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Identificação: Significantes, negação e o traço unário no Seminário IX

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Academic year: 2021

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(1)Encontro Revista de Psicologia Vol. XI, Nº. 16, Ano 2007. IDENTIFICAÇÃO: SIGNIFICANTES, NEGAÇÃO E O TRAÇO UNÁRIO NO SEMINÁRIO IX1 IDENTIFICATION: SIGNIFIERS, NEGATION AND UNARY TRAIT IN SEMINAR IX. Ian Parker Manchester Metropolitan University. RESUMO. i.a.parker@mmu.ac.uk. Tradução: Leandro Alves Rodrigues dos Santos. Este artigo foca em alguns pontos chave explorados por Lacan no Seminário IX, da Identificação – particularmente sobre o significante, negação e o traço unário – no sentido de clarificar como Lacan estava elaborando uma abrangência freudiana da Identificação. Lacan cobre um rol de tópicos neste Seminário – como o escrever, ajustar teoria e topologia – e não endereçaremos nenhum deles em detalhes aqui. O desenvolvimento específico da teoria psicanalítica que Lacan está destacando neste Seminário concerne primariamente com a relação entre sujeito e o significante. Palavras-Chave: Identificação, psicanálise, teoria lacaniana.. ABSTRACT This paper focuses on some key issues explored by Lacan in Seminar IX, Identification – particularly upon the signifier, negation, and the unary trait – in order to clarify how Lacan was elaborating a Freudian account of identification. Lacan covers a range of topics in this seminar – such as writing, set theory and topology – and we will not address these in any detail here. The specific development of psychoanalytic theory that Lacan is outlining in this seminar is concerned primarily with the relationship between the subject and the signifier. Keywords: Identification, psychoanalysis, lacanian theory.. Anhanguera Educacional S.A. Correspondência/Contato Alameda Maria Tereza, 2000 Valinhos, São Paulo CEP. 13.278-181 rc.ipade@unianhanguera.edu.br Coordenação Instituto de Pesquisas Aplicadas e Desenvolvimento Educacional - IPADE Artigo Original Recebido em: 14/01/2007 Avaliado em: 01/02/2007. 1. Artigo originalmente publicado no Journal for Lacanian Studies, 5, (1), pp. 36-52. London: Karnac Books, 2007. ISSN: 1477-3635. Publicação: 27 de outubro de 2008 7.

(2) 8. Identificação: Significantes, negação e o traço unário no Seminário IX. 1.. SEMINÁRIO IX Há, como Lacan nota na sessão de abertura de 15 de Novembro de 1961, uma alternância nos Seminários de 1953 entre o foco no significante e o foco no sujeito. O Seminário IX de fato foca o significante, e isto é particularmente importante como um corretivo no sentido de que identificação é comumente entendida (como veremos), mas Lacan faz algo novo para interromper a seqüência com uma elaboração da relação do sujeito para o significante. Há a repetida invocação da definição de significante como oposto ao signo, então ele pode mostrar que “é do efeito do significante que o sujeito desta maneira emerge” (06 de Dezembro 1961, p.3). Aqui Lacan está fazendo uma distinção entre o signo e o significante em formulações que são um pouco diferentes, crucialmente diferentes, de algumas de suas formulações de Seminários anteriores. Aqui, ele diz, enquanto o signo é o “que representa algo para alguém”, o significante “é o que representa precisamente o sujeito para outro significante” (ibid, p.12). Há significativas marcas teóricas aqui, e a distinção entre signo e significante tem conseqüências para como pensamos sobre transferência e interpretação. Não é de pouca importância destacar que é nesse momento que Lacan estava dando seu Seminário IX – 1961 a 1962 – e alguns textos chaves que estavam aparecendo fornecem algumas coordenadas diferentes para pensar sobre a relação entre signo e significante. De um lado está Heidegger (1962). O Ser e o Tempo foi traduzido para o Inglês em 1962, e ainda que não houvesse tradução para o Francês, a discussão de Heidegger estava caminhando, Lacan toma as dores nas aulas de 1962 do Seminário para insistir que ele não era um ‘neo-Heideggerian’, que alguns comentadores afirmavam ele ser (Lacan, 6 de Junho de 1962, p.6). Quando Lacan nega algo é o caso de termos boas razões para olhar cuidadosamente do que ele está ostensivamente distanciando-se contra (e a discussão da ‘negação’ nos alertará para isso mais ainda). Enquanto Heidegger estava teorizando a natureza do ‘Ser’ e então o lado do sujeito, Lévi-Strauss forneceu um aparato teórico para teorizar a estrutura. Seus livros Totemismo hoje e A mente selvagem apareceram na França em 1962 (Lévi-Strauss, 1963, 1966) e Lacan faz referências explícitas a estes (como ele faz para O Ser e o Tempo), enfatizando que Lévi-Strauss está envolvido com pensar em seu estado bruto; isto é, a teoria de traçar princípios estruturais que são também necessariamente operações lingüís-. Encontro: Revista de Psicologia • Vol. XI, Nº. 16, Ano 2007 • p. 7-23.

