CATÓLICA DE
BRASÍLIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
STRICTO SENSU EM ECONOMIA DE EMPRESAS
Mestrado
DÉFICIT RELATIVO DE SANEAMENTO BÁSICO DOS
MUNICÍPIOS BRASILEIROS
Autora: Mary Brito Silveira
Orientador: Prof. Dr. Carlos Eduardo Gasparini
MARY BRITO SILVEIRA
DÉFICIT RELATIVO DE SANEAMENTO BÁSICO
DOS MUNICÍPIOS BRASILEIROS
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação “Stricto Sensu” em Economia de Empresas da Universidade Católica de Brasília como requisito para obtenção do Título de Mestre em Economia de Empresas
Orientador: Prof. Dr. Carlos Eduardo Gasparini
Trabalho de autoria de Mary Brito Silveira, intitulado “Déficit relativo de saneamento básico dos municípios brasileiros”, requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Economia de Empresas, defendida e aprovada, em de de 2007, pela banca examinadora constituída por:
_____________________________________________ Dr. Carlos Eduardo Gasparini
Professor Orientador
_____________________________________________ Dr. Ricardo Coelho Faria
Membro da Banca
_____________________________________________ Dr. Márcio Bruno Ribeiro
AGRADECIMENTO
Ao Prof. Dr. Carlos E. Gasparini,
Pela orientação e incentivo, guia e mestre sempre paciente e dedicado em todos os momentos do meu trabalho.
Aos Profs. Drs. Tito, Adolfo, Ricardo, Wilfredo e Adelaide pelo estímulo e grande ajuda na minha formação do mestrado.
Aos Prof. Drs. Carlos Pacheco e Joaquim Levy,
Pelo apoio, incentivo e valiosos ensinamentos.
Aos mestres Mauro Ricardo, George Tormin e Elias Haddad,
Pelo apoio durante o período do curso.
À Francisca, Aricieri, Soraya, Mariana, Michele e Gal,
Pela amizade, incentivo e contribuições nas horas mais difíceis do curso.
"O único lugar aonde o sucesso vem antes que o trabalho é no dicionário"
RESUMO
Esta dissertação estima o déficit relativo dos serviços de saneamento básico dos municípios brasileiros, aqui expresso pela disponibilidade relativa destes serviços. O indicador do déficit dos serviços é calculado por meio de método não paramétrico, o Data Envelopment Analysis – DEA, que permite estimar a fronteira de melhor acesso aos serviços - disponibilidade relativa ponderada – sendo que os municípios que se localizam abaixo da fronteira são aqueles que, relativamente, requerem esforço de investimentos buscando o aumento da disponibilidade dos serviços. A metodologia utilizada pode subsidiar o estabelecimento de indicadores mais amplos que os de cobertura dos serviços, visando a priorização de política públicas nos locais de maiores déficits relativos. O indicador sintético do déficit relativo de saneamento básico estimado refere-se não apenas à cobertura dos serviços de água e de esgoto, mas de ambos, ou seja, às necessidades de abastecimento de água e de esgotamento, além de outras necessidades não atendidas, medidas pelo grau de pobreza – ausência de renda – dos municípios. São avaliados cerca de 4.500 municípios, em média, nos anos de 2000, 2001 e 2002. A fronteira da melhor disponibilidade relativa dos serviços reflete as desigualdades regionais do País, mostrando que o maior déficit relativo, destes serviços, está concentrado na Região Nordeste. Os melhores percentuais de acesso àqueles serviços encontram-se na Região Sudeste. Ao traçar a fronteira da melhor disponibilidade relativa dos serviços de saneamento, os resultados encontrados permitem orientar políticas públicas focalizadas de forma eqüitativa, priorizando os municípios abaixo da fronteira.
ABSTRACT
This study estimates the relative deficit of water and sewage services of Brazilian’s municipalities, whose are expressed by the relative service availability. The deficit of these services is calculated using the Data Envelopment Analysis – DEA, which permits to line the efficient frontier of the water and sewage services. The municipalities that are localizated under the frontier need to invest more than the municipalities on the frontier, to increase the services availability. This frontier refleets the equity and could be used to orient the water and sewage services public politics. The estimate relative deficit is no about the water and sewage indicators coverage individualities. It’s about the both indicators – water and sewage together – and the converse of the municipalities’s income. It’s a deficit indicator who envolve more than a dimension of the basic population necessities and we can named like a synthetic indicador. It is available, in average, 4.500 municipalities were analyzed in the 2000, 2001 and 2002 years. The frontier of those services that is founded, reflect the regional inequalities of the country showing that the greatest relative deficit, considerate here as the lower levels of availability that the population has for those services, it’s concentrated at the Norwest Region. Lining the best relative service availability frontier for water and sewage, the results that were found can orient public politics focused in a equality way, making the municipals above the frontier priories.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Gráfico 1 - Percentuais de Cobertura de Água por Região Geográfica...17
Gráfico 2 - Percentuais de Cobertura de Esgoto por Região Geográfica ...18
Figura 1- Projeção da DMU na fronteira eficiente ...35
Figura 2 - Eficiência com Orientação para Input...37
Figura 3 - Eficiência com Orientação para Output...38
Gráfico 3 - Quantidade de Outliers, por Estado, no período 2000-2002...54
Gráfico 4 – Disponiblidade relativa de saneamento básico, por Estado, no período 2000-2002 ...56
Gráfico 5 – Disponiblidade relativa de saneamento básico por Região no período 2000-2002...57
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Percentual de Cobertura de Água e Esgoto por Região ...17
Tabela 2 - Níveis de atendimento urbano com água e esgoto dos prestadores de serviços participantes do “Diagnóstico 2003”, segundo abrangência ...19
Tabela 3 - Número de Outliers por Estado – 2000-2002...53
Tabela 4 - Disponibilidade Relativa dos Serviços de Saneamento Básico - 2000-2002 ...55
Tabela 5 - Região Norte...59
Tabela 6 - Região Nordeste ...60
Tabela 7 - Região Sudeste ...60
Tabela 8 - Região Sul ...61
Tabela 9 - Região Centro-Oeste ...62
Tabela 10 - Brasil ...62
Tabela 11 - Score dos 20 melhores municípios...64
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO __________________________________________________________ 12
CAPÍTULO 1 – CONTEXTUALIZAÇÃO DO SETOR SANEAMENTO NO BRASIL 15
1.1. OS ÚLTIMOS 40 ANOS ____________________________________________________ 15
1.2. ESTRUTURA DO SETOR __________________________________________________ 18
1.3. A UNIVERSALIZAÇÃO SOB O PONTO DE VISTA OFICIAL ___________________ 20
CAPÍTULO 2 – LEVANTAMENTO DE REFERÊNCIAS DO SETOR ____________ 23
2.1. DIAGNÓSTICOS SOBRE O SETOR SANEAMENTO BÁSICO __________________ 23
2.2. A QUESTÃO INSTITUCIONAL E REGULAÇÃO DO SETOR ___________________ 24
2.3. PRIVATIZAÇÃO DO SETOR _______________________________________________ 26
2.4. A EFICIÊNCIA DO SETOR E USO DO DEA __________________________________ 30
CAPÍTULO 3 – METODOLOGIA___________________________________________ 33
3.1. ANÁLISE DE ENVOLTÓRIA DE DADOS (DATA ENVELOPMENT ANALYSIS) – DEA _________________________________________________________________________ 33
3.2. FORMULAÇÃO GERAL DO MÉTODO DEA _________________________________ 34
3.2.1 A Eficiência Produtiva e as Orientações para Input e para Output__________________________ 36 3.2.2. Modelo DEA-CCR (Charnes, Cooper e Rhodes)_______________________________________ 39 3.2.3. Modelo DEA-BCC______________________________________________________________ 43
3.3. FRONTEIRA DE MELHOR DISPONIBILIDADE RELATIVA PARA MESMAS
NECESSIDADES______________________________________________________________ 45
3.4. DEFINIÇÃO DAS UNIDADES TOMADORAS DE DECISÃO (DECISION MAKING UNITS) – DMU’s ______________________________________________________________ 47
3.5. VARIÁVEIS ESCOLHIDAS E CARACTERÍSTICAS DOS BANCOS DE DADOS ___ 48
3.6. DEFINIÇÃO DAS OBSERVAÇÕES ATÍPICAS (OUTLIERS) ____________________ 50
CAPÍTULO 4 – RESULTADOS _____________________________________________ 52
4.1. ANÁLISE DAS OBSERVAÇÕES ATÍPICAS (OUTLIERS) ______________________ 52
4.2. MELHOR DISPONIBILIDADE RELATIVA DE SERVIÇOS DE SANEAMENTO BÁSICO – DÉFICIT RELATIVO ________________________________________________ 54
CONCLUSÃO____________________________________________________________ 66
INTRODUÇÃO
O objetivo desta dissertação é fazer um estudo comparativo da situação do saneamento
básico nos municípios brasileiros com o uso da Análise de Envoltória de Dados – DEA (Data
Envelopment Analysis) que permita estimar o déficit relativo de saneamento básico no País,
por meio da fronteira de melhor disponibilidade relativa dos serviços. O total de municípios
utilizados no estudo traz, em seu bojo, as diferenças geográficas, populacionais e de renda.
