A doutrina criada por Ihering também estaria entre as teorias da ficção. Esta partiria do pressuposto de que o homem é sempre o sujeito de direitos, residindo nele a personalidade. Esse pensamento seria falho, pois não explica como se realizaria o exercício do direito da entidade contra o seu membro componente em caso de conflito. Dessa situação surgiria um contrassenso, qual seja, “a pessoa natural como efetivo sujeito de direito, de que a pessoa jurídica seria sujeito aparente, encontrar-se-ia numa condição de estar exercendo direitos contra si mesma.” 36; a teoria da propriedade coletiva, adotada por Planiol e por Berthélémy, parte da premissa de que “ao lado da propriedade individual existe a propriedade coletiva, e, sob a aparência de uma pessoa civil, o que existe é a massa de bens possuída por um grupo mais ou menos numeroso de pessoas, subtraída ao regime da propriedade individual.” 37 A referida teoria não seria satisfatória, posto que não abrange todos os tipos de entidade, já que, segundo esta, não poderia haver pessoa jurídica sem cogitação patrimonial, bem como não responde aos questionamento que giram em torno da natureza jurídica dos entes morais, da forma de sua atuação, de sua responsabilidade civil, de sua vontade, etc.; a teoria da instituição, criada por Hauriou, em que os entes morais seriam como organizações sociais que seriam personificadas por se destinarem a uma finalidade socialmente útil. A referida teoria não explica a concessão de personalidade jurídica às sociedades que não possuem este fim; e as teorias realistas que têm em comum a ideia da realidade

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25 do ente coletivo, sendo seres dotados de existência própria ou autônoma em relação às pessoas naturais que as criaram. A ordem legal lhes atribui personalidade jurídica, permitindo que estas atuem no campo jurídico, reconhecendo-lhes a existência e facultando-lhes adquirir direitos e obrigações. Nas palavras de Caio Mário, “a pessoa jurídica tem em si, como tal a sua própria personalidade, exprime a sua própria vontade, é titular de seus próprios direitos, e, portanto, é uma realidade no mundo jurídico”. 38

Carlos Roberto Gonçalves39 concentra sua explanação sobre a natureza jurídica desses entes nas teorias afirmativistas, agrupando-as em dois blocos: o das teorias da ficção e o das teorias da realidade. Para as primeiras a pessoa jurídica seria uma mera ficção, sendo apenas um conceito cujo fim é justificar a atribuição de direitos a um grupo de pessoas físicas. A teoria da ficção legal de Savigny é a mais conhecida dentre as primeiras, que, nas palavras do referido autor, acredita que “a pessoa jurídica constitui uma criação artificial da lei, um ente fictício, pois somente a pessoa natural pode ser sujeito da relação jurídica e titular de direitos subjetivos”.40 As teorias da ficção não seriam mais aceitas na atualidade e a principal crítica que se faz em relação a elas é a de que não explicam a existência do Estado como pessoa jurídica e dizer “que o Estado é uma ficção legal ou doutrinária é o mesmo que dizer que o direito, que dele emana, também o é”.41 Para os seguidores das teorias da realidade, as pessoas jurídicas são realidades vivas com existência própria em relação às pessoas naturais, sendo apenas o modo de apreciar essa realidade a diferença entre elas. O autor destaca três concepções: a teoria da realidade objetiva ou orgânica (Gierke e Zitelmann), para a qual a pessoa jurídica é uma realidade sociológica, oriunda da imposição das forças sociais, e para a qual a vontade (pública ou privada) seria capaz de dar vida a um organismo, tornando-o sujeito de direitos. Critica-se essa concepção por admitir que o Estado faz uma mera declaração de realidades já existentes, não esclarece como grupos sociais sem vida própria e personalidade podem adquiri-las; a teoria da realidade jurídica ou institucionalista (Hauriou), para a qual as pessoas jurídicas seriam grupos sociais que teriam por fim executar um serviço ou ofício e, por isso, personalizadas. Aproxima-se da teoria da realidade objetiva em relação ao aspecto sociológico, no entanto, parte da análise das relações sociais, não da vontade humana. É falha, pois não justifica as sociedades sem finalidade de prestar um serviço ou ofício, nem das provenientes fundamentalmente da vontade do instituidor, como ocorre com as fundações; e a teoria da realidade técnica (Saleilles e Colin e

