ADIÇÃO DE RESÍDUO DE AREIA DE FUNDIÇÃO EM MASSA CERÂMICA
J.M.D. Soares; V.SENGER; L.M.H. QUINTANA; R.J.B. PINHEIRO; M.M.
GONÇALVES
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Universidade Federal de Santa Maria – UFSM
RESUMO
O trabalho apresenta o estudo de adição de resíduo (areia de fundição), proveniente de uma fundição localizada em Santo Angelo-RS, na matéria-prima para a produção de cerâmica vermelha. O objetivo deste estudo é buscar a incorporação, de forma inerte, desse rejeito na massa cerâmica, evitando a contaminação do meio ambiente. Para o estudo foi utilizada uma argila que é utilizada na produção de blocos cerâmicos. Foram realizados ensaios de caracterização física e química e moldadas séries de corpos de prova por extrusão para a argila pura (referência) e para adições de 5%, 10% e 15% de resíduo na mistura. Os corpos de prova foram secos em estufa e posteriormente queimados a temperaturas entre 800 °C e 1050
°C para avaliar o comportamento das misturas. A análise dos resultados das propriedades físicas e mecânicas mostra a viabilidade da utilização do rejeito na massa cerâmica, nas taxas estudadas.
Palavras-chave: resíduo, olaria, cerâmica vermelha
INTRODUÇÃO
O processo de geração de resíduos tem crescido em face da multiplicação da produção de bens. O resíduo de areia de fundição (um milhão de toneladas/ano) representa uma significativa parcela do total de resíduos industriais gerados no Brasil. A destinação adequada desse resíduo objetivando seu aproveitamento como adição na produção de materiais de construção deve ser vista não só dos pontos de vista econômico e técnico mas sobretudo como alternativa de minimização de impactos ambientais.
O reaproveitamento de rejeitos/resíduos através da reciclagem ou adição em processos produtivos, especialmente em materiais cerâmicos, tem sido abordado por diversos autores (1) (2) (3) (4) (5)
.
O estudo do reaproveitamento do resíduo de areia de fundição como material de infra-estrutura para pavimentação e agregado em massas asfálticas vem sendo realizado por vários pesquisadores (6) (7).
O objetivo deste trabalho é analisar o comportamento e aproveitamento do resíduo de areia de fundição na produção de cerâmica vermelha, através da incorporação desse rejeito à massa cerâmica.
MATERIAIS E MÉTODOS
Para a realização deste estudo do aproveitamento de resíduo de areia de fundição (RAF), proveniente de fundição localizada na cidade de Santo Ângelo – RS, foi utilizada uma argila que está sendo utilizada em uma olaria da mesma cidade, para a produção de blocos.
Caracterização dos materiais
Os materiais foram caracterizados quanto à granulometria, limites de consistência (wl – limite de liquidez, wp - limite de plasticidade, IP – Índice de plasticidade) , análises química, Tabelas 1 e 2.
Tabela 1 – Caracterização física
Amostra
wl
(%) wp
(%) IP
(%)
Peso Espec.
(kN/m3)
Argila (%)
Silte (%)
Areia (%)
Argila 50 28 22 27,70 42 47 11
Areia de fundição - - - 26,00 1 14 85
Tabela 2 – Principais óxidos constituintes dos materiais Amostra Al2O3
(%)
CaO (%)
Fe2O3
(%)
K2O (%)
MgO (%)
MnO (%)
Na2O (%)
P2O5
(%)
SiO2
(%)
TiO2
(%)
P.F.
(%) Argila 15,3 0,57 5,0 0,24 0,36 0,08 0,19 0,17 55,1 3,7 20,52 Areia de
fundição
11,5 1,0 6,0 0,42 1,5 0,16 1,5 0,07 66,2 0,96 12,37
As Figuras 1 e 2 mostram os gráficos relativos à análise mineralógica dos materiais estudados onde observa-se a presença de caulinita e cristobalita na argila e de quartzo, plagioclásio e anfibólio no resíduo de areia de fundição.