A fronteira encontrada não está voltada para a eficiência relativa dos prestadores de
serviços, a despeito da sua importância, mas para a melhor disponibilidade relativa possível
dos serviços prestados. Abaixo da fronteira, estão indicadas as localizações com menores
disponibilidades dos serviços, que servirão de subsídios na focalização das políticas públicas
para o setor. Ao traçar a fronteira da melhor disponibilidade relativa e encontrar um indicador
sintético daqueles serviços, o estudo identifica os principais focos de maior necessidade dos
serviços, onde devem ser intensificadas as aplicações de políticas específicas que permitam
uma maior eqüidade no acesso àqueles serviços, reduzindo as desigualdades sociais,
econômicas e regionais brasileiras. O indicador sintético avalia as necessidades e a oferta dos
serviços tanto de abastecimento de água, quanto de esgotamento sanitário.
Foram avaliados 4.500 (quatro mil e quinhentos) municípios, em média, para os anos
de 2000, 2001 e 2002. O estudo estabelece uma fronteira de máxima disponibilidade relativa
dos serviços de saneamento básico – água e esgoto, a exemplo do estudo de Puig-Junoy
(1999) que traça uma fronteira semelhante para o setor saúde.
A aplicação que aqui se faz do método DEA, em geral utilizado para medir eficiência
de gestão, traz uma análise não muito comum em estudos econômicos. No entanto, espera-se
que os seus resultados possam subsidiar a focalização do déficit relativo dos serviços de
saneamento básico, importantes tanto na regulação quanto no direcionamento das soluções e
das políticas públicas para o saneamento básico brasileiro.
Por outro lado a vinculação entre o aumento da cobertura dos serviços de saneamento
básico e a redução dos gastos em saúde sugere que as soluções em saneamento podem
representar redução de gastos em saúde pública. Conforme Hutton Haller (2004), para cada
dólar investido em saneamento básico, obter-se-ia um benefício econômico em saúde entre
US$ 3 e US$ 34. Afirmam ainda que, se até 2015 for reduzido à metade o percentual de
pessoas sem acesso ao abastecimento de água e esgoto, haveria uma redução mundial média
de 10% nas ocorrências de diarréias infecciosas, doença considerada responsável pela carga
para higiene pessoal. O estudo abrange os países que assinaram a Declaração do Milênio das
Nações Unidas.
A metodologia dste estudo, ao permitir o cálculo de um indicador sintético das
necessidades de saneamento básico, em suas dimensões de cobertura dos dois serviços e da
renda do município, fornece subsídios à discussão das políticas para o setor, que sempre
estiveram presentes na pauta dos governos, em todos os níveis da federação. Propõe-se que a
política governamental para o setor se volte, num primeiro momento, para a focalização dos
serviços a partir da localização do défitcit. A comparação da disponibilidade dos serviços de
cada município com todos os demais, de características semelhantes, é feita e avaliada. A
fronteira da melhor disponibilidade dos serviços e o indicador sintético para ambos os
serviçoes sõa instrumentos de grande utilidade, na medida em que identifica o espaço
geográfico de menor acesso àqueles serviços e propicia priorizar a melhoria no atendimento
com equidade no nível nacional, regional, estadual ou municipal.
Este trabalho está dividido em seis partes, sendo a primeira essa Introdução, onde
estão apontados o seu objetivo e a relevância do tema, bem como as suas motivações.
O Capítulo 1 contextualiza o setor saneamento no Brasil nos últimos 40 anos e
apresenta sua estrutura, analisa os princípios de igualdade e eqüidade, bem como as proposta
de universalização e de focalização dos serviços de saneamento básico. No Capítulo 2 está
apresentado um levantamento das referências sobre o setor nos seus vários aspectos.
O Capítulo 3 descreve a metodologia empregada neste estudo - com o uso da
ferramenta Data Envelopment Analysis - DEA, utilizada no tratamento dos dados levantados.
Traz, também, breve histórico deste método, desde o artigo de Farrel (1957), que introduziu o
conceito de eficiência relativa das empresas, até o desenvolvimento do software utilizado
neste trabalho. Ainda neste Capítulo, encontram-se citados e caracterizados os bancos de
dados, as fontes de extração dos dados e as razões para a escolha das variáveis de demanda
(inputs) e de oferta (outputs). Encontram-se também indicados os cálculos efetuados para
identificação dos outliers – municípios que não devem demarcar a fronteira sob o risco de
geração de distorções indesejáveis, e da ponderação utilizada quando da agregação dos
resultados por Unidade da Federação e por Região.
O Capítulo 4 traz os resultados encontrados e respectiva análise, do ponto de vista do
Estado e da Região, bem como o resultado do cálculo da fronteira da melhor disponibilidade
relativa dos serviços prestados, independente do prestador do serviço. Esses resultados
na focalização das ações de saneamento básico, de forma a reduzir as desigualdades entre os
residentes nas diferentes unidades de federação e regiões do País.
Na conclusão, são apresentadas considerações sobre os resultados encontrados
seguidas de sugestões de estudos e pesquisas futuros. A conclusão também destaca a
importância do uso da metodologia DEA e dos princípios de focalização na formulação de
CAPÍTULO 1 – CONTEXTUALIZAÇÃO DO SETOR SANEAMENTO NO BRASIL
1.1. OS ÚLTIMOS 40 ANOS
A partir de 1964, no governo militar, o saneamento básico passou a receber tratamento
prioritário, quando até então se caracterizava pela forte predominância de serviços municipais.
A partir de 1969, foi implantado o Plano Nacional de Saneamento – PLANASA, cuja
configuração estava voltada para a criação das Companhias Estaduais de Saneamento,
organizadas sob a forma de Sociedades Anônimas. Essa estrutura empresarial se mantém nos
anos 2000, sendo que, em alguns Estados, essas empresas se tornaram exemplos de
excelência, enquanto outras passam por enormes dificuldades econômico-financeiras.
O Plano contava com metas ambiciosas de cobertura dos serviços de água e esgoto e
para a sua implantação foram transferidos recursos da União, por meio do Banco Nacional de
Habitação - BNH que, ao ser extinto, teve seus programas assumidos pela Caixa Econômica
Federal - CAIXA. O Plano incentivava os municípios a passarem, por 30 anos, a concessão
dos serviços de saneamento básico às Companhias Estaduais, por meio de contratos de
concessão, que era padrão para todos os municípios.
O arcabouço financeiro do Plano baseava-se nos recursos do FUNANSA – Programa
de Financiamento do BNH, e dos Fundos Estaduais de Água e Esgoto que, conforme
planejado, à medida que fossem se fortalecendo, com o retorno dos investimentos,
assumiriam os novos investimentos e seria reduzida, gradualmente, a concessão de
empréstimos do BNH. A estrutura do Plano voltava-se para a construção e ampliação dos
sistemas, sem ênfase na operação dos serviços.
