Entrevista
Texto de Guilherme Salgado Rocha Fotos de Alessandra Anselmi
egundo a professora Suzana Fonseca, que é mineira de Cruzília e leciona na PUC-SP desde 1992 (no curso de Gerontologia a partir de 2007), a base sobre a qual se alicerça a proposta do Programa de Gerontologia é “o compromisso com uma reflexão na qual o problema atual da longevidade humana seja abordado pela via do reconhecimento de que velhos são sujeitos com possibilidades de subverter e transformar valores e modos de vida que, social e culturalmente, lhes são impostos”.
Portal – Obrigado, professora, pela entrevista. Onde a sra. nasceu?
Suzana - Nasci em Minas Gerais, em uma cidadezinha chamada Cruzília. Sou a filha mais velha de cinco irmãos. Meu pai – José Darcy da Fonseca – faleceu em 1995, aos 56 anos de idade. Minha mãe, Jovita da C. Carielo da Fonseca, tem 78 anos e mora em São Vicente de Minas, município vizinho a Cruzília, no sul de Minas Gerais.
Portal – Qual é sua formação?
Suzana – Fiz o fundamental em São Vicente e em 1980 vim para São Paulo trabalhar e fazer cursinho. Formei-me em Fonoaudiologia em 1988, pela PUC-SP, fiz mestrado (1995) e doutorado (2002) em Linguística, no Programa de Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem, da PUC-SP. Sou casada e tenho um filho pré-adolescente.
Professora
Suzana Carielo da Fonseca
PUC-SP
oferece curso com concentração em Gerontologia Social
Portal – Quando começou a dar aulas na PUC?
Suzana - Sou professora da PUC-SP desde 1992. Dei aulas na graduação do curso de Fonoaudiologia até 2005; de 2005 a 2009 dei aula nos cursos de Letras, Jornalismo e Publicidade. E desde 2007 sou professora do Programa de Estudos Pós-Graduados em Gerontologia.
Portal - Como se interessou pela Gerontologia?
Suzana - No campo da Fonoaudiologia meu interesse, como clínica e pesquisadora, esteve sempre voltado para a área de linguagem. Mais especificamente para o exercício da clínica com pacientes afásicos. A afasia é um problema de linguagem, decorrente de lesão cerebral (AVEs, traumatismos cranianos etc), que pode se manifestar na oralidade e na escrita, na compreensão e/ou produção. Esse quadro patológico tem prevalência de incidência na velhice. Sempre me interessei em discutir o par fragilidade versus potência, tendo em vista a articulação entre a incidência da afasia e a velhice, porque intuitivamente constatava que a idade não jogava papel decisivo no drama subjetivo e nos desdobramentos sociais decorrentes da instauração desse quadro patológico.
Portal – A sra. tem, do mesmo modo, estudos sobre as demências.
Suzana – Realmente, mais recentemente tenho pesquisado as demências, que é outro quadro patológico de alta incidência na velhice, embora, como a afasia, não exclusiva dessa faixa etária. Note-se que minha visada é clínica, e nela o que está em causa são os efeitos subjetivo-sociais, seja da incidência da afasia, seja da demência. Interessa-me não só discutir a configuração específica das clínicas que estão em jogo no atendimento desses pacientes, mas a questão que envolve a rede de proteção social, ou a falta dela, demandada nesses casos. Isso me leva a discutir políticas e programas de saúde voltados para o segmento populacional idoso.
Portal - Como conceitua a Gerontologia?
Suzana - A Gerontologia é, por definição, um campo de estudos interdisciplinar que faz do processo de envelhecimento e, mais especificamente da velhice, o seu objeto de investigação. Entendo “interdisciplinaridade” como resultado de um diálogo teórico entre disciplinas. Esse “colocar em relação criticamente” disciplinas resulta do fato de que estamos falando de um processo e de uma condição humana. O uso do adjetivo “humana” já indica a complexidade em causa na investigação do objeto da Gerontologia. Isso porque, como diz Didier-Weill em seu livro “A Nota Azul”, “o humano é o efeito da mestiçagem de
substâncias [...] heterogêneas”. Questões relativas ao entrecruzamento das dimensões biológica, psicológica e social são, portanto, o mistério a ser enfrentado nesse campo de estudos.
Portal - Quando, em âmbito de mestrado, a Gerontologia passou a existir no Brasil?
Suzana - Os programas de pós-graduação pioneiros na área são os da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e da Universidade Estadual de Campinas. Ambos iniciaram suas atividades em 1997.