(3) Ian Parker. ticas (6 de Junho 1962, p.6), entretanto, Lacan não está simplesmente seguindo essa linha de questionamento, traçando a estrutura do significante; ele quer conceituar a relação entre o sujeito e o significante. Ademais, nem Heidegger nem Lévi-Strauss, Lacan diz, conceitualiza o objeto na clássica oposição entre sujeito e objeto como “objeto do desejo” (ibid., p.8).. 2.. FREUD NA IDENTIFICAÇÃO Antes que possamos compreender o que Lacan estava fazendo com a identificação, nós primeiro devemos considerar o que Freud tinha a dizer sobre isto. A mais detalhada discussão teórica de Freud sobre identificação ocorre no seu texto sobre atividade coletiva, num livro a que é dado o um tanto enganoso título em Inglês de “Psicologia do grupo e análise do Ego”.2 Aqui ele define três modos de identificação. Vale recensear esses três modos em detalhes e notar o que Lacan tem a dizer sobre eles, e concentrarei aqui na caracterização que Lacan dá na aula de 07 de Junho de 1961 do Seminário VIII na transferência. É esta caracterização de três modos de identificação em Freud que ele se referirá no Seminário IX sobre a identificação.3 Então, no capítulo sete da identificação em “Psicologia de grupo e análise do Ego”, Freud estabelece três diferentes modos de identificação.. 2.1. Primeiro modo Primeiro, há o modo de identificação com o pai que Freud (1921, p.105) chama de “tipicamente masculino” (ibid.), e há uma interessante ambigüidade aqui sobre o que a relação entre a primeira identificação e o Complexo de Édipo. Freud diz que “isso ocupa uma parte na antiga história do Complexo de Édipo”, mas então notem que quando um garoto mostra um “especial interesse em seu pai”, este comportamento nada tem a ver com uma “atitude passiva ou feminina”, e que na verdade então isso é algo que prepara o caminho para o Complexo de Édipo (ibid., p.106)4 Isto porque Lacan se refere como sendo uma “identificação primitiva” que é ‘anterior ao muito resumido do que é a situação edipiana’(7 de Junho 1961, p.11). E é desta “identificação primordial”, diz. 2 A Massenpsychologie, no titulo alemão do trabalho indica que Freud estava preocupado sobre a relação do individuo com a coletividade de todos os tipos, não somente com o que comumente chamamos de ‘grupos’. 3 Lacan tende a antecipar algumas linhas chaves do argumento para o tópico de um Seminário no fim do imediatamente anterior e, neste caso, o mesmo se aplica sobre o fim do Seminário IX, quando ele discute a ansiedade, tópico do Seminário X. 4 Freud (1921, p.106) usa o garoto como um exemplo aqui, mas argumenta que “com as necessárias substituições” o mesmo se aplica para um bebê menina.. Encontro: Revista de Psicologia • Vol. XI, Nº. 16, Ano 2007 • p. 7-23. 9.

(4) 10. Identificação: Significantes, negação e o traço unário no Seminário IX. Lacan, “que faria surgir o desejo pela mãe e, daí então, pelo reverso, o pai seria considerado um rival’(ibid.). Freud põe desta maneira: o Complexo de Édipo origina-se da ‘confluência’ da identificação com o pai e o que ele chama de “verdadeira catexia de objeto pela sua mãe”, e a identificação com o pai então “toma um colorido hostil” (Freud, 1921, p. 105). Nesta primeira identificação com o pai, "um pai é aquilo que qualquer um gostaria de ser” (ibid, p. 106), e aqui o “laço” libidinal vincula o “sujeito” ao “ego”. O aspecto importante para se notar aqui é que este “tipo de laço é, portanto, já possível antes que qualquer escolha objetal sexual tenha sido feita”. Desta primeira identificação com o pai, o Complexo de Édipo pode ser “invertido” e o pai pode ser tomado como um objeto de uma atitude feminina, na qual aconteceria então uma “escolha do pai como objeto”, ou isto, “ele seria aquele que teria de ter” (ibid). Antes que partamos para o segundo modo de identificação, há dois tipos de nota sobre esta “identificação primordial" que são certamente cruciais para Lacan. O primeiro é a distinção que Freud faz entre as duas possíveis relações que são: um pode ter através do pai, entre “o que ele gostaria de ser como função da primitiva identificação” (como Lacan pôs), e “aquele que gostaria de ter” quando é “tomado como objeto da atitude feminina”. A distinção entre ser e ter é algo que Lacan vai tomar no sentido de caracterizar a relação entre o sujeito e o significante privilegiado, o falo. Outro ponto a ser notado é que identificação é uma identificação que procede de uma rivalidade ciumenta. Vamos então voltar resumidamente ao que Lacan (1938) nos mostra em seu artigo sobre os complexos familiares. Ele pontua que “ciúmes infantil tem tido comovidos observadores”, e ele então dá um exemplo que recorre nos seus Seminários. Este é Lacan se referindo a Santo Agostinho: “Eu vi com os meus próprios olhos”, diz Santo Agostinho, “e eu observei cuidadosamente, um jovem bebê devorado pelo ciúmes: ele ainda não podia falar, ele ainda não poderia se prevenir de empalidecer-se ao amargo espetáculo de ver o irmão no seio da mãe”.(Confissões, I, capítulo VII)’. (Lacan, 1938, p.14). Mas então Lacan carrega nas tintas para pontuar que “a identificação específica neste estágio é baseada no senso de que o outro é compelido a compreender mal sem uma correta concepção de seu valor imaginário” (ibid., p.15). A tentação é tratar essa rivalidade ciumenta como algo que está perdido numa relação particular com os outros e contra isto Lacan diz “... Isto é mais especificamente na situação fraternal primitiva onde a agressividade mostra por si própria ser secundária para a identificação “(ibid., p.17). Novamente, ele insiste que a identificação que é. Encontro: Revista de Psicologia • Vol. XI, Nº. 16, Ano 2007 • p. 7-23.