Os resultados do PLANASA, até a década de 80, foram significativos. Em 1980, cerca
de 80% da população urbana já contava com abastecimento de água, embora concentrado nas
regiões e cidades mais desenvolvidas. Entretanto, a lógica financeira do Plano trouxe sérios
problemas de saúde financeira para as Companhias, que não primavam pela eficiência.
Acrescente-se à lógica financeira os problemas macroeconômicos enfrentados pelo País,
como o crescimento da inflação, o esgotamento das fontes de financiamento e o final do
período de carência dos empréstimos, consequentemente, o início das amortizações.
No início da década de 90, a questão do saneamento básico voltou a fazer parte da
agenda do governo federal. Foi criada a Secretaria de Saneamento, vinculada ao Ministério da
Ação Social - MAS, e no âmbito do Ministério da Saúde, a FUNASA – Fundação Nacional de
Ação Social foi transformado em Ministério do Bem Estar Social – MBS e extinto dois anos
depois.
Neste mesmo ano, sob o argumento de uma melhor e maior articulação das ações de
saneamento com as de desenvolvimento urbano, foi criada a Secretaria de Política Urbana –
SEPURB, vinculada ao Ministério do Planejamento e Orçamento. Esta elaborou e executou
diversos programas de investimentos no saneamento básico, com recursos do Fundo de
Garantia por Tempo de Serviço – FGTS, além de outras fontes.
Voltado para o diagnóstico do setor e para a modernização das empresas estaduais foi
também implantado, no âmbito federal, o Programa de Modernização do Setor Saneamento –
PMSS, com recursos externos, cujo gestor, a partir de 2003, passou a ser o Ministério das
Cidades. Este Programa tem financiado estudos e ações voltadas para uma melhor e mais
eficiente gestão e investimento de Companhias Estaduais, em particular aquelas com grandes
dificuldades, após o fim do PLANASA. Da mesma forma, o PMSS tem financiado a melhoria
da ação institucional do governo federal no setor, o que propiciou recursos técnicos e
financeiros necessários para a criação e implantação do Sistema Nacional de Informações de
Saneamento – SNIS, além de outros componentes institucionais como, por exemplo, a
contratação de estudos e consultores especializados.
Pena e Abicalil (1997) afirmam que, em 1996, a despeito de tais iniciativas e dos
incrementos verificados na oferta dos serviços, persistia uma expressiva demanda não
atendida, em particular nos extratos sociais de mais baixa renda, nos menores municípios, nas
pequenas localidades e na área rural. As desigualdades regionais continuavam presentes
também nos serviços de saneamento básico. Os índices de atendimentos das regiões mais
pobres, em particular Norte e Nordeste, continuavam bastante inferiores quando comparados
com as regiões Sul e Sudeste, por exemplo..
Em 2003, conforme pesquisa a domicílios (BRASIL, 2003b), é possível observar que
não houve melhoria na abrangência dos serviços de abastecimento de água e rede coletora de
esgoto. Perduram as diferenças regionais e os baixos níveis de cobertura de serviços de
esgotamento sanitário (coleta de esgoto). A Tabela 1 apresenta os resultados da pesquisa, em
2003, comparando-os com os resultados das pesquisas de 1993 e 1998.1
1
Tabela 1 - Percentual de Cobertura de Água e Esgoto por Região
Fonte: BRASIL, 2003b
A Região Sudeste, em 2003, continuava com os melhores percentuais de cobertura2,
tanto de abastecimento de água quanto de esgotamento sanitário, sendo que os indicadores do
Nordeste encontravam-se distanciados dos alcançados nas demais, aproximando-se apenas da
Região Centro-Oeste. Ou seja, a proporção de domicílios dotados de esgotamento sanitário
adequado da Região Centro-Oeste ficou pouco acima da referente à Região Nordeste, e ambas
ficaram muito afastadas dos índices de cobertura das Regiões Sul e Sudeste. Cabe destacar
que a análise dos melhores e piores índices de cobertura não considerou a Região Norte, uma
vez que os índices desta Região não retratam a situação do total dos domicílios, urbanos e
rurais, mas apenas dos urbanos.
Conforme observado nos Gráficos 1 e 2, considerando os três anos, houve pequena
elevação nos níveis de cobertura, mas a distribuição regional não foi alterada. Não houve
melhoria significativa, do ponto de vista das regiões brasileiras.
0.0 20.0 40.0 60.0 80.0 100.0
Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste
Regiões (exceto Norte)
P er ce nt ua is
1993 1998 2003
Gráfico 1 - Percentuais de Cobertura de Água por Região Geográfica Fonte: BRASIL, 2003b
2
O índice de cobertura representa o percentual da população atendida com abastecimento de água, ou poços artesianos e com coleta de esgoto.
1993 1998 2003 Regiões Água
% Esgoto % Água % Esgoto % Água % Esgoto % Norte Urbana 70,0 45,3 70,9 51,2 66,0 55,1
Nordeste 57,0 32,4 64,9 35,8 72,1 44,1
Sudeste 86,9 78,2 88,6 83,8 91,0 86,3
Sul 75,5 59,4 79,3 66,0 83,2 74,9
Centro-Oeste 68,0 36,7 72,6 43,6 77,1 45,4
0.0 10.0 20.0 30.0 40.0 50.0 60.0 70.0 80.0 90.0 100.0
Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste
Regiões
P
erce
n
tu
ai
s
1993 1998 2003
Gráfico 2 - Percentuais de Cobertura de Esgoto por Região Geográfica Fonte: BRASIL, 2003b
1.2. ESTRUTURA DO SETOR
Conforme o DATSUS, em 2002, o País contava com cerca de 22,1 milhões de famílias
nos municípios brasileiros. Considerando que cada família corresponde a um domicilio, 6,9
milhões de famílias, 31% do total, não contavam com nenhum tipo de coleta de esgoto (rede
publica ou fossa séptica). Da mesma forma 1,4 milhão de domicílios carecia de qualquer tipo
de abastecimento de água ou poço artesiano.
Em 2004, a Pesquisa Nacional por Amostras a Domicílios – PNAD (BRASIL, 2004b),
confirma a manutenção desse percentual de atendimento. Num total de 51,7 milhões de
domicílios, 5,5 milhões, 10% do total, continuavam sem abastecimento de água domiciliar.
Os domicílios que não contam com rede coletora de esgoto ou fossas sépticas somam 16,0
milhões, isto é, 31% do total.
Do ponto de vista institucional e de acordo com Parlatore (1999), na segunda metade
da década de 90 a discussão sobre o setor saneamento teve como ponto central a sua
privatização e a definição da titularidade dos serviços nas regiões metropolitanas. Para alguns,
se a regulação e o controle tivessem como preocupação primeira as relações imediatas de
direitos e deveres contratuais entre o poder concedente e o concessionário, e se estes
pudessem contar com formas eficazes de controle social, e com diretrizes gerais e regras
claras entre os agentes relevantes, as perspectivas de desenvolvimento da privatização de
serviços públicos de água e esgoto poderiam ser promissoras.
Para Moreira (2002), movimentos de privatização ocorriam mesmo antes da edição da
Perfuração de Poços, localizada no município de São Carlos, em operação desde maio de
1994, atendendo, atualmente 25.000 habitantes (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS
CONCESSIONÁRIAS PRIVADAS DE SERVIÇOS PÚBLICOS DE ÁGUA E ESGOTO,
2006). Ao final de 1996 já havia mais de 10 editais de licitação para privatização,
concentrados no Estado de São Paulo. Nesse período, o Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social - BNDES agiu pró - ativamente na orientação tanto aos Municípios, na
elaboração de editais, quanto às instituições financiadoras do setor.
Entretanto, tal processo não obteve o sucesso esperado e, em 2002,
registravam-se apenas 15 prestadoras de registravam-serviços locais privados, concentradas na Região Sudeste e
Centro-Oeste. No mesmo ano, essas quinze empresas realizaram investimentos de R$
99,8 milhões, frente ao total de investimentos, dos demais prestadores de serviços
(regionais, locais e micro-regionais), de R$ 2,7 bilhões. Em 2003, o número de empresas
privadas caiu para 13 e os investimentos para R$ 73,5 milhões.