38 MÁRIO, Caio. Instituições de Direito Civil. 25. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012, v.1, p. 257.

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26 Capitant), para a qual a personificação seria de ordem técnica, atribuída a grupos em que a lei reconhece vontade e objetivos autônomos. Essa atribuição de personalidade teria por fim possibilitar a participação das pessoas jurídicas nas mesmas condições das pessoas físicas e seria concedida em determinadas situações que atendessem a requisitos fixados. Nas palavras do referido autor:

Malgrado a crítica que se lhe faz, de ser positivista e, assim desvinculada de pressupostos materiais, é a que melhor explica o fenômeno pelo qual um grupo de pessoas, com objetivos comuns, pode ter personalidade própria, que não se confunde com a de cada um de seus membros e, portanto, a que melhor segurança oferece. É a teoria adotada pelo direito brasileiro, como se depreende do art. 45 do Código Civil [...], bem como dos arts. 51, 54, VI, 61, 69 e 1.033 do mesmo diploma.42

Em síntese, para as teorias realistas a pessoa moral é ente real (vivo e ativo), independente dos indivíduos que a compõem. Dotada de vontade própria, com capacidade de agir e de praticar ilícitos penais. Já as teorias da Ficção, como a criada por Savigny, defendem que as pessoas jurídicas têm existência fictícia, irreal ou de pura abstração, sendo incapazes de delinqüir, pois carecem de vontade e de ação.43 Em virtude de uma ficção, decisões de representantes são consideradas como suas. Não há vontade propriamente dita. Os delitos que podem ser imputados à pessoa jurídica são praticados por seus membros ou diretores, ou seja, por pessoas naturais.

Para os seus defensores, as pessoas jurídicas não podem ser responsabilizadas penalmente, posto que não podem delinqüir. Logo, essa parte da doutrina dá uma interpretação diferenciada do art. 225 da CF, na qual a responsabilidade penal cabe, apenas, às pessoas individuais, pois possuem o elemento “vontade”, devendo incidir sobre elas a análise da culpabilidade44. Para Juarez Cirino dos Santos, o termo “conduta”, que depende do agir humano, indica que somente o ser individual poderia ser responsabilizado criminalmente. Já as pessoas jurídicas, por não apresentarem conduta, mas mera “atividade”, responderiam na esfera cível e administrativa. Logo, a criminalização da pessoa jurídica pela Lei 9.605/98 seria inconstitucional. 45

Washington de Barros Monteiro46 também se filia a corrente que afirma que as pessoas jurídicas não podem cometer crimes, baseado nos brocardos societas delinquere non potest e universitas non delinquunt. Porém, afirma que já se reconhece a prática nos crimes contra o consumidor e o meio ambiente.

42 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 12.ed. São Paulo: Saraiva, 2014, v.1, p. 220. 43 PRADO, Luiz Regis. Direito Penal do Ambiente. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.

44 PETRY, Diogo. A Sociedade de Risco Mundial e a Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica: o papel das empresas e suas marcas como elementos indutores à conscientização ambiental. 2010. 153 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade de Caxias do Sul, Caxias do Sul, 2010.

45 SANTOS, Juarez Cirino dos. As idéias erradas do professor Lecey sobre a criminalização de pessoas jurídicas. Discursos Sediciosos. Crime, Direito e Sociedade, Rio de Janeiro: Revan, v.9, n. 14, p. 257-268, 2004, p. 258.

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27 Sílvio Rodrigues defende que o direito brasileiro atribui realidade objetiva a esses entes, pois a lei assim o teria dito, pois o art. 45 do Código Civil determina que comece a existência legal das pessoas jurídicas pela inscrição de seus contratos no seu registro peculiar. Vale ressaltar que em sua classificação “a idéia básica dessa teoria é que as pessoas jurídicas, longe de serem mera ficção, são uma realidade sociológica, seres com vida própria, que nascem por imposição de forças sociais”. 47

Art. 45. Começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo, averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato constitutivo.

