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PROBLEMAS NA CARACTERIZAÇÃO DA CLASSE DOS ADVÉRBIOS: O CASO DO ASSIM Giovanna Mazzaro VALENZA (G- UFPR)

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Academic year: 2021

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PROBLEMAS NA CARACTERIZAÇÃO DA “CLASSE” DOS ADVÉRBIOS: O CASO DO ASSIM Giovanna Mazzaro VALENZA (G- UFPR)

ABSTRACT: In this work, I intend to focus on one of the adverbs which do not follow the traditional classification rules – the adverb “assim” –, by the analysis of its various occurrences and possible sub-classification, based on the different functions that it takes on the sentence’s structure.

KEYWORDS: adverbs; assim; anaphora ; cataphoresis .

0 INTRODUÇÃO

Ao longo dos nossos anos de escola, aprendemos a falar e a escrever nossa língua tendo como base a gramática tradicional. Consideramos essa gramática a única forma “correta” de aprendizado da língua portuguesa e procuramos seguir suas regras. Essa imposição acaba fazendo com que aceitemos o que n os é dado, sem possibilidade de refletir acerca dos paradigmas sobre os quais a gramática tradicional está construída. E, muitas vezes, não percebemos que a gramática tradicional apresenta incoerências. As classes de palavras, por exemplo, já geraram muita discussão quanto aos seus critérios de definição.

Este trabalho se propõe a estudar uma expressão pertencente a uma dessas classes – a dos advérbios – a qual, segundo alguns autores, nem poderia ser propriamente nomeada como uma classe. Os advérbios são especialmente incertos quanto à sua classificação e merecem um estudo isolado e aprofundado, pois apresentam vários problemas. Pretendo enfocar um deles – o assim –, e estudá-lo de forma aprofundada.

Segundo Ilari et alii (1991: 69), o assim “pertence a um grupo de elementos que não atendem aos critérios tradicionais e que, no entanto, são tradicionalmente classificados como advérbios”. Essa classificação foi o ponto de partida para uma pesquisa mais abrangente. Ao analisar os dados coletados através do BANCO DE DADOS LINGÜÍSTICOS “VARSUL”, com falantes de Curitiba, foi possível observar que o caso do assim era muito mais complexo e que exigia uma subclassificação mais exata.

Neves (2000: 241-243) classifica o assim como um advérbio de modo – i. e., qualificador de uma ação, um processo ou um estado, ou modificador de propriedades de verbos e adjetivos –, que tem natureza pronominal e funciona como referenciador textual (anafórico ou catafórico); pode incidir sobre um substantivo, na mesma posição sintática de um adjetivo, e ainda indicar grande quantidade. Em todos os exemplos apontados por Neves, exceto os que tratam de expressão de grande quantidade,

(1) Essa estrebaria está assim de pulgas. [assim = cheia, com muitas]

o assim pode ser substituído por “dessa maneira / desse modo”:

(2) Não custa muito dizer “sim senhor, padrinho”. No meu tempo de rapaz era assim que se dizia. [anáfora – desse modo que já foi explicitado]

(3) Medida de tamanho alcance tomada assim de afogadilho explica-se pelas circunstâncias do momento. [catáfora – dessa maneira que vai ser explicitada]

(4) Deixe disso mano: você não é assim tão materialista. [catafórico – seguido de um sintagma de valor adjetivo]

A classificação do assim como advérbio de modo pode trazer problemas. Como pude perceber na minha pesquisa, há casos em que ele não qualifica o modo de uma ação, e sim, um sintagma nominal ou uma sentença inteira. E, muitas vezes, não pode ser substituído por “dessa forma”.

Apresento, a seguir, alguns dos exemplos retirados do corpus do Banco de Dados Lingüísticos VARSUL, que comprovam as mais variadas ocorrências do assim, e uma tentativa de subclassificação desse (se é que pode ser assim nomeado) advérbio.

1 SUBCLASSIFICAÇÃO DO ASSIM

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1.1 ASSIM FÓRICO

O assim que remete ao que já foi ou ao que vai ser dito é o caso mais comum dentre as ocorrências analisadas. Divide-se em dois grandes grupos - anafóricos e catafóricos.

(5) Era diferente, o mercado era redondo assim. (prctb24: 1187) [anafórico]

(6) Então tinha assim uns engenheiros que moravam ali, mas agora o Álvaro Dias eu não estou sabendo dessa, né? (prctb1: 0352) [catafórico]

1.1.1 Anafórico

O grupo dos anafóricos é heterogêneo. As funções exercidas pelo assim divergem; podem ou não ser substituídas por “dessa forma”; podem remeter a uma parte da sentença, a uma sentença inteira ou ainda para fora dela. É dividido em três subgrupos: a) típico; b) introdutor de informação nova e c) que remete para fora de S.