A Tabela 2 traz a quantidade de prestadores de serviços por agrupamento
(regional, micro-regional ou local), a quantidade de municípios atentidos pelos
respectivos prestadores de serviços e da mesma forma a população atendida por água e
por coleta de esgoto.
Tabela 2 - Níveis de atendimento urbano com água e esgoto dos prestadores de serviços participantes do “Diagnóstico 2003”, segundo abrangência
Prestador de
Serviços Qtde nº
Pop. c/ Água (milhões)
Pop.c/ Esgoto (milhões)
Municípios c/ Água
Municípios c/ Esgoto
Regional 25 105.8 77.3 3.886 864
Micro-regional 8 0.6 0.2 22 8
Local 285 26.4 24.3 285 163
Brasil 318 132.9 101.7 4.193 1.035
Fonte: BRASIL, 2003b
Há predominância das Companhias Estaduais, de abrangência regional, no
atendimento global dos serviços com água e esgoto. As empresas estaduais são responsáveis
pelo abastecimento de água de 3.886 municípios, num total analisado de 4.193 municípios.
Também na segunda metade da década de 90, dada a inexistência de um marco
regulatório do setor, que poderia ser um dos fatores inibidores da privatização, destaca-se a
discussão do Projeto de Lei 4.147/01 (BRASIL, 2001) que estabelecia diretrizes gerais para o
e o Projeto de Lei do Senado 266, de 1996 (BRASIL, 1996), representaram tentativas de
regulamentação que se caracterizaram pelo amplo debate e controvérsias. Com este último,
em particular, pretendia-se implantar definitivamente uma regulação para o setor. Entretanto,
o Projeto não conseguiu ultrapassar as barreiras políticas da discussão sobre a titularidade dos
serviços, principalmente no tocante às Regiões Metropolitanas, cuja criação está a cargo dos
Estados, conforme o Artigo 25 da Constituição Federal, de 1988 (BRASIL, 1988).
A regulação do setor voltou a ser fortemente debatida a partir de 2003, e depois de
quatro anos de debates foi aprovada, em 05 de janeiro de 2007, a Lei 11.445, denominada a
Lei do Saneamento. Esta Lei estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico,
agpra com um conceito mais amplo incluindo, além do abastecimento de água e esgotamento
sanitário, a limpeza urbana e o manejo de resíduos sólidos e a drenagem urbana e o manejo
de águas pluviais urbanas. A Lei traz o marco regulatório, ficando a regulamentação a ser
definida por Decreto Presidencial.
1.3. A UNIVERSALIZAÇÃO SOB O PONTO DE VISTA OFICIAL
As metas de universalização no atendimento da demanda essencial dos serviços de
saneamento básico estão presentes nos diversos textos e artigos da Série Modernização do
Setor Saneamento, do governo federal, e em documentos do Ministério do Planejamento e
Orçamento, elaborados sob a coordenação da Secretaria de Política Urbana – SEPURB.
Também estão presentes em artigos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA,
entidade governamental, principalmente, a partir de 1995. O tema também tem sido objeto de
outras publicações nacionais e internacionais, de dissertações de mestrado e teses de
doutorado de universidades brasileiras e estrangeiras.
Em publicação do governo federal (BRASIL, 1995), a demanda, a oferta e as
necessidades dos serviços de saneamento são analisadas e apresentam-se como sugestão de
gestão para a universalização do atendimento, duas estratégias que propiciariam a expansão
da prestação dos serviços:
1) Metas de atendimento progressivo:
- Abastecer 30% da população fora do sistema nos cinco primeiros anos (até 2000); 60% ao
final de dez anos (até 2005); e 100% ao cabo de 15 anos (até 2010);
- Dotar as residências, em todas as etapas, de instalação hidráulica mínima para satisfazer o
consumo de água e as necessidades de higiene e conforto de uma família.
2) Padrões de atendimento, que deveriam ser melhorados por etapas:
- Atender com sistema simplificado de distribuição (abastecimento por chafarizes públicos)
60% da população urbana não atingida por sistemas públicos de água potável, nos cinco
primeiros anos (até 2000); 90% nos oito primeiros anos (até 2003); e 100% em dez anos (até
2005);
- Atender com sistema de distribuição completa (com ligações domiciliares), 100% da
população fora dos sistemas públicos de água, em 15 anos (até 2010);
- Dotar as residências, fora dos sistemas públicos de água, de instalações domiciliares
adequadas, com a seguinte seqüência de atendimento: em cinco anos (até 2000), 60% delas
com, no mínimo, reservatórios para guardar com segurança a água; em dez anos (até 2005),
100% com, no mínimo, reservatórios para guardar com segurança a água;
- Em 15 anos (até 2010), 100% das residências com instalação hidráulica mínima para
satisfazer o consumo de água e as necessidades de higiene e conforto de uma família.
Para o esgotamento sanitário o estudo propõe estratégias semelhantes. Destaca a
relevância da educação sanitária, das instalações internas das residências e da necessidade de
ações paralelas de coleta de esgoto, para que a água abastecida não escorra a céu aberto, com
graves riscos sanitários. Embora as metas tenham sido apresentadas e publicadas por órgãos
do governo federal, estas não se refletiram nos programas e prioridades do governo federal,
estadual e municipal. Mesmo como proposta, o objetivo, já em 1995, era de universalização,
pelo menos do abastecimento de água, até 2005. Os dados e indicadores do setor saneamento,
publicados periodicamente, como a Pesquisa Nacional por Amostrade Domicílios – PNAD, e
o Diagnóstico dos Serviços de Água e Esgotos, do Sistema Nacional de Informações sobre
Saneamento – SNIS, demonstram que, nem mesmo no abastecimento da água, esse objetivo
foi atingido. Em alguns estados essa meta está bastante próxima, mas, se considerado o País,
o alcance da meta está bem mais distante.
Em 1999, em nova publicação oficial (BRASIL, 2002) pode ser encontrado um
registro das visões de alguns especialistas do setor, expressas por meio de entrevistas e de
artigos. O documento descreve a situação vigente naquele ano, buscando subsidiar as políticas
para o setor, no âmbito de um novo mandato presidencial que se iniciava. O estudo apresenta
classe, dirigentes governamentais e de empresas públicas e privadas relacionadas com a área
de saneamento, legisladores, instituições financeiras, prefeitos e sindicalistas. Traz também 7
(sete) artigos sobre o setor saneamento nos quais, de forma genérica, o foco é o déficit
daqueles serviços e a questão da universalização.
O Presidente da República, eleito em 2002, criou o Ministério das Cidades, que tem
como Missão, “assegurar os direitos humanos fundamentais de acesso à água potável e à vida
em ambiente salubre nas cidades e no campo, mediante a universalização do abastecimento de
água e dos serviços de esgotamento sanitário, coleta e tratamento de resíduos sólidos [...].”
(BRASIL, 2003a).
No âmbito do Ministério das Cidades, foi feito estudo (BRASIL, 2003a) sobre as
necessidades de investimentos para a universalização dos serviços de abastecimento de água e
de coleta e tratamento de esgoto sanitário no Brasil, cujo objetivo foi estimar o crescimento
populacional e os investimentos anuais necessários para a meta de universalização. Com base
nos dados censitários da população, de 2000, foi estimada a população para os anos de 2005,
2010, 2015 e 2020, e a demanda dos serviços de saneamento básico.
Com essas estimativas foram calculados os investimentos necessários à
universalização dos serviços de saneamento básico no Brasil até 2020. As demandas estão
apresentadas como retratos instantâneos datados, ou seja, as que se referem a um determinado
ano equivalem à necessidade correspondente à eliminação do déficit naquele ano. Os
investimentos necessários a essa meta, conforme a estimativa, são de R$ 178 bilhões,
iniciando em 2000, até 2020. Ao divulgar o estudo, o Ministério das Cidades não apontou a
estratégia para a captação e aplicação de recursos.