(5) Ian Parker. primária: “A manifestação do ciúmes em relação ao mamar, uma visão clássica ilustrada pela citação acima de Santo Agostinho, necessita ser interpretada com muito cuidado. De fato o ciúme pode ainda se manifestar um longo tempo após o sujeito ter sido desmamado e isto não mais dentro de uma situação de competição vital com seu irmão. O fenômeno, portanto, parece requerer como uma pré-condição, certa identificação com um estado fraternal; de irmandade” (ibid). Há ainda a tentação de combinar identificação com esta rivalidade ciumenta, e então ainda reverter a relação entre os dois, e só então há aqui a um risco de cairmos dentro de algo como uma visão de ‘natureza humana’ preenchida com conteúdo particular, imaginando que a natureza humana é já predisposta a desenvolver certos tipos de ódios e amor por outros. Estas possibilidades permanecem fixadas no que nos chamamos de ‘identificação imaginária’. O que Lacan está elaborando no Seminário IX é um cálculo que é um pouco diferente; a relação do sujeito para o significante é o que temos e que poderíamos chamar de ‘identificação simbólica’.. 2.2. Segundo modo Vamos agora então nos voltar para o segundo modo de identificação discutido por Freud. Isto é a base para o próprio cálculo de Lacan. Há aqui uma “identificação que ocorre na estrutura do sintoma neurótico” (Freud, 1921, p.106), e Freud novamente se vira para o exemplo de uma pequena garotinha. A variante disto é que Freud chama de “estrutura completa de um sintoma histérico” (ibid). Suponha que a pequena garotinha “desenvolva o mesmo sintoma doloroso de sua mãe – por instância a mesma tosse atormentadora (ibid). A identificação aqui pode vir do Complexo de Édipo, e “nesse caso significa um desejo hostil de parte dessa garota para tomar o lugar da mãe e o sintoma expresso o seu amor objetal pelo pai e traz então a realização, sob a influência de um sentimento de culpa de seu desejo de tomar o lugar da mãe ‘Você queria ser sua mãe, agora você é, portanto seu sentimento faz sentido’.”(ibid) Uma segunda variação deste segundo modo de identificação seria onde o sintoma é o mesmo da pessoa que é amada e aqui Freud dá o exemplo de Dora que imitou a tosse de seu pai (e ele está aqui assumindo que é o pai, que é o objeto de amor de Dora). Aqui Freud diz, “identificação tem aparecido ao invés de uma escolha objetal, e a escolha objetal tem regredido até a identificação” (ibid., pp. 106-107). O aspecto regressivo desse processo é crucial para caracterização do que Freud dá do segundo modo de identificação, pelo qual aqui a “escolha objetal é voltada para a identificação” (ibid., p.107). La-. Encontro: Revista de Psicologia • Vol. XI, Nº. 16, Ano 2007 • p. 7-23. 11.

(6) 12. Identificação: Significantes, negação e o traço unário no Seminário IX. can então também caracteriza este segundo modo de identificação em Freud como uma “identificação regressiva”, e realça esse processo pelo qual, num aspecto, o sujeito identifica-se com o objeto, como segue: “na medida em que o objeto recusa amor, o sujeito, por meio de um processo regressivo, é capaz de identificar-se a si mesmo para o objeto, no que, na sua demanda de amor, o desaponta (7 de Junho 1961, p.11). Retornaremos para este segundo modo de identificação, em breve.. 2.3. Terceiro modo O terceiro modo de identificação que Freud delineia é aquele no qual, Freud diz, “a identificação deixa inteiramente fora de conta qualquer objeto relacionado a pessoa que está sendo copiada” (Freud 1921, p. 107). O exemplo que Freud dá é quando uma garota num internato recebe uma carta de alguém por quem ela está secretamente apaixonada, o que faz com que ela fique ciumenta, então ela acaba por ter um ataque histérico; “então, algumas de suas amigas que sabem sobre isso também terão o mesmo ataque, como nós dissemos, por uma infecção mental” (ibid). Por quê? Porque “as outras garotas gostariam de ter um amor secreto também, e sob a influencia do sentimento de culpa, elas também aceitam o sofrimento envolvido nisso” (ibid). Freud então diz que “um ego percebeu uma significante analogia com outro até certo ponto” e então “a identificação por meio do sintoma tem se tornado a marca de um ponto de coincidência entre dois egos que tem que ser mantida reprimida” (ibid). Mesmo que Lacan não tenha muito a dizer sobre o terceiro modo freudiano de identificação, apesar disso ele comenta no final do Seminário IX, com referencia ao “oito interno” (uma da figuras topológicas que ele discutia então), que: “O campo no qual tenho estado desde que introduzi o significante no ‘oito interior’ é um do terceiro modo de identificação, essa identificação na qual o sujeito é constituído como desejo” (Lacan, 20 de Junho 1962, p.1). Lacan aqui encaixa um cálculo ostensivamente individual na conta dos laços sociais, mas ele não está preparado para isso com a referencia de “grupo”, suas muitas referências para posicionar a teoria no Seminário IX não são designadas pelo grupo de pessoas juntas como membros de uma mesma categoria. De fato, é esta exclusão de um grupo que marca o sujeito, não ser membro de um grupo de qualquer tipo”. Então Lacan provoca sua audiência para “não acreditar, portanto, na mais extrema maneira que ‘Koinonia’ para usar um termo de Platão, tudo que marca uma comunidade algum gene (gênero) e especialmente aquelas que são mais originais para. Encontro: Revista de Psicologia • Vol. XI, Nº. 16, Ano 2007 • p. 7-23.

(7) Ian Parker. nós” (13 de Dezembro de 1961, p.3). Isto é precisamente o que Freud aparenta estar fazendo em “Psicologia de grupo e análise do eu”, e é o que Lacan coloca ele mesmo contra quando se refere ao seu próprio artigo no tempo lógico em um número de ocasiões nesse Seminário em particular (Lacan, 1988a). Há um ponto geral aqui que é a não inclusão do sujeito no significante, então eles podem ser genuinamente e inteiramente representados por isto, por alguém mais que está sendo descrito por Lacan. Quiçá, é que o sujeito é excluído de algum significante que represente o sujeito para outro significante. Lacan diz, por exemplo, “o nascimento do sujeito depende do fato de que ele não pode pensar si mesmo como excluído de um significante que o determina” (2 de Maio de 1962).. 2.4. Segundo modo e o significante Deixaremos o terceiro modo de identificação à parte agora, e voltaremos ao segundo modo de identificação, aquele que é organizado em torno dos exemplos de Freud, uma tosse que é a mesma tosse da mãe, que “significa um desejo hostil por parte da garota por tomar o lugar da mãe”, ou uma tosse que poderia ser a mesma tosse do pai, então ser o mesmo que a pessoa que é amada “(Freud 1921, p.106). Freud nota; e isto é algo que contém uma frase chave que o Seminário IX de Lacan gira em torno, que “em ambos os casos a identificação é parcial extremamente limitada e somente traz um traço singular da pessoa que é tomada como objeto”. (ibid, p.107). Lacan comenta neste sentido, no final do seu Seminário anterior, (Seminário VIII sobre a transferência); “identificação sempre ocorre através de ein einziger Zug (7 de Junho de 1961, p.12). Este é o traço singular que Freud está se referindo na tradução inglesa e no original alemão einziger Zug’. Lacan se compromete com isso, porque ele quer focar os dois primeiro modos de identificação – a “identificação primitiva” com o pai e a “identificação regressiva” organizada na relação ao objeto – e ele argumenta que é “nestes dois modos de identificação” os dois primeiros modos fundamentais... identificação sempre ocorre através do ein einziger Zug (7 de junho 1961, p.12). Ele não está então envolvido com o terceiro modo de identificação – talvez porque isso se concerne com o processo secundário do ego nas relações do ego que constitui as coletividades, a “psicologia de massa” que Freud está interessado no seu livro de 1921 – mas toma aqui este ein einziger Zug e elabora isto como o “traço unário”, que é fundamental para a identificação numa primeira relação do sujeito para o significante. Então, esse “traço singular” – o ein einziger Zug. Encontro: Revista de Psicologia • Vol. XI, Nº. 16, Ano 2007 • p. 7-23. 13.