1.1.1.1 Anafórico típico

É o anafórico que tem como antecedente um termo da sentença. Pode ser substituído pela expressão “dessa forma” e remeter a uma parte da sentença

(7) Aqui só havia primeiro, segundo, terceiro anos quase junto assim. (prctb1: 0071) [quase junto = função adverbial]

(8) Porque se fosse, vamos supor, fazer uma centena ou só um milhar assim e parasse não, mas é uma produção que eles têm que sempre manter. (prctb1: 0680) [só um milhar = SN]

ou a uma sentença inteira:

(9) E daí você levava, vamos supor, as meninas levavam um salgado, os rapazes levavam bebida e assim a gente fazia as festinhas. (prctb1: 0880)

(10) Você sai, está com urgência, vai indo a pé, coisa e tal, o vizinho às vezes dá uma carona, coisa e tal, lá já o pessoal não via assim, né? (prctb1: 1118)

1. 1.1.2 Anafórico que introduz informação nova

Neste uso, o assim não pode ser substituído por “dessa forma” e introduz uma informação nova no enunciado:

(11) Aquelas famílias antigas, aquelas, sabe? que estão lá sepultados, aqueles mausoléus assim, eu gosto de ir lá, aqueles epitáfios, sabe? (prctb24: 1152)

(12) Então, o pessoal ia passear, os casais, as crianças, né? e tinha lá um tipo de um bar, mas era bonita a casa, tipo de um quiosque assim, sabe? (prctb24: 1206)

1.1.1.3 Anafórico que remete para fora de S

Como foi visto, há casos em que o assim remete a uma sentença inteira. Aqui, ele pode remeter a algo que está fora de uma sentença, ou a um texto inteiro anterior. Exerce a função de resumir tudo o que foi dito anteriormente.

(3)

(13) Então a gente tinha que fazer assim, né? (prctb1: 0877)

(14) Eu acho que não é bem assim, eu acho que tanto faz você estar aqui, vamos supor, Curitiba, ou você sair pra fora, se você não souber fazer o ambiente, ninguém vai te cumprimentar. (prctb1: 1069)

O assim que faz referência a algo exterior à sentença e o que resume um texto inteiro parecem ocorrer freqüentemente com: “e foi”, “e era”, “então (foi/era)”. Acontece em finais de narrativas, para resumir as várias sentenças anteriores.

(15) E foi assim que eles começaram aí. (prctb1: 0767)

(16) E era assim que a gente ia levando o timinho pra frente. (prctb1: 0954) (17) Eu sei que era assim. (prctb24: 1305)

1.1.2 Catafórico (grupo homogêneo)

O grupo dos catafóricos é homogêneo – não possui subgrupos. Remete a algo que vai ser dito e freqüentemente parece ser uma “pausa” no desenvolvimento da enunciação, como se o falante estivesse pensando no que vai dizer em seguida. Pode ser visto como um introdutor de informação nova (como o anafórico, mas com a diferença de que a nova informação ainda vai ser dita). Muitas vezes pode ser cortado, sem danos para o entendimento da sentença, pois, nesses casos, o assim e a expressão que ele substitui são redundantes. Também pode remeter a uma parte da sentença

(18) Agora eu não sei, assim, total de crianças que tinha na sala , porque a gente não tinha noção, né? (prctb1: 0026)

(19) Não sei nunca fui assim de começar a trabalhar assim preso dentro de firma . (prctb1: 0793) (20) Não sei nunca fui assim de começar a trabalhar assim p reso dentro de firma. (prctb1: 0793)

ou a uma sentença inteira:

(21) Então daí ficava assim: uma turma que estudava no Guido Staub e outra que estudava no lar das meninas que fazia pra completar a turma, né? (prctb1: 0098)

(22) Assim, às vezes, escuto rumores, coisa e tal, mas você não presta atenção porque ainda é muito cedo. (prctb1: 0455)

1.1.3 Vamos supor assim

Na análise de dados feita com os falantes de Curitiba, foram encontradas muitas expressões do tipo “vamos supor assim” e “assim, vamos supor”. Elas ocorrem exercendo papel ora de anafórico, ora de catafórico.