Em 2003, o governo retomou a discussão do reordenamento institucional do setor
saneamento, denominando-o de Saneamento Ambiental, onde estão incluídos não apenas o
abastecimento de água e a coleta e tratamento do esgoto, mas também a coleta e destinação
final dos resíduos sólidos e a drenagem urbana. Com a criação do Ministério das Cidades, a
Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental, após a Conferência Nacional das Cidades,
declarou a intenção de forte retomada dos investimentos em saneamento ambiental, e
coordenou a elaboração de proposta do marco regulatório para o setor, por meio de um
Ante-Projeto de Lei. No texto da proposta, mais uma vez, surge o objetivo de atingir a
universalização do saneamento ambiental no País.
Assim, tanto nas ações como nas propostas e discussões a respeito da regulação, é
freqüente o uso do termo universalização dos serviços sem que possam ser identificadas
políticas para o setor não se caracterizam pelo foco no maior atendimento com equidade, seja
no nível estadual ou regional. Esta dissertação propõe a focalização das políticas públicas na
redução do déficit relativo dos municípios, de forma a torná-los mais equânimes.
CAPÍTULO 2 – LEVANTAMENTO DE REFERÊNCIAS DO SETOR
No trabalho de revisão da literatura, foram encontradas publicações nacionais e
internacionais sobre saneamento básico, que enfocam os diversos aspectos do setor. Os textos
para discussão e as publicações levantadas trazem diagnósticos do setor; análises do processo
de privatização dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário no Brasil e em
outros países, como por exemplo, Inglaterra; discussões sobre regulação; análises sobre a
eficiência dos prestadores de serviços públicos e privados, de forma específica e comparativa
e estudos que usam o método DEA para análise da eficiência dos prestadores de serviços.
2.1. DIAGNÓSTICOS SOBRE O SETOR SANEAMENTO BÁSICO
Foram analisados, além da Série Modernização, os Diagnósticos dos Serviços de Água
e Esgostos dos anos de 2000, 2001 e 2002, e as respectivas publicações da Visão Geral da
Prestação dos Serviços de Água e Esgotos, todos do Programa Modernização do Setor
Saneamento – PMSS, do Ministério das Cidades.
No âmbito governamental e internacional, destaca-se a Declaração do Milênio
(NAÇÕES UNIDAS, 2000) e as suas Metas. Este documento foi assinado por 191 Nações,
inclusive o Brasil, onde foram acordados os Objetivos de Desenvolvimento da Declaração do
Milênio3. Um de seus objetivos refere-se à garantia de sustentabilidade do meio ambiente. A
este foi incorporada como meta a redução à metade, até o ano de 2015, da proporção de
pessoas que não têm acesso a água potável segura e, até o ano de 2020, atingir melhoria
considerável nas condições de vida de pelo menos 100 milhões de habitantes. O indicador da
primeira meta é a proporção da população com acesso sustentável a melhores fontes de
abastecimento de água em zonas urbanas e rurais. O da segunda é a proporção da população
com acesso a melhores serviços de saneamento.
Pena e Abicalil (1997) elaboraram um diagnóstico, sob o ponto de vista do déficit de
atendimento à população, das necessidades de investimentos no setor, apresentando sugestão
de uma Política Nacional de Saneamento e uma agenda para o saneamento nos anos
3
seguintes. Analisaram a realidade do déficit de saneamento no Brasil e os desafios do setor,
numa perspectiva da nova Política Nacional de Saneamento. Considerando o saneamento
como serviço público essencial e, portanto, de responsabilidade pública, destacaram a
importância da organização e capacitação do Estado na sua regulação e controle, assegurando
o envolvimento e a participação da sociedade. Com os dados do IBGE – PNAD 1996
(BRASIL, 1996) – apresentam um déficit total de 22,4% em rede de água e de 56,9% em rede
de esgoto. Percentuais que representavam, principalmente, o atendimento à população urbana,
pois o déficit rural representava 80,2% e 81,8%, em água e esgoto, respectivamente.
Silva e Alves (1997) publicaram artigo sobre o saneamento das águas no Brasil,
tratando dos níveis de atendimento dos serviços de água e esgoto. Apresentaram um
panorama dos serviços de saneamento básico, da organização do setor e dos objetivos da
Política Nacional de Saneamento, na década de 90, assim como as estratégias adotadas para a
reforma do setor e dos investimentos realizados e previstos para o período 1995-98, com
vistas à universalização dos serviços. Após relatar as realizações daquele período,
apresentaram propostas e perspectivas para o saneamento básico. Foi destacada a importância
da institucionalização da regulação para o aumento da qualidade e da eficiência dos serviços.
Apontaram também a necessidade de foco no atendimento à população de baixa renda e no
esgotamento sanitário, bem como a necessidade de um novo padrão de financiamento do
setor, envolvendo melhores tarifas, investimentos públicos e privados.
2.2. A QUESTÃO INSTITUCIONAL E REGULAÇÃO DO SETOR
Se os anos 90 foram marcados por estudos de diagnósticos e propostas de políticas no
setor saneamento, a década atual tem sido rica em estudos sobre o setor saneamento, com
enfoque nas questões institucionais, de regulação e de eficiência na prestação dos serviços.
A necessidade e a dificuldade na implantação de reformas no atendimento à população
com os serviços públicos, em particular com a prestação de serviços de saneamento básico,
tem sido alvo de novas teorias. Spiller e Savedoff (1999) definiram Equilíbrio de Baixo Nível
- EBN como resultante das políticas desenvolvidas em alguns países da América Latina.
Faria, Nogueira e Mueller (2002) analisaram as condições do EBN para o caso do Brasil. Os
resultados deste estudo podem ser resumidos: i) com exceção dos estados de São Paulo,
Minas Gerais e suas respectivas regiões metropolitanas, assim como o Distrito Federal e a
região metropolitana de Curitiba, a qualidade dos serviços de abastecimento urbano de água e
municipais, no tocante ao atendimento, são melhores que os prestados pelas Companhias
estaduais de saneamento básico (CESB’s); iii) as concessões ao setor privado ainda não
proporcionaram melhorias significativas para o setor; iv) na maioria dos casos analisados, as
tarifas não cobrem o custo dos serviços por metro cúbico; v) o setor continua dependendo de
recursos não-onerosos; vi) a falta de um modelo institucional e regulatório no âmbito federal
possibilita um equilíbrio de baixo nível; vii) a falta de investimentos privados no setor não é
explicada predominantemente pela instabilidade política do país; viii) o caso brasileiro
apresenta a particularidade de que a compressão das tarifas é, muitas vezes, subordinada às
políticas antiinflacionárias; e ix) a heterogeneidade da renda no Brasil deixa mais evidente
que a questão da qualidade dos serviços está, em última instância, condicionada pela própria
condição de subdesenvolvimento do país.
Faria, Faria e Mota (2003) fizeram estudo visando responder à importante questão: os
serviços de saneamento no Brasil que apresentam bons índices de atendimento são
sustentáveis no longo prazo? Para isso elaboraram uma extensão à Teoria do Equilíbrio de
Baixo Nível de Spiller e Savedoff (1999). Partiram das hipóteses dessa Teoria e ampliaram
suas conclusões argumentando que, mesmo aquelas empresas com bons índices de
atendimento à população não estariam imunes à possibilidade de cair no equilíbrio de baixo
nível. O estudo traz ainda a análise de caso da Companhia de Saneamento do Distrito Federal
– CAESB, sendo que o mesmo pode ser extrapolado para outras companhias que operem num
ambiente institucional semelhante. Para os autores é importante mostrar que o Equilíbrio de
Alto Nível se torna muito difícil de ser mantido numa condição de estagnação econômica, de
concentração de renda, de dívida pública elevada e de outras mazelas macroeconômicas.