(8) 14. Identificação: Significantes, negação e o traço unário no Seminário IX. Freud especifica no texto original em alemão – é traduzido como o primeiro ponto de identificação simbólica, como um “signo” no Seminário sobre a transferência (7 de junho 1961, p.12), e então crucialmente, como um significante no Seminário sobre identificação (29 de novembro 1961, p.1). A diferenciação teórica entre significante e signo permite Lacan questionar a suposta unidade do significado, imagem sonora na concepção de Saussure (1974) sobre o signo. Então novamente no Seminário IX Lacan refuta apelar para o “significado” sob o significante que daria então uma completude, uma noção de profundidade no sujeito e as emoções sob a superfície (então o analista poderia então imaginar que eles poderiam acessar a emoção e repercutir com isso em um tipo de empatia profunda com o analisando). A discussão de Lacan sobre topologia neste Seminário – toro, cross-cap e oito interior, é designada para enfatizar o caminho que foi conceituado como “profundo” em psicanálise podendo ser re-conceituado como uma tampa de superfície. O que Lacan está preocupado com isto neste Seminário, ele insiste, é no infinitamente vazio do objeto (07 de março de 1962, p.10). A chave crucial na leitura de Lacan de Freud então mexe, revolve sobre o significante como um ponto de identificação mais do que uma unificação (ibid, p. 11), isto é pura diferença que o unário, em sua função de significação, estrutura-se a si mesmo (ibid, p. 10). Isto significa que a identificação simbólica com um significante que então repetirá a si mesmo através da vida do sujeito e, claro, também no curso da transferência. Isto não pressupõe a internalização de uma imagem, certamente um ponto de unificação para definir a consciência do sujeito para si mesmo. Lacan investe certo tempo neste Seminário organizando uma historia subjacente específica na suposição desta possibilidade de consciência, alguma coisa que manifesta se a si mesmo num “sujeito suposto saber”, há nisto toda própria identificação que A = A; “A` é A, constituiu, como eu poderia dizer, a condição de uma completa era de pensamento no qual a exploração cartesiana que eu comecei [o Seminário] é o termo.”(ibid) A diferença entre significantes está intimamente conectada com diferença entre significante e coisas, e entre significante e o objeto. Freud (1921, p.107) comenta que uma coisa nós aprendemos na discussão dos diferentes modos de identificação é que “identificação é a forma original de laço emocional com o objeto”. No Seminário IX Lacan está preocupado como este “laço com o objeto” é constituído como o objeto pode ser tratado como algo diferente. Isto também, claro, será importante para o próximo. Encontro: Revista de Psicologia • Vol. XI, Nº. 16, Ano 2007 • p. 7-23.

(9) Ian Parker. Seminário (Seminário X sobre a ansiedade), no qual a ansiedade é conceituada como algo que surge quando o objeto chega muito perto: “ansiedade é o medo do que o grande outro em si mesmo deseja do sujeito, este ‘em si mesmo’ funda precisamente a ignorância do que é desejado no nível do Outro. Isto é do lado do Outro que o objeto pequeno a vem a luz, não muito como falta, mas como tem que ser. (27 de Junho de 1962, p.10)5 No Seminário IX, nós verdadeiramente temos a primeira aparição de uma das imagens favoritas de Lacan para a relação do sujeito com o desejo do Outro – um macho louva-a-deus aparece refletido nos olhos do Outro, uma fêmea gigantesca louva-adeus (no qual a questão que surge é o que ele é para o outro e o que ela deseja). Na sessão de 28 de Abril de 1962 ele clama que isto é um exemplo que ele fez pela manhã para ilustrar a ansiedade provocada pelo pressentimento que: “Eu não sei o que sou como objeto do Outro”. (ibid., p. 7)6 Se ele fez este exemplo pela manhã, parece muito possível que estava lendo o livro de Georges Bataille; Thomas, o obscuro, no mesmo tempo em que ele estendia para o trabalho na sessão final do Seminário, na hora de evocar formas horríveis pela qual o objeto pode aparecer incluindo o apuro de alguém na frente de um outro que pode, como um louva-a-deus, devorá-lo (27 de junho 1962, p. 11). O que isto já enfatiza é o fato que a identificação é também sempre constituída na relação com um outro objeto. A necessária diferença entre o sujeito e objeto – o objeto como objeto do desejo” – é especificado em psicanálise como negação.. 3.. NEGAÇÃO As repetidas referências a negação no Seminário são alusões para o artigo chave de Freud sobre a negação, e claro Lacan havia gasto algum tempo endereçando a importância da negação nos seus Seminário anteriores. A negação é tão importante para sua conta que aqui nós precisamos nos lembrar o que o argumento de Freud era e o que o Lacan fez disto. A discussão da negação então toma um caráter particular aqui no Seminário IX em relação ao que o Lacan faz da identificação presente na discussão de Freud.. 5. A frase aqui na tradução em Cornac Gallagher tem um ‘pequeno o’ ao invés de ‘objeto pequeno a’. “Imagine-me numa área fechada sozinho com um louva-a-deus de três metros de altura – esta é a proporção exata para mim pelo mesmo tamanho que para o supracitado macho, e mais ainda, estou vestido numa pele do tamanho do macho, que é 1,75m, é mais ou menos o meu tamanho. Olho pra mim mesmo, eu olho para minha imagem no caminho de estar face a face com o olho do já supracitado louva-a-deus. É isso ansiedade? (24 de Abril 1962, p.60). A questão que deveria responder é sim. 6. Encontro: Revista de Psicologia • Vol. XI, Nº. 16, Ano 2007 • p. 7-23. 15.