Orlando Gomes afirma que a doutrina moderna fixa-se ao redor das teorias realistas, no entanto considera que a doutrina inclina-se para a concepção da realidade técnica, posto que a realidade objetiva seria flagrantemente artificial.48 Caio Mário segue a mesma linha de pensamento ao afirmar que:

O jurista moderno é levado, naturalmente, à aceitação da teoria da realidade técnica, reconhecendo a existência dos entes criados pela vontade humana, os quais operam no mundo jurídico adquirindo direitos, exercendo-os, contraindo obrigações, seja pela declaração de vontade, seja por imposição da lei. Sua vontade é distinta da vontade individual dos membros componentes; seu patrimônio, constituído pela afetação de bens, ou pelos esforços dos criadores ou associados, é diverso do patrimônio de uns e de outros; [...] o jurista e o ordenamento jurídico não podem fugir da verdade inafastável: as pessoas jurídicas existem no mundo do direito e existem como seres dotados de vida própria, de uma vida real. 49

Portanto, apesar da doutrina atual dividir as teorias de forma um pouco diferente, a corrente majoritária é no sentido de que as pessoas jurídicas têm personalidade própria, direitos, obrigações e possuem vontade distinta das pessoas naturais que a compõem. Constata-se que a natureza jurídica desses entes é de fundamental importância para saber se a pessoa jurídica tem capacidade de ação e, por consequência, se é possível ou não responsabilizar penalmente esses entes pela prática de crimes ambientais.

3.3 Teoria da personalidade jurídica

A personalidade jurídica tem, segundo Washington de Barros Monteiro, por princípios fundamentais a pessoa jurídica ter personalidade distinta da de seus membros (universitas distat a singulis), patrimônio distinto e vida própria, diferente da de seus membros. 50

47 RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil. 34. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, v.1, p. 88.

48 GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. 19. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 169. 49 MÁRIO, Caio. Instituições de Direito Civil. 25. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012, v. 1, p. 257-158.

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28 Orlando Gomes tenta explicar a necessidade de personalizar esses entes coletivos ao afirmar que:

A realização do fim para que se uniram se dificultaria extremamente, ou seria impossível, se a atividade conjunta somente se permitisse pela soma [...] de ações individuais. Surge, assim, a necessidade de personalizar o grupo, para que possam proceder como uma unidade [...]. Essa individualização necessária só se efetiva se a ordem jurídica atribui personalidade ao grupo, permitindo que atue em nome próprio, com capacidade jurídica igual à das pessoas naturais.51

Nas palavras de Carlos Roberto Gonçalves, “a razão de ser, portanto, da pessoa jurídica está na necessidade ou conveniência de os indivíduos unirem esforços e utilizarem recursos coletivos para a realização de objetivos comuns, que transcendem as possibilidades individuais”. 52

Segundo Caio Mário “a personificação do ente abstrato destaca a vontade coletiva do grupo, das vontades individuais dos participantes, de tal forma que o seu querer é uma “resultante” e não mera justaposição das manifestações volitivas isoladas”. 53 Logo, a personalidade é necessária para que a pessoa jurídica atinja os seus fins.

3.4 Capacidade e representação da pessoa jurídica

A capacidade da pessoa moral advém da personalidade que a ordem jurídica lhe reconhece a partir do seu registro.

Para Caio Mário, enquanto a capacidade da pessoa natural é ilimitada, a da pessoa jurídica é restrita. Afirma que, segundo o princípio da especialização, a personalidade desta deve ser reconhecida na medida dos fins da entidade, devendo sua capacidade ser limitada ao âmbito de sua atividade própria. Entretanto, alerta que não se pode levar esse princípio às últimas consequências, devendo utilizá-lo com mitigações.54 Observa que até no campo dos direitos patrimoniais há restrições, conforme exemplos contidos no trecho:

[...] a autorização ou concessão para o aproveitamento dos recursos minerais somente pode ser dada a brasileiros ou a empresa constituída sob as leis brasileiras (Constituição Federal, art. 176, § 1º) e às pessoas jurídicas de direito público externo, estrangeiras, é vedada a participação direta ou indireta na assistência à saúde no País, salvo nos casos previstos em lei (Constituição Federal, art.199, § 3º. Não implica, evidentemente, isto, incapacidade, porém restrições ao exercício de direitos. 55

Segundo Maria Helena Diniz, essa capacidade abrange todos os campos do Direito, não se limitando à esfera patrimonial. 56