01-082-1403 (C) - Cristobalite alpha, syn - SiO2 - Y: 6.41 % - d x by: 1. - WL: 1.5409 - 0 - I/Ic PDF 5. - 00-014-0164 (I) - Kaolinite-1A - Al2Si2O5(OH)4 - Y: 3.53 % - d x by: 1. - WL: 1.5409 - 0 - 00-033-1161 (D) - Quartz, syn - SiO2 - Y: 42.75 % - d x by: 1. - WL: 1.5409 - 0 - I/Ic PDF 3.6 - Operations: X Offset 0.025 | Import
UFSM - File: Argila Preta.RAW - Type: 2Th/Th locked - Start: 2.000 ° - End: 72.000 ° - Step: 0.020 ° - Step time: 1. s - Temp.: 25 °C (Room) - Time Started: 5 s - 2-Theta: 2.000 ° - Theta: 1.000 ° -
Lin (Counts)
0 500
2-Theta - Scale
3 10 20 30 40 50 60 70
d=7,16074 d=4,44356d=4,24842d=4,04874 d=3,55609 d=3,34123 d=2,56301 d=2,45353 d=2,27833d=2,23407 d=2,12662 d=1,97852 d=1,81637 d=1,67073 d=1,54070 d=1,38155d=1,37275
d=1,48837
d=2,74469
Argila Preta
Quartzo
Caolinita Cristobalita
Figura 1 – Mineralogia da argila
00-016-0152 (D) - Tridymite - SiO2 - Y: 3.22 % - d x by: 1. - WL: 1.5409 - 0 -
00-020-0656 (N) - Magnesioriebeckite - (Na,Ca)2(Mg,Fe)5Si8O22(OH)2 - Y: 3.19 % - d x by: 1. - WL: 1.5409 - 0 - 00-005-0586 (*) - Calcite, syn - CaCO3 - Y: 3.53 % - d x by: 1. - WL: 1.5409 - 0 - I/Ic PDF 2. - 00-020-0554 (D) - Albite, ordered - NaAlSi3O8 - Y: 5.91 % - d x by: 1. - WL: 1.5409 - 0 - 00-033-1161 (D) - Quartz, syn - SiO2 - Y: 70.67 % - d x by: 1. - WL: 1.5409 - 0 - I/Ic PDF 3.6 - Operations: X Offset 0.033 | Import
UFSM - File: Areia de Fundição.RAW - Type: 2Th/Th locked - Start: 2.000 ° - End: 72.000 ° - Step: 0.020 ° - Step time: 1. s - Temp.: 25 °C (Room) - Time Started: 2 s - 2-Theta: 2.000 ° - Theta: 1.
Lin (Counts)
0 500 1000 1500
2-Theta - Scale
3 10 20 30 40 50 60 70
d=8,48208 d=6,36146 d=4,25718d=4,08981 d=3,34001 d=3,18367d=3,13389d=3,03166 d=2,45685 d=2,33729d=2,28106d=2,23608 d=2,12729 d=1,97926 d=1,81828 d=1,67095 d=1,54213 d=1,38213d=1,37274
Areia de Fundição
Quartzo
Calcita Plagioclásio
Anfibólio Tridimita
Figura 2 – Mineralogia da areia de fundição
Adições de areia de fundição na massa cerâmica, moldagem e ensaios
As proporções dos materiais, em volume, utilizadas foram:
Amostra 1 – 100% de argila
Amostra 2 – 95% de argila + 5% de areia de fundição Amostra 3 – 90% de argila + 10% de areia de fundição Amostra 4 – 85% de argila + 15% de areia de fundição
Em seqüência, foram moldadas séries de corpos de prova (10mm x 20mm x 100mm), por extrusão a vácuo, para a realização de ensaios cerâmicos. Após a secagem ao ar e em estufa (105°C) os corpos de prova foram queimados nas temperaturas de 800°C, 900°C, 950°C e 1050°C.
Após a sinterização, os corpos de prova foram avaliados quanto à contração linear, absorção de água e resistência mecânica (ruptura à flexão), para todas as temperaturas.
A preparação dos corpos de prova e ensaios foi realizada segundo as recomendações da CIENTEC-RS (8).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
As Tabelas e Figuras 3 a 7 apresentam os resultados de ensaios de contração linear total, absorção de água e tensão de ruptura à flexão, para todas as misturas e temperaturas estudadas.