(10) 16. Identificação: Significantes, negação e o traço unário no Seminário IX. No seu artigo de 1925 “Negação (Die Vernienung)”, Freud faz o já conhecido argumento psicanalítico que quando o paciente nega alguma coisa, você pode estar certo que é o caso; “Se o paciente... diz que o que ele pensa é mais incrível, ele quase sempre faz a confissão certa” (Freud 1925, p. 235). Disso ele argumenta que, “o conteúdo de uma imagem reprimida ou idéia pode forçar caminho para a consciência ou na condição que é negada” (ibid). Então, “negação é uma maneira de tomar consciência do que é reprimido, certamente já é uma operação da repressão, ainda que, é claro, uma aceitação do que está reprimido” (ibid., p 235-236). Há um importante colorário desse processo marcando a diferença entre o sujeito e o objeto, pois... “a sua função intelectual é separada de processos afetivos”, e então há... “um tipo de aceitação intelectual do reprimido, enquanto que o que é essencial para a repressão persista” (ibid., p. 236). Freud deixa de fora esta separação da função intelectual, “aceitação intelectual” da repressão no seu comentário: “um julgamento negativo é o substituto intelectual para a repressão, este ‘não’ é o marca da repressão, um certificado de origem – como diríamos, “Made in Germany”. Com a ajuda do símbolo da negação, pensando livremente das restrições da repressão e enriquecendo-se com o material que é indispensável para seu próprio funcionamento”(ibid.).7 O ponto chave aqui é que “o reconhecimento da parte inconsciente do ego é expresso numa fórmula negativa” (ibid., p.239). Então Freud está enfatizando aqui “ a função do julgamento”(ibid., p.237), e isto é alguma coisa que Lacan vai tomar como uma parte essencial da relação neurótica para com o objeto e com o real. Isto é o significante, ele diz, “que introduz a diferença dentro do real” (6 de Dezembro de 1961, p. 10). Lacan pediu a Jean Hypolite para providenciar um comentário sobre o artigo de Freud durante o Seminário I, e aqui há alguns pontos interessantes surgindo que Lacan se apropria.8 (7) Hypolite (2006, pp. 746-747) no seu comentário de 1954, publicado em 1956 e incluído nos Escritos, notou por todo o texto que alguém deve distinguir entre a negação... “dentro de um julgamento e a atitude de negação”. Ele então ar7 É uma nota de John Forrester, para a tradução da passagem de Freud que Lacan cita no Seminário I, no qual Forrester diz: “a frase ‘Made in Germany’ aparece em inglês no original German (e no Frances), deste modo destacando que a marca da repressão está escrita numa língua estrangeira. Há um aspecto histórico para isso: o requerimento para que os bens alemães disponham uma marca de origem (escrito em inglês) foi imposto pelos governos da Alemanha e Áustria durante a Primeira Guerra Mundial (e conseqüentemente um pouco antes Freud estava escrevendo), o ato governamental estava objetivando facilitar a discriminação contra bens alemães estigmatizando-os. Isto teve o efeito inverso, desde que os bens estampados com Made in Germany passaram a ser mais procurados posteriormente (nota de pé de pagina do tradutor em Lacan, 1998b, p. 290). 8 Hyppólite era um Hegeliano, e então há uma retomada particular da psicanálise através das categorias Hegelianas. Por exemplo, num ponto do seu comentário (que está incluído no Seminário I, bem como no apêndice dos Escritos). Encontro: Revista de Psicologia • Vol. XI, Nº. 16, Ano 2007 • p. 7-23.

(11) Ian Parker. gumenta que: “No julgamento da existência, é uma questão de atribuir ao ego ou, antes ao sujeito (é mais compreensivo) a representação que não tem sido mais um objeto que corresponde a isso, apesar de que o objeto tenha que correspondido a isso num período anterior. O que importa aqui é a genesis “do dentro e de fora” (ibid., p. 751)9 Há então uma densa discussão no Seminário IX de diferentes formas de negação na linguagem, e a importância da ambigüidade sobre a atual existência do que é refutado. O objeto, então, não é algo que nós dominamos, não é algo que nós certamente podemos fazer existir, mas é algo que nós giramos em volta como se tentássemos “reencontrá-lo”. Freud diz nesse artigo sobre negação que “o primeiro e imediato objetivo, portanto, do teste de realidade é, não encontrar o objeto na real percepção que corresponda a aquele apresentado, mas, reencontrar algo como um objeto para convencer a si mesmo que aquilo ainda está lá” (Freud, 1925, PP.237-238). O objeto, então, é o objeto perdido, e identificação transmite essa perda. O argumento de Lacan sobre o papel da negação na relação entre o significante e o objeto obedece a um certo numero de passos. Primeiro, ele pontua que a marca num sistema hieroglífico antigo são sempre diferenciais. Ainda que eles sejam derivados de um tipo particular de objeto e parecem sempre assemelhar-se ao objeto, aqui uma “diferença” inscrita nesta marca. Por exemplo, ele pontua que “o M [que marca para própria figura a qual Lacan se refere como uma ‘antiga linguagem egípcia’] vai significar mais que uma coisa” (10 de janeiro de 1962). Então, isto funciona “mais ou menos como introdução do tipo ‘olhem’, uma função para fixar a atenção”. Entretanto, enquanto isto fixa a atenção no que ‘é’, isto também marca a diferença do que não é. O significante é também diferente daquilo que significa. Lacan diz; “fazendo de um significante... alguma coisa... carrega-nos para um nível de interrogação sobre uma certa relação existencial, aquela que já é situada numa referência de negatividade, o modo no qual a negação aparece, naquilo que o significante de uma negatividade efetiva é experienciado” (ibid., p.5). Este é o ponto no qual ele está começando a diferen-. Hyppólite comenta que: ”a pessoa psicanalisada... volta atrás na sua negação e ainda a repressão está aqui [:]... alguém deve dar ao que acontece aqui um nome filosófico... negação da negação (Hyppolite, 2006, p.749). 9 Em Lacan (1988b) responde para Hyppolite no Seminário I, Lacan foca na “diferença entre os níveis de Behajung, de afirmação e negatividade”, Lacan, então endereça isto de dois ângulos diferentes. O primeiro concerne o papel de Verwerfung, forclusão psicótica. O segundo concerne a interpretação que Ernst Kris dá no Homem dos miolos frescos que nos deixaremos à parte aqui. A respeito da forclusão, Lacan argumenta que “o que acontece então com esse Behajung não acontece, num sentido de que nada aparece no registro simbólico? No caso do Homem dos lobos, Lacan diz, “não havia Behajung para ele, não havia realização no plano genital”. E então, “castração que é precisamente, que é aquilo que não existia para ele, manifesta-se em si mesmo na forma de algo que ele imagina – para cortar seu pequeno dedo, tão profundamente que isto se dependura por um pequeno pedaço de carne. Ele é então tomado por um sentimento de catástrofe que é tão inexpressível que não ousa falar para a pessoa ao seu lado. O que ele não quer falar sobre isso – é se essa pessoa para aquele que ele imediatamente refere todas as emoções fosse anulado. O outro não existe mais (ibid., p. 58).. Encontro: Revista de Psicologia • Vol. XI, Nº. 16, Ano 2007 • p. 7-23. 17.