51 GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. 19. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 167.

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29 Os doutrinadores e o direito positivo reconhecem a capacidade das pessoas jurídicas, mas reconhecem, também, a necessidade de aparelhamento técnico (órgãos de deliberação e representação) para que haja o exercício dos seus direitos, pois não dispõem de manifestação direta de vontade. Dispõe a lei que o estatuto designará o representante e, se for omisso, caberá aos diretores a representação (Código Civil, arts. 45 e 46). 57

O Código Civil, no art. 47, dispõe que os atos dos administradores obrigam as pessoas jurídicas quando exercidos nos limites de seus poderes definidos no ato constitutivo. Quando excederem esses limites, eles responderão pessoalmente pelos prejuízos causados a terceiros. Se houver ausência de administração, o juiz poderá nomear administrador provisório, conforme art. 49 do CC/2002:

Art. 49. Se a administração da pessoa jurídica vier a faltar, o juiz, a requerimento de qualquer interessado, nomear-lhe-á administrador provisório.

Caio Mário explica como deve ser a tomada de decisões nesses órgãos:

Agindo através de seus órgãos, as decisões serão tomadas na do que dispõe o estatuto. Sendo unipessoal a administração, cabe ao dirigente a deliberação. Se for coletiva, as decisões serão tomadas na forma do que vem disposto no ato constitutivo, quer na observância de quórum especial, quer na delegação de poderes a um ou mais administradores. É comum o estatuto exigir para certos atos a presença de a presença de mais de um, ou associar um deles a um procurador. No silêncio do ato constitutivo, o código destacou, no art. 48, que as decisões coletivas da administração da pessoa jurídica, salvo disposição estatutária em contrário, são tomadas pela maioria dos votos dos presentes.58 3.5 Classificação

3.5.1 Quanto às suas funções e órbitas de atuação

São de direito público, interno (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) ou externo (nações, Santa Sé, Organização das Nações Unidas), e de direito privado (associações e sociedades). Conforme o Código Civil de 2002:

Art. 40. As pessoas jurídicas são de direito público, interno ou externo, e de direito privado. Art. 41. São pessoas jurídicas de direito público interno:

I - a União;

II - os Estados, o Distrito Federal e os Territórios; III - os Municípios;

IV - as autarquias, inclusive as associações públicas; V - as demais entidades de caráter público criadas por lei. [...]

Art. 42. São pessoas jurídicas de direito público externo os Estados estrangeiros e todas as pessoas que forem regidas pelo direito internacional público.

Art. 44. São pessoas jurídicas de direito privado: I - as associações;

II - as sociedades;

(30)

30 III - as fundações;

IV - as organizações religiosas; V - os partidos políticos;

VI - as empresas individuais de responsabilidade limitada.

3.5.2 Quanto à sua estrutura59

3.5.2.1 Universitas personarum: se constituem em torno da reunião de pessoas, como ocorre com as associações, que não possuem finalidade lucrativa (clubes esportivos, centros culturais, etc.), e as sociedades, que possuem finalidade lucrativa.

3.5.2.2 Universitas honorum: se constituem em torno de um patrimônio destinado a um fim, tendo como exemplo as fundações.

3.5.3 Quanto à sua nacionalidade

São nacionais ou estrangeiras.

3.6 As pessoas jurídicas na sociedade moderna

As empresas buscam, cada vez mais, serem reconhecidas como “ecologicamente corretas”, visto que isso melhora sua imagem perante a sociedade e, por consequência, gera um aumento no faturamento.

Diogo Petry60 aponta as vantagens de uma empresa que assume responsabilidades socioambientais, que são: eleva seu grau de visibilidade, produz com maior eficiência bens para o mercado, auxilia o meio ambiente, ganha benefícios fiscais e forma uma imagem positiva perante a sociedade. Conclui que se as empresas que cumprem as regras ambientais incrementam seus lucros, conforme trecho abaixo:

A grande verdade, para não dizer o grande negócio, é que ser uma empresa que cumpre com suas funções socioambientais representa, nos dias atuais, um cheque em branco: é resultado de incremento no grau de investimento, na melhoria na relação da empresa com o consumidor e com os órgãos públicos, no maior acesso aos mercados externos, além de eficiente publicidade. É, portanto, lucratividade certa. 61

No entanto, os entes coletivos continuam sendo apontados como os maiores degradadores da natureza, pois os lucros gerados com a degradação, na maioria das vezes, compensam as punições que possam sofrer e os seus atos geram impactos bem maiores que os oriundos dos particulares.