1.1.3.1 Anafórico

(23) Você, às vezes, com uma passagem, você roda, quase todos os bairros de Curitiba, então você fica bem à vontade, vamos supor assim, né? (prctb1: 0470)

(24) Outras cidades assim eu conheço assim de passeio , vamos supor assim. (prctb1: 1047)

(4)

(25) É, vamos supor assim: era um saquinho com uma alça, daí você jogava em cima do ombro, tá? e os cadernos dentro, lápis, tudo. (prctb1: 0050)

(26) Não, é que você se sente, vamos supor assim, se tivesse numa fazenda, né? num sítio. (prctb1: 0184)

1.2 FÁTICO

Na língua falada, pode-se perceber o uso constante do assim como fático. Ele não possui valor relevante na sentença e é pronunciado “gratuit amente”.

(27) Naquela época era mais a festinha americana que dominava tudo assim. (prctb1: 0888) (28) Ali, Água Verde, bairro da Água Verde, é devido o riacho Água Verde que nasce dentro do cemitério, e que vai se avolumando, vai, vai e depois deságua não sei em que rio lá pro lado do Parolin, mas ele passa assim ali eu sei. (prctb24: 1015)

1.3 OUTRAS OCORRÊNCIAS

O assim freqüentemente se liga a outra expressão para indicar alguma idéia. Alguns exemplos:

1.3.1 Assim que = quando

Esta forma parece ser mais usada em linguagem escrita e pode ser substituída por “quando”, com sentido temporal. O assim deve necessariamente juntar-se ao que para dar esse efeito de temporalidade; não encontra-se sozinho substituindo o “quando”.

(29) Assim que as coisas se normalizarem, passarei em cada cantinho deixando meu carinho e retribuindo os comentários de novos amigos que recebi.

1.3.2 Mesmo assim / assim mesmo

As expressões mesmo assim / assim mesmo dão uma idéia parecida à da expressão “ainda que”, e parecem remeter a algo anterior à sentença (poderia ser entendida como anafórica).

(30) Ame-as mesmo assim. (31) E mesmo assim ficou bonito.

(32) E outra, se fosse hoje eu pegava assim mesmo. (prctb24: 0483)

1.3.3 Assim como = bem como

Neste caso, o assim se combina com o como e podem ser substituídos por “bem como”.

(33) Por ocasião da revolução federalista, ali matavam, degolavam, sabe? enterravam por ali, assim como no cemitério municipal, que era outro deserto. (prctb24: 1144)

(5)

Meio assim é um expressão que pode ser substituída por “mais ou menos”. Talvez seja um uso específico da língua falada.

(34) De Chopin todo mundo gosta, eu gosto mas é meio assim, não é aquilo, não é aquilo. (prctb1: 0800)

2 CONCLUSÃO

O uso do assim é muito abrangente e possui sentidos bem distintos, tanto quando ocorre sozinho, como também quando se liga a outra palavra. Ficam muitas dúvidas quanto à sua classificação e aos papéis que ele pode exercer. Nas sentenças seguintes, por exemplo, não foi possível descobrir se trata-se de um assim anafórico ou catafórico:

(35) Canal quatro, rádio, televisão, tudo então- fica bem no meio, está num centro assim que está cercado de tudo que você quer. (prctb1: 0241)

(36) Então são milhares que saem assim por hora . (prctb1: 0679)

(37) Ah! era particular, feita numa tipografia, em que o nós fazíamos muita festa e rifas, e coisas assim que poderia angariar fundos, né? tinha a caixa escolar, também e com esse dinheiro a gente pagava o jornal. (prctb24: 0262)

A ambigüidade poderia ser resolvida na língua falada, conforme a entonação dada a uma parte da sentença, a qual pode ser retomada pelo assim.

Este trabalho procurou explicitar estes variados usos e subclassificar as ocorrências do assim, de modo a entendê-lo e partir para um questionamento maior: o assim pode ser classificado como “advérbio”, ou se encaixa em uma outra classe de palavras? Há muito estudo pela frente e mais algumas (muitas) horas de pesquisa. Ainda não foi possível desvendar tal “mistério”, mas é certo que o presente trabalho possui algumas chaves para essa descoberta.

RESUMO: Pretendo, neste trabalho, enfocar um dos chamados “advérbios” que não atendem aos critérios tradicionais de classificação – o assim –, fazendo uma análise das suas mais diversas ocorrências e uma possível subclassificação, com base nas diferentes funções que ele assume na estrutura da sentença.

PALAVRAS-CHAVE: advérbios; assim; anáfora; catáfora. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ILARI, Rodolfo et alii. Considerações sobre a posição dos advérbios. In: CASTILHO, A. T. Gramática do português falado: a ordem. Campinas: FAPESP / Ed. da Unicamp, 1991. pp. 63-141.

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