(12) 18. Identificação: Significantes, negação e o traço unário no Seminário IX. ciar o significante do signo, ele está preocupado aqui com o caminho que “é das primeiras problemáticas da estruturação da linguagem, sendo identificado pela elocução na primeira conjugação de algo vocal com o signo como é” (ibid.), e é só necessariamente como o significante se relaciona com um objeto. Ao invés de olhar para isso como uma relação harmônica entre significante e significado que poderia fazer o signo dentro de algo unificadamente fechado, então nós poderíamos saber que o significado é o que “amarra” cada significante particular (então o signo pode representar algo para mais alguém). Há um diferente tipo de relação sendo conceituado aqui; nomeando com algo que já está referido para uma primeira manipulação do objeto (ibid). Então, temos na discussão de Lacan até então, uma ênfase na marca de alguma coisa que não é, uma ênfase na negatividade, a discussão do significante que funciona como marca do que não é, o significante como é e o que não é – e também uma natureza “binária” – e então uma questão sobre a relação com o objeto, que nós podemos conceituar o objeto dando traço, que nos termos de Lacan é “unicidade” (10 de Janeiro de 1962, p.5).10. 4.. O TRAÇO UNÁRIO Nós chegamos aqui com argumentos chave sobre a emergência do traço unário. O traço unário não aparece simplesmente randomicamente como um significante particular que representará o sujeito. O traço unário está intimamente conectado com o objeto; Lacan diz que “é do objeto que o traço emerge, [e] isto é algo do objeto que o traço retém: precisamente sua unicidade” (10 de Janeiro de 1962, p.5). Entretanto, há uma complicação aqui, para o “objeto” não é só isso mesmo que pode ser observado (e sua função como objeto da fantasia é algo que Lacan vai elaborar como o objeto pequeno ‘a’). Também devemos observar para o caminho que Freud (1921, p. 107) – por um capitulo 7 do livro sobre psicologia de massas – trilha na escolha de que o “objeto é sempre voltado para dentro da identificação”, e também no cômputo de Lacan para o traço unário. Vamos então tomar o exemplo que Lacan fornece de Robson Crusoé descobrindo uma pegada, e seu apagamento neurótico regular na ordem de constituir um lugar para o qual o significante na presença de Sexta Feira pode aparecer. Esta passagem vale a pena ser citada e aqui é um numero de questões emergem sobre o papel da. 10. No Seminário XI, Lacan (1979, p. 218) propõe o seguinte: “Há, então, alguém poderia dizer a questão de vida ou morte entre o significante unário e o sujeito, na qualidade de significante binário, causa do seu desaparecimento. O Vorstellungsrepräsentantz é o significante binário.. Encontro: Revista de Psicologia • Vol. XI, Nº. 16, Ano 2007 • p. 7-23.

(13) Ian Parker. negação na formação do traço unário. Aqui Lacan está nos mostrando as condições da possibilidade do significante e como um significante representa de um sujeito para outro significante.11 Começamos com a descoberta da pegada: “emoção que o coração acelera antes do traço”. Tudo isso nada nos ensina, ainda que da batida acelerada do coração aqui resulte um completo lote de pisadas sobre este traço, isto poderia acontecer na passagem de algum animal (24 de janeiro de 1962, p. 3). Algo aqui está acontecendo, e isto é a tentativa de apagamento, eliminando a retirada de cena do traço que a marca faz como um lugar. A questão para Robinson Crusoé é que quer seja ou não a realidade uma marca de pé, ainda é a marca de outro sujeito. Podemos especular sobre as diferentes respostas para a descoberta da pegada e o caminho que um Robinson Crusoé em diferentes estruturas clinicas, poderia ter lidado com a presença do traço. Se ele fosse psicótico, ele poderia, talvez, ter imediatamente pulado para a conclusão que havia uma mensagem endereçada diretamente a ele. Isto poderia ser colocado num rol de funções paranóicas correlativas sobre porque o traço teria aparecido ali e o que significaria, Então não haveria duvida que seria porque uma pegada mandada como um signo do outro. Um Robinson Crusoé perverso poderia ter localizado na pegada algo que assumira que poderia ter sido feito por ele, talvez mudando a estranha aparição do traço como parte de um sistema ’escrito’ que poderia estabilizá-lo para tomar lugar como objeto, muito como a marca da cama feita pela função de Marquês de Sade, Lacan diz, como marca que possibilita o sujeito perverso inscrever o seu prazer dentro de um tipo de sistema escrito no qual ele pode se contar, incluindo ele mesmo dentro disto (e. g., 28 de Fevereiro, 1962). Um Robinson Crusoé neurótico, por outro lado, poderia perguntar a si mesmo, se aquilo ali era uma pegada e fantasiar sobre como seria e o que encontraria com outra pessoa e, como seria angustiante se talvez ele não pudesse estabelecer o que isto significa. Uma reivindicação é que Robinson Crusoé não responde como um psicótico ou um sujeito perverso faria, e isto, claro, pelo fato de que ele apaga a pegada.12 Então 11. Eu estou agradecido pela discussão detalhada deste exemplo, e a discussão da diferentes estruturas clinicas de Robinson Crusoé, in Dunker, C. (2006) ‘Lacan: Estilo é o si mesmo do homem’, The Letter: Lacanian Perspectives on Psychoanalysis. 12 Fazendo esta chamada, Dunker(2006) argumenta que a resposta de Crusoé tampouco é da estrutura ‘neurótica’, mas é uma feita por um sujeito ‘normal’, e ele então toma este ponto como oportunidade para pesquisar debates entre lacanianos brasileiros sobre a natureza do sujeito ‘normal’ como um ‘neurótico’ (ou não). Isto faz surgir um certo numero de tópicos, um é como conceituamos a relação entre ser neurótico (perverso ou psicótico) e ser ‘normal’. Lacan marca. Encontro: Revista de Psicologia • Vol. XI, Nº. 16, Ano 2007 • p. 7-23. 19.