Tabela 3 – Resultados de ensaio – Argila pura – 100%
Temperatura (°C)
Contração linear (%)
Absorção de água (%)
Tensão de ruptura (MPa)
105 8,50 -
5,63
800 8,36 19,90 7,14
900 8,61 19,89 9,12
950 9,08 19,64 11,44
1050
11,22 18,20 13,91
Tabela 4 – Resultados de ensaio – 95% de Argila pura + 5% de areia de fundição Temperatura
(°C)
Contração linear (%)
Absorção de água (%)
Tensão de ruptura (MPa)
105 6,73 - 5,39
800 7,18 23,44 4,11
900 7,28 23,76 5,31
950 7,37 23,72 5,26
1050
8,44 22,44 7,29
Tabela 5 – Resultados de ensaio – 90% de Argila pura + 10% de areia de fundição Temperatura
(°C)
Contração linear (%)
Absorção de água (%)
Tensão de ruptura (MPa)
105 6,74 - 5,40
800 6,83 21,97 3,43
900 7,08 22,32 4,36
950 7,24 22,13 5,21
1050
8,16 21,02 6,09
Tabela 6 – Resultados de ensaio – 85% de Argila pura + 15% de areia de fundição Temperatura
(°C)
Contração linear (%)
Absorção de água (%)
Tensão de ruptura (MPa)
105 6,73 - 5,03
800 6,82 21,53 3,18
900 7,09 21,80 4,51
950 7,19 21,66 5,07
1050
7,82 20,67 6,77
ABSORÇÃO MÁXIMA D'ÁGUA
16,00 17,00 18,00 19,00 20,00 21,00 22,00 23,00 24,00 25,00
800 900 950 1050
Temperatura de Queima (°C)
Absorção Máx. d'Água (%) Argila Pura
Adição 5% Minério
Adição 10% Minério
Adição 15% Minério
Figura 3 - Absorção de água
CONTRAÇÃO LINEAR TOTAL
8,5 8,36 8,61 9,08 11,22
6,73 7,18 7,28 7,37 8,44
6,74 6,83 7,08 7,24 8,16
6,73 6,81 7,09 7,19 7,82
0,00 2,00 4,00 6,00 8,00 10,00 12,00 14,00
105 800 900 950 1050
Temperatura de Queima (°C)
Contração Linear Total (%) Argila Pura
Adição 5% Resíduo Adição 10% Resíduo Adição 15% Resíduo Valor Máximo Aceitável
Figura 4 – Contração linear total
RESISTÊNCIA À FLEXÃO
5,63 5,39 5,40 5,03
0,00 1,00 2,00 3,00 4,00 5,00 6,00 7,00
105
Temperatura de Secagem (°C) Tensão de Ruptura à Flexão (MPa)
Argila Pura
Adição 5% Resíduo
Adição 10% Resíduo
Adição 15% Resíduo IPT - Tijolo Maciço IPT - Bloco Cerâmico Vazado
IPT - Telha
Figura 5 – Resistência à flexão para a temperatura de secagem
RESISTÊNCIA À FLEXÃO
7,14 9,12 11,44 13,91
4,11 5,31 5,26 7,29
3,43 4,36 5,21 6,09
3,18 4,51 5,07 6,77
0,00 2,00 4,00 6,00 8,00 10,00 12,00 14,00 16,00
800 900 950 1050
Temperatura de Queima (°C) Tensão de Ruptura à Flexão (MPa)
Argila Pura
Adição 5% Resíduo
Adição 10% Resíduo
Adição 15% Resíduo IPT - Tijolo Maciço IPT - Bloco Cerâmico Vazado IPT - Telha
Figura 6 – Resistência à flexão para as temperaturas de queima
9,12 19,89 33,31 8,61
5,31 23,46 36,19 7,28
4,36 22,32 36,85 7,08
4,51 21,8 36,24 7,09
0,00 5,00 10,00 15,00 20,00 25,00 30,00 35,00 40,00
MRF (MPa) AA (%) PA (%) CLT (%)
Características
Valores
0% Resíduo
5% Resíduo
10% Resíduo
15% Resíduo
Figura 7 - Características a 900º C - (MRF- módulo de ruptura; AA- absorção;
PA – porosidade; CLT – contração linear toral)
A análise e interpretação das tabelas e gráficos das figuras permite fazer as seguintes observações:
- A absorção de água, para todas as dosagens, ficou na faixa de 20,7 a 23,4%, apresentando variações significativas para a taxa de 5% de adição do resíduo. Esta faixa de variação está um pouco acima
valores máximos indicados por Souza Santos (8) como aceitáveis para a produção de blocos e telhas (18 a 20%).
- A argila pura apresenta contração linear total alta com retrações da ordem de 8 a 11%, próximo do limite de 12% considerado como máximo aceitável para evitar problemas de perdas durante os processos de secagem e queima dos produtos, nas olarias.
- A adição de areia de fundição teve uma ação benéfica de redução da contração total , da ordem de 26 a 37%, Figura 3.