Recentemente, Motta e Moreira (2005) apresentaram importante contribuição para o
debate sobre a regulação dos serviços de saneamento no Brasil. O texto discute a eficiência da
regulação no setor à luz dos debates de proposta encaminhada pelo Governo Federal ao
Congresso Nacional. Conforme os autores, o saneamento brasileiro ainda enfrenta a
controvérsia sobre em que nível de governo reside o poder concedente e como o setor privado
pode operar neste setor sem ferir os seus objetivos sociais. O estudo mostra que essas não são
as principais barreiras ao desenvolvimento do saneamento básico no País, quando se analisa o
desempenho da produtividade dos operadores dos serviços. Parte da premissa de que os
operadores de água e esgoto fornecem múltiplos serviços, em proporções e custos distintos e,
usualmente, a um único preço. Assim, as razões diretas produto/insumo não são aplicadas
para a mensuração da eficiência para cada produto. Para lidar com isso, fizeram o uso da
como base de dados as informações do SNIS de 1998-2004. Os resultados encontrados
demonstraram que os operadores regionais beneficiam-se das economias de escala, contudo
têm o mais baixo nível de produtividade total. Autarquias municipais têm o mais alto nível de
eficiência e praticam tarifas mais baixas. Entretanto, quando estimadas as variações de
produtividade, no período analisado, os operadores locais públicos e privados apresentam a
mesma variação positiva dos níveis de produtividade total. Os operadores regionais
permanecem lá atrás. Os resultados indicam que a renda monopolista não é compartilhada
com os usuários, uma vez que os ganhos de produtividade não representam reduções de
tarifas. Portanto, para os autores, o debate sobre poder concedente e sobre administração
pública e privada está mal colocado. As evidências mostram que na ausência de incentivos à
eficiência, os operadores dissipam o seu potencial de produtividade e aplicam tarifas mais
altas.
2.3. PRIVATIZAÇÃO DO SETOR
Outros estudos estão voltados para a privatização do setor e para a dicotomia serviços
de saneamento básico públicos ou privados, com foco tanto na propriedade quanto na
eficiência dos serviços.
Feigenbaum e Teeples (1983) publicaram estudo comparativo dos serviços de
abastecimento de água de empresas públicas e privadas dos EUA. Foram avaliadas 57
empresas do setor privado e 262 do setor público, participantes da American Water Works
Association - AWWA. Partiram do pressuposto de que estudos anteriores apresentavam
resultados conflituosos e não conclusivos quanto à variação sistemática na estrutura de custos
dos serviços públicos em função do tipo de propriedade. Tais inconsistências poderiam ser
parcialmente explicadas pelas diferenças na especificação do processo de produção dos
serviços públicos tais como imprecisões na medida de produção dos serviços; arbitrária
especificação da tecnologia e omissão de fatores de preços relevantes. Concluíram que a
metodologia de comparação das funções de custos da distribuição de água dos serviços
públicos e privados podem, erroneamente, atribuir à propriedade variações de custos, se a não
especificação da função custo resultar na omissão de variáveis que sistematicamente variam
com o tipo de propriedade. O estudo indica que uma função de produção Cobb-Douglas
somente é adequada se a natureza multidimensional do abastecimento de água for incorporada
ao modelo. O uso de uma abordagem hedônica trouxe grande avanço na explicação das
hedônica. Entretanto, em ambas as formulações não foi encontrada diferenças significativas
na função custo de operação dos serviços públicos e privados.
Byrnes, Grosskopf and Hayes (1986), partindo do mesmo pressuposto de Feigenbaum
e Teeples (1983), apresentaram estudo comparando a eficiência dos serviços de abastecimento
de água de 68 empresas públicas e 59 privadas, dos EUA, com os dados da American Water
Works Association - AWWA. Utilizando a abordagem da função custo, e com o uso de
técnicas de programação, não encontraram diferenças significativas na eficiência daqueles
serviços pelo tipo de propriedade, se pública ou privada. A abordagem dos autores difere das
anteriores por dois motivos: pela medida da eficiência diretamente em termos das relações de
produção, mais do que pela estimativa da função de custo, e pelo uso de técnicas de
programação linear, não assumindo uma forma funcional e estimando uma função estocástica.
O uso de programação linear tem algumas vantagens, em comparação à abordagem
estocástica. O método permite construir a fronteira da produção sem impor restrições
artificiais impostas pela forma funcional. Restrições não adequadas implicam em não
especificação que pode confundir diferenciais de custo e produtividade pelo tipo de
propriedade. O estudo conclui que a eficiência de escala, tanto das empresas privadas quanto
das empresas públicas, é melhor do que a eficiência técnica. Em ambas as eficiências – de
escala e técnica – a performance das empresas privadas é ligeiramente melhor do que a
eficiência das empresas públicas.
Bharracharyya, Parker e Raffiee (1994) examinaram o comportamento dos prestadores
de serviços de abastecimento de água públicos (225) e privados (32) americanos pela
estimativa da função custo variável generalizada, contendo as características regulares da
função custo neoclássica, sem requerer que a minimização de custo, sujeita aos preços de
mercados, seja imposta como uma hipótese. Assumindo que os preços não observados
refletem o ambiente regulatório da indústria de água, testes para minimização de custos são
obtidos pela derivação de preços não observados em função de preços de mercado. Os
resultados empíricos evidenciam que serviços públicos de abastecimento de água da amostra
são mais eficientes que os serviços privados, em média, tanto tecnicamente, como no uso de
variáveis de inputs de trabalho, energia e materiais. Porém, as empresas privadas de
abastecimento de água são mais consistentes nos seus graus de eficiência, ou seja, as
empresas públicas são mais amplamente dispersas entre melhores e piores práticas.
Parlatore (1999) descreveu a estrutura institucional do setor saneamento e discutiu a
viabilidade e as premissas para o processo de privatização. Sobre o mesmo tema, Moreira
privatização de operadoras dos serviços municipais. O estudo concluiu que o processo de
privatização é inevitável para a eficiência e viabilidade dos investimentos do setor.
Estache e Rossi (2002) ressaltaram que as políticas públicas nos países desenvolvidos,
ávidos em resolver o debate de mais de uma década sobre os ganhos da privatização dos
serviços abastecimento de água, estão crescentemente interessadas na avaliação da eficiência
desses serviços, sejam de propriedade pública ou privada. Afirmam que os estudos recentes
deixaram a impressão de que não existe evidência da superioridade de um serviço sobre o
outro (público vs privado). O artigo contribui para o debate, de forma mais evidente,
estimando uma fronteira estocástica com os dados de 1995, de uma amostra de 50
companhias de água, em 29 países da Ásia e da Região do Pacífico. Devido aos conflitos da
evidência empírica, o autor traz como assuntos chave do artigo a justificação dos modelos e a
sua robustez. Esse estudo aplica duas abordagens para medir eficiência: componentes de erros
e efeito técnico de eficiência, e aplica testes para as diferentes especificações. A análise
confirma os resultados dos Estados Unidos e sugere que a eficiência não é significativamente
diferente nas companhias públicas e privadas. O estudo não conclui sobre qual dos dois
serviços é mais eficiente, mas afirma que o serviço privado não é necessariamente mais
eficiente que o serviço público de abastecimento de água. A não conclusão do estudo
comparativo reflete o fato de que é mais importante melhorar a competitividade das empresas,
sejam elas públicas ou privadas, do que se preocupar com a propriedade das mesmas.
Estache e Trujillo (2003) analisam o governo nacional da Argentina e da maioria de
suas províncias, no contexto das reformas dos serviços de água e esgoto, durante os anos 90.
Mostram que é possível verificar que várias companhias de água da Argentina obtiveram
ganhos de eficiência técnica. Em duas províncias, nas quais os dados estavam disponíveis, os
ganhos de eficiência foram de 2% ao ano. Os autores questionam, porém, se esses ganhos são
sustentáveis, ou seja, se serão mantidos após os efeitos das reformas.
Renzetti e Dupont (2003) avaliam, de forma crítica, como é conhecida na literatura da
teoria econômica a relação entre os serviços privados e públicos de água. Conforme os
autores, argumentos teóricos levam a certa propriedade dos serviços, à escolha pública e a
modelos de agente principal, enfatizando a dificuldade que os governos têm em monitorar e
prover incentivos próprios para a administração dos serviços públicos. Esses modelos
predizem que os serviços privados de água são superiores em performance aos serviços
públicos de água. Entretanto, esses modelos têm suas limitações e críticas. Assim, foram
tomadas as evidências empíricas dos Estados Unidos, Inglaterra e França, revelando que não
os serviços privados de água levam a aumentos não ambíguos na performance. Porém, existe
alguma evidência que as parcerias público-privadas nesses países devem facilitar uma
operação eficiente e sustentável desses serviços. O artigo conclui pelo exame das condições
que promovem o sucesso da parceria público-privada. Os autores trazem um quadro
comparativo de diversos artigos sobre o assunto.