(14) 20. Identificação: Significantes, negação e o traço unário no Seminário IX. o argumento é que: “Com o procedimento de transformar o status da pegada na marca, desta marca que passa a ser um traço. Isto é porque pode ser apagada ou maculada, dependendo do nosso desejo, que um traço é um traço. Sendo apagada e mesmo assim ainda sendo uma inscrição para Crusoé, isso pode ser “indefinidamente repetido” (Dunker, 2006). Lacan está conceituando a particularidade do sujeito como algo universal, melhor do que apelando para que o sujeito tenha em comum como base de uma espúria universalidade, da qual nós somos membro de uma mesma “comunidade”. Então, na mesma parte do Seminário na qual ele insiste que nós não devemos acreditar “de maneira mais intensa” a qualquer noção de comunidade, ele também relembra que “é no nível do particular que sempre surgem as funções do que há para uma função universal (13 de Dezembro de 1961, p. 3). Ele então vai referir para o registro do simbólico e a “tríade do simbólico, do imaginário e do real”(ibid., p. 4). Não obstante, isso poderia ser possível para endereçar que o traço unário é como um carregador de um nome real do sujeito quando ele entra em análise (e. g. Himes, 2005), nós devemos tomar cuidado para não reduzir este espaço, essa diferença mínima na qual significantes chaves venham operar, para algumas marcas atuais que são visíveis para o sujeito (ou para outros). Um outro comentador do traço unário coloca que “o sujeito inicia-se estando alerta para o fato que está situado, ele mesmo nisso”. Isto origina aqui e acolá, contando ele mesmo de lá, isto desta maneira pode ser consciência de si mesmo, somente porque o lugar é esvaziado de uma característica; é só uma linha, mas uma linha fundamental na ausência do qual algum conceito de unidade ou unicidade seria apagado desse mundo. A constituição dessa linha nos permite abstrair uma proposta universal de singularidade de todas as entidades, humanas ou astrais, lugares ou objetos (Shingu, 2005, p 59).13 (12) Outro ponto que eu quero considerar rapidamente aqui é relação entre o apagamento do traço por Robinson Crusoé e a já aparente tentativa de apagamento do traço. Na conta de Lacan no Seminário IX há uma ambigüidade sobre isso já ter sido pelo próprio Sexta Feira, o outro que tem tentado apagar sua própria pegada. Lacan punha. este ponto no final do Seminário IX que “o neurótico, como o perverso, como o psicótico, são somente faces da estrutura normal” (13 de Junho de 1962, p.11). Na seção seguinte ele diz “que cada um daqueles tem sido chamados neurótico, perverso e psicótico é normal. O psicótico é normal na sua psicose, e mais ainda, porque o psicótico no desejo tem que lidar com seu corpo, o perverso é normal na sua perversão porque tem que lidar com o falo na sua variedade e o neurótico tem que lidar com o Outro, o grande Outro como entendemos, eles são normais porque eles são três termos normais de constituição do desejo. (20 de Junho de 1962, p.4). Quer seja para situar este argumento, além de tudo é um ponto a se debater. 13 Shingu faz um argumento particular aqui, desenhando nas observações de Barthes no Japão, sobre a maneira que o traço unário funciona para os japoneses quando eles estão aptos a serem estrangeiros pra si mesmo.. Encontro: Revista de Psicologia • Vol. XI, Nº. 16, Ano 2007 • p. 7-23.