- A contração total apresenta, como era de se esperar, um aumento com a temperatura, especialmente para a temperatura de 1050 °C (Figura 4).
- A resistência mecânica, para temperatura de 105°C, apresentou pequena redução com o aumento da taxa de resíduo. Os valores da tensão de ruptura à flexão foram todos superiores aqueles recomendados por Souza Santos (8), como mínimos aceitáveis para permitir o manuseio das peças durante o processo de fabricação até a colocação no forno (Figura 5).
- Para a temperatura de queima de 800 ºC a resistência mecânica apresentou resultados mais baixos devido às fases iniciais do processo de sinterização, indicando o necessário cuidado com a baixa temperatura de queima dos produtos, nas indústrias cerâmicas.
- Para a temperatura a 900 °C, a resistência mecânica atingiu resultados superiores aqueles recomendados como mínimos aceitáveis por Souza Santos (9), para todas as taxas de adição, somente para produção de tijolos maciços. Observa-se da Figura 6 que para a temperatura de 950
oC a tensão de ruptura, para as três taxas de adição, apresentou valores muito parecidos, e próximos do limite inferior de resistência recomendado por Souza Santos (8) para indicação para produção de blocos.
- Na Figura 7 pode-se observar a coerência entre variações do módulo de resistência com a porosidade e absorção de água, em função das taxas de resíduo utilizadas.
CONCLUSÕES
A análise dos resultados mostra a viabilidade do uso de resíduo de areia de fundição como adição na matéria prima para cerâmica vermelha.
O resíduo de areia de fundição tem potencial como redutor de plasticidade e de contração linear de massa cerâmica.
As taxas de adição de até 15% de resíduo se mostraram adequadas para a produção de tijolos maciços, apesar da redução da resistência mecânica.
Para a produção de blocos é indicada a temperatura de queima de 950 oC, para taxas de adição de até 15% de resíduo e verificação dos propriedades tecnológicas dos lotes iniciais de blocos produzidos.
A incorporação do resíduo à massa cerâmica é uma alternativa para a destinação desse resíduo, bem como contribui para a redução de impacto ambiental.
REFERÊNCIAS
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LUKASHIK, V.D. Adição de resíduo de minério de ferro em massa cerâmica. 50º Congresso Brasileiro de Cerâmica, Blumenau,2006 , p1-10.
2. SOARES, J.M.D.; REICHERT, M.; TOMAZETTI, R.R.; TAVARES, I.S. Adição de resíduo de couro na massa para produção de cerâmica vermelha. 45º Congresso Brasileiro de Cerâmica, Florianópolis,2001, p.0402601-0402610.
3. QUINTANA, L.M.H.; SOARES, J.M.D.; The use of rice husk ash in the production of structural ceramics. Construction & Environment – CIB2000, São Paulo, 2000, 9p.
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6. PEREIRA, R.L.; PIRATH, C.E.H.; CNHA, C.J.; PEREIRA, D. Reaproveitamento do Resíduo de Areia de fundição como material de infra-estrutura para pavimentação e agregado em misturas asfálticas. Geosul,2004, Curitiba, p.165- 173.
7. BONET, I.I. Valorização do resíduo areia de fundição (RAF). Incorporação nas massas asfálticas di tipo CBUQ. Dissertação de mestrado (Engenharia de produção). UFSC. Florianópolis, 2002.
8. CIENTEC – Fundação de Ciência e Tecnologia do Estado do Rio Grande do Sul, Cadernos de Métodos – M – CIENTEC C-015 a C-027. Porto Alegre, 1995, 29p.
9. SOUZA SANTOS, P. Ciência e Tecnologia de Argilas, volume1, 2ª ed., Saulo Paulo: Edgard Blücher, 1989.
ADDITION OF FOUNDRY SAND IN CERAMIC MASS ABSTRACT
This work presents the study of the addition of waste (foundry sand), from a fusion factory located in Santo Angelo – RS, into the raw material for the production of traditional ceramics. This study aims to incorporate, in a passive way, the waste mentioned into the ceramic paste, so that the environment contamination can be reduced. For this experiment it was used a ceramic clay of Santo Angelo. Tests of physical, chemical and mineralogical were performed, and then shaped specimen series for natural clay (as reference) and for additions of 5%, 10% and 15% of waste into the mixture. The specimen were stewed and later burned through several temperatures in order to evaluate the mixture’s behavior. The result’s analysis shows that it is perfectly possible the use of the waste into the ceramic paste, with the rates studied.
Key-words: ceramic mass, clay, residue