Faria, Souza e Moreira (2005) compararam a eficiência técnica das companhias
públicas e privadas de abastecimento de água brasileiras. Para medir a eficiência, estimaram
um modelo de fronteira estocástica de produção, usando duas distribuições competitivas para
o componente erro da ineficiência: truncado normal e exponencial. A distribuição exponencial
se mostrou mais adequada e foi usada para avaliar as diferenças na eficiência técnica entre as
empresas públicas e privadas Os resultados estatísticos demonstram que as companhias
privadas são apenas marginalmente mais eficientes que as públicas.
Faria, Faria e Moreira (2006) fizeram uma comparação de performance dos serviços
de saneamento básico (água e esgoto) no Brasil, prestados por instituições públicas e
concessionários privados. Os resultados demonstram que as empresas privadas, em média,
apresentam maior produtividade do trabalho e do capital, em ambos os serviços. Apresentam
também melhores indicadores no atendimento de abastecimento de água. O mesmo não
ocorre com a performance financeira e com o nível de atendimento nos serviços de esgoto.
Nestes casos, os concessionários privados não apresentam melhores indicadores que as
instituições públicas. O trabalho conclui que um eventual processo de privatização no Brasil,
no setor saneamento básico, por si só, não garante a melhoria dos serviços prestados, visto em
todos os seus aspectos. Os resultados encontrados podem orientar e prescrever políticas
públicas naquele setor. Alertam, porém, para a necessidade de uma estratégia geral de
regulação, caso o caminho da privatização seja o escolhido.
Souza, Faria e Moreira (2007) avaliaram os custos da oferta de água das companhias
públicas e privadas de abastecimento de água brasileiras. Para medir a eficiência usaram um
modelo de fronteira estocástica derivado de uma especificação similar a Cobb-Douglas
incluindo um termo quadrático no logaritmo de produção. Os parâmetros do modelo foram
estimados usando os dados das empresas brasileiras no ano de 2002. As inferências
estatísticas levaram à conclusão de que não existem evidências de que as firmas privadas e
públicas são significativamente diferentes em termos de medidas de eficiência.
Faria et al. (2007) compararam o desempenho econômico-financeiro e de atendimento
entre companhias estaduais (regionais) e empresas locais (municipais) de saneamento básico
um dos grupos é, em média, melhor do que o outro grupo em todos os aspectos. A avaliação
depende tanto dos indicadores considerados, quanto do tipo de serviço prestado. Mesmo
assim, alguns aspectos foram observados, podendo afirmar que as empresas regionais
apresentam maior produtividade do trabalho no sistema de água e maior produtividade do
capital no esgoto. Por outro lado, as empresas locais possuem maior produtividade do
trabalho no sistema de esgoto e melhor performance financeira nos serviços de abastecimento
de água. No atendimento, as empresas locais apresentam melhor performance..Quando
tomados todos os indicadores, em conjunto, as empresas regionais se apresentam melhores na
prestação dos serviços de água. No esgotamento sanitário não há diferença significativa.
Concluem que os resultados não permitem defender uma orientação política para a
descentralização e nem para regionalização de todos os serviços.
2.4. A EFICIÊNCIA DO SETOR E USO DO DEA
Com o foco na gestão das empresas regionais de saneamento básico brasileiras,
Alencar Filho (2003) avaliou o desempenho das Companhias Estaduais de Saneamento
Básico - CESB´s, por meio de metodologia alternativa denominada “Valor Econômico
Agregado” (Economic Value Added – EVA), compatível com o modelo de “Fluxo de Caixa
Descontado”. Os dados utilizados foram coletados nos demonstrativos financeiros, de 1998 a
2001, das 26 CESB’s avaliadas. O autor conclui que a partir das dimensões operacional,
financeira e econômica a contribuição ineficaz dos gestores daquelas empresas, para elevar o
resultado econômico, sugere haver a necessidade de reformulação no modelo de gestão das
CESB’s, em particular quanto aos aspectos operacional e financeiro, o que poderia ser feito a
partir de uma maior inversão do capital.
Estudos recentes têm utilizado o método DEA para analisar a eficiência dos
prestadores de serviços de saneamento básico, sejam estes companhias locais, regionais ou
municipalidades, isto é, quando os serviços são prestados pela administração direta
(autarquias) do município, sem a criação de uma empresa.
A eficiência das Companhias Estaduais de Saneamento Básico – CESB’s, com o uso
do método DEA, foi objeto de estudo elaborado por Castro (2003) e teve como objetivo
principal testar a aplicabilidade do método na análise do setor. O trabalho usa a base de dados
do SNIS para extrair as informações do ano de 2000 de todas as operadoras de serviços, sejam
elas de abrangência regional, micro-regional ou local. Foram avaliadas e comparadas
responsáveis pela prestação daqueles serviços. O estudo não distingue o setor público do
privado na amostra global, uma vez que o objetivo maior é verificar a aplicabilidade do
método e não, necessariamente, avaliar a eficiência de empresas privadas em relação às
companhias regionais públicas ou ainda órgãos públicos. Por isso, não traz a nominação das
operadoras da amostra, se limitando a denominá-las de C1, C2, C3,..., C26. Assim, não é
possível avaliar a característica administrativa das prestadoras de serviço, que se encontram
na fronteira da eficiência, traçada com o uso do DEA.
O mesmo método – o DEA – e a mesma fonte de dados – o SNIS – foram utilizados
por Carmo e Távora Júnior (2003) para avaliar a eficiência técnica das empresas de
saneamento brasileiras, de âmbito regional – CESB’s, e fornecer pistas para o aumento da
produtividade. O estudo apresentou como resultado 21 empresas eficientes no modelo DEA-V
(retornos variáveis de escala) e 15 empresas no modelo DEA-C (retornos constantes de
escala). O percentual de empresas que apresentaram eficiência de escala foi de 57,69%.
Quanto à localização das empresas, foi observado que a região mais eficiente é a Região
Sudeste, seguida pelas regiões Sul, Centro-Oeste, Norte e Nordeste. Este resultado está
diretamente relacionado com a eficiência das empresas conforme ranking de eficiência
relativa apresentado no estudo. Os autores recomendaram, porém, a comparação com outros
setores e o uso de outros métodos, tendo em vista que o resultado encontrado não é absoluto,
isto é, trata da eficiência relativa entre as próprias empresas da amostra. Esse estudo
apresentou uma maior eficiência relativa na Região Sudeste, onde estão localizadas as
maiores e melhor estruturadas Companhias Estaduais de Saneamento Básico.
Em artigo semelhante, Tupper e Rezende (2004) analisaram a eficiência relativa das
Companhias de Saneamento no Brasil, durante o período de 1996 a 2000, onde foram
encontrados os escores, com o uso do DEA, indicando um desempenho sub-ótimo das
Companhias Estaduais de Saneamento, em relação às companhias locais públicas e privadas.
Os autores sugeriram uma melhoria do desempenho por meio de mudanças na jurisdição,
afirmando a necessidade de se obter medidas específicas de retornos de escala das Unidades
Tomadoras de Decisão - DMU, que apontem padrões de anomalia, os quais indicariam a
direção das mudanças institucionais necessárias. Por exemplo, se alguma DMU apresentasse
retornos decrescentes de escala deveria ser sugerida sua fragmentação empresarial.