(15) Ian Parker. assim, contrastando isso com um traço de algum animal velho, “se vem inesperadamente, eu acho que o traço de alguma coisa que o traço de alguém tem tentado apagar, ou ainda então eu não mais continuo sem achar que o traço desse esforço, se eu tenho que voltar porque eu sei... que eu tenho deixado traço, que eu tenho encontrado, sem nenhuma correlação que permite este esvaziamento para ser unido a um esvaziamento geral de traços na configuração, alguém tem verdadeiramente, e bem, apagado o traço como, então estou certo que estou lidando com um sujeito real” (24 de janeiro 1962, p.3). Este pode ser Sexta Feira que primeiro aparece como um sujeito para Robinson Crusoé e seria suportado pelos comentários de Lacan que “o que o sujeito está fazendo desaparecer é sua própria passagem como sujeito” (ibid). E então, numa maneira tipicamente neurótica, remanescente do Homem dos Ratos, movendo a pedra para trás no caminho da carruagem de sua amada, caminho no qual poderia passar, que o apagamento do traço é composto por uma tentativa que o ato de apagar faria: Lacan diz “o desaparecimento é redobrado pelo desaparecimento que é desejado, no qual o ato por si mesmo está fazendo desaparecer”(ibid). Lacan argumenta depois no Seminário que “o neurótico quer retransformar o significante naquilo que o signo é... quer apagar o apagamento, ele quer trazer isso como se isso não tivesse acontecido. Este é o mais profundo significado do breve comportamento exemplar do obsessivo. Entretanto, na narrativa do livro de Daniel Defoe, não é Sexta Feira, mas Robinson Crusoé que vem aparecer como sujeito, com a pegada operando como traço unário no lugar daquilo que ele estaria confirmando como um sujeito humano, naquele momento em que ele lê a pegada como um significante de um outro sujeito, então “o traço unário que uma vez foi destacado, faz o sujeito aparecer como aquele que conta – no duplo sentido do termo” (28 de março 1962, p 5).. 5.. CONCLUSÕES A lição para ser tirada da ambigüidade, no exemplo de Lacan da produção do traço unário; ainda que seja Robinson Crusoé ou Sexta Feira, que é constituído como um sujeito no caminho desse apagamento do traço, sendo o material da negação operando na areia – é a emergência de um sujeito que está intimamente atado com a emergência de outro e essa emergência de um sujeito está intimamente ligado ao objeto do Outro (que muita vezes causa ansiedade se chega muito perto). Um independente e auto-. Encontro: Revista de Psicologia • Vol. XI, Nº. 16, Ano 2007 • p. 7-23. 21.

(16) 22. Identificação: Significantes, negação e o traço unário no Seminário IX. suficiente Robinson Crusoé é muito mais uma fantasia sobre a burguesia individual como uma idéia de identidade e, alguma coisa discreta e auto identificável. A função de contar novamente mostra-nos como ciúmes é uma função de identificação, isto requer que o neurótico normal seja excluído do significante, mais do que destacá-lo, como o perverso faz, para contar-se nele. Como Lacan põe ciúmes, “ciúmes, sexualidade ciumenta, requer que o sujeito saiba como contar”. (20 de Junho de 1962, p.11) Para Lacan a repetição de significantes, longe de operar como uma garantia de auto identidade, solapa isso, e então a identificação simbólica deveria ser tratada como uma prática que, dentro disto, teria sempre uma possibilidade de excesso de identificação. O cálculo de Lacan da identificação não tenta selar a si mesmo daquilo que é diferente, ao invés disto o significante tem uma fecundidade, porque nunca é um caso idêntico ao mesmo (6 de Dezembro de 1961, p.4), e a repetição do significante produz diferença, ao invés de ser simplesmente tautológica. Então, o traço unário pode somente aparecer através de um ato de negação, e este traço então marca o sujeito como um sujeito que conta, mas conta a si mesmo fora da cadeia de significantes – este é um sujeito barrado do inconsciente – e então se torna possível pra o sujeito ser representado pelo significante para outro significante.. REFERÊNCIAS Dunker, C. (2006) ‘Lacan: “Style is the man himself”’, The Letter: Lacanian Perspectives on Psychoanalysis 31: 120-143 Freud, S. (1921) Group Psychology and the Analysis of the Ego, J. Strachey (ed.) The Standard Edition of the Complete Psychological Works of Sigmund Freud, Vol. 18. London: The Hogarth Press and the Institute of Psycho-Analysis, pp. 65-143. Freud, S. (1925) ‘Negation’, J. Strachey (ed.) The Standard Edition of the Complete Psychological Works of Sigmund Freud, Vol. 19. London: The Hogarth Press and the Institute of PsychoAnalysis, pp. 233-239. Heidegger, M. (1962[1927]) Being and Time. Oxford: Basil Blackwell. Himes, M. (2005) ‘What’s in a name? Reflections on a Lacanian perspective’, Journal for Lacanian Studies 3(2): 209-221. Hyppolite, J. (2006[1956] ‘A spoken commentary on Freud’s “Verneinung”, in Lacan, J. (2006) Écrits: The First Complete Edition in English (translated with notes by Bruce Fink in collaboration with Héloïse Fink and Russell Grigg). New York: W. W. Norton & Co. Lacan, J. (1938) ‘Family complexes in the formation of the individual’ (translated by Cormac Gallagher from Lacan’s article ‘La Famille’, Encyclopédie francaise (A. de Monzie, Editor), vol. 8. Lacan, J. (1960-61) The Seminar of Jacques Lacan, Book VIII: Transference (translated by Cormac Gallagher from unedited French manuscripts).. Encontro: Revista de Psicologia • Vol. XI, Nº. 16, Ano 2007 • p. 7-23.

(17) Ian Parker. Lacan, J. (1961-62) The Seminar of Jacques Lacan, Book IX: Identification (translated by Cormac Gallagher from unedited French manuscripts). Lacan, J. (1962-63) The Seminar of Jacques Lacan, Book X, Anxiety (translated by Cormac Gallagher from unedited French manuscripts). Lacan, J. (1974[1973]) The Four Fundamental Concepts of Psyco-Analysis (translated by Alan Sheridan, edited by Jacques-Alain Miller). Harmondsworth: Penguin. Lacan, J. (1988a[1946]) ‘Logical time and the assertion of anticipated certainty: A new sophism’ (translated by B. Fink and M. Silver), Newsletter of the Freudian Field, 2, pp. 4-22. Lacan, J. (1988b[1953-54]) The Seminar, Book I: Freud’s Papers on Technique (translation and notes by J. Forrester), J.-A. Miller (ed.). Cambridge: Cambridge University Press. Lévi-Strauss, C. (1963[1962]) Totemism Today. Boston: Beacon Books. Lévi-Strauss, C. (1966[1962]) The Savage Mind. London: Weidenfeld and Nicolson. Saussure, F. de (1974[1915]) Course in General Linguistics. Glasgow: Fontana/Collins. Shingu, K. (2005) ‘Freud, Lacan and Japan’, The Letter: Lacanian Perspectives on Psychoanalysis 34: 48-62.. Encontro: Revista de Psicologia • Vol. XI, Nº. 16, Ano 2007 • p. 7-23. 23.

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