59 RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil. 34. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, v. 1, p. 90.

60 PETRY, Diogo. A Sociedade de Risco Mundial e a Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica: o papel das empresas e suas marcas como elementos indutores à conscientização ambiental. 2010. 153 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade de Caxias do Sul, Caxias do Sul, 2010, p. 114.

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31 O XII Congresso Internacional de Direito Penal de Hamburgo, que ocorreu em 1979, na Alemanha, reconheceu que os crimes ambientais são praticados, em maior escala, pelas pessoas jurídicas. 62

Conforme Fernando A. N. Galvão da Rocha, a responsabilização da pessoa jurídica funciona como instrumento de prevenção de danos ambientais e, também, de educação dos infratores. Mesmo não sendo possível aplicar pena privativa de liberdade, devido à natureza da pessoa jurídica, a incriminação seria eficaz por seguir a lógica capitalista. Neste sentido:

No caso da pessoa jurídica, a marca da responsabilidade criminal dificulta os negócios da pessoa jurídica e, na defesa de seus interesses econômicos, os dirigentes da pessoa jurídica são estimulados a evitar o processo penal. Na lógica do mercado, a certificação de qualidade ambiental do ISO 14.001 abre caminho para bons negócios. Já a denúncia criminal possui efeito contrário, descredencia e, em alguns casos, inviabiliza a transação comercial com a pessoa jurídica responsável por dano ambiental. O tempo se encarregará de mostrar que a opção pela responsabilização criminal da pessoa jurídica desenvolve estratégia muito eficiente na preservação do meio ambiente, em especial porque trabalha intervindo na lógica capitalista do lucro. 63

Roxin previu que “as sanções a pessoas jurídicas desempenharão um grande papel no futuro. Afinal, as formas mais socialmente lesivas da criminalidade econômica e ambiental têm sua origem nas grandes e poderosas empresas”. 64 Arrematou afirmando que “sanções que se acoplem a uma falha da organização (independentemente de quem, individualmente, seja o culpado), podem ter intensos efeitos preventivos” 65.

Por ser uma poluidora com impacto maior que as pessoas naturais individualmente consideradas, a pessoa jurídica pode ser o ponto de partida para reverter a crise ambiental que estamos vivendo. Pode ser útil tanto na conscientização da preservação ambiental e do desenvolvimento sustentável, quanto na utilização de tecnologias ditas limpas. O seu poderio econômico pode ser utilizado para pressionar governos e influenciar consumidores. Nesse jaez, Jared Daimond afirma que as grandes corporações podem salvar o planeta e que algumas destas já fazem mais que muitos governos no tocante ao meio ambiente. Nessa linha de pensamento:

Ao longo dos anos, entrei para o conselho diretor de dois grupos ambientais, o WWF e a Conservação Internacional, atuando ao lado de muitos executivos de empresas.

[...] descobri que, embora algumas empresas sejam de fato tão destrutivas quanto muitos suspeitam, outras estão entre as mais positivas forças do mundo para a sustentabilidade ambiental. 66

62 FROTA, Hélio Mamede. Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica. Revista da EJUSE, Nº 18, 2013, p. 207. 63 ROCHA, Fernando A. N. Galvão da. Responsabilidade penal da pessoa jurídica. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 16-17.

64 ROXIN, Claus. Estudos de Direito Penal. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 27. 65 ROXIN, Claus. Estudos de Direito Penal. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 28.

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33

4 A RESPONSABILIDADE PENAL DAS PESSOAS JURÍDICAS POR CRIMES

AMBIENTAIS

O presente capítulo discorre sobre a responsabilidade penal das pessoas jurídicas. Inicia com o histórico do assunto. Em seguida, analisa a compatibilidade da responsabilidade penal da pessoa jurídica com o Direito Penal brasileiro. Finaliza com as correntes de interpretação do dispositivo constitucional (art. 225, § 3º) e com a evolução jurisprudencial dos tribunais superiores referente ao tema.