Portal - O curso oferecido pela PUC-SP em que se difere dos demais? Suzana - O curso oferecido pela PUC-SP é o único no
Brasil com área de concentração em Gerontologia Social. Por isso, há um eixo que articula grupos e linhas de pesquisa e as disciplinas da estrutura curricular, qual seja: o Processo de Envelhecimento e o Idoso: Estado, Comunidade e Família. Nessa perspectiva, a base sobre a qual se alicerça a proposta do Programa da PUC-SP é o compromisso com uma reflexão na qual o problema atual da longevidade humana é abordado pela via do reconhecimento de que velhos são sujeitos com possibilidades de subverter e transformar valores e modos de vida que, social e culturalmente, lhes são impostos. Tal perspectiva recusa a representação reducionista de que velhice seja sinônimo de doença e inatividade, condições que oneram o Estado, a família e a sociedade. O que ganha destaque é o fato de que envelhecer, do ponto de vista biológico, é um fenômeno que afeta todos os seres. Do ponto de vista sociocultural e subjetivo ele é marcado por diversidade e singularidade.
Portal – Quais são as atividades dos alunos que compõem o corpo discente? Suzana - O corpo discente é composto por profissionais de diversas formações: médicos, fisioterapeutas, assistentes sociais, educadores físicos, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos, psicólogos, administradores de empresa, enfermeiros, advogados, jornalistas, artistas plásticos, músicos, pedagogos, entre outros. A formação é bem diversificada e os alunos são oriundos de várias regiões do país.
Portal - Onde poderão atuar?
Suzana - Os nossos discentes atuam em empresas privadas, são autônomos, ou são profissionais que trabalham como funcionários públicos ou em organismos não governamentais, o terceiro setor. Há alguns que são docentes universitários no interior ou em outros Estados. As portas se abrem para todos esses campos de atuação. Gostaria de aproveitar a oportunidade para salientar que as inscrições para o processo seletivo estão abertas (de 01 de abril a 03
de maio). Todas as informações para quem quiser participar podem ser encontradas no site www.pucsp.br.
Portal – Cite, por favor, questões levantadas pela Gerontologia que deveriam ser objeto de preocupação da sociedade.
Suzana - Entendo que, com o crescente aumento da longevidade, o foco da atenção de pesquisadores e gestores deveria se voltar cada vez mais para o modo como, na contemporaneidade, o contexto social afeta ou influencia o processo de envelhecimento. Questões que envolvem novos arranjos familiares, relações intergeracionais, domínio de novas tecnologias, cuidados, entre outras, merecem destaque especial. Do meu ponto de vista, pesquisadores da área podem, e muito, contribuir com suas investigações para que, cada vez mais, elas se ofereçam como subsídios para as políticas públicas e sociais voltadas para o segmento populacional idoso. É por essa via que a questão da “qualidade de vida” pode ou deve ser abordada: viver mais e bem resulta de um empreendimento que implica aquele que vive/experimenta a velhice, e as condições nas quais a vida se desenrola.
A professora Suzana orienta a mestranda Teresa Cristina Ferreira Camargo
Portal - Após esse tempo de “vida” da Gerontologia, como a avalia?
Suzana - A Gerontologia vem, gradativamente, se firmando como um campo de conhecimento. Responder ao “como” e ao “por que” dos fenômenos relativos ao envelhecimento e à velhice, no Brasil e no mundo, e às suas consequências, do ponto de vista coletivo – social - e subjetivo é tarefa cuja investigação está longe de ter sido esgotada. É preciso considerar que o passo explicativo suscitado pelas questões que movimentam o campo requer teorização. Uma teorização que dê conta, ao mesmo tempo, do geral e do particular/singular. Essa é a grande tendência dos estudos gerontológicos: uma tarefa desafiadora atrelada com a vida concretamente vivida; ela é, ao mesmo tempo, objeto e lugar onde se desdobra a investigação.
Acessem as fotos dos bastidores da entrevista com a Professora Suzana Carielo na nossa página do facebook:
www.facebook.com/portaldoenvelhecimento
Data de recebimento: 13/03/2013; Data de aceite: 23/03/2013.
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Guilherme Salgado Rocha - Jornalista e revisor. Formado pela Universidade Federal de Juiz de Fora (MG) em 1979, tem 53 anos. Desde dezembro 2011 passou a integrar a equipe do Portal do Envelhecimento. Email:
rochaguilherme@hotmail.com
Alessandra Anselmi - Formada em Relações Públicas pela Metodista em
1996 e em Marketing e Vendas pela Anhembi Morumbi em 2012. Atualmente é Coordenadora de Marketing e Comunicação e responsável pelo gerenciamento de Redes Sociais do Portal do Envelhecimento / OLHE - Observatório da Longevidade Humana e Envelhecimento. Atua também com Locução e Fotografia. Email: alessandra.anselmi@uol.com.br