O método DEA também tem sido utilizado para traçar fronteiras de eficiência sob o
ponto de vista da disponibilidade dos serviços pelos prestadores à população,
independentemente da propriedade do prestador do serviço, se local, regional, público ou
O estudo feito por Puig-Junoy (1999) analisa o problema da evolução das
desigualdades na distribuição geográfica das demandas por serviços públicos. O objetivo do
trabalhofoi apresentar um modelo de alocação de recursos para os serviços públicos regionais
cuja solução levaria à máxima disponibilidade relativa daqueles serviços, localizada abaixo da
melhor disponibilidade – a fronteira -, sujeita à restrição orçamentária, que é exógena, e da
igualdade de acesso para critérios de necessidades iguais. Para isso, utiliza método de
programação linear, como o DEA, e ilustra os efeitos da aplicação deste método para a
alocação de recursos financeiros, tendo por base a distribuição dos recursos, voltados para a
saúde, entre as Comunidades Autônomas Espanholas.
Gasparini e Ramos (2004) analisaram a saúde nos Estados e Regiões brasileiras, com o
uso do DEA, e elaboraram uma medida do déficit relativo de serviços de saúde entre os
Estados brasileiros, tomando por base diversos indicadores de oferta e demanda de serviços
nessa área. Foi estimada uma fronteira de melhor disponibilidade de serviços para idênticas
necessidades, por meio da qual foram avaliadas as diferenças existentes entre os Estados do
País, com base no princípio da eqüidade.
A metodologia e os procedimentos destes dois estudos são semelhantes aos utilizados
CAPÍTULO 3 – METODOLOGIA
3.1. ANÁLISE DE ENVOLTÓRIA DE DADOS (DATA ENVELOPMENT ANALYSIS) – DEA
Os estudos na área do DEA - Data Envelopment Analysis tiveram como marco inicial
o trabalho de avaliação de firmas feita por Farrel (1957). O trabalho de Charnes, Cooper e
Rhodes (1978), tendo como base o marco inicial, é uma extensão da Teoria, representando o
desenvolvimento da técnica com base em programação matemática. Voltados para a avaliação
de escolas públicas americanas, os autores propuseram um modelo de avaliação visando
reduzir os gastos com os insumos sem alterar a produção, ou seja, uma avaliação voltada para
insumos. Assim, surgiu o primeiro modelo de DEA que, dada a suposição de retornos
constantes de escala, passou a ser denominada DEA-CRS, em referência a Constant Returns
of Scale, ou simplesmente como DEA-CCR, em homenagem aos autores.
Bankers, Charnes e Cooper (1984), por sua vez, propuseram um modelo que considera
retornos variáveis de escala, permitindo que os retornos sejam constantes, crescentes ou
decrescentes na fronteira eficiente e denominaram DEA-VRS (Variable Returns of Scale) ou
DEA-BCC, seguindo as iniciais dos autores. Conforme relatam Seiford e Thrall (1990), que
fazem uma excelente resenha dos trabalhos publicados, já em 1990, existiam mais de 400
artigosna literatura com análises e extensões do DEA.
No Brasil, a metodologia tem sido aplicada em diversas áreas, principalmente no setor
público e em instituições sem fins lucrativos4. A aplicação do DEA, como medida de
eficiência dos prestadores de serviços do setor saneamento no Brasil, é recente, mas já estão
publicados trabalhos com o uso do método. Castro (2003) testou o método no setor
saneamento. Carmo e Távora Júnior (2003) e Tupper e Rezende (2004) avaliaram a eficiência
técnica das empresas de saneamento brasileiras, de âmbito regional – CESB’s. Ambos usaram
os dados do SNIS. Buscando discutir e propor melhoria nas políticas de alocação de recursos
públicos, e também com o uso do DEA, Puig-Junoy (1999) analisa o problema da evolução
das desigualdades na distribuição geográfica das demandas por serviços públicos.
Entre as vantagens do método DEA no presente estudo, destaca-se o fato de que o
mesmo permite a utilização de múltiplos insumos (necessidades) e múltiplos produtos (oferta) 5
. Por ser um método não-paramétrico, não requer a imposição de uma forma funcional para a
função de produção. Além disso, esse método possibilita uma análise comparativa, onde cada
4
Alguns exemplos são Paiva e Lima (1999), no setor de transporte; Gasparini e Ramos (2004) na área de saúde; e Gasparini e Ramos (2003), em educação.
5
município, Unidade Tomadora de Decisão - DMU, ao ser avaliado, é comparado à melhor
prática observada entre os demais.
Nesta dissertação, ao traçar a fronteira da melhor disponibilidade dos serviços de
saneamento básico, frente às necessidades da população, é utilizada a abordagem proposta por
Puig-Junoy (1999) na aplicação do método DEA. Esse método tem sido mais comumente
usado para medir fronteira de eficiência técnica ou alocativa. Porém, a aplicação do DEA
oferece vantagens na avaliação e proposta de melhorias de serviços cuja aplicação e alocação
dos recursos são descentralizadas, como no saneamento básico. Neste estudo, é considerado
um conjunto de variáveis que refletem as necessidades e o atendimento dos serviços de
saneamento básico nos municípios brasileiros. Com esses dados é construída a fronteira de
melhor disponibilidade desses serviços para idênticas necessidades da população.
Ter a melhor disponibilidade relativa de serviços prestados (oferta) significa estar na
fronteira, ao passo que as piores ofertas, ou níveis de atendimento inferiores, observados nos
Municípios, podem ser identificados por meio do distanciamento destes em relação à
fronteira. Por todas essas características, o método DEA é a melhor alternativa para esta
análise.
3.2. FORMULAÇÃO GERAL DO MÉTODO DEA
Conforme Seiford e Thrall (1990), estimar uma fronteira eficiente tornou-se objeto de
interesse dos pesquisadores desde o clássico artigo de Farrell (1957), que marcou os estudos
sobre produção eficiente. Na teoria microeconômica clássica, o conceito de uma função de
produção é a base para a descrição das relações entre insumos e produção de uma firma.
Em geral, em economia, são duas as abordagens ou paradigmas usados para estimar as
fronteiras da eficiência. A abordagem paramétrica e a abordagem não paramétrica, iniciada
por Charnes, Cooper and Rhodes (1978) com o método Data Envelopment Analysis - DEA. O
DEA é uma técnica alternativa para extrair informações a partir de um conjunto de
observações. Contrariamente à abordagem paramétrica, o DEA não requer a suposição de
uma função de produção. Na abordagem não paramétrica a eficiência de uma empresa ou
município – decision making units – DMU é medida em relação a todas as outras DMU’s com
a simples restrição de que todas elas estejam na fronteira eficiente ou abaixo dela. Ao
contrário dos métodos paramétricos, cujo objetivo é otimizar um plano de regressões simples
amostra, calculando uma fronteira determinada pelo conjunto Pareto-eficiente das unidades
avaliadas.
Em síntese, o foco do DEA está nas observações individuais representadas pelas “n”
otimizações, uma para cada DMU, não tendo foco nas médias e estimativas de parâmetros que
estão associadas com as técnicas e aproximações estatísticas (CHARNES et al.,1994).
A aproximação paramétrica requer, além da imposição de uma função de produção e
sua forma funcional, que sejam relacionadas as variáveis independentes com as variáveis
dependentes e se assumam hipóteses específicas sobre distribuição de erros e diversas outras
restrições. O DEA não necessita da suposição de nenhuma forma funcional, e é capaz de
calcular a máxima medida de desempenho para cada DMU relativa a todas as outras DMU’s
no conjunto de observações, tendo como requisito único que cada DMU esteja sobre a
fronteira de eficiência ou abaixo dela. Se considerarmos que níveis de consumo e produção
podem ser encontrados no conjunto de referência, que dominam de forma estrita a DMU em
teste, então a unidade testada é ineficiente. Por outro lado, uma DMU é eficiente se nenhuma
outra DMU (ou combinações lineares convexas de DMU’s) no conjunto de referência seja
capaz de produzir maior quantidade de outputs com a mesma quantidade de inputs, ou o
mesmo nível de outputs com menor quantidade de inputs. A Figura 1 abaixo traz um exemplo
dessa comparação.
Figura 1- Projeção da DMU na fronteira eficiente Fonte: Castro (2003)
A Figura 1 apresenta um conjunto de unidades P1, P2 , ...., P6 sendo que cada uma
delas consome a mesma quantidade de um único input e produz diferentes quantidades de