4.1 Histórico

Nos países de origem romano-germânico prevalecia o princípio societas delinquere non potest, pelo qual não é possível responsabilizar penalmente as pessoas jurídicas. Já nos países anglo-saxões, vigia o princípio da common law, segundo o qual é possível a responsabilidade criminal das pessoas jurídicas. No entanto, essa divisão vem sendo relativizada, posto que a responsabilidade penal dos entes coletivos vem ganhando espaço também entre as nações que adotam o sistema anglo-saxão devido à dificuldade de punir efetivamente a denominada criminalidade moderna. 67

Atualmente, há um movimento internacional no sentido de responsabilizar penalmente as pessoas jurídicas, pensamento difundido, principalmente, através de congressos internacionais. Esse movimento teria ganhado força após a Primeira Guerra Mundial, quando o Estado passou a ser mais intervencionista e quando as empresas ganharam força no cenário econômico, passando a serem as principais violadoras das determinações estatais. 68

Com o aumento da degradação ambiental, vários países também passaram a responsabilizar penalmente as pessoas jurídicas, alguns com previsão constitucional, outros infraconstitucional. A França, antes contrária à tese, adotou-a desde 1994, salvo em relação ao próprio Estado, estabelecendo, inclusive, normas de adaptação que possibilitassem a sua aplicação prática.

Segundo as palavras de Shecaira:

Observe-se, ademais, que nos últimos anos, tem-se forte tendência padronizadora decorrente da globalização econômica, o que não é ignorado pelo direito penal. Atualmente, três são os sistemas que imperam no mundo no que concerne à responsabilização das pessoas jurídicas. Um, seguido basicamente pelos países da Common Law, mas que hoje recebe a adesão de outros países da Civil Law em que se reconhece plenamente a responsabilidade penal das pessoas jurídicas. O segundo sistema refuta frontalmente tal responsabilidade. A maioria dos países da Europa continental adota tal postura. Uma terceira posição, hoje dominante na Alemanha e em outros países, adota posicionamento intermediário. Às pessoas jurídicas

67 GOMES, Luiz Flávio (coord.). Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica e Medidas Provisórias no Direito Penal (coleção temas atuais de direito criminal v. 2). São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 51-52.

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34 podem ser impostas sanções pela via do chamado direito penal administrativo, ou contravenção à ordem. Estas se constituem em infrações de menor gravidade. Sua sanção não é uma multa penal (Geldstrafe), mas sim uma multa administrativa (Geldbusse): por essa via são punidas as infrações econômicas. Nestes casos não se indaga sobre a culpabilidade das empresas, mas utiliza-se de uma punição com um espírito mais pragmático. 69

No âmbito do direito brasileiro, o Código Criminal do Império de 1831 (art. 80) e o Código Penal de 1890 (art. 103, parágrafo único) mencionavam a responsabilidade das corporações. Este último dispositivo, no entanto, era incompatível com o art. 25 do Código Penal de 1890, que pregava a responsabilidade pessoal. O Código Penal Brasileiro vigente (Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, com a reforma de julho de 1984) não dispôs sobre a responsabilidade penal da pessoa jurídica e tem por escopo os conceitos clássicos de conduta e culpabilidade da pessoa física.70

A Constituição Federal de 1988, expressamente, tutelou os direitos difusos, dando atenção especial à questão ambiental, destinando capítulo próprio à matéria. O § 3º, do art. 225, e o § 5º, do art. 173, ambos da CF, inovaram ao prever a responsabilidade penal da pessoa jurídica.

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações. § 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. (grifo nosso)

Art. 173

§ 5º A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular.

O art. 3º da lei 9.605/98, por sua vez, materializou a responsabilidade penal da pessoa jurídica por crimes ambientais:

Art. 3º As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade.

Parágrafo único. A responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas, autoras, co-autoras ou partícipes do mesmo fato. (grifo nosso)

Segundo Luiz Regis Prado, o legislador brasileiro se inspirou no Direito Francês para formular os referidos dispositivos, no entanto o fez de modo incompleto, posto que só enunciou a responsabilidade penal da pessoa jurídica, sem prevê os meios de instituí-la.

69 SHECAIRA, Sérgio Salomão. Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica. 3ª ed.Rio de Janeiro: Elsevier, 2011, p. 26-27.

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